Difference between revisions of "Salmos"

From Biblia: Os Quatro Evangelhos e os Salmos
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66(65)'''Hino de ação de graças'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;''Ao diretor. Cântico. Salmo''.
 
 
 
Aclamai a Deus, terra inteira<ref name="ftn350">Este é um salmo coletivo de ação de graças. A primeira parte é um hino recordando os prodígios realizados por Deus em tempos antigos (vv. 1-7). É aqui que se encontra a garantia de segurança frente aos inimigos. A ação de graças coletiva (vv. 8-12) volta a lembrar a vitória alcançada numa batalha. Outra parte de ação de graças aparece na primeira pessoa do singular, embora esteja envolvida pelo sentido coletivo que principalmente marca as duas partes anteriores (vv. 13-20).</ref>,
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;@</nowiki>:cantai a glória do seu nome,
 
 
:dai-lhe glória e louvor!
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;Dizei a Deus: «Como são prodigiosas as tuas obras!
 
 
:Pelo teu grande poder,
 
 
:os teus inimigos curvam-se diante de ti.
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Toda a terra te adora e canta,
 
 
:canta hinos ao teu nome».''Pausa''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;Vinde e vede as maravilhas de Deus,
 
 
:prodígios espantosos em favor dos seres humanos.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Transformou o mar em terra firme,
 
 
:e atravessaram o rio a pé enxuto<ref name="ftn351">A travessia do Mar Vermelho e a travessia do Jordão para entrar na terra prometida servem frequentemente para recordar e resumir para os hebreus todo o passado prodigioso que Deus lhes providenciou (cf. Sl 74,15; 114,3.5; Ex 14,16; Js 3,13; Is 44,27; 50,2).</ref>.
 
 
:Por isso, nos alegramos nele.
 
 
<span style="color:red"><sup>7</sup></span>&nbsp;Da sua fortaleza eterna governa o mundo;
 
 
:os seus olhos vigiam os povos,
 
 
:para que os rebeldes não se levantem contra Ele.''Pausa''
 
 
<span style="color:red"><sup>8</sup></span>&nbsp;Bendizei, ó povos, o nosso Deus;
 
 
:fazei ressoar a voz do seu louvor.
 
 
<span style="color:red"><sup>9</sup></span>&nbsp;Foi Ele que manteve a nossa alma em vida
 
 
:e não permitiu que os nossos pés resvalassem<ref name="ftn352">Se alguma referência a experiências históricas se pode dar como implícita neste texto, poderia ser a das ameaças dos assírios relatadas em 2Rs 18,13-19,26; Is 36,1-37,37.</ref>.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>10</sup></span>&nbsp;Sim, Tu nos puseste à prova, ó Deus<ref name="ftn353">As metáforas usadas nos vv. 10-12 fazem parte dos recursos literários frequentes na Bíblia para descrever experiências de sofrimento e de catástrofe.</ref>,
 
 
:e nos purificaste como se purifica a prata.
 
 
<span style="color:red"><sup>11</sup></span>&nbsp;Fizeste-nos cair na armadilha,
 
 
:puseste um pesado fardo às nossas costas.
 
 
<span style="color:red"><sup>12</sup></span>&nbsp;Deixaste que cavalgassem sobre as nossas cabeças,
 
 
:passámos pelo fogo e pela água,
 
 
:mas fizeste-nos sair para o reconforto<ref name="ftn354">As traduções desde a antiguidade e as edições críticas dividem-se entre aceitar o texto consonântico hebraico como está agora (''rwyh'') ou pressupondo uma ligeira diferença inicial (''rwḥh''). Os matizes semânticos partilhados pelas duas leituras apontam para ''largueza, folga, respiração, satisfação''. Qualquer destes matizes servem como solução para a experiência negativa anteriormente relatada.</ref>.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>13</sup></span>&nbsp;Entrarei na tua casa com holocaustos<ref name="ftn355">Desde aqui até ao fim do salmo o texto está centrado numa única pessoa que fala em nome próprio. Faz sentido que quem toma de ora em diante a palavra seja uma personagem com capacidade de continuar a representar os interesses comuns de todo o povo. Há quem pense que a figura do rei Ezequias poderia ser significativa para assumir esta representação. Verifica-se, com efeito, que nos salmos o foco de interesse se desloca naturalmente entre o que interessa ao povo e o que diz respeito ao rei.</ref>,
 
 
:cumprirei as promessas que te fiz.
 
 
<span style="color:red"><sup>14</sup></span>&nbsp;São promessas que meus lábios proferiram,
 
 
:palavras da minha boca, quando estava em aflição.
 
 
<span style="color:red"><sup>15</sup></span>&nbsp;Hei de oferecer-te animais gordos em holocausto;
 
 
:com o fumo dos sacrifícios de carneiros,
 
 
:apresentarei novilhos e cabritos.''Pausa''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>16</sup></span>&nbsp;Vinde e escutai, todos vós que temeis a Deus;
 
 
:vou contar-vos aquilo que Ele fez por mim.
 
 
<span style="color:red"><sup>17</sup></span>&nbsp;Com a minha boca clamei por Ele,
 
 
:e o seu louvor estava já na minha língua.
 
 
<span style="color:red"><sup>18</sup></span>&nbsp;Se, em meu coração, eu visse maldade,
 
 
:o Senhor não me teria escutado.
 
 
<span style="color:red"><sup>19</sup></span>&nbsp;No entanto, Deus escutou-me,
 
 
:atendeu ao clamor da minha súplica.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>20</sup></span>&nbsp;Bendito seja Deus que não recusou a minha oração
 
 
:nem a sua misericórdia para comigo.
 
 
 
67(66)'''Convite ao louvor de Deus'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;''Ao diretor. Com instrumentos de corda. Salmo. Cântico''.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;Que Deus se compadeça de nós e nos abençoe<ref name="ftn356">Este é um salmo coletivo de ação de graças. É possível que esta ação de graças estivesse integrada num cântico próprio da festa das colheitas, uma vez que refere os produtos da terra como o sinal da bênção de Deus (vv. 7-8). No final do salmo e como é frequente neste género, a atenção amplia-se na contemplação da soberania de Deus sobre o mundo inteiro. É o processo natural de alargamento do olhar que a atitude de oração desenvolve. A referência sublinhada aos outros povos pode ter a ver com memórias de guerras passadas e celebradas na literatura bíblica, como é, por exemplo, a relatada em 2Rs 19, ou simplesmente como a maneira de proclamar a soberania de Deus sobre todo o mundo.</ref>
 
 
:e mostre para connosco o seu rosto luminoso<ref name="ftn357">Este v. serve-se de uma fórmula tradicional de bênção usada na liturgia (cf. Ex 6,24-26).</ref>.''Pausa''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;Que sejam conhecidos na terra os teus caminhos
 
 
:e em todas as nações, a tua salvação<ref name="ftn358">Os caminhos de Deus são os padrões e princípios de comportamento que devem ser seguidos e também os modos que Deus tem de intervir no mundo e na história. A sua salvação são as vitórias e os êxitos que Ele garante àqueles a quem ajuda.</ref>!
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Que os povos te louvem, ó Deus!
 
 
:Todos os povos te louvem!
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;Alegrem-se e exultem as nações,
 
 
:porque julgas os povos com retidão<ref name="ftn359">O que justifica a soberania de Deus proclamada sobre o mundo é o facto de essa soberania se traduzir no reconhecimento e na gestão equitativa dos interesses e direitos de cada povo.</ref>
 
 
:e governas as nações sobre a terra.''Pausa''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Que os povos te louvem, ó Deus!
 
 
:Todos os povos te louvem!
 
 
 
<span style="color:red"><sup>7</sup></span>&nbsp;A terra produziu o seu fruto.
 
 
:Deus, o nosso Deus, nos abençoa.
 
 
<span style="color:red"><sup>8</sup></span>&nbsp;Que Deus nos abençoe,
 
 
:e que o temam todos os confins da terra.
 
 
 
68(67)''' Cântico triunfal'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;''Ao diretor. De David. Salmo. Cântico''.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;Deus levanta-se: os seus inimigos dispersam-se<ref name="ftn360">Este salmo parece claramente um salmo coletivo de ação de graças. O que nele aparece como motivo para o agradecimento não são tanto ajudas individualizadas e concretas. É, antes, uma síntese de todos os benefícios realizados por Deus em favor de Israel ao longo da sua história. Esta espécie de epopeia religiosa da história de Israel poderia eventualmente servir como hino especial para uma festa de celebração da aliança. Daí o facto de aparecerem bem sublinhadas as referências ao Sinai e as repercussões benéficas que a proteção de Deus garante para a vida quotidiana dos israelitas.</ref>
 
 
:e fogem diante dele os que o odeiam.
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;Como se dissipa o fumo, assim eles se dissipam;
 
 
:como a cera se derrete junto do fogo,
 
 
:assim perecem os malfeitores diante de Deus.
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Mas os justos alegram-se e rejubilam;
 
 
:na presença de Deus exultam de alegria.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;Cantai a Deus, entoai hinos ao seu nome,
 
 
:abri caminho àquele que cavalga sobre os desertos.
 
 
:Pois o seu nome é Senhor! Exultai na sua presença.
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Pai dos órfãos e defensor das viúvas
 
 
:é o Deus que habita no seu santuário.
 
 
<span style="color:red"><sup>7</sup></span>&nbsp;Deus faz regressar a casa os que vivem sós
 
 
:e faz sair os prisioneiros em liberdade,
 
 
:mas os rebeldes ficarão em terra árida.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>8</sup></span>&nbsp;Quando saíste à frente do teu povo, ó Deus<ref name="ftn361">O texto dos vv. 8-10 está composto a imitar de algum modo o do cântico de Débora em Jz 5,4s.</ref>,
 
 
:e caminhavas através do deserto,
 
 
<span style="color:red"><sup>9</sup></span>&nbsp;a terra tremia e os céus gotejavam
 
 
:na presença de Deus, o do Sinai,
 
 
:na presença de Deus, o Deus de Israel.
 
 
<span style="color:red"><sup>10</sup></span>&nbsp;Fizeste cair, ó Deus, a chuva com abundância;
 
 
:e restituíste o vigor à tua herança enfraquecida.
 
 
<span style="color:red"><sup>11</sup></span>&nbsp;As tuas criaturas<ref name="ftn362">Lit.: ''o teu vivente'', no sentido coletivo.</ref> voltaram à terra,
 
 
:que, na tua bondade, ó Deus, preparaste para o pobre.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>12</sup></span>&nbsp;O Senhor proclama um oráculo,
 
 
:as boas novas de um grande exército:
 
 
<span style="color:red"><sup>13</sup></span>&nbsp;«Os reis dos exércitos fogem, fogem,
 
 
:e uma dona de casa reparte os despojos.
 
 
<span style="color:red"><sup>14</sup></span>&nbsp;Será que podeis ficar descansados entre os rebanhos<ref name="ftn363">Possível referência ao texto de Jz 5,16.</ref>,
 
 
:com asas de pomba<ref name="ftn364">A pomba é uma imagem que aparece como representando o próprio Israel (Sl 74,19; Os 7,11). Os despojos de combate servem para eles se ornamentarem (Js 22,8; Jz 8,48-49).</ref> cobertas de prata
 
 
:e as suas penas, de ouro fino?
 
 
 
<span style="color:red"><sup>15</sup></span>&nbsp;Quando o Todo Poderoso<ref name="ftn365">Lit.: ''chadday''. Como nome de Deus, El-Chadai era usado com frequência no tempo dos patriarcas (Gn 17,1; 49,25). As traduções costumam substitui-lo por nomes equivalentes, tais como ''Todo Poderoso'', ''Soberano'', etc..</ref> dispersava os reis,
 
 
:um nevão caía sobre o monte Salmon<ref name="ftn366">Salmon é um monte de localização hoje desconhecida que deveria estar localizado a norte da margem oriental do rio Jordão.</ref>».
 
 
 
<span style="color:red"><sup>16</sup></span>&nbsp;Ó montanha elevada<ref name="ftn367">Lit.: ''Montanha de Deus''. Esta expressão é usada em hebraico com sentido de superlativo.</ref>, montanha de Basan<ref name="ftn368">A montanha de Basan, situada na região norte da margem oriental do Jordão, era conhecida pela sua produtividade. Este destaque faz com que Basan apareça com muita frequência referenciada na literatura bíblica.</ref>!
 
 
:Montanha escarpada, montanha de Basan!
 
 
<span style="color:red"><sup>17</sup></span>&nbsp;Ó montes escarpados, por que razão invejais
 
 
:a montanha que Deus desejou para sua morada<ref name="ftn369">O monte Sião é a montanha desejada por Deus para sua morada.</ref>?
 
 
:Contudo, o Senhor há de habitar nela eternamente.
 
 
<span style="color:red"><sup>18</sup></span>&nbsp;Os carros de Deus<ref name="ftn370">Na Bíblia são famosos os carros de Salomão (1Rs 10,26), mas a alusão mais provável aqui deve ser aos carros divinos da visão de Eliseu (2Rs 6,17; Is 66,15).</ref> são milhares<ref name="ftn371">Lit.: ''duas'' ''miríades.''</ref> de esquadrões cintilantes;
 
 
:neles vem o Senhor do Sinai para o santuário<ref name="ftn372">O texto hebraico atual significaria: ''O Senhor está neles, o Sinai é no santuário. ''É possível ver aqui indícios de releitura posterior, tendente a sublinhar que Sião é o Sinai, no sentido de valorizar a festa de Pentecostes como festa da entrega da Lei.</ref>.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>19</sup></span>&nbsp;Tu subiste às alturas, levando contigo prisioneiros;
 
 
:recebeste homens, mesmo rebeldes, como tributo,
 
 
:para ali habitares, ó Senhor e Deus.
 
 
<span style="color:red"><sup>20</sup></span>&nbsp;Bendito seja o Senhor, dia após dia;
 
 
:Ele cuida de nós, é o Deus da nossa salvação.''Pausa''
 
 
<span style="color:red"><sup>21</sup></span>&nbsp;Ele é o nosso Deus, é o Deus para a salvação.::É pelo Senhor, nosso Deus<ref name="ftn373">Lit.: ''Adonai.''</ref>,
 
 
:que é possível escapar da morte.
 
 
<span style="color:red"><sup>22</sup></span>&nbsp;Pois Deus esmaga a cabeça dos seus inimigos,
 
 
:o crânio dos que persistem nas suas culpas.
 
 
<span style="color:red"><sup>23</sup></span>&nbsp;O Senhor disse: «De Basan os farei voltar,
 
 
:farei voltar das profundezas do mar<ref name="ftn374">A tradução dos LXX pressupõe um texto consonântico com uma preposição diferente, resultando numa tradução alternativa para o segundo hemistíquio: ''farei voltar às profundezas do mar''. Como se refere a uma maneira de tratar os inimigos, a alternativa faz sentido.</ref>.
 
 
<span style="color:red"><sup>24</sup></span>&nbsp;Assim molharás os pés no seu sangue
 
 
:e a língua dos teus cães terá os inimigos como ração».
 
 
<span style="color:red"><sup>25</sup></span>&nbsp;Eles viram, ó Deus, os teus cortejos triunfais,
 
 
:os cortejos do meu Deus e rei no santuário.
 
 
<span style="color:red"><sup>26</sup></span>&nbsp;Os cantores vão na frente, os músicos atrás,
 
 
:no meio, as donzelas tocando pandeiretas.
 
 
<span style="color:red"><sup>27</sup></span>&nbsp;Bendizei a Deus nas assembleias,
 
 
:bendizei o Senhor, nas solenidades<ref name="ftn375">Lit.: ''nas convocatórias'', porque as solenidades eram objeto de uma «convocatória» e foi esta designação que ficou no texto hebraico.</ref> de Israel.
 
 
<span style="color:red"><sup>28</sup></span>&nbsp;Ali vai Benjamim, o mais novo, a comandar os outros;
 
 
:depois, os chefes de Judá, com os seus grupos<ref name="ftn376">Ou: ''em duas filas''. Benjamim e Judá seguem na frente do cortejo, uma vez que fazem parte do Reino do Sul, onde o templo se encontra integrado (Js 15,8-63; 18,16; Jz 1,21). Zabulão e Neftali são duas tribos situadas na região setentrional do Reino do Norte, ou Samaria (Jz 4,6; Is 8,23).</ref>,
 
 
:os chefes de Zabulão e os chefes de Neftali<ref name="ftn377">Numa festa da Páscoa do tempo de Ezequias é referida a presença das tribos do Norte (2Cr 30).</ref>.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>29</sup></span>&nbsp;Impõe claramente o teu poder, ó meu Deus<ref name="ftn378">Esta tradução pressupõe cortar diferentemente o texto hebraico de ''’lhyk ''como ''’elohay kî''. Este ''kî'' tem função de ênfase, significando ''claramente'', como o termo ''zû ''da segunda parte do v.. </ref>,
 
 
:o poder com que intervieste em nosso favor, ó Deus.
 
 
<span style="color:red"><sup>30</sup></span>&nbsp;Do teu santuário, em Jerusalém,
 
 
:onde os reis virão oferecer-te presentes<ref name="ftn379">Cf. Is 60,1-14; Ag 2,7-10; Tb 13,11.</ref>,
 
 
<span style="color:red"><sup>31</sup></span>&nbsp;domina a fera dos canaviais,
 
 
:a manada de touros e povos como novilhos.
 
 
Eles rebaixam-se perante bocados de prata<ref name="ftn380">Vários termos hebraicos deste v. têm levantado dificuldades de tradução desde a antiguidade.</ref>.
 
 
:Dispersa as nações que desejam a guerra!
 
 
<span style="color:red"><sup>32</sup></span>&nbsp;Do Egito chegarão ricos presentes
 
 
:e a Etiópia acorrerá, estendendo as mãos para Deus.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>33</sup></span>&nbsp;Cantai a Deus, ó reinos da terra,
 
 
:entoai hinos ao Senhor!''Pausa''
 
 
<span style="color:red"><sup>34</sup></span>&nbsp;Ele cavalga pelos céus, os céus de outrora,
 
 
:e faz ouvir a sua voz, uma voz poderosa.
 
 
<span style="color:red"><sup>35</sup></span>&nbsp;Reconhecei o poder de Deus<ref name="ftn381">Lit.: ''Dai a Deus o poder.''</ref>!
 
 
:A sua majestade resplandece sobre Israel,
 
 
:e o seu poder na vastidão das nuvens.
 
 
<span style="color:red"><sup>36</sup></span>&nbsp;Deus é prodigioso, desde o seu santuário<ref name="ftn382">Tal como no v. 29, também aqui o conjunto consonântico hebraico ''mmqdchyk ''deveria ser cortado como'' mimmiqedachyô ''(''do seu santuário''), lendo o ''kî ''restante como ''pois'', a iniciar a frase seguinte.</ref>.
 
 
:Pois é Ele o Deus de Israel que dá força e vigor ao seu povo.
 
 
:Bendito seja Deus!
 
 
 
69(68)'''Oração do justo aflito'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;''Ao diretor. Pela melodia ''«''Os lírios''»''. De David''.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;Salva-me, ó Deus<ref name="ftn383">Neste salmo individual de súplica, o salmista lamenta o sofrimento que tem de suportar por causa de Deus e pede-lhe proteção contra os inimigos, prometendo agradecer essa ajuda. As tonalidades sapienciais de meditação que aqui se encontram contêm conotações análogas a algumas passagens de Job. Tem igualmente semelhanças com o Sl 22. Tendo em conta a maneira como as releituras cristãs do messianismo valorizaram o sofrimento do justo, é natural verificar que este salmo foi muito apreciado por parte dos primeiros cristãos. Como em muitos outros salmos, verifica-se também aqui uma referência à restauração do povo, a servir de conclusão. Isto pode sugerir que a data de composição do salmo é posterior ao exílio ou também que o tema importante da restauração foi sendo introduzido como complemento e atualização em textos de oração de época anterior.</ref>,
 
 
:porque as águas me chegam até ao pescoço<ref name="ftn384">As situações de grande ameaça e sofrimento são expressas com metáforas derivadas dos mitos do caos e do mar. Cf. Sl 12,5.</ref>.
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;Estou a afundar-me num lamaçal profundo,
 
 
:não tenho ponto de apoio.
 
 
Entrei em águas profundas,
 
 
:e a corrente arrasta-me.
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Estou esgotado de tanto gritar,
 
 
:e a minha garganta está rouca;
 
 
consomem-se já os meus olhos
 
 
:de tanto esperar o meu Deus.
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;São mais que os cabelos da minha cabeça
 
 
:aqueles que injustamente me odeiam.
 
 
São poderosos os que me querem destruir,
 
 
:os inimigos que mentem contra mim.
 
 
Terei eu então de restituir
 
 
:aquilo que não roubei?
 
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Ó Deus, Tu conheces a minha insensatez,
 
 
:e as minhas faltas não te são ocultas.
 
 
<span style="color:red"><sup>7</sup></span>&nbsp;Não sejam confundidos por minha causa
 
 
:os que esperam em ti, Senhor, Senhor dos exércitos.
 
 
Que não fiquem envergonhados por minha causa
 
 
:aqueles que te procuram, ó Deus de Israel.
 
 
<span style="color:red"><sup>8</sup></span>&nbsp;Por causa de ti, tenho suportado insultos,
 
 
:o meu rosto cobriu-se de vergonha.
 
 
<span style="color:red"><sup>9</sup></span>&nbsp;Tornei-me estranho para os meus irmãos,
 
 
:um estrangeiro para os filhos da minha mãe.
 
 
<span style="color:red"><sup>10</sup></span>&nbsp;Pois a paixão pela tua casa me consome<ref name="ftn385">Lit.: ''O ciúme da tua casa me consome. ''Antigos comentadores entendem aqui os ciúmes que os estrangeiros sentem do salmista por causa do santuário. O sentido de paixão como sentimento do próprio salmista é mais verosímil.</ref><nowiki>;</nowiki>
 
 
:os insultos dos que te insultam caíram sobre mim.:
 
 
<span style="color:red"><sup>11</sup></span>&nbsp;Mortifico a minha alma com jejuns,
 
 
:e até isso provoca mais insultos contra mim.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>12</sup></span>&nbsp;Se me visto de luto,
 
 
:sou para eles objeto de escárnio.
 
 
<span style="color:red"><sup>13</sup></span>&nbsp;Murmuram contra mim, sentados à porta da cidade
 
 
:e entoam cantigas contra mim, bebendo vinho.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>14</sup></span>&nbsp;Mas eu dirijo a ti a minha oração,
 
 
:ó Senhor, no tempo favorável.
 
 
Responde-me, ó Deus, pela tua grande misericórdia,
 
 
:pela fidelidade da tua salvação.
 
 
<span style="color:red"><sup>15</sup></span>&nbsp;Retira-me do lodo, para que não me afunde!
 
 
:Livra-me dos que me odeiam e das águas profundas!
 
 
<span style="color:red"><sup>16</sup></span>&nbsp;Não me cubram as ondas, nem me engula o abismo;
 
 
:que a boca do poço não se feche sobre mim.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>17</sup></span>&nbsp;Responde-me, Senhor, pois a tua misericórdia é bondosa;
 
 
:volta-te para mim, pela tua grande compaixão.
 
 
<span style="color:red"><sup>18</sup></span>&nbsp;Não escondas a tua face deste teu servo;
 
 
:responde-me depressa, porque estou angustiado.
 
 
<span style="color:red"><sup>19</sup></span>&nbsp;Aproxima-te da minha alma e liberta-a,
 
 
:resgata-me, por causa dos meus inimigos.
 
 
<span style="color:red"><sup>20</sup></span>&nbsp;Tu bem conheces o meu opróbrio,
 
 
:a minha desilusão e vergonha;
 
 
:tens bem presentes os que me perseguem.
 
 
<span style="color:red"><sup>21</sup></span>&nbsp;O insulto despedaçou-me o coração até desfalecer:
 
 
:esperei compaixão, mas não havia;
 
 
:esperei por quem me confortasse e não encontrei.
 
 
<span style="color:red"><sup>22</sup></span>&nbsp;Colocaram fel na minha comida;
 
 
:e, quando tive sede, deram-me vinagre a beber.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>23</sup></span>&nbsp;Que a sua mesa seja para eles uma armadilha
 
 
:e uma cilada para os seus amigos.
 
 
<span style="color:red"><sup>24</sup></span>&nbsp;Que a vista se lhes escureça e não vejam,
 
 
:e que os seus rins fraquejem sem cessar.
 
 
<span style="color:red"><sup>25</sup></span>&nbsp;Descarrega sobre eles a tua indignação;
 
 
:que o furor da tua ira os atinja.
 
 
<span style="color:red"><sup>26</sup></span>&nbsp;Que o seu acampamento seja um deserto,
 
 
:e não haja quem habite nas suas tendas.
 
 
<span style="color:red"><sup>27</sup></span>&nbsp;Pois perseguem aqueles que Tu castigaste
 
 
:e acrescentam o sofrimento daqueles que feriste.
 
 
<span style="color:red"><sup>28</sup></span>&nbsp;Coloca mais culpa sobre a sua culpa;
 
 
:e não tenham acesso à tua justiça.
 
 
<span style="color:red"><sup>29</sup></span>&nbsp;Sejam riscados do livro dos vivos
 
 
:e não sejam inscritos na lista dos justos.
 
 
<span style="color:red"><sup>30</sup></span>&nbsp;Mas a mim, triste e aflito,
 
 
:que a tua salvação, ó Deus, me restabeleça.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>31</sup></span>&nbsp;Louvarei, com cânticos, o nome de Deus
 
 
:e proclamarei a sua grandeza como ação de graças.
 
 
<span style="color:red"><sup>32</sup></span>&nbsp;Isso agradará mais a Deus que o sacrifício de um touro
 
 
:ou de um novilho já com chifres e cascos.:
 
 
<span style="color:red"><sup>33</sup></span>&nbsp;Que os humildes vejam; e se alegrem os que buscam a Deus.
 
 
:Que o vosso coração recupere a vida!
 
 
<span style="color:red"><sup>34</sup></span>&nbsp;Pois o Senhor escuta os necessitados
 
 
:e não despreza o seu povo de prisioneiros.
 
 
<span style="color:red"><sup>35</sup></span>&nbsp;Que o louvem os céus e a terra,
 
 
:os mares e tudo quanto neles se movimenta.
 
 
<span style="color:red"><sup>36</sup></span>&nbsp;Sim, Deus há de salvar Sião
 
 
:e reconstruir as cidades de Judá.
 
 
:Eles ali habitarão e tomarão posse dela.
 
 
<span style="color:red"><sup>37</sup></span>&nbsp;Os filhos dos seus servos recebê-la-ão em herança,
 
 
:e os que amam o seu nome hão de ali morar.::
 
 
 
70(69)'''Pedido de auxílio'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;''Ao diretor. De David. Em memorial''.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;Ó Deus<ref name="ftn386">Este salmo individual de súplica retoma essencialmente os temas e a forma literária que integram a parte final do Sl 40,14-18 (cf. notas seguintes). A separação desta parte deveu-se provavelmente ao facto de constituir uma oração perfeita para pedir auxílio a Deus. O primeiro v. é utilizado na liturgia para dar início a todas as horas canónicas.</ref>, vem socorrer-me<ref name="ftn387">Ao copiar-se esta parte do Sl 40,14-18, ficou de fora o imperativo inicial: “''Digna-te”''.</ref>,
 
 
:vem depressa em meu auxílio.
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;Sejam confundidos e cobertos de vergonha
 
 
:os que procuram tirar-me a vida.
 
 
Retrocedam e corem de vergonha
 
 
:os que desejam a minha desgraça.
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Retirem-se<ref name="ftn388">O Sl 40,16 diz: ''fiquem desolados.''</ref> cobertos de vergonha
 
 
:aqueles que escarnecem<ref name="ftn389">O Sl 40,16 acrescenta: ''contra mim.''</ref>: «Olha! Olha!».
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;Alegrem-se e rejubilem por ti
 
 
:todos aqueles que te procuram.
 
 
E proclamem sem cessar: «Deus<ref name="ftn390">No Sl 40,17, em vez de ''Deus'', é usado o nome de Javé (''Senhor'').</ref> é grande!»
 
 
:aqueles que amam a tua salvação.
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Eu sou pobre e necessitado;
 
 
:ó Deus<ref name="ftn391">O Sl 40,18 usa aqui ''Senhor'' (''Adonai'').</ref>, vem até mim depressa<ref name="ftn392">O Sl 40,18 diz: ''cuida de mim''.</ref>!:
 
 
Tu és o meu auxílio e a minha libertação.
 
 
:Ó Senhor<ref name="ftn393">O Sl 40,18 usa: ''meu Deus''.</ref>, não tardes!
 
 
 
71(70)'''Súplica de um ancião'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;Em ti, Senhor, me refugio<ref name="ftn394">Este salmo individual de súplica descreve a situação de alguém que se encontra sujeito a dolorosas perseguições, mas reafirma toda a sua confiança em Deus. Devido talvez a este clima de confiança, verificamos que neste salmo não aparecem os ataques contra os inimigos que habitualmente se encontram em textos deste género. A imagem do salmista é a de um piedoso ancião (vv. 9 e 18), cuja vida se desenrolou no cumprimento dos seus deveres religiosos. Este salmo não apresenta em título nenhuma das referências que constam habitualmente no texto hebraico. Em contrapartida, na tradução grega dos LXX está escrito como título: ''De David. Dos filhos de Jonadab e primeiros exilados''.</ref>.
 
 
:Que eu nunca mais seja confundido.
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;Pela tua justiça livra-me e protege-me;
 
 
:inclina para mim os teus ouvidos e salva-me.
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;Sê para mim um rochedo de refúgio,
 
 
:onde eu possa acolher-me sempre.
 
 
Tu decidiste salvar-me,
 
 
:pois és a minha rocha e fortaleza.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Meu Deus, livra-me da mão do malfeitor,
 
 
:das garras do opressor e do violento.
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;Senhor, Tu és a minha esperança;
 
 
:és a minha confiança, desde a juventude, ó Senhor.
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Em ti me apoio desde o ventre materno,
 
 
:desde o seio de minha mãe Tu és meu protetor<ref name="ftn395">O termo hebraico entendido como pertencendo à raiz ''gzz ''poderia significar como ''o que corta o cordão umbilical'', oferecendo ao recém-nascido o primeiro acolhimento. O termo paralelo no Sl 22,10 também não é muito mais claro. Nos textos de Qumrân foi lido com ‘''ozzî ''(''minha força''). Não se trata da mesma raiz, mas serve como perceção de sentido segundo o contexto.</ref><nowiki>;</nowiki>
 
 
:para ti vai sempre o meu louvor.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>7</sup></span>&nbsp;Para muitos sou motivo de admiração,
 
 
:porque Tu és o meu refúgio seguro.
 
 
<span style="color:red"><sup>8</sup></span>&nbsp;A minha boca está cheia dos teus louvores;
 
 
:todo o dia proclamo a tua magnificência.
 
 
<span style="color:red"><sup>9</sup></span>&nbsp;Não me rejeites no tempo da velhice,
 
 
:não me abandones, quando se me acabam as forças.
 
 
<span style="color:red"><sup>10</sup></span>&nbsp;Os meus inimigos falam contra mim
 
 
:e entre si conspiram os que espiam a minha vida.
 
 
<span style="color:red"><sup>11</sup></span>&nbsp;Eles dizem: «Deus abandonou-o.
 
 
:Persigam-no e agarrem-no,
 
 
:pois não há quem o salve».
 
 
 
<span style="color:red"><sup>12</sup></span>&nbsp;Ó Deus, não te afastes de mim!
 
 
:Meu Deus, vem depressa socorrer-me.
 
 
<span style="color:red"><sup>13</sup></span>&nbsp;Sejam confundidos e destruídos
 
 
:aqueles que atentam contra a minha vida.
 
 
Cubram-se de opróbrio e vergonha
 
 
:os que procuram a minha desgraça.
 
 
<span style="color:red"><sup>14</sup></span>&nbsp;Eu, porém, esperarei continuamente
 
 
:e proclamarei ainda mais o teu louvor.
 
 
<span style="color:red"><sup>15</sup></span>&nbsp;A minha boca anunciará a tua justiça<ref name="ftn396">Colocar em paralelo o conceito de justiça e o de salvação significa que se está a sublinhar neste conceito a dimensão radical de generosidade e exigência, muito para além da ideia limitada de dar o seu a seu dono.</ref>
 
 
:e, todo o dia, a tua salvação,
 
 
:mesmo sem as saber contar.
 
 
<span style="color:red"><sup>16</sup></span>&nbsp;Eu entrarei nas tuas fortalezas<ref name="ftn397">O verbo ''entrar'' sugere que o contexto é o de um espaço delimitado, onde vai praticar um ato de piedade. ''As'' ''fortalezas'' é uma metáfora para indicar o templo, edifício de uma funcionalidade variada e complexa que justificava o plural, segundo o uso cananaico. A mesma relação entre ''entrar'' e ''tuas fortalezas'' reaparece, logo a seguir, no v. 18. </ref>, ó Senhor<ref name="ftn398">Lit.: ''Adonai''.</ref>,
 
 
:e recordarei, Senhor, a tua justiça que é só tua.
 
 
<span style="color:red"><sup>17</sup></span>&nbsp;Instruíste-me, ó Deus, desde a minha juventude
 
 
:e até hoje tenho anunciado as tuas maravilhas.
 
 
<span style="color:red"><sup>18</sup></span>&nbsp;Também agora, na velhice e de cabelos brancos<ref name="ftn399">Esta referência à velhice pode aplicar-se ao indivíduo orante, mas também a um Israel envelhecido. Os profetas e os textos bíblicos servem-se frequentemente destas categorias de idade como expressão do acumular histórico de esperanças, desilusões e experiências.</ref>,
 
 
:não me abandones, ó Deus,
 
 
enquanto eu anuncio a tua força<ref name="ftn400">Lit.: ''o teu braço. ''O braço é a metáfora caraterística para exprimir a intervenção de Deus realizada no êxodo.</ref> a esta geração
 
 
:e a todos os que vão entrando nas tuas fortalezas.
 
 
<span style="color:red"><sup>19</sup></span>&nbsp;A tua justiça, ó Deus, chega até às alturas,
 
 
:pois fizeste grandes coisas.
 
 
:Quem é igual a ti, ó Deus?
 
 
 
<span style="color:red"><sup>20</sup></span>&nbsp;Fizeste-me passar por grandes males e aflições;
 
 
:mas voltarás a dar-me a vida<ref name="ftn401">O texto hebraico consonântico diz: ''voltarás a dar-nos vida. ''A nota marginal massorética recomenda que se leia no singular.</ref>
 
 
:e dos abismos<ref name="ftn402">O hebraico usa, no plural, o mesmo termo que em Gn 1,2 é usado para designar o abismo ou caos inicial (''tehom''). O conceito de morte e mundo dos mortos associa todas estas conotações.</ref> da terra me erguerás de novo.
 
 
<span style="color:red"><sup>21</sup></span>&nbsp;Acrescentarás a minha dignidade,
 
 
:aproximando-te para me confortar.
 
 
<span style="color:red"><sup>22</sup></span>&nbsp;Por isso, quero louvar-te ao som da harpa,
 
 
:louvar a tua fidelidade, ó meu Deus.
 
 
Quero cantar-te ao som da cítara,
 
 
:ó santo de Israel.
 
 
<span style="color:red"><sup>23</sup></span>&nbsp;Ao cantar-te hinos, vibrarão de alegria meus lábios
 
 
:e também a minha alma que Tu resgataste.
 
 
<span style="color:red"><sup>24</sup></span>&nbsp;A minha língua recitará, todo o dia, a tua justiça,
 
 
:pois ficaram confundidos e cheios de vergonha
 
 
:os que procuravam a minha desgraça.
 
 
72(71)'''Oração pelo rei ideal'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;''De Salomão''<ref name="ftn403">Este título não significa que Salomão seja autor do salmo; significa que a imagem do grande rei ficou bem marcada na memória dos hebreus (1Rs 3,9.12.28; 4,20; 10,1-29; 1Cr 22,9). A tradição judaica e cristã viu nele a figura do messias, o qual leva também o título de Filho de David. </ref>''.''
 
 
 
Ó Deus, concede ao rei o teu modo de julgar<ref name="ftn404">Este é um salmo real que, segundo o título, é atribuído a Salomão, tal como acontece com o Sl 127. Por isso aparece com frequência utilizado em contextos messiânicos. Pode presumir-se que, pelo seu conteúdo, seja um salmo realmente composto durante o tempo da monarquia. Mas os traços bastante idealizados que o caraterizam podem também sugerir outras épocas possíveis de composição, mesmo quando Israel já não tinha reis. Segundo este salmo, as caraterísticas do rei ideal são a justiça no sentido pleno que a Bíblia lhe dá (vv. 1-4), universalidade e eternidade (vv. 5-11), cuidado dos pobres (vv. 12-15), prosperidade e esplendor (vv. 16-17). Neste sentido, o conteúdo deste salmo converge com o ideal de governação apresentado em Is 9,5; 11-15; Zc 9,9s.</ref>
 
 
:e ao filho do rei, a tua justiça,
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;para que ele julgue o teu povo na justiça
 
 
:e os teus pobres com equidade.
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;Que os montes tragam a paz ao povo<ref name="ftn405">A justiça da governação é completa, se a ela corresponder um bem-estar no mundo.</ref>
 
 
:e as colinas, a justiça.
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Que o rei tome a defesa dos humildes do povo,
 
 
:ajude os necessitados e esmague os opressores.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;Que ele possa permanecer como o Sol<ref name="ftn406">A lógica sequencial do texto faz com que este v. se deva entender como aplicado ao rei. Na verdade, a antiga tradução grega dos LXX vai nesse sentido. Para tal, costuma propor-se ler o termo hebraico ''yr’wk ''como ''y’ryk'', ''que ele prolongue'', em vez do primeiro, ''que eles te vejam''. A atual vocalização massorética daria como sentido: ''Que eles te vejam como o Sol''.</ref>
 
 
:e como a Lua, de geração em geração.
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Que ele seja como o cair da chuva sobre a relva,
 
 
:como os aguaceiros que regam a terra.
 
 
<span style="color:red"><sup>7</sup></span>&nbsp;Que em seus dias floresça o justo<ref name="ftn407">Lendo assim, o texto hebraico parece estar a sublinhar um sentido mais messiânico. As versões antigas leem ''justiça'', mantendo assim um sentido mais em aberto.</ref>
 
 
:e abundância de paz, até se acabar a Lua<ref name="ftn408">A Lua faz aqui pendão com o Sol que aparecia no v. 5. A duração de ambos os astros é o padrão de duração para o tempo messiânico.</ref>.
 
 
<span style="color:red"><sup>8</sup></span>&nbsp;Que ele domine de um ao outro mar,
 
 
:desde o rio<ref name="ftn409">Este rio deverá referir-se ao Eufrates, que era considerado como um dos pontos de referência para os limites da Palestina ideal. Cf. Jz 20,1s.</ref> até aos confins da terra.
 
 
<span style="color:red"><sup>9</sup></span>&nbsp;Diante dele se inclinem as criaturas do deserto<ref name="ftn410">A expressão ''criaturas do deserto'' designa animais ou demónios que representam uma ameaça e servem de pendão aos outros inimigos (Is 13,21; 34,14; Jr 50,39; Ez 34,28).</ref>,
 
 
:e os seus adversários tenham de lamber o pó.
 
 
<span style="color:red"><sup>10</sup></span>&nbsp;Os reis de Társis<ref name="ftn411">Társis indica o extremo ocidente mediterrânico (Sl 48,5).</ref> e das ilhas oferecerão tributo;
 
 
:os reis de Sabá<ref name="ftn412">Sabá é uma região situada no sul da península da Arábia, famosa pelos seus produtos exóticos.</ref> e Seba trarão suas ofertas.
 
 
<span style="color:red"><sup>11</sup></span>&nbsp;Todos os reis se prostrarão diante dele;
 
 
:todas as nações o servirão.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>12</sup></span>&nbsp;Ele socorrerá o pobre que o invoca
 
 
:e o indigente que não tem quem o ajude.
 
 
<span style="color:red"><sup>13</sup></span>&nbsp;Terá compaixão do humilde e do pobre
 
 
:e salvará a vida dos necessitados.
 
 
<span style="color:red"><sup>14</sup></span>&nbsp;Há de livrá-los da opressão e da violência,
 
 
:porque o seu sangue é precioso a seus olhos.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>15</sup></span>&nbsp;Enquanto viver, ser-lhe-á dado ouro de Sabá!
 
 
:Em favor dele se há de rezar sempre,
 
 
:e todos os dias será abençoado<ref name="ftn413">A falta de sujeito explícito faz com que este texto se possa interpretar também como sendo o rei a interceder e a abençoar o povo.</ref>.
 
 
<span style="color:red"><sup>16</sup></span>&nbsp;Haverá nos campos fartura de trigo,
 
 
:ondulando por cima dos montes.
 
 
 
O seu fruto será como o Líbano,
 
 
:florescendo como a erva dos prados.
 
 
<span style="color:red"><sup>17</sup></span>&nbsp;Que o seu nome permaneça pelos séculos;
 
 
:que o seu nome esteja firme diante do Sol.
 
 
Por ele, todos os povos se sentirão abençoados
 
 
:e todos o hão de felicitar.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>18</sup></span>&nbsp;Bendito seja o Senhor, que é Deus, o Deus de Israel;
 
 
:Ele é o único a realizar maravilhas.
 
 
<span style="color:red"><sup>19</sup></span>&nbsp;Bendito seja para sempre o seu nome glorioso
 
 
:e a terra inteira se encha da sua glória!
 
 
:Amen! Amen<ref name="ftn414">Os vv. 18-19 constituem uma doxologia que encerra a segunda coleção de salmos, tal como no Sl 41,14. O v. 20 é um colofão para o grupo de salmos davídicos (Sl 51-72). Mais adiante aparecem, no entanto, mais salmos atribuídos a David (101; 108-110; 138-145).</ref>!
 
 
 
<span style="color:red"><sup>20</sup></span>&nbsp;''Terminaram as orações de David, filho de Jessé.''
 
 
 
73(72)''' Retribuição do mal e do bem'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;''Salmo. De Asaf ''<ref name="ftn415">Asaf foi o chefe de um dos grupos da música do templo (1Cr 16,5-7.37; 25,1s). O seu nome aparece no título da série de salmos entre 73 e 83.</ref>.
 
 
 
Como Deus é bom para Israel<ref name="ftn416">Este salmo tem as caraterísticas de uma meditação sapiencial. Trata de questões candentes do comportamento humano, particularmente a questão do prémio e do castigo, que nem sempre parecem acontecer da maneira considerada mais justa. A solução que se propõe é a de reforçar a confiança em Deus (Jr 12,1-6; Hab 1,13; Ml 3,15). A posição de fundo que aqui aparece é, no geral, mais confiante do que aquela que frequentemente transparece no livro de Job. </ref>,
 
 
:para os que têm coração puro!
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;Ai de mim! Os meus pés estavam quase a resvalar,
 
 
:por pouco os meus passos caíam em falso.
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;Pois senti inveja dos ímpios,
 
 
:ao ver a prosperidade dos malfeitores.
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Para eles não há dissabores;
 
 
:o seu corpo é sadio e bem nutrido.
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;Fadigas humanas não as têm
 
 
:nem são atormentados como os outros homens.
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Por isso, o seu colar é de orgulho,
 
 
:e o seu manto de adorno é a violência.
 
 
<span style="color:red"><sup>7</sup></span>&nbsp;Do corpo obeso lhes sai a iniquidade<ref name="ftn417">Aproveitando a sugestão implícita na tradução grega dos LXX, parece mais provável ler ''‘wnmw, a sua iniquidade'', em vez de ''‘ynmw'', ''os seus olhos''. </ref><nowiki>;</nowiki>
 
 
:pelo seu coração perpassam ideias loucas.
 
 
<span style="color:red"><sup>8</sup></span>&nbsp;Zombam e falam com malícia;
 
 
:com altivez, fazem ameaças de opressão.
 
 
<span style="color:red"><sup>9</sup></span>&nbsp;Contra o céu abrem a sua boca
 
 
:e a sua língua percorre a terra.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>10</sup></span>&nbsp;Por isso o seu povo se volta para eles
 
 
:e sorvem as suas palavras como se fosse água<ref name="ftn418">Ou: ''Por isso, estão sentados no alto / e a enchente não os atinge''. Este v. levanta muitas dificuldades para uma tradução segura.</ref>.
 
 
<span style="color:red"><sup>11</sup></span>&nbsp;E dizem: «Como é possível que Deus saiba disto
 
 
:e o Altíssimo tenha conhecimento?».
 
 
<span style="color:red"><sup>12</sup></span>&nbsp;São assim os malfeitores,
 
 
:sempre tranquilos e a amontoar riquezas.
 
 
<span style="color:red"><sup>13</sup></span>&nbsp;De nada me serve ter o coração puro
 
 
:e as minhas mãos limpas e inocentes.
 
 
<span style="color:red"><sup>14</sup></span>&nbsp;Terei de me atormentar durante todo o dia
 
 
:e sentir-me castigado todas as manhãs?
 
 
 
<span style="color:red"><sup>15</sup></span>&nbsp;Se eu pensasse: «Vou falar como eles»,
 
 
:estaria a atraiçoar a geração dos teus filhos.
 
 
<span style="color:red"><sup>16</sup></span>&nbsp;Refleti melhor para entender estas coisas,
 
 
:mas era muito penoso aos meus olhos.
 
 
<span style="color:red"><sup>17</sup></span>&nbsp;Até que entrei no santuário de Deus<ref name="ftn419">O hebraico pode traduzir-se literalmente: ''os santuários de Deus, ''ou ''de deus ''ou ''de El'', o chefe do panteão de Canaã. O que está em causa é saber se está em questão uma ida ao santuário de Deus em Jerusalém (e nesse caso o plural ''santuários'' justifica-se pela grandeza das construções) ou se se trata de uma ida a santuários pagãos que motivou a reflexão que vem a seguir. </ref><nowiki>;</nowiki>
 
 
:compreendo agora o fim que os espera.
 
 
<span style="color:red"><sup>18</sup></span>&nbsp;Na verdade, Tu os colocas em plano escorregadio;
 
 
:fizeste-os cair em ruínas.
 
 
<span style="color:red"><sup>19</sup></span>&nbsp;Num momento, ficam na desolação
 
 
:e acabam transidos de pavor!
 
 
<span style="color:red"><sup>20</sup></span>&nbsp;Como quando se desperta de um sonho, Senhor,
 
 
:ao acordar desprezarás a sua imagem<ref name="ftn420">Ou: ''Tu os desprezarás na cidade dos fantasmas.'' Esta alternativa assenta na leitura do texto hebraico consonântico ''ṣlmm'' como um plural (''ṣelamim'' – imagens ou fantasmas), significando com esta metáfora de cidade dos mortos, o mundo inferior, i.e., o Cheol. Esta alternativa possível de leitura oferece um interessante paralelo para o v. 24, segundo o qual aquele que é fiel será recebido por Deus na glória.</ref>.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>21</sup></span>&nbsp;Outrora, o meu coração andava exasperado,
 
 
:e eu consumia-me nas minhas entranhas.
 
 
<span style="color:red"><sup>22</sup></span>&nbsp;Como insensato, eu nada compreendia;
 
 
:era como um animal<ref name="ftn421">O hebraico diz ''Behemot'', que poderia sugerir a figura monstruosa das mitologias de criação. Neste contexto parece mais que o salmista compara a sua insensatez e incapacidade de compreender à de um animal (cf. Jb 40,15).</ref> na tua presença.
 
 
<span style="color:red"><sup>23</sup></span>&nbsp;No entanto, estive sempre contigo,
 
 
:e Tu seguraste a minha mão direita.
 
 
<span style="color:red"><sup>24</sup></span>&nbsp;Guiaste-me com o teu conselho<ref name="ftn422">Ou: ''Guiaste-me para o teu conselho.'' Entender aqui o termo ''‘a''ş''at ''como ''assembleia'', ''reunião'', ''conselho'', como alguns veem no Sl 1,1, oferece um bom paralelo para a ''glória'', no segundo hemistíquio. </ref>
 
 
:e, por fim, hás de receber-me na glória.
 
 
<span style="color:red"><sup>25</sup></span>&nbsp;Quem mais tenho eu no céu?
 
 
:E contigo nada mais desejo na terra.
 
 
<span style="color:red"><sup>26</sup></span>&nbsp;Se o meu corpo e o meu coração desfalecem,
 
 
:Deus é o rochedo para o meu coração.
 
 
:Deus é a minha herança para sempre.
 
 
<span style="color:red"><sup>27</sup></span>&nbsp;Aqueles que estão longe de ti perecerão;
 
 
:Tu exterminas os que te são infiéis<ref name="ftn423">Lit.: ''aquele que se prostitui contra ti. ''Esta metáfora da infidelidade a Deus é frequente entre os profetas (cf. Os 1,2s).</ref>.
 
 
<span style="color:red"><sup>28</sup></span>&nbsp;Para mim, felicidade é estar próximo de Deus<ref name="ftn424">A imagem conclusiva que fica deste tratado de ética e de escatologia resume-se na fórmula final dos que ficam longe de Deus e daqueles que ficam perto dele.</ref>.
 
 
:Coloquei no Senhor DEUS a minha confiança,
 
 
:para proclamar todas as tuas obras<ref name="ftn425">A tradução dos LXX, a Vg e a NVg acrescentam: ''às portas da filha de Sião, ''expressão que pode vir do Sl 9,15.</ref>.
 
 
 
74(73)'''Oração pela libertação do povo'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;''Poema. De Asaf.''
 
 
 
Ó Deus, porque nos rejeitaste para sempre<ref name="ftn426">Salmo coletivo de súplica, onde se lamenta uma ofensa de alguns inimigos contra o santuário do Senhor. Lembra os prodígios que Deus realizou por ocasião da saída do Egito e da entrada na terra de Canaã, como motivo perene de confiança. No que diz respeito aos ataques referidos contra o santuário, eles podem ser muito variados, se bem que possamos tomar sempre como referência maior a destruição do mesmo pelos conquistadores neobabilónicos em 587 ou 586 ( 2Rs 25,9; Lm 1,4-10; 2,5-9); outra referência pode ser a profanação do templo por ordem de Antíoco IV, em 170 a.C., acontecimento que provocou a revolta dos Macabeus.</ref>?
 
 
:Porque se inflama a tua ira
 
 
:contra o rebanho de que és pastor?
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;Lembra-te da tua comunidade, que há muito adquiriste,
 
 
:da tribo que resgataste para tua herança,
 
 
:do monte Sião, onde tens a tua morada.
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;Dirige os teus passos para estas ruínas sem fim;
 
 
:o inimigo destruiu tudo no santuário.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Os teus adversários rugiram no meio das tuas assembleias,
 
 
:hastearam ali as suas bandeiras como emblema.
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;Atacaram a entrada superior
 
 
:e destruíram as madeiras a golpes de machado<ref name="ftn427">Ou: ''Pareciam lenhadores a brandir o machado / numa floresta espessa''. O hebraico deste v. torna difícil uma tradução segura. As portas do templo foram despedaçadas pelos soldados babilónicos (Lm 1,4; 2,9) e no tempo dos Macabeus foram queimadas pelos selêucidas (1Mac 4,38).</ref>.
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Deitaram abaixo todas as suas portas
 
 
:a golpes de malho e de martelo.
 
 
<span style="color:red"><sup>7</sup></span>&nbsp;Deitaram fogo ao teu santuário,
 
 
:derrubaram e profanaram a morada do teu nome.
 
 
<span style="color:red"><sup>8</sup></span>&nbsp;Disseram em seus corações: «Destruamo-los a todos!»
 
 
:e incendiaram todas as assembleias de Deus no país<ref name="ftn428">Em qualquer das duas datas de ataque referidas, os hebreus tinham apenas um templo. Os inimigos podem estar a fazer um exagero ou generalização como opção retórica, atitude com que pretenderiam atingir o país inteiro (cf. Is 10,11).</ref>.
 
 
<span style="color:red"><sup>9</sup></span>&nbsp;Já não vemos os nossos sinais, nem existem mais profetas,
 
 
:e ninguém entre nós sabe até quando.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>10</sup></span>&nbsp;Até quando, ó Deus, o inimigo nos vai ultrajar?
 
 
:Poderá o adversário desprezar o teu nome para sempre?
 
 
<span style="color:red"><sup>11</sup></span>&nbsp;Porque retiras a tua mão
 
 
:e escondes a direita no teu peito?
 
 
<span style="color:red"><sup>12</sup></span>&nbsp;Deus é o meu rei desde tempos antigos;
 
 
:é Ele que alcança vitórias no meio do país.
 
 
<span style="color:red"><sup>13</sup></span>&nbsp;Tu dividiste o mar com o teu poder<ref name="ftn429">Referência à travessia do Mar Vermelho (Ex 14,15).</ref>,
 
 
:partiste as cabeças aos monstros marinhos.
 
 
<span style="color:red"><sup>14</sup></span>&nbsp;Quebraste as cabeças de Leviatan<ref name="ftn430">Leviatan é o nome para um dos monstros marinhos na mitologia de Canaã. Na literatura de Ugarit era descrito como tendo sete cabeças (Is 27,1; Sl 104,26; Jb 3,8; 11,25ss.)</ref>
 
 
:e deste-o a comer aos monstros do mar.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>15</sup></span>&nbsp;Tu fizeste brotar fontes e torrentes
 
 
:e fizeste secar rios de caudal perene.
 
 
<span style="color:red"><sup>16</sup></span>&nbsp;O dia é teu e tua é também a noite;
 
 
:Tu estabeleceste a lua<ref name="ftn431">Lit.: ''luzeiro e sol.''</ref> e o sol.
 
 
<span style="color:red"><sup>17</sup></span>&nbsp;Tu fixaste todas as fronteiras da terra;
 
 
:o verão e o inverno, Tu os formaste.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>18</sup></span>&nbsp;Lembra-te, Senhor, que o inimigo te insultou,
 
 
:e um povo insensato desprezou o teu nome.
 
 
<span style="color:red"><sup>19</sup></span>&nbsp;Não entregues aos abutres a vida da tua pomba<ref name="ftn432">Ou: ''dos teus fiéis''. Oseias compara Israel a uma pomba: Os 7,11; 11,11 (cf. Ct 5,2).</ref><nowiki>;</nowiki>
 
 
:não esqueças para sempre a vida dos teus pobres.
 
 
<span style="color:red"><sup>20</sup></span>&nbsp;Olha pela tua aliança,
 
 
:pois os recantos do país estão cheios de violência.
 
 
<span style="color:red"><sup>21</sup></span>&nbsp;Que os humildes não voltem confundidos;
 
 
:que o pobre e o indigente possam louvar o teu nome.
 
 
<span style="color:red"><sup>22</sup></span>&nbsp;Ergue-te, ó Deus, defende a tua causa
 
 
:e lembra-te das ofensas
 
 
:que, todo o dia, te fazem os insensatos.
 
 
<span style="color:red"><sup>23</sup></span>&nbsp;Não te esqueças dos gritos dos teus inimigos,
 
 
:do tumulto sempre crescente dos teus adversários.
 
 
 
75(74)'''Deus, juiz dos povos'''
 
 
 
<span style="color:red"><sup>1</sup></span>&nbsp;''Ao diretor. Pela melodia ''«''Não destruas''»''. Salmo. De Asaf. Cântico''.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>2</sup></span>&nbsp;Nós te louvamos, ó Deus, nós te louvamos<ref name="ftn433">Este salmo tem as caraterísticas próprias de uma exortação profética. Trata do julgamento que Deus há de realizar sobre o mundo. O tempo em que isso irá acontecer parece ser percebido como já próximo. Os adversários que aqui aparecem a ser condenados são aqueles que não reconhecem que a justiça de Deus é o único critério que servirá para julgar o mundo.</ref>!
 
 
:Invocamos o teu nome, anunciamos os teus prodígios<ref name="ftn434">Ou: ''O teu nome está próximo dos que contam os teus prodígios.''</ref>.
 
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>&nbsp;«No momento que Eu marcar,
 
 
:vou julgar segundo o direito.
 
 
<span style="color:red"><sup>4</sup></span>&nbsp;Mesmo que tremam a terra e todos os seus habitantes,
 
 
:sou Eu quem sustenta os seus pilares».''Pausa''
 
 
<span style="color:red"><sup>5</sup></span>&nbsp;Digo aos arrogantes: «Não sejais insolentes!»
 
 
:e aos malfeitores: «Não levanteis a cabeça!
 
 
<span style="color:red"><sup>6</sup></span>&nbsp;Não levanteis para o alto a vossa fronte;
 
 
:não protesteis contra o rochedo antigo».
 
 
 
<span style="color:red"><sup>7</sup></span>&nbsp;Pois Ele é forte no Oriente e no Ocidente;
 
 
:é forte no deserto e na montanha.
 
 
<span style="color:red"><sup>8</sup></span>&nbsp;Sim, é Deus quem governa:
 
 
:a uns derruba, a outros levanta.
 
 
<span style="color:red"><sup>9</sup></span>&nbsp;Sim, há uma taça<ref name="ftn435">A imagem da taça aparece frequentemente na Bíblia: Sl 11,6; Jr 25,11; 48,26; 49,12; 51,17s; Ez 23,31; Ap 14,10. </ref> na mão do Senhor
 
 
:cheia de vinho a espumar, que Ele deu a beber;
 
 
todos os criminosos da terra beberam dela
 
 
:até chegarem às borras.
 
 
 
<span style="color:red"><sup>10</sup></span>&nbsp;Assim, eu louvarei o Deus eterno,
 
 
:entoarei cânticos ao Deus de Jacob.
 
 
<span style="color:red"><sup>11</sup></span>&nbsp;Pois o poder dos criminosos será abatido,
 
 
:e o poder dos justos será exaltado.
 
  
 
76(75)'''Cântico triunfal'''
 
76(75)'''Cântico triunfal'''

Revision as of 20:09, 17 December 2019

Livro dos
Salmos


INTRODUÇÃO

1.Nome e significado


O nome de Salmos, dado aos cento e cinquenta cânticos litúrgicos, deriva do grego Psalmoi e foi cunhado para a tradução grega dos LXX, no séc. III a. C.. Com efeito, no livro do Eclesiástico ou de Ben Sira (Sir 40,21; 47,9; 50,18), já é referido com esse nome. Antes disso, pode ter tido outros nomes em hebraico como Mizmorot, termo que significa "Cânticos". Realmente, a designação de cântico aparece em vários títulos de salmos (Sl 33,2; 71,22; 95,5; 147,7; 149,3) como termo técnico. O título de "Orações" poderia igualmente ter andado em uso. Com efeito, o designativo de Tefillot, "orações" (Sl 72,20), poderia servir como título adequado para toda a coleção.

Entretanto, Tehillim, que significa "louvores", foi o nome que acabou por se impor na Bíblia Hebraica. Este último título segue o modelo de título adotado na tradução dos LXX. Em fase mais tardia do judaísmo, a mesma ideia de louvor, expressa com o nome de Hodayot, de uma raiz hebraica sinónima, serviu em Qumrân para designar uma coleção de hinos que o grupo escreveu no intuito de formar um saltério complementar.

Com a sua aparente simplicidade, a história literária dos Salmos comporta domínios de muito difícil análise. O tipo de texto que representam não é sempre fácil de articular com épocas, contextos, acontecimentos ou personalidades históricas. Esta dificuldade de concretização é pertinente sobretudo no que toca às questões de origem, composição e data de cada um deles.

Sabemos que as religiões orientais anteriores à Bíblia conheciam o uso litúrgico de hinos de grande valor literário e religioso. Essas religiões reconheciam que a atitude de louvor era o aspeto mais significativo da linguagem religiosa. Por isso, a poesia litúrgica, associada pela tradição bíblica ao dinamismo criativo e organizador do rei David, deverá ter conhecido uma história igualmente dinâmica, na tradição religiosa de Canaã, antes dos hebreus. A vida cultual do templo de Jerusalém até ao tempo do exílio terá sido o espaço privilegiado para criação e utilização dos salmos. No entanto, os indícios que temos vão no sentido de que esta criatividade se manteve até próximo do Novo Testamento.

O templo representa o ambiente vivencial para estes textos; é ali que se realiza a sua dimensão comunitária. No entanto, a experiência religiosa e psicológica espelhada em muitos salmos exprime vivências de espiritualidade pessoal, sempre presente na vida do fiel. Este lado íntimo e pessoal da experiência religiosa dá valor e profundidade à dimensão comunitária. Na realidade interior destas vivências é que assenta a consciência de que os salmos constituem uma herança de profunda continuidade entre o judaísmo e o cristianismo. Para além de algumas divergências em matéria de interpretações messiânicas, os salmos representam um espaço de ecumenismo e comunhão devota tanto para judeus como para cristãos.


2.Organização, autor e data de composição


A numeração dos salmos foi conhecendo algumas diferenças, desde os tempos antigos. Nesta Bíblia aparece, em primeiro lugar, a numeração que se convenciona usar nas atuais edições críticas do texto hebraico; entre parêntesis, aparece, quando é o caso disso, a numeração específica da tradução grega dos LXX, que foi seguida pela tradução latina, chamada Vulgata, e que continua a ser utilizada nas edições destinadas à liturgia. As divergências de número ocorrem entre o Sl 9 e o Sl 147.

No livro dos Salmos, podemos encontrar indícios de outras maneiras de os organizar em coleções. Exemplos disso podem ser: o uso de doxologias finais, que sugerem cinco coleções (1-41; 42-72; 73-89; 90-106; 107-150); a escolha de um nome específico para se referir a Deus (Sl 1-41 com o nome de Yahweh, e 42-83, com o de Elohim); os cânticos de peregrinação como designação de um outro conjunto (Sl 120-134).

A referência ao nome de um autor ou colecionador poderia ser outro princípio de organização. São referidos os filhos de Asaf (Sl 50; 73-83), filhos de Coré (42; 44-48; 84-85; 87-88), David, com setenta e três salmos, segundo o texto hebraico, e mais catorze, segundo o grego. Ao rei Salomão são atribuídos dois salmos e apenas um a Moisés. Muitos dos salmos, porém, não têm qualquer indicação de autor. Informações conservadas no interior da coleção (cf. Sl 72,20) sugerem-nos que a coleção de salmos passou por vários tipos de arranjos e edições. Entretanto, foi-se ampliando com mais textos e foi-se enriquecendo com mais sentidos e ressonâncias. É difícil, contudo, avaliar o valor histórico e o significado exato destes dados colocados à cabeça dos salmos e bem assim as referências técnicas sobre modos de execução musical ou de acompanhamento instrumental.

A tradição, judaica e cristã, sempre associou o conjunto dos salmos à figura de David, tal como associou a Moisés o conjunto dos livros do Pentateuco. David, com efeito, foi o fundador da monarquia e o templo de Jerusalém aparece como seu templo oficial. Nisto assentava o sentimento de identidade nacional.

Desde as épocas remotas, no Oriente, a poesia, lírica, religiosa ou humanista, representa o fio de continuidade literária, por onde podemos acompanhar as vivências e a expressão de consciência dos humanos. Assim também os salmos representam as vivências humanas e a consciência religiosa, ao longo da Bíblia. Alguns salmos podem ter a sua origem em tempo anterior aos hebreus (Sl 29); outros, pelo contrário, podem ter sido compostos próximo da era cristã (Sl 44; 74; 85). Mais do que o enquadramento histórico, o que prevalece é definir o conteúdo de cada salmo.


3.Géneros literários


Nas literaturas orientais de que a Bíblia herdou modelos e temas, a poesia é o modelo de escrita preferido para tratar com mais profundidade, solenidade e beleza os assuntos de interesse humano mais intenso. Mitos, profecias, vivências históricas marcantes, cânticos, hinos e orações são expressões literárias onde se concentram as interrogações, as aspirações, as esperanças e os momentos de perplexidade e drama.

O facto de serem apresentados em forma poética pode justificar-se por várias razões. Por um lado, é o tempo e o esforço de elaboração percebido como um caminho pedagógico para garantir maior apuramento dos sentimentos e sentidos que ali se encontram em jogo. Por outro lado, a beleza poética proporciona uma dose maior de satisfação no formular das questões e na maneira como se vão intuindo e interiorizando perspetivas de resposta. A capacidade de persistência e de resiliência do discurso poético torna-o mais adequado para que nele se concentrem as mais representativas convicções de fé e de sentido da vida.

Do ponto de vista do recorte literário, o discurso poético do Oriente antigo define-se e carateriza-se sobretudo pela maneira como exprime a sua posição face à realidade, numa atitude de contemplação das suas vertentes e matizes. Por isso, o pensamento poético se exprime sob a forma de espelho, desdobrando as ideias em formas que se completam, se contrapõem ou se corrigem, de modo a criar espaço para uma síntese mais matizada. A isto chama-se o paralelismo que representa antes de mais uma atitude e uma forma de pensar. Esta é a marca poética mais clara que encontramos também nos salmos. Para além dela, pode assinalar-se o ritmo marcado das frases com um verso normalmente dividido em duas metades (hemistíquios) e sem uso sistemático de rima. No vocabulário e nas construções sintáticas, deparamo-nos com uma linguagem mais elaborada e também mais conservadora.

Os salmos são certamente os textos poéticos mais próximos dos estados de consciência individuais, das vivências comunitárias mais abrangentes e dos horizontes humanos mais universais. Esta riqueza de sentido fica mais valorizada ainda com o frequente uso litúrgico que os situa no imediato da experiência quotidiana e faz deles os conteúdos mais populares de literatura poética.

Sob este ponto de vista dos conteúdos e formas literárias, o estudo dos salmos levou à definição de modelos que podem derivar de práticas milenares. Na verdade, a Bíblia foi a última literatura a surgir entre as culturas do Antigo Oriente e foi viva e profunda a influência das anteriores. Os géneros literários utilizados dependiam principalmente de conteúdos e objetivos, contextos e modelos assumidos para cada salmo. Os elementos específicos de um género literário podem encontrar-se noutros géneros, dando lugar a formas mistas. Neste sentido, costumam considerar-se como principais géneros literários os seguintes:


a)Salmos de louvor:


Muitos salmos são realmente hinos. Em hebraico, o título deste livro acabou por se fixar como tehillim, que significa louvor e deriva da mesma raiz da expressão "aleluia", que agora usamos como exclamação. Estes hinos de louvor são sobretudo endereçados a Deus. Nisto, a Bíblia dá continuidade à literatura litúrgica das religiões vizinhas e anteriores, onde os hinos são a forma mais habitual de os humanos se dirigirem à divindade, sobretudo em contextos de maior solenidade. Este género literário implica a narração das grandezas ou benfeitorias e o agradecimento que daí decorre. Bons exemplos são os Sl 8; 19; 28; 33; 47; 65-66; 93; 96-100; 104-105; 111; 113; 117; 135; 146; 148-150. Este género literário dos hinos pode aparecer também dirigido ao rei, focando especialmente a cerimónia da entronização real, com toda a expetativa de intervenção divina para o bem-estar do povo e o ordenamento justo do mundo. Com o fim da monarquia, estes salmos foram acentuando as conotações messiânicas, que já antes tinham implícitas. Vejam-se os Sl 2; 18; 20-21; 45; 72; 89; 101; 110; 132; 144. Podemos ainda considerar como hinos os salmos que celebram Jerusalém, que com o templo apresenta uma especial ligação a Deus. São os Sl 46; 48; 76; 84; 87; 122.


b)Salmos de súplica:


O tema da súplica é marcante nesta lírica religiosa. O seu conceito pode mesmo absorver quase todo o sentido da oração e transformar-se num sinónimo da mesma. Em numerosos salmos, a súplica parece ser a motivação mais imediata e a maior preocupação. A diversidade de narrativas e de sentimentos envolvidos nestas orações pode parecer uma acumulação dispersa e algo banal. A amálgama aparente de peripécias do quotidiano e de relações humanas constitui uma síntese de experiências e de sofrimento, situadas no extremo limite da angústia. Neste sentido, os salmos oferecem um quadro rico de vivências interiores, de psicologia individual e coletiva e de relacionamento entre seres humanos. Tratando-se de uma época tão remota, é uma manifestação indispensável de estados de consciência. Na dificuldade de fazer uma lista completa e consensual, podem ver-se como salmos de súplica coletiva os Sl 12; 44; 58; 60; 74; 80; 83; 85; 90; 94; 108; 123; 127. Mesmo que seja difícil distinguir uma súplica coletiva de uma individual, podem ver-se como salmos de súplica individual os Sl 3; 5-7; 13; 17; 22; 26; 27,7-14; 28; 31; 35; 39; 42-43; 51; 54-57; 59; 61; 63; 64; 69-71; 88; 102; 109; 120; 130; 140-143. As situações que motivam a súplica podem ser amargas e desesperadas, mas estes salmos exprimem, em geral, um estado de espírito de confiança e terminam em ação de graças. É por tudo isso que eles se encontram no saltério.


c)Salmos históricos:


O contexto religioso e litúrgico faz com que os salmos sejam sempre uma celebração de fé. Quando tratam de acontecimentos passados, não é para ensinar história, mas para reviver memórias onde assentam as convicções fundamentais da fé de Israel, nomeadamente a convicção de que é relendo a sua história que descobrem o modo como Deus se preocupa com eles. Para além da consciência nuclear expressa no pequeno credo histórico (Dt 26,5-9), vários poemas-oração aparecem disseminados ao longo da Bíblia, onde esta consciência de manifestação de Deus na história do povo recebe lídima expressão. Na função de remeter para a história, podem destacar-se os Sl 78; 105; 106; e ainda Sl 111; 114; 135; 136.


d)Salmos litúrgicos:


Todos os salmos têm alguma intenção litúrgica; é no templo que a sua utilização se enquadra diretamente e foi para isso que foram recolhidos. Um certo número destes salmos, no entanto, procura meditar sobre as exigências a ter por parte de quem se dirige ao templo (Sl 15; 24; 91; 95; 134) e se associa aos seus rituais. Destacam-se aqui os cânticos de peregrinação (Sl 120-134).


e)Salmos proféticos:


Mais do que pelo anúncio de acontecimentos do futuro, alguns salmos têm cariz profético, por interpelarem os comportamentos individuais ou coletivos, como fazem os profetas. Exemplo disso são os Sl 14; 50; 52-53; 75; 78; 81; 95. Os salmos que se costumam designar como penitenciais (6; 32; 38; 51; 102; 103; 143) podem ter um significado análogo ao dos oráculos proféticos de conversão.


f)Salmos sapienciais:


A marca sapiencial dos salmos nota-se em técnicas e recursos de escrita, no interesse em analisar o comportamento humano, as opções éticas e suas consequências, e ainda na meditação sobre o que anda implicado nas orientações religiosas de vida e pensamento. Estes temas aparecem nos Sl 1; 14; 34; 36; 37; 39; 49; 53; 73; 74. O Sl 119 poderia ser considerado um tratado sapiencial, nos moldes de uma longa meditação sobre a lei de Deus. A técnica de iniciar cada verso como parte de um acróstico alfabético parece ter deliciado os criadores desta literatura sapiencial, como testemunham os salmos 9; 10; 25; 112; 119 e 145.


4.Conteúdo doutrinal


O templo de Jerusalém, mesmo antes da rigorosa centralização do culto, por obra do rei Josias, pouco antes do exílio, sempre promoveu a unidade simbólica e doutrinal entre todos os que se sentiam identificados com o conteúdo religioso dos salmos. A devoção e as práticas de culto são propícias para exprimir uma conceção de Deus de tipo monoteísta. Desta maneira, os salmos podem representar, na literatura bíblica, um núcleo pioneiro de sentimentos e de pensamento monoteístas, antes mesmo de aparecerem as formulações mais explícitas, por altura do exílio. A devoção, a emoção religiosa e as vivências cultuais dão profundidade e valorizam a representatividade humana dos símbolos e dos conceitos. A dimensão doutrinal e as convicções de fé que encontramos nos salmos serão, portanto, aquelas que mais naturalmente se podem coadunar com o contexto de oração individual e sobretudo comunitária. É a coerência natural entre orar e acreditar, a sintonia entre a lex orandi e a lex credendi. Nas orações dos salmos circulam e ressoam de modo especial muitos dos conteúdos religiosos que a literatura bíblica exprime, por outras formas e contextos. Com esta riqueza de conotações e temas sugeridos, os salmos constituem um verdadeiro microcosmos da Bíblia e da vida humana.

5.Leitura perene e interpretação


A caraterística de intemporalidade reconhecida na maioria dos salmos não significa que neles encontremos apenas fórmulas desenraizadas ou ideias abstratas e de grande rigidez. Na verdade, estes poemas estão enriquecidos com uma imensa variedade de matizes de grande subtileza pelo contexto em que foram criados. Por outro lado, a sua utilização devocional e litúrgica, continuada ao longo de milénios, fez com que os seus conceitos e ideias religiosas se tenham tornado representativas da experiência religiosa e da própria experiência humana. Por este longo horizonte de acumulação de significados, qualquer tradução procura espelhar o mais possível o sentido original do texto, mas não pode deixar de descurar as ressonâncias que o uso milenar acumulou, numa cadeia de infinita cumplicidade entre leitores e devotos de todos os tempos.


6.Sobre a tradução


Com os meios de que dispomos atualmente, podemos acompanhar o processo de tradução dos salmos desde que ele começou, i.e., desde há mais de dois mil anos. Este longo itinerário de traduções oferece-nos uma variedade imensa de interpretações. As mais antigas costumam ser vistas como complementares para ajudar a resolver problemas de vária ordem motivados pelo estado do texto hebraico. E as mais reconhecidas traduções bíblicas de hoje continuam a prestar atenção ao entendimento que nos oferecem as antigas traduções. Por outro lado, novos dados históricos e arqueológicos e as possibilidades que existem para uma melhor compreensão do texto hebraico antigo fazem com que esta tradução assente, na medida do possível, sobre a interpretação do texto hebraico, não descurando as luzes que nos oferecem as mais antigas traduções. Para casos complexos de texto ou de interpretação temos como padrão a Neovulgata.

A tradução procurará retratar o conteúdo do texto hebraico da forma mais fiel e literal possível. Em nota ficarão registadas algumas formas hebraicas de caráter mais idiomático; serão também apresentadas propostas alternativas de tradução, quando o texto original as parece justificar com evidência.


A Subcomissão do Antigo Testamento

José Augusto Martins Ramos (moderador)

Luísa Maria Varela Almendra

Armindo dos Santos Vaz






76(75)Cântico triunfal


1 Ao diretor. Com instrumentos de corda. Salmo. De Asaf. Cântico.


2 Deus deu-se a conhecer em Judá[1],

grande é o seu nome em Israel.

3 A sua tenda está em Salém[2]

e a sua morada, em Sião.

4 Ali quebrou as flechas do arco,

os escudos, as espadas e armas de guerra[3].Pausa


5 Tu resplandeces glorioso,

por sobre as montanhas de despojos[4].

6 Os mais valentes foram espoliados

e dormem o seu sono.

Os homens de guerra não conseguiram

encontrar o vigor dos seus braços.

7 Por causa das tuas ameaças, ó Deus de Jacob,

tanto carros como cavalos ficaram imóveis.


8 Tu, sim! Tu és temível!

Quem poderá resistir na tua presença,
quando se inflama a tua ira?

9 Do alto do céu, proclamas a sentença;

a terra treme e fica silenciosa,

10 quando Deus se levanta para o julgamento,

para salvar os humildes da terra.Pausa

11 Pois a ira do homem é para ti louvor,

e os que sobrevivem à ira festejarão à tua volta[5].


12 Fazei promessas e cumpri-as ao Senhor, vosso Deus!

Todos à sua volta levem presentes ao que é temível[6].

13 Ele corta a respiração aos governantes

e é temido pelos reis da terra.


77(76)Meditação sobre o passado


1 Ao diretor. Para Jedutun[7]. De Asaf. Salmo.


2 A Deus ergo a minha voz e clamo[8];

a Deus ergo a minha voz, para que Ele me ouça.

3 No dia da minha angústia procurei o Senhor;

à noite, ergo as minhas mãos sem descanso,
e a minha alma recusa ser confortada.

4 Lembro-me de Deus e suspiro;

medito e o meu espírito desfalece.


5 Mantiveste abertos os meus olhos;

fiquei perturbado, sem nada dizer.

6 Pus-me a pensar nos tempos antigos,

nos anos do tempo passado.

7 De noite, relembro o meu cântico;

com o meu coração medito,
e o meu espírito põe-se à procura.

8 Será que o Senhor nos vai abandonar para sempre?

Não voltará mais a ser-nos favorável?

9 Acaso se esgotou para sempre a sua misericórdia,

retirando a promessa feita para gerações e gerações?

10 Ter-se-á Deus esquecido da compaixão,

ou terá fechado com a ira as suas entranhas[9]?

11 Por isso eu digo: «A minha dor

é que a mão do Altíssimo tenha mudado assim»[10].


12 Lembro-me dos prodígios[11] do Senhor.

Sim. Lembro-me das tuas maravilhas de outrora.

13 Volto a pensar em todas as tuas obras

e medito nos teus prodígios.


14 Ó Deus, o teu caminho é de santidade.

Que outro deus é grande como o nosso Deus?

15 Tu és o Deus que realiza maravilhas;

manifestaste entre os povos o teu poder.

16 Com o teu braço resgataste o teu povo,

os filhos de Jacob e de José[12].


17 Viram-te as águas, ó Deus;

viram-te as águas e tremeram
e até os abismos do mar se agitaram.

18 As nuvens deixaram cair a chuva;

ressoou a voz das trovoadas,
e as tuas setas corriam para todo o lado.


19 O ruído do teu trovão ecoou pelo firmamento;

os relâmpagos iluminaram o mundo;
a terra agitou-se e estremeceu[13].

20 Pelo mar foi o teu caminho,

e o teu percurso, pelas águas caudalosas,
e as tuas pegadas não foram descobertas.

21 Conduziste o teu povo como um rebanho,

pela mão de Moisés e de Aarão.


78(77) Deus e o seu povo


1 Poema. De Asaf.


Escuta, meu povo[14], o meu ensinamento[15].

Prestai bem atenção às palavras da minha boca.

2 Vou abrir a minha boca em provérbios

vou revelar os enigmas de outros tempos.

3 Assim o ouvimos e conhecemos

e os nossos antepassados nos contaram.

4 Não o ocultaremos aos seus filhos;

tudo contaremos às gerações vindouras.

São as glórias do Senhor e o seu poder,

e as coisas maravilhosas que Ele fez.


5 Ele estabeleceu uma norma em Jacob

e instituiu uma lei em Israel:

ordenou aos nossos pais

que a dessem a conhecer aos seus filhos.

6 A fim de que as gerações futuras a conhecessem,

e os filhos que haviam de nascer
se erguessem e a contassem aos seus filhos;

7 para que pusessem em Deus a sua confiança

e não esquecessem os prodígios de Deus,
mas cumprissem os seus mandamentos;

8 para que não fossem como os seus pais,

uma geração rebelde e desobediente,

geração que não é firme no seu coração

e cujo espírito não é fiel ao seu Deus.

9 Os filhos de Efraim, arqueiros de erguer o arco,

viraram costas no dia do combate[16].

10 Não guardaram a aliança de Deus,

recusaram-se a seguir a sua lei.

11 Esqueceram-se das suas obras,

das maravilhas que Ele lhes deu a ver.

12 Diante de seus pais Deus fez maravilhas,

na terra do Egito, nas planícies de Soan[17].

13 Dividiu o mar para os fazer passar,

conteve as águas como um dique.

14 Conduziu-os de dia por meio de uma nuvem

e toda a noite com um clarão de fogo.

15 Abriu rochedos no deserto

e deu-lhes a beber água como das torrentes do abismo[18].

16 Deus fez brotar ribeiros de dentro da pedra,

e fez correr a água como grandes rios.


17 Mas eles continuaram a pecar contra Ele,

revoltando-se contra o Altíssimo na estepe árida.

18 Provocaram a Deus em seus corações,

reclamando manjares segundo os seus apetites.

19 Murmuraram contra Deus, dizendo:

«Será que Deus é capaz de nos preparar a mesa no deserto?».

20 E mesmo quando bateu na rocha e jorrou a água

e as torrentes correram abundantes, diziam:

«Será que Deus pode também dar pão

e preparar carne para o seu povo?».


21 Por isso, o Senhor ouviu e se indignou;

e um fogo foi ateado contra Jacob,
e a sua cólera cresceu também contra Israel.

22 Pois eles não tiveram fé em Deus

e não confiaram na sua salvação.

23 E do alto deu ordens às nuvens

e abriu as comportas do céu.

24 Fez chover sobre eles o maná para comerem[19]

e deu-lhes trigo do céu.

25 Os homens comeram do pão dos fortes[20],

enviou-lhes comida até se saciarem.


26 Fez soprar pelos céus o vento leste[21]

e com seu poder conduziu o vento sul.

27 Fez chover sobre eles carne como torrões

e aves tão numerosas como as areias do mar.

28 Fê-las cair no meio do seu acampamento,

à volta das suas tendas de habitação.

29 Comeram até ficarem bem saciados,

e concedeu-lhes tudo conforme os seus desejos.

30 Quando mal tinham saciado o seu apetite[22]

e tinham ainda a comida na boca,

31 a ira de Deus ergueu-se sobre eles;

semeou a morte entre os mais fortes
e fez vergar os escolhidos de Israel.


32 Apesar de tudo isto, voltaram a pecar uma vez mais

e não acreditaram nas suas maravilhas.

33 Por isso, Ele extinguiu os seus dias como um sopro

e os seus anos, como uma miragem.

34 Quando os feria de morte, então eles procuravam-no

e de novo se voltavam para Deus[23].

35 Lembravam-se então que Deus era o seu rochedo

e o Altíssimo, o seu redentor[24].

36 Mas, enquanto o lisonjeavam com a sua boca,

a sua língua proferia mentiras contra Ele.

37 O seu coração não era firme para com Ele,

e eles não eram fiéis à sua aliança.

38 Mas Ele é misericordioso:

perdoava o pecado e não os destruía.

Muitas vezes conteve a sua ira

e não deixou desencadear todo o seu furor.

39 Lembrou-se de que eles eram seres de carne,

um sopro que vai e não volta mais.


40 Quantas vezes o provocaram no deserto

e lhe causaram desgosto na estepe!

41 Voltaram continuamente a pôr Deus à prova,

a provocar o Santo de Israel.

42 Não se lembraram de que foi a sua mão

que, um dia, os libertou da angústia,

43 quando, no Egito, realizou os seus prodígios[25]

e as suas maravilhas nas planícies de Soan;

44 quando converteu em sangue os seus rios e canais,

para que não tivessem que beber.

45 Mandou contra eles moscas que os molestavam,

e rãs que os infestavam.

46 Entregou as suas colheitas aos insetos

e o fruto do seu esforço aos gafanhotos.

47 Destruiu as suas vinhas com o granizo

e os seus sicómoros com a geada.

48 Cercou o seu gado com granizo

e os seus rebanhos com os raios.

49 Enviou contra eles a sua ira,

a indignação, o furor e a aflição,
embaixada de mensageiros da desgraça.

50 Deu livre curso à sua ira;

não os poupou à morte,
mas entregou as suas vidas à peste.

51 Feriu todos os primogénitos no Egito,

as primícias do seu vigor nas tendas de Cam[26].


52 Encaminhou o seu povo como ovelhas

e conduziu-os como um rebanho no deserto.

53 Guiou-os em segurança e não tiveram medo,

enquanto o mar encobria os seus inimigos.

54 Introduziu-os no seu território sagrado,

aquela montanha que a sua direita conquistou[27].

55 Desalojou povos da sua frente,

distribuiu entre eles a herança por medida
e nas suas tendas instalou as tribos de Israel.

56 Mas eles puseram à prova o Deus Altíssimo

e revoltaram-se; não cumpriram os seus preceitos.

57 Afastaram-se e atraiçoaram como os seus pais,

desviaram-se como um arco sem força.

58 Irritaram-no em seus lugares altos[28],

provocaram-lhe ciúmes com os seus ídolos.

59 Deus ouviu isto e indignou-se

e repudiou profundamente Israel.

60 Abandonou o santuário de Silo[29],

a tenda que Ele armou entre os homens.

61 Colocou a sua fortaleza[30] em cativeiro

e o seu esplendor na mão dos inimigos.

62 Cercou o seu povo à espada,

irritou-se contra a sua herança.

63 Os seus jovens, devorou-os o fogo,

e as suas virgens não tiveram cântico nupcial.

64 Os seus sacerdotes tombaram à espada,

e as suas viúvas não choraram a sua morte.


65 Mas o Senhor despertou como de um sono,

qual guerreiro adormecido pelo vinho.

66 Atacou e fez retroceder os seus inimigos[31];

cobriu-os de ignomínia para sempre.

67 Assim repudiou a tenda de José

e não escolheu a tribo de Efraim[32].

68 Escolheu antes a tribo de Judá,

o monte de Sião que Ele amou.

69 Construiu o seu santuário como os altos céus

e como a terra que Ele firmou para sempre.

70 Escolheu o seu servo David,

e foi buscá-lo ao meio do redil.

71 Retirou-o de andar atrás das ovelhas,

para ser pastor de Jacob, seu povo,
e de Israel, sua herança.

72 E ele apascentou-os com a retidão do seu coração

e com a prudência das suas mãos os conduziu.

79(78)Destruição de Jerusalém


1 Salmo. De Asaf.


Ó Deus[33], os povos invadiram a tua herança,

profanaram o teu santo templo
e puseram Jerusalém em ruínas[34].

2 Deram os cadáveres dos teus servos

em alimento às aves do céu
e o corpo dos teus fiéis, às feras selvagens.

3 Derramaram o seu sangue como água

em torno de Jerusalém,
e ninguém lhes dá sepultura.

4 Tornámo-nos motivo de escárnio para os nossos vizinhos,

riso e desprezo para os que estão à nossa volta.


5 Até quando, Senhor, estarás irritado? Para sempre?

Será a tua indignação como um fogo abrasador?

6 Derrama a tua ira sobre os povos que não te conhecem[35]

e sobre os reinos que não invocam o teu nome.

7 Porque eles devoraram o povo de Jacob

e devastaram os seus domínios[36].

8 Não recordes contra nós as faltas dos antepassados[37].

Que a tua compaixão venha depressa ao nosso encontro,
pois estamos totalmente esgotados.


9 Socorre-nos, ó Deus, nosso salvador, pela glória do teu nome!

Livra-nos e apaga os nossos pecados, por causa do teu nome.

10 Porque hão de perguntar os povos: «Onde está o seu Deus?».

Que nós vejamos como se reconhece entre os povos
que foi vingado o sangue derramado dos teus servos.


11 Chegue junto de ti o gemido dos cativos,

e com teu longo braço poupa da morte os condenados.

12 E faz recair sete vezes no peito dos nossos vizinhos

as ofensas com que te ultrajaram, ó Senhor.

13 E nós, teu povo e rebanho de que és pastor,

queremos glorificar-te para sempre
e contaremos os teus louvores, de geração em geração.


80(79)Oração pela restauração de Israel


1 Ao diretor. Segundo «Os lírios são testemunho». De Asaf. Salmo.


2 Escuta[38], pastor de Israel[39],

Tu que apascentas José[40] como um rebanho,
Tu que tens o teu trono sobre os querubins.

Mostra a tua grandeza

3 a favor de Efraim, Benjamim e Manassés[41]!

Desperta o teu poder e vem para nos salvar!

4 Ó Deus, volta-te para nós[42]!

Mostra o teu rosto luminoso e seremos salvos!


5 Senhor, Deus dos Exércitos,

até quando te vais mostrar indignado,
perante as súplicas do teu povo?

6 Deste-lhes a comer pão de lágrimas

e a beber, lágrimas a triplicar.

7 Fizeste de nós motivo de conversa para os nossos vizinhos,

e os nossos inimigos escarnecem de nós.


8 Ó Deus dos Exércitos, volta-te para nós!

Mostra o teu rosto luminoso e seremos salvos!


9 Arrancaste uma videira do Egito[43],

desalojaste outros povos e transplantaste-a.

10 Preparaste-lhe o terreno

e ela foi ganhando raízes até encher a terra.

11 As montanhas cobriram-se com a sua sombra,

e os seus ramos ultrapassaram os mais altos cedros[44].


12 Estendeu os seus sarmentos até ao mar

e até ao grande rio, os seus rebentos[45].

13 Porque derrubaste os seus muros,

deixando que a vindimem quantos passam pelo caminho?

14 É devastada pelo javali da floresta

e serve de pastagem para os animais do campo[46].


15 Ó Deus dos Exércitos, volta, por favor!

Do céu, olha e vê; cuida desta vinha!

16 Protege aquilo que a tua direita plantou,

o filho[47] que tornaste forte para ti.

17 Aqueles que a queimaram no fogo como desperdício

pereçam diante do teu rosto ameaçador.

18 Põe a tua mão sobre o homem da tua direita[48]

sobre o filho de homem que tornaste forte para ti.

19 Nunca mais nos afastaremos de ti.

Dá-nos vida e continuaremos a invocar o teu nome.


20 Senhor, Deus dos Exércitos, volta-te para nós!

Mostra o teu rosto luminoso e seremos salvos!


81(80)Aliança eterna


1 Ao diretor. Sobre a lira de Gat. De Asaf.


2 Alegrai-vos em Deus, nossa força[49],

aclamai o Deus de Jacob!

3 Erguei um cântico, tocai tambor

e cítara suave juntamente com a harpa.

4 Fazei ressoar a trombeta[50] na lua nova

e na lua cheia, nossos dias de festa[51].

5 Pois isto é um preceito para Israel,

uma sentença do Deus de Jacob;

6 é um testemunho que deixou em José[52],

quando saiu da terra do Egito:


«Eu ouvi[53] a voz de alguém que não conhecia[54].

7    Então retirei os seus ombros do jugo,

as suas mãos deixaram de carregar os cestos.

8 Na angústia, tu chamaste e Eu te libertei,

respondi-te, do meio do trovão.
E pus-te à prova junto das águas de Meribá.

9 Escuta, meu povo, que Eu vou avisar-te!

Ó Israel, vê se me escutas!

10 Não deve existir em teu meio nenhum deus estranho,

nem te prostrarás diante de qualquer deus estranho.

11 Eu sou o Senhor, teu Deus,

aquele que te fez subir da terra do Egito.
Abre bem a tua boca e Eu enchê-la-ei.


12 Mas o meu povo não escutou a minha voz,

e Israel não quis nada comigo.

13 Por isso, entreguei-o à teimosia dos seus corações.

Que eles sigam os seus propósitos.

14 Quem dera que o meu povo me escutasse,

e que os de Israel seguissem os meus caminhos!

15 Num instante, Eu humilharia os seus inimigos

e ergueria a minha mão contra os seus adversários.

16 Os que odeiam o Senhor têm de curvar-se perante Ele,

o seu destino está traçado para sempre.

17 Mas Eu alimentarei o povo com a flor da farinha

e te saciarei com mel dos rochedos»[55].

82(81)Deus, juiz supremo


1 Salmo. De Asaf.


Deus ergueu-se[56] na assembleia divina[57];

no meio dos deuses, Ele profere a sentença:

2 «Até quando proferireis sentenças iníquas[58]

e deixareis que os malvados levantem a cabeça?

3 Defendei o oprimido e o órfão;

fazei justiça ao humilde e ao pobre.

4 Libertai o oprimido e o necessitado

e livrai-os das mãos dos malfeitores».


5 Eles não conhecem nem compreendem;

vagueiam na escuridão;
e os fundamentos da terra ficam abalados[59].

6 Eu disse: «Vós sois deuses,

todos vós sois filhos do Altíssimo[60].

7 Porém, como qualquer mortal, morrereis

e, como qualquer um dos príncipes, havereis de cair».

8 Levanta-te, ó Deus, para julgar a terra,

porque tens o domínio sobre todos os povos.


83(82)Os inimigos do povo de Deus


1 Cântico. Salmo. De Asaf.


2 Ó Deus, não fiques calado[61];

não fiques mudo nem impassível, ó Deus!

3 Vê como os teus inimigos se agitam

e levantam a cabeça aqueles que te odeiam.

4 Engendram planos astuciosos contra o teu povo

e conspiram contra os teus protegidos.

5 Dizem: «Andem! Vamos exterminá-los como povo!

E não volte mais a ser lembrado o nome de Israel».

6 Assim decidiram de comum acordo

e estabeleceram uma aliança contra ti:

7 as tendas de Edom e os ismaelitas[62],

Moab e os agarenos,

8 Guebal, Amon e Amalec,

os filisteus com os habitantes de Tiro.

9 Até os assírios se juntaram com eles,

e foram o braço dos filhos de Lot[63].

10 Trata-os como fizeste com Madian e Sísera[64],

como a Jabin na ribeira de Quichon.

11 Foram destruídos em En-Dor,

serviram de adubo para as terras.

12 Trata os seus príncipes como Oreb e Zeeb;

e todos os seus chefes como Zeba e Salmuna.

13 Pois eles tinham declarado:

«Tomemos para nós os campos de Deus[65]».


14 Ó meu Deus, atira-os para o redemoinho,

como palha levada pelo vento,

15 como o fogo que devora a floresta

e como a chama que incendeia os montes.

16 Persegue-os com a tua tempestade;

atormenta-os com o teu turbilhão!

17 Cobre-lhes o rosto de ignomínia;

e que então procurem o teu nome, ó Senhor.

18 Sejam confundidos e abalados para sempre,

sejam envergonhados e pereçam.

19 Fiquem a saber que o teu nome é Senhor;

Tu és o único Altíssimo sobre toda a terra!


84(83)Saudades da casa de Deus


1 Ao diretor do coro. Sobre a lira de Gat. Dos filhos de Coré. Salmo.


2 Quão amáveis são as tuas moradas[66],

ó Senhor, Deus dos Exércitos.

3 A minha alma se consome,

suspirando pelos átrios do Senhor;

o meu coração e o meu corpo

exultam de alegria pelo Deus vivo.


4 Até os pássaros encontram abrigo,

e as andorinhas têm um ninho
e ali põem os seus filhotes.

É junto dos teus altares, Senhor dos Exércitos,

meu rei e meu Deus.

5 Felizes os que habitam na tua casa,

e continuamente cantam os teus louvores.

6 Feliz aquele que tem em ti a sua força

e no seu coração as peregrinações.

7 Os que atravessam o vale do pranto[67]

fazem dele uma nascente,
como as primeiras chuvas o cobrem de bênçãos.

8 Caminharão cada vez com mais forças,

até contemplarem a Deus, em Sião.


9 Ó Senhor, Deus dos Exércitos, escuta a minha prece;

presta-me atenção, ó Deus de Jacob.

10 Olha para aquele que é o nosso escudo, ó Deus;

põe os olhos no rosto do teu ungido[68].

11 É melhor um dia nos teus átrios

do que mil em minha casa[69].

É melhor ficar à porta da casa do meu Deus

do que habitar nas tendas do malfeitor.


12 Pois Deus, o Senhor, é como um Sol e um escudo;

o Senhor concede a graça e a glória.

Ele não recusa os seus favores

àqueles que vivem com retidão.

13 Ó Senhor dos Exércitos,

feliz aquele que em ti confia.


85(84)A salvação está perto


1 Ao diretor. Dos filhos de Coré. Salmo.


2 Foste favorável para a tua terra, Senhor[70];

restauraste a prosperidade de Jacob[71].

3 Perdoaste a iniquidade do teu povo,

cobriste todos os seus pecados.

4 Recolheste a tua imensa indignação,

fizeste retroceder o furor da tua ira.


5 Volta para nós, ó Deus, nosso salvador,

e acalma a tua indignação para connosco.

6 Estarás para sempre irritado contra nós

ou prolongarás o teu furor, de geração em geração?

7 Voltarás certamente a dar-nos vida,

e o teu povo se alegrará em ti.

8 Mostra-nos, Senhor, a tua misericórdia

e concede-nos a tua salvação.


9 Quero escutar o que Deus diz;

pois o Senhor fala de paz

ao seu povo e aos seus fiéis,

aos que voltam a ter confiança nele[72].

10 Sim. A sua salvação está perto dos que o temem,

e a sua glória há de habitar a nossa terra[73].


11 A misericórdia e a verdade vão-se encontrar,

vão-se beijar a paz e a justiça[74].

12 Da terra há de brotar a verdade,

e a justiça espreitará do céu.

13 Assim o Senhor nos concederá os seus favores,

e a nossa terra produzirá seus frutos[75].

14 A justiça caminhará na sua frente

e marcará o caminho com os seus passos[76].


86(85)Oração do humilde


1 Oração. De David.


Inclina, Senhor, o teu ouvido[77];

responde-me, que estou aflito e necessitado.

2 Guarda a minha alma, porque sou fiel.

Tu és o meu Deus!
Salva o teu servo que em ti confia.

3 Tem compaixão de mim, Senhor,

que por ti clamo todo o dia.

4 Alegra o ânimo do teu servo,

pois a ti, Senhor, elevo a minha alma.

5 Pois Tu, ó Senhor, és bom e indulgente,

rico em misericórdia para quantos te invocam.


6 Senhor, escuta a minha oração,

atende ao clamor das minhas súplicas.

7 No meu dia de angústia clamo por ti,

na certeza de que me responderás.

8 Entre os deuses não há como Tu, Senhor,

e nada se compara às tuas obras.

9 Todas as nações que Tu fizeste virão

e inclinar-se-ão diante de ti, Senhor,
e darão glória ao teu nome[78].

10 Pois Tu és grande e fazes maravilhas;

Tu, só Tu és Deus.


11 Ensina-me, Senhor, o teu caminho,

pois quero caminhar na tua verdade;
que ela oriente o meu coração no temor do teu nome.

12 Hei de louvar-te de todo o coração, Senhor, meu Deus,

e glorificar o teu nome para sempre.

13 Pois é grande a tua misericórdia para comigo,

e libertaste a minha alma das profundezas da morte[79].


14 Os orgulhosos erguem-se contra mim, ó Deus,

a turba dos prepotentes ameaça a minha vida
e não te têm presente diante deles.

15 Tu, porém, Senhor, és um Deus terno e compassivo,

paciente e rico em misericórdia e fidelidade.

16 Volta para mim a tua face e tem compaixão de mim;

concede a tua força ao teu servo
e salva o filho da tua serva.

17 Faz para comigo um gesto de bondade,

e que os meus inimigos sejam confundidos,
ao verem que Tu, Senhor, me ajudaste e confortaste.


87(86)A glória de Sião


1 Dos filhos de Coré. Salmo. Cântico.

Fundada por Ele sobre montanhas sagradas[80],

2 o Senhor ama as portas de Sião

mais do que todas as moradas de Jacob.

3 Coisas gloriosas se proclamam de ti,

ó cidade de Deus.

4 Lembrarei Raab[81] e a Babilónia entre os que me conhecem.

Eis a Filisteia, Tiro e a Etiópia[82];
cada um ali nasceu.


5 De Sião, porém, se dirá:

«Um e outro, todos ali nasceram;
e o próprio Altíssimo a estabeleceu».

6 O Senhor apontará no registo dos povos:

«Este nasceu ali».Pausa


7 E dançando, eles cantarão[83]:

«As minhas fontes estão todas em ti».


88(87)Oração no meio do sofrimento


1 Cântico. Salmo dos filhos de Coré. Ao diretor. Em coro. Poema.

De Heman, o ezraíta[84].


2 Ó Senhor, meu Deus e salvador[85],

na tua presença, eu clamo dia e noite.

3 Chegue diante de ti a minha oração,

inclina o teu ouvido para o meu clamor.


4 A minha alma está saturada de amarguras,

os meus dias chegaram ao abismo da morte[86].

5 Estou contado entre os que descem à sepultura[87];

sou como um guerreiro já sem forças.

6 Estou largado entre os mortos,

como os defuntos que jazem no sepulcro.

Desses já não te lembras mais,

pois foram separados da tua mão[88].

7 Lançaste-me nas profundezas da cova,

nas trevas, nos abismos.:

8 Pesa sobre mim a tua indignação,

e com todas as tuas ondas me oprimes.Pausa

9 Afastaste de mim os meus conhecidos,

tornaste-me abominável para eles;
estou como um preso, sem poder sair.

10 A minha vista apagou-se de tanto sofrer.

Todos os dias clamo por ti, Senhor,
e estendo para ti as minhas mãos.

11 Será que fazes prodígios para os mortos?

Irão os defuntos levantar-se para te louvar?

12 Porventura se conta a tua misericórdia no sepulcro,

ou a tua fidelidade no lugar da perdição[89]?

13 Serão as tuas maravilhas conhecidas na escuridão,

ou a tua justiça na terra do esquecimento?


14 Por isso, venho a ti, Senhor, e clamo por socorro;

e, pela manhã, a minha oração se apresenta diante de ti.

15 Porque rejeitas a minha alma, ó Senhor,

e escondes de mim o teu rosto?

16 Infeliz de mim, que agonizo desde a juventude;

de tanto suportar os teus temores, estou esgotado.

17 Sobre mim passaram as tuas indignações,

os teus terrores me aniquilaram.

18 Como vagas, rodeiam-me todo o dia;

e todos juntos caem sobre mim.

19 Afastaste de mim amigos e companheiros;

os meus conhecidos são as trevas.:


89(88) Aliança messiânica


1 Poema. De Etan, o ezraíta[90].


2 Cantarei para sempre as misericórdias do Senhor[91];

de geração em geração anunciarei
a tua fidelidade por minha boca.

3 Por isso, proclamo que a tua misericórdia

está edificada para sempre,
e a tua fidelidade está firme como os céus[92].


4 «Fiz uma aliança com o meu escolhido[93],

fiz um juramento em favor de David, meu servo:

5 Estabelecerei a tua descendência para sempre

e firmarei o teu trono de geração em geração».


6 Os céus louvarão as tuas maravilhas, ó Senhor;

e a assembleia dos santos, a tua fidelidade[94].

7 Quem nas alturas se pode igualar ao Senhor?

Quem se assemelha ao Senhor entre os deuses[95]?

8 Deus é respeitado no conselho dos santos,

superior e temível para todos os que o rodeiam.

9 Quem é como Tu, Senhor, Deus dos Exércitos?

És poderoso, Senhor,
e a tua fidelidade é a corte à tua volta.


10 Tu governas a fúria dos mares[96]

e acalmas o fragor das suas ondas.

11 Tu despedaçaste o cadáver de Raab[97],

dispersaste os teus inimigos com a força do teu braço.

12 O céu é teu e a terra é tua também;

formaste o mundo e tudo aquilo que o preenche.

13 O norte e o sul, Tu os criaste;

o Tabor e o Hermon rejubilam com o teu nome[98].

14 O teu braço é poderoso,

a tua mão é robusta, e excelsa, a tua direita.


15 Justiça e retidão são o fundamento do teu trono[99];

verdade e misericórdia caminham à tua frente.

16 Feliz o povo dos que te sabem aclamar, Senhor:

caminharão à luz do teu rosto.

17 Em teu nome se regozijam todo o dia

e se orgulham com a tua justiça.

18 Pois Tu és a nossa honra e força;

e com o teu desígnio nos fazes erguer a cabeça.

19 Na verdade, o nosso escudo é o Senhor,

e o nosso rei é o Santo de Israel.


20 Outrora declaraste em visão[100]

e disseste aos teus fiéis[101]:

«Eu prestei ajuda a um herói[102],

promovi um jovem do meio do povo.

21 Encontrei David, meu servo,

e ungi-o com o meu óleo santo.

22 Pois a minha mão estará firmemente com ele,

e o meu braço há de torná-lo forte.

23 O inimigo não se levantará contra ele[103],

nem o homem perverso há de humilhá-lo.

24 Derrubarei diante dele os seus adversários

e destruirei aqueles que o odeiam.

25 A minha fidelidade e misericórdia estarão com ele,

e pelo meu nome crescerá o seu poder.

26 Estenderei o poder da sua mão esquerda sobre o mar

e o da sua direita sobre os rios[104].

27 Ele me invocará, dizendo: “Tu és meu pai,

és o meu Deus e o rochedo da minha salvação!”

28 E Eu farei dele o primogénito,

o mais excelso entre os reis da terra.

29 Hei de assegurar-lhe para sempre a minha misericórdia,

e a minha aliança manter-se-á fiel com ele.

30 Estabelecerei para sempre a sua descendência,

e o seu trono permanecerá como os céus.


31 Se os seus filhos abandonarem a minha lei

e não caminharem segundo os meus preceitos;

32 se transgredirem as minhas ordens

e não guardarem os meus mandamentos,

33 então hei de castigar o seu crime com uma vara

e a sua maldade com um chicote.

34 Porém, não lhes retirarei a minha misericórdia,

nem faltarei à minha promessa.

35 Não profanarei a minha aliança,

nem mudarei a palavra da minha boca.

36 Jurei uma vez pela minha santidade

que não enganaria David.

37 A sua descendência permanecerá para sempre

e o seu trono será como o Sol, diante de mim.

38 Estará firme para sempre como a Lua,

testemunha fiel no firmamento».


39 Tu, porém, rejeitaste e abandonaste o teu ungido[105]

e te irritaste contra ele.

40 Renegaste a aliança com o teu servo

e profanaste por terra a sua coroa.

41 Derrubaste todos os seus muros,

reduziste a escombros as suas fortalezas.

42 Todos os transeuntes o saquearam;

tornou-se motivo de escárnio para os seus vizinhos.


43 Ergueste a mão dos seus inimigos,

encheste de alegria todos os seus adversários.

44 Mas a ele, desgastaste-lhe o fio da espada

e não lhe deste vitória na batalha.

45 Fizeste cessar o seu esplendor,

deitaste por terra o seu trono.

46 Abreviaste os dias da sua juventude

e cobriste-o de vergonha.


47 Até quando, Senhor, continuarás escondido?

Arderá para sempre a tua ira como fogo?

48 Lembra-te de mim. Que breve existência!

Para que ilusão criaste os seres humanos?

49 Quem é tão forte que possa viver sem ver a morte

e consiga livrar a sua alma das garras do abismo?

50 Onde está a tua misericórdia de outrora,

a qual juraste a David pela tua fidelidade?

51 Lembra-te, Senhor, das injúrias contra os teus servos,

pois trago no peito o ultraje de tantas nações poderosas[106]!

52 Como os teus inimigos proferem injúrias, Senhor!

Como injuriam os passos do teu ungido!


53 Bendito seja o Senhor para sempre! Amen! Amen[107]!


90(89)Brevidade da vida


1 Oração. De Moisés, homem de Deus[108].


Ó Senhor, Tu foste para nós um refúgio[109],

de geração em geração.

2 Antes de terem nascido as montanhas

e serem dados à luz a terra e o mundo,
desde sempre e para sempre, Tu és Deus.

3 Tu podes fazer voltar o mortal ao pó;

basta dizeres[110]: «Regressai, ó seres humanos!».

4 Pois mil anos aos teus olhos

são como o dia de ontem que passou
ou uma vigília da noite[111].

5 Se os arrebatas durante o sono,

de manhã são como a erva que se corta.

6 Se de manhã está verdejante e é cortada,

pela tarde, já está murcha e depois seca.


7 Em verdade, fomos consumidos pela tua ira,

estamos perturbados pela tua indignação.

8 Colocaste diante de ti as nossas culpas,

os nossos segredos estão à luz dos teus olhos.


9 Todos os nossos dias decorreram debaixo da tua cólera,

os nossos anos dissipam-se como um suspiro.

10 Os nossos dias de vida podem ser setenta anos

ou, para os mais fortes, oitenta.

E a sua agitação é trabalho e miséria;

depressa a satisfação passa, e nós desaparecemos.


11 Quem pode compreender a violência da tua ira

e a tua cólera contra aqueles que te temem?

12 Ensina-nos a orientar corretamente os nossos dias,

para entrarmos no pórtico da sabedoria[112].


13 Volta, Senhor! Até quando?

Tem compaixão dos teus servos.

14 Que a tua misericórdia nos sacie pela manhã,

para exultarmos e nos alegrarmos todos os nossos dias.

15 Dá-nos tantos dias de alegria

como aqueles em que nos afligiste,
como os anos em que vimos a desgraça.

16 Manifesta aos teus servos a tua obra,

e aos filhos deles, o teu esplendor.


17 Desça sobre nós a bondade do Senhor, nosso Deus!

E confirma para nós a obra das nossas mãos.
Sim! Confirma a obra das nossas mãos!


91(90)Deus, refúgio e proteção


1 Aquele que habita sob a proteção do Altíssimo[113]

e se acolhe à sombra do Omnipotente,

2 esse poderá exclamar: «Ó Senhor,

Tu és o meu refúgio e minha cidadela;
és o meu Deus, em quem confio!»[114].


3 É Ele que te há de livrar da armadilha

e proteger-te da peste[115] maligna.

4 Ele te cobrirá com as suas penas;

debaixo das suas asas terás refúgio;::a sua fidelidade é escudo e couraça.

5 Não temerás o terror da noite,

nem a seta que voa de dia.

6 Não temerás a peste que alastra nas trevas,

nem o flagelo que devasta em pleno dia[116].

7 Podem cair mil à tua esquerda

e dez mil à tua direita,
que a ti não te atingirá.

8 Basta abrires os olhos

e verás a paga dos malfeitores.

9 Pois tu disseste: «O Senhor é meu refúgio»

e fizeste do Altíssimo o teu abrigo.

10 Nenhuma desgraça se aproximará de ti,

nenhuma epidemia chegará à tua tenda.

11 Por ti, Ele deu ordens aos seus anjos,

para te guardarem em todos os teus caminhos[117].

12 Eles hão de transportar-te na palma das mãos,

para que o teu pé não tropece em nenhuma pedra.

13 Poderás caminhar sobre serpentes e víboras,

calcar aos pés leões e dragões.


14 «Porque se entregou a mim, Eu o libertarei;

defendê-lo-ei, porque conhece o meu nome[118].

15 Ele invoca-me e Eu respondo-lhe,

estarei com ele na tribulação,
para o livrar e cobrir de honra.

16 Hei de saciá-lo com longos dias de vida

e farei com que veja a minha salvação».

92(91) Em louvor da justiça de Deus


1 Salmo. Cântico. Para o dia de sábado.


2 Como é bom dar graças[119] ao Senhor[120],

e cantar hinos ao teu nome, ó Altíssimo!

3 É bom anunciar de manhã a tua misericórdia

e a tua fidelidade durante a noite[121],

4 com a lira de dez cordas e a cítara

e ao som melodioso da harpa.


5 Tu me alegraste, Senhor, com os teus feitos,

e exulto com as obras das tuas mãos.

6 Como são grandiosas as tuas obras, ó Senhor!

Quão profundos são os teus desígnios!:

7 O homem insensato não entende estas coisas,

e o ignorante não compreende nada disto.

8 Ainda que os malfeitores cresçam como a erva

e floresçam todos os que praticam a maldade,
é para serem exterminados para sempre.

9 Tu, porém, Senhor,

és o excelso para sempre.

10 Por isso, os teus inimigos, Senhor,

os teus inimigos hão de perecer
e serão dispersos todos os que praticam a iniquidade.


11 Fizeste-me erguer a cabeça como um búfalo[122]

e ungiste-me com óleo perfumado.

12 Os meus olhos hão de ver o fim dos que me espiam

e os meus ouvidos hão de ouvir
os gritos[123] dos que se erguem contra mim.


13 O justo florescerá como a palmeira

e crescerá como um cedro no Líbano[124].

14 Plantados na casa do Senhor,

florescerão nos átrios do nosso Deus.

15 Até de cabelos brancos continuam viçosos

e hão de manter sempre a seiva e o vigor,

16 para proclamar que o Senhor é reto,

é o meu rochedo e nele não há falsidade.


93(92)Deus reina sobre a criação


1 O Senhor é rei[125], revestido de majestade;

o Senhor, revestido e cingido de poder!
Ele firmou o universo, que não vacilará[126].

2 O teu trono, ó Deus, está firme desde o princípio,

pois Tu és desde a eternidade.


3 Ergueram as torrentes, ó Senhor,

ergueram as torrentes o seu bramido,
ergueram as torrentes o seu fragor.

4 Porém, mais que o bramido das águas caudalosas,

mais poderoso que o rebentar das vagas do mar
é poderoso o Senhor lá nas alturas.


5 Os teus preceitos são inteiramente eficazes,

a tua casa está adornada de santidade,
por dias sem fim, ó Senhor[127]!


94(93) Deus, juiz do mundo


1 Ó Senhor, Deus justiceiro[128]!

Deus justiceiro[129], manifesta-te!

2 Levanta-te, juiz da terra;

retribui aos soberbos a paga merecida.

3 Até quando os malfeitores, Senhor,

até quando os malfeitores triunfarão?

4 Todos os que praticam a iniquidade

vomitam palavras insolentes e vangloriam-se.


5 Eles esmagam o teu povo, Senhor,

e oprimem a tua herança.

6 Matam a viúva e o estrangeiro

e assassinam os órfãos[130].

7 Eles dizem: «O Senhor[131] não vai ver;::o Deus de Jacob não se aperceberá!».


8 Compreendei isto, ó gente imbecil!

E vós, insensatos, quando ganhareis juízo?

9 Aquele que implantou o ouvido não ouviria?

Aquele que formou os olhos não haveria de ver?

10 Aquele que corrige os povos não castigaria?

Se é Ele que ensina aos humanos a sabedoria!

11 O Senhor conhece bem os pensamentos dos humanos

e sabe que eles são uma ilusão[132].


12 Feliz o homem a quem Tu corriges, Senhor,

e ensinas com a tua lei[133]!

13 Assim terá descanso nos dias de aflição,

enquanto se abre a cova para o malfeitor.

14 Pois o Senhor não rejeita o seu povo[134]

e não abandona a sua herança.

15 Voltará a haver equidade na justiça[135]

e hão de segui-la todos os de coração reto.


16 Quem se levantará por mim contra os maus?

Quem resistirá por mim contra os que praticam o mal?

17 Se o Senhor não fosse o meu auxílio,

num instante a minha alma habitaria o silêncio[136].

18 Mal eu digo: «Os meus pés vacilam»,

logo a tua misericórdia, Senhor, me ampara.

19 Quando crescem as preocupações dentro de mim,

os teus gestos de conforto deliciam a minha alma.


20 Poderá aliar-se contigo um tribunal iníquo,

que forja injustiças contra o direito?

21 Atentam contra a vida do justo

e condenam à morte o inocente[137].

22 Mas o Senhor é a minha fortaleza

e o meu Deus é o rochedo onde me refugio.

23 Fará recair sobre eles a sua iniquidade

e os destruirá com a sua própria maldade.
O Senhor, nosso Deus, os destruirá!


95(94)Exortação ao louvor de Deus


1 Vinde! Exultemos de alegria no Senhor[138],

aclamemos o rochedo[139] da nossa salvação.

2 Vamos à sua presença com hinos de louvor,

aclamemo-lo com cânticos.


3 Pois grande Deus é o Senhor,

é rei poderoso acima de todos os deuses.

4 Na sua mão estão as profundezas da terra,

e são suas as alturas das montanhas.

5 Seu é o mar, pois foi Ele quem o fez,

e a terra firme que as suas mãos modelaram.

6 Entrai, inclinemo-nos e prostremo-nos;

ajoelhemos diante do Senhor que nos criou.

7 É Ele o nosso Deus e nós, o povo de que Ele é pastor[140],

as ovelhas que a sua mão conduz.
Oxalá ouvísseis hoje a sua voz[141]!


8 «Não endureçais os vossos corações como em Meribá,

como no dia de Massá, no deserto[142],

9 quando os vossos pais me provocaram e puseram à prova,

apesar de terem visto as minhas obras.

10 Durante quarenta anos[143] abominei tal geração,

e disse: “São um povo de coração desorientado
e não reconheceram os meus caminhos!”

11 Por isso jurei na minha ira:

“Não entrarão no meu lugar de repouso[144]».


96(95)Deus, rei do universo


1 Cantai ao Senhor um cântico novo[145],

cantai ao Senhor, terra inteira!

2 Cantai ao Senhor, bendizei o seu nome,

anunciai de dia em dia a sua salvação.

3 Ide contar entre os povos a sua glória,

em todas as nações, as suas maravilhas.

4 Pois o Senhor é grande e digno de todo o louvor,

é mais temível do que todos os deuses.

5 Todos os deuses dos povos são apenas ídolos,

mas o Senhor é que fez os céus[146].

6 Na sua presença há majestade e esplendor,

no seu santuário, beleza e poder[147].


7 Dai ao Senhor, famílias dos povos,

dai ao Senhor glória e poder.

8 Dai ao Senhor a glória do seu nome,

levai as ofertas e entrai nos seus átrios.

9 Inclinai-vos diante do Senhor no esplendor do santuário;

e trema diante dele a terra inteira!

10 Proclamai entre os povos: «O Senhor é rei!».

Por isso, a terra está firme, sem vacilar,
pois Ele faz justiça aos povos com equidade.

11 Alegrem-se os céus e rejubile a terra;

ressoe o mar e tudo o que ele contém.

12 Regozijem-se os campos e tudo o que neles existe

e que todas as árvores da floresta rejubilem,:

13 diante do Senhor que vem,

que vem para julgar a terra!

Ele julga o mundo com justiça

e os povos com a sua fidelidade.


97(96)Reinado universal de Deus


1 O Senhor é rei: exulte a terra[148]

e alegrem-se as ilhas numerosas!

2 Em seu redor há nuvens e tempestades[149];

a justiça e o direito são a base do seu trono.

3 Um fogo caminha à sua frente

e incendeia os seus adversários, em volta.

4 Os seus relâmpagos iluminam o mundo;

a terra viu e estremeceu.

5 As montanhas derreteram-se como cera, diante do Senhor,

diante do senhor de toda a terra.


6 Os céus apregoam a sua justiça[150],

e todos os povos viram a sua glória.

7 Sejam envergonhados todos os que servem estátuas,

aqueles que se vangloriam em ídolos.
Diante dele se prostrem todos os deuses.


8 Sião ouviu e encheu-se de alegria[151],

e as cidades de Judá regozijaram,
por causa das tuas sentenças, ó Senhor.

9 Pois Tu, Senhor, és o Altíssimo sobre toda a terra

e subiste muito acima de todos os deuses.

10 Os que amam o Senhor odeiam o mal;

Ele guarda as almas dos seus fiéis
e livra-os das mãos dos inimigos.

11 Uma luz desponta para o justo,

e a alegria para os retos de coração[152].

12 Alegrai-vos, justos, no Senhor,

e celebrai a memória do seu nome santo.


98(97)Hino ao rei do universo


1 Salmo.


Cantai ao Senhor um cântico novo[153],

porque Ele fez maravilhas!

A sua mão direita e o seu santo braço

lhe deram a vitória[154].

2 O Senhor anunciou a sua vitória,

revelou a sua justiça aos olhos dos povos.

3 Lembrou-se da sua misericórdia e fidelidade

para com a casa de Israel.

Todos os confins da terra viram

a salvação do nosso Deus[155].

4 Aclamai o Senhor, terra inteira,

gritai, rejubilai e cantai.

5 Cantai ao Senhor, ao som da harpa,

ao som da harpa e da lira.

6 Com as trombetas e ao som do cornetim,

aclamai na presença do Senhor, que é rei.


7 Ressoe o mar e tudo o que ele contém[156],

o mundo e os que nele habitam.

8 Que os rios batam palmas,

em coro, as montanhas gritem de alegria,

9 diante do Senhor, que vem julgar a terra!

Ele julga o mundo com justiça
e os povos com retidão.


99(98)Rei supremo e santo


1 O Senhor é rei[157], tremam os povos[158]!

O seu trono é sobre os querubins[159].
Que a terra inteira estremeça.

2 O Senhor é grande em Sião

e é excelso sobre todos os povos.

3 Que eles louvem o teu nome, grande e terrível,

porque ele é santo!

4 A força de um rei está em amar a justiça.

Ora, Tu estabeleceste a equidade,

o direito e a justiça em Jacob.

Tu é que o realizaste.


5 Exaltai o Senhor, nosso Deus,

prostrai-vos junto ao estrado dos seus pés,
pois Ele é santo.

6 Moisés e Aarão estão entre os seus sacerdotes[160]

e Samuel, entre os que invocam o seu nome.
Invocavam o Senhor e Ele respondia-lhes.

7 De uma coluna de nuvem Deus falava;

eles guardaram os seus preceitos
e a lei que lhes tinha dado.


8 Senhor, nosso Deus, Tu respondeste-lhes;

foste um Deus indulgente para com eles,
mesmo castigando as suas maldades[161].


9 Exaltai o Senhor, nosso Deus,

prostrai-vos junto da sua montanha santa,
pois o Senhor, nosso Deus, é santo.


100(99)Hino de ação de graças


1 Salmo. Para ação de graças.


Aclamai o Senhor, terra inteira[162]!

2 Servi ao Senhor com alegria,

ide à sua presença com júbilo!

3 Sabei que só o Senhor é Deus;

foi Ele que nos fez e a Ele pertencemos[163];
somos o seu povo e o rebanho de que Ele é pastor.

4 Entrai nas suas portas em ação de graças,

nos seus átrios com hinos de louvor;
agradecei-lhe e bendizei o seu nome.

5 Pois o Senhor é bom;

é eterna a sua misericórdia[164],
e a sua fidelidade continua de geração em geração.:


101(100)O rei ideal


1 De David. Salmo.


Quero cantar a misericórdia e a justiça[165].

Para ti, Senhor, dirijo o meu canto.

2 Quero compreender bem o caminho da honestidade.

Quando virás ao meu encontro[166]?

Caminharei na integridade do meu coração,

no interior da minha casa.

3 Não porei diante dos meus olhos coisas indignas[167];

odeio os que praticam perversidades,
não se hão de ligar a mim.

4 O coração perverso ficará longe de mim;

não quero saber do homem mau.

5 Aquele que em segredo difama o seu próximo,

reduzi-lo-ei ao silêncio.

O que tem olhar altivo e coração ambicioso,

esse eu não suportarei[168].


6  </nowiki>Os meus olhos estão com a gente fiel da terra,

para poder habitar comigo.

Aquele que segue pelo caminho da honestidade,

esse estará ao meu serviço.

7 Dentro da minha casa não habitará

aquele que comete o engano.

Aquele que profere mentiras

não se aguentará diante dos meus olhos.

8 Cada manhã[169], reduzirei ao silêncio

todos os malfeitores da terra,

para eliminar da cidade do Senhor

todos os que praticam a iniquidade.


102(101)Oração de um aflito


1 Oração de um aflito que, a desfalecer, expôs diante do Senhor o seu lamento.


2 Senhor, escuta a minha oração[170],

e chegue junto de ti o meu clamor!

3 Não escondas de mim o teu rosto,

no dia em que eu estiver em aflição.

Inclina para mim o teu ouvido;

no dia em que eu gritar, responde-me depressa!


4 Pois os meus dias se desvanecem como fumo,

e os meus ossos ardem como um braseiro.

5 Como erva cortada, o meu coração está ressequido;

até me esqueço de comer o meu pão.

6 De tanto gritar e gemer,

os meus ossos colaram-se-me à carne[171].


7 Estou parecido com um mocho do deserto,

sou como uma coruja das ruínas.

8 Não consigo dormir e assim fico[172]

como um pássaro solitário no telhado.

9 Os meus inimigos insultam-me todo o dia,

os que me louvavam amaldiçoam-me[173].

10 Em vez de pão, tenho comido cinza[174];

e misturo a minha bebida com lágrimas.


11 Foi por causa da tua indignação e do teu furor,

pois levaste-me ao alto e a seguir deitaste-me fora.

12 Meus dias são como sombra que se prolonga,

e eu vou secando tal como a erva.


13 Tu, porém, Senhor, permaneces para sempre,

e a tua memória por todas as gerações.

14 Levanta-te e tem compaixão de Sião;

é tempo de lhe perdoares, chegou a hora.

15 Os teus servos querem muito às suas pedras

e têm pena das suas ruínas.


16 Os povos hão de temer o nome do Senhor,

e os reis da terra a tua glória.

17 Quando o Senhor tiver reconstruído Sião

e se manifestar na sua glória[175],

18 há de voltar-se para a oração do indigente

e não desprezará as suas súplicas.

19 Que isto fique escrito para a geração futura,

e os que ainda hão de nascer louvarão o Senhor[176].

20 Pois o Senhor observa do alto do seu santuário,

lá do céu fixa os olhos na terra,

21 para escutar os gemidos dos prisioneiros

e abrir as portas aos que estão condenados a morrer;

22 para anunciar em Sião o nome do Senhor

e o seu louvor em Jerusalém,

23 quando se reunirem os povos e os reinos,

para juntos servirem o Senhor.


24 Ele esgotou-me as forças no caminho

e abreviou os meus dias.

25 E eu disse: «Não me leves, meu Deus, a meio dos meus dias!».

Os teus anos duram por todas as gerações[177].

26 Ao princípio, assentaste os fundamentos da terra

e os céus são obra das tuas mãos.

27 Eles perecerão, mas Tu permanecerás;

como um tecido, todos se desgastam.
Como se muda de vestido Tu os mudarás e desaparecerão.

28 Tu, porém, és o mesmo;

os teus anos não acabarão.

29 Os filhos dos teus servos terão onde viver,

e os seus descendentes estarão firmes diante de ti.


103(102)Hino à misericórdia de Deus


1 De David.


Bendiz, ó minha alma, o Senhor[178],

e todo o meu íntimo bendiga o seu santo nome.

2 Bendiz, ó minha alma, o Senhor,

e não esqueças nenhum dos seus benefícios.

3 É Ele quem perdoa as tuas culpas,

quem cura todas as tuas enfermidades.

4 É Ele quem resgata do túmulo a tua vida

e te coroa de misericórdia e ternura.

5 É Ele quem sacia de bens a tua existência[179]

e renova como a águia a tua juventude.


6 O Senhor garante justiça

e direito para todos os oprimidos.

7 Deu a conhecer os seus caminhos a Moisés

e os seus prodígios aos filhos de Israel[180].

8 O Senhor é bondoso e compassivo,

paciente e cheio de misericórdia[181].

9 Não está continuamente a repreender,

nem a sua ira dura para sempre.

10 Não nos tratou conforme os nossos pecados,

nem nos pagou de acordo com as nossas culpas.

11 Pois tal como o céu está bem alto acima da terra,

assim é forte a sua misericórdia para os que o temem.

12 Como o Oriente está afastado do Ocidente,

assim Ele afasta de nós os nossos pecados.

13 Como um pai se compadece dos filhos,

assim o Senhor se compadece dos que o temem.

14 Pois Ele conhece a nossa inclinação,

lembrando-se de que somos pó[182].


15 Para um ser humano, os seus dias são como a erva[183];

como a flor do campo, também ele floresce.

16 Quando o vento lhe passa por cima, desaparece,

e já nem se reconhece o seu lugar.


17 Mas a misericórdia do Senhor é de sempre e para sempre

para aqueles que o temem;
e a sua justiça é também para os filhos dos seus filhos.

18 Ela é para os que guardam a sua aliança

e se lembram de cumprir os seus preceitos.

19 O Senhor estabeleceu nos céus o seu trono,

e a sua realeza domina tudo o que existe.


20 Bendizei o Senhor, vós, os seus anjos[184],

poderosos mensageiros que executais as suas ordens,
sempre atentos à sua palavra.

21 Bendizei o Senhor, todos os seus exércitos,

servidores e executores da sua vontade.

22 Bendizei o Senhor, todas as suas obras,

em todos os lugares do seu domínio.
Bendiz, ó minha alma, o Senhor!


104(103)Hino ao criador do universo


1 Bendiz, ó minha alma, o Senhor[185]!

Senhor, meu Deus, como Tu és grande!
Estás revestido de esplendor e majestade.

2 És aquele que está envolto de luz como de um manto,

que estende os céus como um toldo;

3 aquele que armazena de água as suas altas moradas[186];

aquele que faz das nuvens o seu carro
e caminha sobre as asas do vento;

4 aquele que faz dos ventos os seus mensageiros

e dos relâmpagos, seus servidores;

5 aquele que fundou a terra sobre as suas bases,

para não vacilar jamais.

6 Tu a cobriste com o manto do oceano,

e as águas mantinham-se por cima das montanhas.

7 Com a tua ameaça, elas fugiram;

ao fragor do teu trovão, precipitaram-se.

8 Subiam para as montanhas e desciam às profundezas,

conforme o lugar que lhes preparaste.

9 Estabeleceste um limite para as águas não ultrapassarem

e não voltarem a cobrir a terra.

10 És Tu que envias a água das nascentes para os rios,

que correm por entre as montanhas.

11 Eles dão de beber a todos os animais do campo;

ali matam a sede os burros selvagens.

12 Por cima dos rios moram as aves do céu

e de entre as ramagens entoam o seu canto.


13 És aquele que rega as montanhas desde as tuas altas moradas.

A terra fica saciada com o fruto das tuas obras.

14 És o que faz brotar a erva para o gado

e as verduras para benefício dos homens,

para assim fazerem brotar da terra o seu pão

15    e o vinho que alegra o coração dos humanos.

Assim obtém azeite para fazer brilhar o seu rosto

e pão que lhe reconforta o ânimo.


16 Ficam satisfeitas as árvores do Senhor,

os cedros do Líbano que Ele plantou.

17 Ali fazem os pássaros o seu ninho;

dos cedros faz a cegonha a sua casa[187].

18 Os altos montes são para as cabras,

os penhascos são o refúgio dos roedores.


19 A Lua procede conforme os tempos,

e o Sol conhece o seu ocaso.

20 Tu estendes a escuridão e faz-se noite[188];

nela vagueiam todos os animais da selva.

21 Os leões rugem em busca da presa,

pedindo a Deus o seu alimento.

22 Nasce o Sol, logo se retiram,

para se recolherem nos seus refúgios.

23 Sai o homem para a sua tarefa,

para o seu trabalho até ao anoitecer.


24 Como são numerosas as tuas obras, Senhor!

Tudo fizeste com sabedoria;
a terra está cheia das tuas criaturas.

25 Eis ali o mar, grande e de vastas extensões,

onde se agitam, sem número,
animais pequenos e grandes.

26 Por ali andam os navios e o Leviatan,

monstro que formaste para com ele brincar[189].

27 Todos esperam por ti,

para lhes dares o alimento a seu tempo.

28 Tu lhes dás e eles recolhem;

abres a tua mão e ficam saciados de bens.

29 Se deles escondes o teu rosto[190], ficam perturbados;

se lhes retiras o alento, expiram
e voltam ao pó de onde saíram.

30 Se lhes envias o teu espírito[191], são de novo criados.

E assim renovas a face da terra.


31 Que a glória do Senhor seja para sempre!

Que o Senhor se alegre nas suas obras!

32 Ele observa a terra e ela estremece[192],

toca nos montes e eles fumegam.

33 Quero cantar ao Senhor, enquanto eu viver;

tocarei para o meu Deus, enquanto existir.

34 Que o meu poema lhe seja agradável,

pois no Senhor está a minha alegria.

35 Desapareçam da terra os pecadores[193]!

E não existam mais os malfeitores!

Bendiz, ó minha alma, o Senhor!

Aleluia[194]!


105(104)Deus e a história de Israel


1 Louvai o Senhor, aclamai o seu nome[195],

dai a conhecer entre os povos os seus prodígios.

2 Cantai, entoai hinos em sua honra,

proclamai todas as suas maravilhas.

3 Gloriai-vos no seu santo nome;

alegre-se o coração dos que procuram o Senhor.

4 Recorrei ao Senhor e ao seu poder,

buscai continuamente a sua face.

5 Recordai as maravilhas que Ele fez,

os seus prodígios e as sentenças da sua boca[196],

6 vós que sois descendentes de Abraão, seu servo,

e filhos de Jacob, seu escolhido.

7 Ele é o Senhor, nosso Deus,

por toda a terra vigoram as suas sentenças.

8 Ele lembra-se eternamente da sua aliança[197],

da palavra que estabeleceu por mil gerações,

9 do pacto que fez com Abraão

e do juramento que fez a Isaac.

10 Ele confirmou-a como lei para Jacob,

como aliança eterna para Israel.

11 Pois disse: «A ti darei a terra de Canaã,

como parte que vos cabe em herança».


12 Eles eram, então, um pequeno número[198],

poucos e estrangeiros naquela terra;

13 iam vagueando de povo em povo[199]

e de um reino para outra nação.

14 Ele não permitiu que ninguém os oprimisse

e castigou reis por causa deles:

15 «Não toqueis nos meus ungidos,

não maltrateis os meus profetas».


16 Depois, chamou a fome sobre aquela terra,

destruindo todas as searas de pão.

17 Enviou à frente deles um homem

que fora vendido como escravo, José.

18 Prenderam-lhe os pés com grilhões

e o pescoço, numa argola de ferro,

19 até ao tempo em que se realizou a sua palavra

e a declaração do Senhor lhe deu razão.

20 Enviou então um rei, para que o soltassem[200],

e um soberano de povos, para lhe abrir a porta.

21 Este nomeou-o senhor da sua casa

e governador de todos os seus bens,

22 para instruir por si mesmo os seus príncipes

e tornar sábios os seus anciãos[201].


23 Foi então que Israel entrou para o Egito,

Jacob foi como imigrante para o país de Cam.

24 Deus fez frutificar grandemente o seu povo

e tornou-o mais forte do que os seus adversários.

25 Mudou o coração dos outros e passaram a odiar o povo de Deus,

tratando com artimanhas os seus servos.


26 Enviou então o seu servo Moisés

e Aarão, que foi o seu escolhido.

27 Estes realizaram maravilhas entre os egípcios

e prodígios no país de Cam[202].

28 Enviou as trevas e tudo escureceu[203],

mas eles não fizeram caso das suas palavras.

29 Converteu as suas águas em sangue

e fez morrer todos os seus peixes.

30 Encheu de rãs todo o seu país,

até nos aposentos do seu rei.

31 Deus ordenou e chegaram nuvens de insetos

e mosquitos, por todo o seu território.

32 Em vez das chuvas deu-lhes granizo

e línguas de fogo por todo o país.

33 Destruiu as suas vinhas e figueiras[204]

e destroçou as árvores do seu território.

34 Deu ordens e chegaram os gafanhotos

e larvas, em número incalculável;

35 devoraram toda a verdura dos campos

e comeram os frutos das suas terras.

36 Feriu de morte todos os primogénitos do país,

as primícias de todo o seu vigor.


37 Fê-los[205] sair levando prata e ouro,

e ninguém fraquejou entre as suas tribos[206].

38 Alegrou-se o Egito com a saída deles,

pois recaíra sobre eles o medo dos israelitas.

39 Estendeu uma nuvem de proteção

e um fogo para os iluminar à noite.

40 Pediram-lhe e chegaram as codornizes,

e saciou-os com pão do céu.

41 Abriu o rochedo e brotou água,

que corria pelo deserto como um rio.

42 Pois Ele lembrou-se da sua palavra sagrada

para com Abraão, seu servo,

43 e fez sair o seu povo com alegria

e os seus escolhidos com gritos de júbilo.


44 Entregou-lhes as terras de outros povos

e eles recolheram as riquezas das nações,

45 com o propósito de guardarem os seus preceitos

e observarem as suas leis[207].
Aleluia!


106(105)Infidelidades de Israel


1 Aleluia!

Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom[208],

porque é eterna a sua misericórdia.

2 Quem poderá contar os feitos do Senhor

e apregoar todos os seus louvores?

3 Feliz daquele que observa o direito

e cumpre a justiça em todo o tempo.


4 Lembra-te de mim[209], Senhor, pelo bem do teu povo,

vem visitar-me com a tua salvação,

5 para que eu veja a felicidade dos teus escolhidos,

para me alegrar com a alegria do teu povo
e me sentir feliz com a tua herança.


6 Nós pecámos, tal como os nossos pais,

cometemos crimes e maldades.

7 Os nossos pais, no Egito,

não compreenderam as tuas maravilhas;

não se lembraram da grandeza da tua misericórdia

e revoltaram-se junto ao mar, no Mar Vermelho.


8 Mas Ele salvou-os, para honra do seu nome

e para manifestar o seu poder.

9 Ameaçou o Mar Vermelho e ele secou

e fê-los caminhar nas profundezas como num deserto.

10 Salvou-os das mãos dos que os odiavam

e resgatou-os da mão do inimigo.

11 As águas cobriram os seus adversários;

de modo que nem um só deles sobreviveu.

12 Então acreditaram nas suas palavras

e cantaram o seu louvor.


13 Mas eles depressa esqueceram as suas obras

e não confiaram no seu projeto.

14 No deserto, deixaram-se vencer pelos seus apetites

e puseram Deus à prova, no descampado.

15 Deus concedeu-lhes o que pediam

e expulsou das suas almas o definhamento[210].


16 Porém, tiveram inveja de Moisés no acampamento;

e de Aarão, o consagrado do Senhor.

17 Abriu-se, então, a terra e engoliu Datan

e fechou-se sobre a seita de Abiram;

18 o fogo consumiu os seus partidários,

e as chamas devoraram os malvados.


19 Construíram um bezerro no monte Horeb

e prostraram-se diante de uma estátua.

20 Trocaram o seu Deus glorioso

pela imagem de um touro que remói erva.

21 Esqueceram a Deus, que os salvara,

realizando prodígios no Egito,

22 maravilhas no país de Cam,

coisas tremendas junto ao Mar Vermelho.

23 Deus declarou que os ia aniquilar,

se não fosse Moisés, o seu escolhido:

este colocou-se como barreira diante de Deus,

para impedir que a sua ira os destruísse.


24 Mostraram desprezo pela terra deliciosa[211],

não acreditaram na sua palavra.

25 Murmuraram nas suas tendas

e não escutaram a voz do Senhor.

26 Por isso, ergueu a sua mão contra eles,

jurando que os faria cair no deserto,

27 que faria cair os seus filhos entre os povos,

dispersando-os por entre as nações.


28 Depois, ligaram-se ao deus Baal de Peor[212]

e comeram de sacrifícios em honra dos mortos.

29 Provocaram-no com as suas iniquidades,

e a peste irrompeu no meio deles.

30 Fineias ergueu-se, para garantir o direito,

e então a peste acabou.

31 A sua ação foi-lhe reconhecida como justa,

por todas as gerações e para sempre.


32 Eles irritaram a Deus, junto das águas de Meribá,

e Moisés teve de sofrer por causa deles[213],

33 porque lhe amarguraram o espírito

e ele proferiu desatinos com seus lábios.


34 Não exterminaram os povos[214]

que o Senhor lhes tinha indicado.

35 Pelo contrário, misturaram-se com esses povos

e aprenderam os seus costumes.

36 Prestaram culto aos seus ídolos,

que foram para eles uma armadilha.

37 Ofereceram em sacrifício os seus filhos[215]

e as suas filhas aos demónios.

38 Derramaram o sangue inocente,

o sangue dos seus filhos e filhas,

que sacrificaram aos ídolos de Canaã;

e a terra ficou manchada com o sangue.


39 Deixaram-se contaminar com as suas obras[216]

e prostituíram-se[217] com os seus crimes.

40 Por isso, o Senhor se indignou com o seu povo

e sentiu desgosto pela sua herança.

41 Então entregou-os nas mãos dos povos,

e foram dominados por aqueles que os odiavam.

42 Os seus inimigos oprimiram-nos,

e foram submetidos ao seu poder.

43 Muitas vezes Ele os libertou,

mas eles mostraram-se rebeldes nas suas ideias
e cada vez mais se afundavam na sua maldade.


44 Contudo, Ele olhou para eles na aflição,

ao ouvir os seus lamentos.

45 Lembrou-se da sua aliança para com eles

e compadeceu-se deles, na sua imensa misericórdia.

46 Fez com que eles fossem tratados com benevolência

por parte dos seus conquistadores[218].


47 Salva-nos, ó Senhor, nosso Deus,

e volta a reunir-nos de entre os povos[219],

para darmos graças ao teu santo nome

e celebrarmos os teus louvores.


48 Bendito seja o Senhor, Deus de Israel,

desde sempre e para sempre.

E diga todo o povo: «Amen!»

Aleluia[220]!


107(106)Deus salva de todos os perigos


1 Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom[221],

porque é eterna a sua misericórdia.

2 Que o digam os resgatados pelo Senhor[222],

os que Ele resgatou da mão do inimigo,

3 aqueles que Ele reuniu de entre as nações,

do Oriente e do Ocidente, do Norte e do mar a sul[223].


4 Andavam errantes pelo deserto e descampado[224],

sem encontrar o caminho de uma cidade onde habitar[225].

5 Andavam esfomeados e sedentos;

e o seu ânimo já lhes desfalecia.


6 Mas, na sua angústia, clamaram ao Senhor,

e Ele livrou-os das suas aflições.

7 Encaminhou-os por um caminho direito,

para chegarem a uma cidade onde habitar.


8 Que eles deem graças ao Senhor, pela sua misericórdia

e pelas suas maravilhas em favor dos humanos.

9 Pois Ele matou a sede aos sequiosos

e aos que tinham fome encheu de bens.


10 Eles jaziam na escuridão e nas trevas[226],

prisioneiros da aflição e dos ferros,

11 por se terem revoltado contra as ordens de Deus

e desprezado os desígnios do Altíssimo.

12 Abateu-lhes o coração com dificuldades;

tropeçavam e ninguém os socorria.

13 Mas, na sua angústia, clamaram ao Senhor,

e Ele salvou-os das suas aflições.

14 Fê-los sair das trevas e da escuridão

e despedaçou as suas cadeias.


15 Que eles deem graças ao Senhor, pela sua misericórdia

e pelas suas maravilhas em favor dos humanos.

16 Ele despedaçou as portas de bronze

e quebrou as barras de ferro!


17 Enfraquecidos pelos seus caminhos de pecado[227]

e aflitos por causa das suas culpas,

18 qualquer alimento lhes causava náuseas

e já chegavam às portas da morte.


19 Mas, na sua angústia, clamaram ao Senhor,

e Ele salvou-os das suas aflições.:

20 Deus enviou a sua palavra para os curar

e para os livrar das suas chagas[228].


21 Que eles deem graças ao Senhor, pela sua misericórdia

e pelas suas maravilhas em favor dos humanos.

22 Ofereçam sacrifícios de ação de graças

e anunciem as suas obras com júbilo.


23 Os que vão para o mar com os seus navios[229],

fazendo negócio pela imensidão das águas,

24 esses viram as obras do Senhor

e as suas maravilhas no alto mar.


25 Ele falou e ergueu-se um vento de tempestade

que levantou as ondas do mar.

26 Os marinheiros subiam até aos céus e desciam às profundezas,

com a alma desfeita pela desgraça;

27 rodavam e cambaleavam como ébrios

e toda a sua perícia se tornava inútil.


28 Mas, na sua angústia, clamaram ao Senhor,

e Ele tirou-os das suas aflições.

29 Transformou a tempestade em leve brisa,

e acalmaram-se as ondas do mar.

30 Eles alegram-se quando as ondas ficam calmas,

e Ele guia-os para o seu porto desejado.


31 Que eles deem graças ao Senhor pela sua misericórdia

e pelas suas maravilhas em favor dos humanos.

32 Que o exaltem na assembleia do povo[230]

e o louvem no conselho dos anciãos.


33 Ele transformou os rios em deserto

e as fontes de água em terra árida;

34 transformou a terra fértil em chão salgado,

pela maldade dos que nela habitavam;

35 mudou o deserto em lago de água

e a terra árida em nascentes de água,

36 para fazer habitar ali os famintos,

e eles estabelecerem uma cidade para habitar.


37 Semearam campos e plantaram vinhas

e tiveram uma colheita abundante.

38 Abençoou-os e cresceram em grande número

e não deixou que os seus rebanhos ficassem reduzidos.


39 Ficaram reduzidos e abatidos,

por causa da opressão, da maldade e da angústia.

40 Porém, aquele que derrama desprezo sobre os poderosos

e os faz vaguear pelo vazio, sem caminhos,

41 Ele mesmo levanta o pobre da angústia[231]

e multiplica as famílias como um rebanho.


42 Os íntegros veem isto e alegram-se,

e toda a maldade fica de boca fechada.

43 Aquele que for sábio guardará estas coisas

e todos compreenderão as misericórdias do Senhor.


108(107)Hino e súplica


1 Cântico. Salmo. De David.


2 O meu coração está firme, ó Deus[232],

o meu coração está firme!
Quero cantar e salmodiar! Anima-te, minha alma[233].

3 Despertai, harpa e lira,

que eu quero despertar a aurora!

4 Hei de louvar-te entre os povos, Senhor,

hei de cantar-te salmos entre as nações;

5 pois a tua misericórdia é mais alta que os céus

e a tua fidelidade chega até às nuvens.

6 Ó Deus, ergue-te acima dos céus

e enche a terra inteira da tua glória!

7 Para que os teus amigos sejam libertados,

mostra a tua direita salvadora e responde-me[234].


8 Deus falou no seu santuário:

«Com alegria repartirei Siquém[235]
e medirei o vale de Sucot!

9 É minha a terra de Guilead e de Manassés;

Efraim é o capacete da minha cabeça e Judá, meu cetro real.

10 Moab é a bacia em que me lavo;

sobre Edom ponho a minha sandália
e cantarei vitória sobre os filisteus».


11 Quem me conduzirá à cidade fortificada?

Quem me guiará até Edom?

12 Quem senão Tu, ó Deus, que nos rejeitaste

e já não sais, ó Deus, com os nossos exércitos!

13 Concede-nos ajuda contra o inimigo,

porque é vã a salvação que vem do homem.

14 Com Deus, havemos de fazer proezas:

e Ele calcará aos pés os nossos inimigos.


109(108)Prece contra os inimigos

1 Ao diretor. De David. Salmo.


Ó Deus, não sejas surdo ao meu louvor[236]!

2 Pois contra mim abriram a boca,

a sua boca cheia de maldade e traição,
e falaram de mim com língua mentirosa.

3 Com palavras de ódio me cercaram

e me combatem sem razão.

4 Em paga do meu amor, acusam-me;

e eu, em oração.

5 Retribuem-me com o mal em paga do bem,

e com o ódio em paga do meu amor.


6 «Seja nomeado contra ele um malvado[237]

e que à sua direita esteja um acusador.

7 Quando for julgado, que ele saia condenado

e o seu pedido seja mais um crime.

8 Que os seus dias de vida sejam limitados

e que outro se apodere da sua função!

9 Que os seus filhos fiquem órfãos,

e a sua mulher fique viúva.

10 Que os seus filhos andem errantes a mendigar

e a procurar por entre as suas ruínas.

11 Que o credor lhe retire todos os seus haveres,

e os estranhos o despojem do fruto do seu suor.

12 Que ninguém tenha compaixão dele

nem se compadeça dos seus filhos órfãos.

13 Seja exterminada a sua descendência,

e o seu nome apagado na geração seguinte.

14 Que a culpa de seus pais seja recordada ao Senhor

e jamais se apague o pecado da sua mãe.

15 Que o Senhor os tenha sempre presentes

e extermine da terra a sua memória».


16 Visto que não se lembrou de agir com misericórdia,

mas perseguiu o pobre e o desvalido
e o de coração atribulado, para os matar.

17 Preferiu a maldição: que ela venha sobre ele!

Não procurou a bênção: que ela se afaste dele!

18 Que ele se vista de maldição como um manto;

que ela entre como água para o seu interior
e como óleo penetre nos seus ossos.


19 Seja como a roupa que o envolve,

como a cinta com que se aperta sempre.

20 É isto que o Senhor faz aos meus acusadores,

aos que dizem calúnias contra mim.:

21 Mas Tu, ó Senhor, trata bem de mim,

para honra do teu nome, Senhor.
Salva-me, pela tua bondade e misericórdia!

22 Pois estou pobre e desvalido

e dentro de mim tenho o coração angustiado.


23 Vou passando como sombra que se prolonga;

vejo-me enxotado como um gafanhoto.

24 Os meus joelhos vacilam de tanto jejuar

e o meu corpo definha de magreza.

25 Tornei-me para eles um objeto de escárnio;

olham para mim e abanam a cabeça.

26 Socorre-me, Senhor, meu Deus;

salva-me, pela tua misericórdia.

27 Que eles saibam que isto é da tua mão,

que Tu, Senhor, o fizeste.

28 Eles podem amaldiçoar, mas Tu abençoas.

Levantem-se os meus inimigos e sejam envergonhados
e que o teu servo se regozije.

29 Que os meus inimigos se cubram de vergonha;

que eles se cubram da sua confusão como de um manto.

30 Com a minha boca, darei muitas graças ao Senhor

e louvá-lo-ei no meio da multidão.

31 Pois Ele coloca-se à direita[238] do pobre,

para o salvar dos que o condenam à morte.


110(109)Promessa de Deus ao seu ungido


1 De David. Salmo.


Oráculo do Senhor para o meu senhor[239]:

«Senta-te à minha direita

que Eu farei dos teus inimigos um assento,

um estrado para os teus pés»[240].

2 De Sião, o Senhor estenderá o cetro do teu poder.

Domina os teus inimigos no combate!

3 A tua estirpe é de nobreza,

no dia do teu poder!

Entre esplendores de santidade,

das entranhas da madrugada
como orvalho te fiz nascer[241].

4 O Senhor jurou e não se arrepende:

«Tu és sacerdote para sempre,
segundo a ordem de Melquisedec»[242].

5 O Senhor está à tua direita;

Ele há de esmagar reis, no dia da sua ira.

6 Ele ditará a justiça entre as nações, amontoará cadáveres,

esmagará cabeças pela vastidão da terra.

7 No caminho, beberá da torrente;

e assim erguerá bem alto a cabeça[243].


111(110)Hino às obras de Deus


1 Aleluia!

Alef

Louvarei o Senhor de todo o coração[244],

Bet

no conselho dos justos e na assembleia[245].

Guimel

2 Grandes são as obras do Senhor,

Dalet

dignas de meditação para quem as ama.

He

3 As suas obras têm majestade e esplendor

Wau

e a sua justiça permanece para sempre.

Zain

4 Tornou memoráveis as suas maravilhas;

Het

o Senhor é compassivo e bondoso.

Tet

5 Dá sustento aos que o temem

Yod

e lembra-se da sua aliança para sempre.

Kaf

6 Mostrou ao seu povo o poder das suas obras[246],

Lamed

entregando-lhes a herança de outros povos.

Mem

7 As obras das suas mãos são verdade e justiça;

Nun

'são firmes todos os seus preceitos.

Samec

8 Foram estabelecidos para séculos e séculos

Ain

'e estão feitos de verdade e retidão.

Pe

9 Enviou a libertação ao seu povo,

Sadé

estabeleceu a sua aliança para sempre;

Qof

'santo e tremendo é o seu nome.


Resh

10 O princípio[247] da sabedoria é o temor do Senhor;

Sin

têm bom entendimento aqueles que os praticam[248].

Tau

O seu louvor permanece para sempre.


112(111)Elogio do homem honrado


1 Aleluia!

Alef

Feliz o homem que teme o Senhor[249]

Bet

e muito se compraz nos seus mandamentos.

Guimel

2 A sua descendência será poderosa sobre a terra,

Dalet

é bendita a geração dos que são honestos.

He

3 Na sua casa haverá abundância e riqueza

Wau

e a sua justiça durará para sempre.

Zain

4 Nas trevas, brilha uma luz para os honestos;

Het

'Ele é generoso, compassivo e justo.

Tet

5 É bom o homem que se compadece e empresta,

Yod

pois administra os seus bens com justiça.

Kaf

6 Esse jamais vacilará;

Lamed

o justo terá memória eterna.

Mem

7 De más notícias não terá medo;

Nun

:o seu coração está firme e confiante no Senhor.

Samec

8 O seu coração está seguro e nada teme

Ain

até ver o fim dos seus inimigos.

9 Reparte e dá aos necessitados,

Sadé

a sua justiça permanece para sempre

Qof

e a sua frente se erguerá em glória.

Resh

10 O malfeitor vê e fica furioso,

Sin

e rangendo os dentes, desfalece.

Tau

'O desejo dos malfeitores fracassará.

113(112)A misericórdia de Deus


1 Aleluia!

Louvai, ó servos do Senhor[250],

louvai o nome do Senhor.

2 Bendito seja o nome do Senhor,

desde agora e para sempre.

3 Desde o nascer do Sol até ao seu ocaso,

seja louvado o nome do Senhor.

4 O Senhor ergue-se acima de todos os povos,

acima dos céus está a sua glória.


5 Quem é como o Senhor, nosso Deus,

que está entronizado nas alturas?

6 Ele inclina-se para observar

o que acontece nos céus e na terra.

7 Ele levanta do pó o indigente

e ergue das cinzas o necessitado,

8 para o fazer sentar com os nobres,

com os nobres do seu povo.

9 Ele faz com que a estéril se sente em casa[251],

como mãe feliz de muitos filhos.
Aleluia!


114(113,1-8) Hino sobre a saída do Egito


1 Quando Israel saiu do Egito[252]

e a casa de Jacob, do meio de um povo estranho,

2 Judá tornou-se seu santuário[253]

e Israel, os seus domínios.


3 O mar[254] viu e afastou-se,

o Jordão[255] voltou para trás.

4 Os montes saltaram[256] como carneiros,

as colinas como cordeirinhos.

5 Que tens, ó mar, para assim fugires?

E tu, Jordão, porque voltas para trás?

6 Ó montes, porque saltais como carneiros

e vós, colinas, como cordeirinhos?


7 Em presença do Senhor, treme, ó terra[257],

em presença do Deus de Jacob.

8 Pois Ele transforma rochedos em lagos

e as pedras, em fontes de água[258].

115(113,9-26)Deus verdadeiro e único


1 Não a nós, ó Senhor, não a nós[259],

mas ao teu nome dá glória,
pela tua misericórdia e fidelidade.

2 Porque hão de perguntar os povos:

«Onde está o seu Deus?».

3 O nosso Deus está nos céus;

tudo o que lhe agrada, Ele o faz.

4 Os ídolos deles são prata e ouro,

obra das mãos dos homens:

5 têm boca, mas não falam;

têm olhos, mas não veem;

6 têm ouvidos, mas não ouvem;

têm nariz, mas não cheiram;

7 têm mãos, mas não tocam;

têm pés, mas não caminham;
e da sua garganta não emitem qualquer som.

8 Sejam como eles aqueles que os fazem

e todo aquele que neles confia.

9 Ó Israel, confia no Senhor,

pois Ele é para todos ajuda e proteção.

10 Vós, casa de Aarão[260], confiai no Senhor,

pois Ele é para todos ajuda e proteção.

11 Vós que temeis o Senhor, confiai no Senhor,

pois Ele é para todos ajuda e proteção[261].

12 O Senhor lembrou-se de nós e nos abençoará,

abençoará a casa de Israel,
abençoará a casa de Aarão,

13 abençoará os que temem o Senhor,

os pequenos junto com os grandes.

14 Que o Senhor vos acrescente prosperidade

a vós e aos vossos filhos.

15 Que sejais abençoados pelo Senhor,

que fez o céu e a terra!

16 Os céus, esses são para o Senhor,

mas a terra, deu-a aos seres humanos.

17 Não são os mortos que louvam o Senhor,

nem os que descem ao mundo do silêncio[262].

18 Nós é que louvaremos o Senhor,

desde agora e para sempre.
Aleluia!


116(114-115)Hino de ação de graças


1 Foi por amor de mim[263] que o Senhor escutou[264]

a minha voz, a minha súplica.

2 Pois Ele inclinou para mim o seu ouvido

nos dias em que o invocava.

3 Envolviam-me os laços da morte,

alcançaram-me as angústias do abismo;
encontrava-me aflito e angustiado.

4 Mas invoquei o nome do Senhor:

«Por favor, Senhor, salva a minha alma!».


5 O Senhor é benevolente e justo,

o nosso Deus é compassivo.

6 O Senhor guarda os simples;

eu estava sem forças e Ele veio salvar-me.

7 Volta, ó minha alma, ao teu repouso,

porque o Senhor foi generoso para contigo.

8 Pois tu, minha alma, foste libertada da morte[265],

os meus olhos, das lágrimas e os meus pés, da queda.

9 Hei de caminhar na presença do Senhor,

na terra dos vivos[266].


10 Eu acreditei, mesmo quando dizia:

«É muito grande a minha aflição!».

11 Na minha perturbação, dizia:

«Todos os homens são mentirosos!».

12 Como hei de retribuir ao Senhor

todos os seus benefícios para comigo?

13 Erguerei o cálice da salvação

e invocarei o nome do Senhor[267].


14 Pagarei as minhas promessas ao Senhor,

e que seja diante de todo o seu povo.


15 É preciosa aos olhos do Senhor[268]

a morte dos que lhe são fiéis.

16 Por favor, Senhor! Eu sou teu servo,

sou teu servo, filho da tua serva;
Tu abriste as minhas cadeias.

17 A ti oferecerei sacrifícios de louvor,

invocando o nome do Senhor.

18 Pagarei as minhas promessas ao Senhor,

e que seja diante de todo o seu povo,

19 nos átrios da casa do Senhor,

no meio de ti, Jerusalém!
Aleluia!


117(116)Louvor ao Senhor


1 Louvai ao Senhor, todos os povos[269],

glorificai-o, todas as nações!

2 Pois é poderosa[270] sobre nós a sua misericórdia,

e a fidelidade do Senhor é para sempre.
Aleluia!


118(117)Cântico triunfal de ação de graças


1 Louvai o Senhor, porque Ele é bom[271],

porque é eterna a sua misericórdia.

2 Que o diga a casa de Israel[272]:

«É eterna a sua misericórdia!».

3 Que o diga a casa de Aarão:

«É eterna a sua misericórdia!».

4 Que o digam os que temem o Senhor:

«É eterna a sua misericórdia!».


5 Do meio da angústia, clamei ao Senhor;

o Senhor respondeu, pondo-me a salvo.

6 O Senhor está comigo, nada temo.

Que mal me pode fazer o homem?

7 O Senhor está comigo para minha ajuda,

e eu hei de ver o fim dos meus inimigos.

8 É melhor refugiar-se no Senhor

do que confiar no homem.

9 É melhor refugiar-se no Senhor

do que confiar nos grandes.


10 Todos os povos me cercavam,

mas, em nome do Senhor, eu os enfrentei.

11 Voltaram de novo a cercar-me,

mas, em nome do Senhor, eu os enfrentei.

12 Cercavam-me como enxames de vespas;

a sua fúria crepitava como fogo entre os espinhos,
mas, em nome do Senhor, eu os enfrentei.

13 Empurraram-me[273] com violência para cair,

mas o Senhor socorreu-me.

14 O Senhor é a minha força e o meu cântico de júbilo;

foi Ele a minha salvação.


15 Há vozes de alegria e de vitória

nas tendas dos justos[274]:
«A direita do Senhor fez prodígios!

16 A direita do Senhor foi excelsa,

a direita do Senhor fez prodígios!».


17 Eu não hei de morrer. Vou viver

e vou contar as obras do Senhor.

18 O Senhor castigou-me com dureza,

mas não me entregou à morte.


19 Abri-me as portas da justiça[275];

quero entrar por elas e darei graças ao Senhor.

20 Esta é a porta que leva ao Senhor;

os justos entrarão por ela.

21 Eu te louvo, porque me respondeste

e foste para mim a salvação.

22 A pedra que os construtores rejeitaram

tornou-se a pedra angular[276].

23 Isto aconteceu da parte do Senhor;

é maravilhoso aos nossos olhos.

24 Este é o dia em que o Senhor atuou[277],

cantemos e alegremo-nos nele.

25 Por favor, Senhor, faz com que sejamos salvos[278]!

Senhor, faz com que prosperemos, por favor!


26 Bendito seja aquele que vem em nome do Senhor[279]!

Da casa do Senhor, nós vos abençoamos.

27 O Senhor é Deus; Ele nos ilumina.

Entrançai ramagens de festa[280],
até aos ângulos do altar!


28 Tu és o meu Deus e eu te dou graças.

Tu és o meu Deus e te exaltarei.

29 Louvai o Senhor, porque Ele é bom,

porque é eterna a sua misericórdia.


119(118)Grandeza e mistério da lei de Deus


Alef

1 Felizes os que seguem um caminho íntegro[281],

que caminham segundo a lei do Senhor.

2 Felizes os que cumprem os seus preceitos

e o procuram de todo o coração,

3 que não praticam a maldade,

mas andam nos caminhos do Senhor.

4 Tu estabeleceste os teus preceitos,

para serem cumpridos fielmente.

5 Oxalá os meus passos sejam firmes,

para cumprir os teus decretos.

6 Então não terei de me envergonhar, prestando atenção

a todos os teus mandamentos.

7 Poderei louvar-te de coração sincero,

instruído pelas tuas justas sentenças.

8 Hei de cumprir as tuas leis;

não me abandones jamais.


Bet

9 Como poderá um jovem manter íntegro o seu caminho?

Guardando as tuas palavras.

10 Eu procuro-te com todo o meu coração;

não me deixes desviar dos teus mandamentos.

11 Guardo no meu coração as tuas palavras,

para não pecar contra ti.

12 Bendito sejas, Senhor!

Ensina-me as tuas leis.

13 Com os meus lábios tenho anunciado

todos os decretos da tua boca.

14 Tenho mais alegria em seguir as tuas ordens

do que com todas as riquezas.

15 Meditarei nos teus preceitos

e prestarei atenção aos teus caminhos.

16 Nas tuas leis estão as minhas delícias;

não esquecerei as tuas palavras.


Guimel

17 Concede um favor ao teu servo:

que eu viva e guarde a tua palavra!

18 Abre os meus olhos para que eu veja

as maravilhas da tua lei.

19 Eu sou um peregrino nesta terra[282],

não escondas de mim os teus mandamentos.

20 Desfalece a minha alma,

no desejo das tuas sentenças, a toda a hora.

21 Tu repreendes os orgulhosos[283];

malditos são os que transgridem os teus mandamentos.

22 Afasta de mim insultos e desprezos,

porque tenho observado os teus ensinamentos.

23 Ainda que os grandes se sentem a conspirar contra mim,

o teu servo meditará nos teus decretos.

24 Sim. Os teus preceitos são as minhas delícias;

são eles os membros do meu conselho.


Dalet

25 A minha alma está colada ao pó[284];

restitui-me a vida segundo a tua palavra.

26 Contei-te os meus caminhos e Tu respondeste-me;

ensina-me as tuas leis.

27 Faz-me compreender o caminho dos teus preceitos,

para meditar nas tuas maravilhas.

28 A minha alma chora de tristeza;

reconforta-me segundo a tua palavra.

29 Afasta de mim os caminhos da mentira

e concede-me a graça da tua lei.

30 Escolhi o caminho da fidelidade

e dei preferência às tuas sentenças.

31 Apeguei-me aos teus ensinamentos, Senhor,

não deixes que fique envergonhado.

32 Quero correr pelo caminho dos teus mandamentos,

porque dás largueza ao meu coração.


He

33 Ensina-me, Senhor, o caminho das tuas leis,

que eu quero guardá-las como recompensa[285].

34 Dá-me entendimento para eu cumprir a tua lei;

hei de obedecer-lhe de todo o coração.

35 Faz-me caminhar pela senda dos teus mandamentos,

porque neles sinto satisfação.

36 Inclina o meu coração para os teus ensinamentos,

e não para a cobiça.

37 Desvia os meus olhos daquilo que é falso[286];

faz com que eu viva nos teus caminhos.

38 Confirma ao teu servo a tua promessa,

destinada àqueles que te temem.

39 Afasta de mim a afronta que eu temo,

pois são agradáveis as tuas sentenças.

40 Vê como tenho desejado os teus preceitos;

faz-me viver segundo a tua justiça.


Vau

41 Venha sobre mim, Senhor, a tua misericórdia,

venha a tua salvação, conforme a tua promessa.

42 Darei, então, resposta àqueles que me insultam,

porque confio na tua palavra.

43 Não retires jamais da minha boca a palavra da verdade,

porque pus a minha esperança nas tuas sentenças.

44 Guardarei continuamente a tua lei

para todo o sempre.

45 Andarei por caminhos espaçosos,

pois procurei as tuas instruções[287].

46 Diante de reis, falarei dos teus preceitos

e não me envergonharei.

47 Ponho as minhas delícias nos teus mandamentos,

que eu muito amo.

48 Eu hei de levantar as minhas mãos

pelos teus mandamentos que eu amo
e meditarei nas tuas leis.


Zain

49 Lembra-te da palavra dada ao teu servo,

da qual fizeste a minha esperança.

50 A minha consolação na minha angústia

é que a tua palavra me dê vida.

51 Os orgulhosos zombaram muito de mim,

mas não me desviei da tua lei.

52 Recordo-me dos teus decretos de outrora;

neles encontro a consolação, ó Senhor.

53 Domina-me a indignação contra os malfeitores,

que rejeitam a tua lei.

54 Os teus decretos são os meus cânticos

na casa do meu peregrinar.

55 De noite, lembro-me do teu nome, Senhor,

e guardo vigília com a tua lei[288].

56 Uma coisa contou sempre para mim:

o guardar os teus preceitos.


Het

57 Eu disse: a minha herança é o Senhor,

é pôr em prática as tuas palavras.

58 De todo o coração eu te imploro:

tem piedade de mim, segundo a tua promessa.

59 Refleti sobre os meus caminhos

e volto a dirigir os meus passos pelos teus preceitos.

60 Apressei-me e não me deixei esmorecer

em cumprir os teus mandamentos.

61 Cercaram-me as redes dos malfeitores,

mas não me esqueci da tua lei.

62 A meio da noite levanto-me para te louvar,

por causa das tuas sentenças de justiça.


63 Sou amigo de todos os que te temem

e dos que cumprem as tuas ordens.

64 Ó Senhor, a terra está cheia da tua bondade;

ensina-me as tuas leis.


Tet

65 Trataste com bondade o teu servo,

segundo a tua palavra, Senhor.

66 Ensina-me o bom senso e o conhecimento,

pois confio nos teus mandamentos.

67 Antes de ter sido humilhado, eu era transgressor;

mas agora cumpro a tua palavra.

68 Tu és bom e fazes o bem,

ensina-me as tuas leis.

69 Os soberbos forjam mentiras contra mim,

mas eu cumpro as tuas instruções de todo o coração.

70 O seu coração ficou pesado[289] e insensível;

quanto a mim, na tua lei estão as minhas delícias.

71 Foi bom para mim ter sido afligido,

pois assim aprendi as tuas leis.

72 É melhor para mim a lei da tua boca

do que milhões em ouro e prata.


Yod

73 As tuas mãos me criaram e formaram;

dá-me inteligência para aprender os teus mandamentos.

74 Ao verem-me, hão de alegrar-se os que te temem,

porque pus a minha esperança na tua palavra.

75 Senhor, eu sei que as tuas sentenças são justas

e é com verdade que me humilhas.


76 Peço que a tua misericórdia me sirva de conforto,

como prometeste ao teu servo.

77 Que a tua compaixão venha sobre mim e viverei,

porque na tua lei estão as minhas delícias.

78 Sejam confundidos os soberbos

que com falsidades me desorientam,
enquanto eu medito nos teus preceitos.

79 Voltem para mim os que te temem

e que conhecem os teus preceitos.

80 Que o meu coração seja perfeito nas tuas leis,

e deste modo não ficarei envergonhado.


Caf

81 A minha alma consome-se à espera da tua salvação:

confio na tua palavra.

82 Consomem-se os meus olhos pela tua promessa,

perguntando quando virás reconfortar-me.

83 Estou como quem chora por causa do fumo[290],

mas não me esqueci dos teus preceitos.

84 Quantos dias de vida terá o teu servo?

Quando farás justiça contra os que me perseguem?

85 Os orgulhosos abriram covas para mim;

isso não condiz com a tua lei.

86 Todos os teus mandamentos são verdade;

perseguem-me sem razão. Ajuda-me!

87 Por pouco não me eliminaram da terra,

mas eu nunca abandonei os teus preceitos.

88 Dá-me a vida pela tua misericórdia

e cumprirei as ordens da tua boca.


Lamed

89 Senhor, a tua palavra permanece para sempre,

mais estável do que os céus.

90 De geração em geração dura a tua fidelidade;

estabeleceste a terra e ela continua firme.

91 Os teus decretos ainda hoje se mantêm,

porque todos eles são obra tua[291].

92 Se eu não tivesse na tua lei as minhas delícias,

já teria sucumbido na minha aflição.

93 Jamais esquecerei os teus preceitos,

pois é por eles que me dás a vida.

94 Eu sou teu: salva-me,

pois sempre tenho procurado os teus preceitos!

95 Os malfeitores esperam pela minha perdição,

mas eu presto atenção às tuas ordens.

96 Para toda a perfeição eu vi limites;

mas a largueza dos teus mandamentos é grande.


Mem

97 Quanto amo, Senhor, a tua lei!

Nela medito durante todo o dia.

98 O teu mandamento faz-me mais sábio que os meus inimigos,

porque está sempre comigo.

99 Tornei-me mais instruído que todos os meus mestres,

porque os teus preceitos são a minha meditação.

100 Tenho mais entendimento que os anciãos,

porque tenho cumprido as tuas instruções.

101 Desviei os meus pés de todo o mau caminho,

para obedecer à tua palavra.

102 Não me tenho desviado das tuas sentenças,

pois foste Tu que me instruíste.


103 Como é doce para o meu paladar a tua palavra!

Mais doce do que o mel para a minha boca.

104 Dos teus preceitos recebi entendimento;

por isso detesto qualquer caminho de mentira.


Nun

105 A tua palavra é lanterna para os meus passos

e luz para os meus caminhos.

106 Eu jurei e vou mesmo cumprir;

vou observar os teus justos decretos.

107 Sinto-me profundamente angustiado,

dá-me a vida, Senhor, segundo a tua palavra.

108 Aceita, Senhor, os louvores[292] da minha boca

e ensina-me os teus decretos.

109 A minha alma está nas mãos do eterno[293],

e não esqueço a tua lei.

110 Os malfeitores armaram-me uma cilada,

mas nunca me afastei dos teus preceitos.

111 As tuas ordens são minha herança para sempre,

pois são elas a alegria do meu coração.

112 Orientei o meu coração para cumprir as tuas leis:

esta é a recompensa para sempre[294].


Samec

113 Detesto espíritos fingidos

e amo a tua lei.


114 Tu és o meu refúgio, meu escudo protetor;

na tua palavra pus a minha confiança.

115 Afastai-vos de mim, perversos,

pois quero cumprir os mandamentos do meu Deus.

116 Ampara-me, segundo a tua promessa, e viverei;

e não me deixes envergonhado por causa da minha esperança.

117 Ajuda-me e assim serei salvo;

e estarei sempre atento aos teus decretos.

118 Tu repudias todos os que se desviam das tuas leis,

porque os seus projetos são de mentira.

119 Consideras como lixo todos os malvados da terra;

por isso, eu amo os teus preceitos.

120 O meu corpo estremece com medo de ti

e as tuas sentenças infundem-me temor.


Ain

121 Tenho praticado o direito e a justiça;

não me entregues aos meus opressores.

122 Sê fiador do teu servo para o bem;

que não me oprimam os orgulhosos.

123 Os meus olhos consumiram-se, à espera da tua ajuda

e da justiça que prometeste.

124 Trata o teu servo conforme a tua misericórdia

e ensina-me as tuas leis.

125 Eu sou teu servo, dá-me entendimento,

para que eu conheça os teus preceitos.

126 Já é tempo de agires, Senhor;

eles desprezaram a tua lei.

127 É por isso que eu amo os teus mandamentos

muito mais que o ouro, o ouro fino.

128 Por isso, eu segui a direito todos os teus preceitos

e detesto os caminhos da mentira.


129 Os teus preceitos são admiráveis;

por isso a minha alma os tem cumprido.

130 A explicação das tuas palavras ilumina,

dá inteligência aos simples.

131 Abro com avidez a minha boca,

porque tenho fome dos teus mandamentos.

132 Volta-te para mim e trata-me com bondade,

como é tua norma com os que amam o teu nome.

133 Dá firmeza aos meus passos, segundo a tua promessa;

não permitas que me domine qualquer maldade.

134 Livra-me dos que oprimem os humanos

e guardarei os teus preceitos.

135 Que o teu rosto se ilumine para o teu servo;

e ensina-me as tuas leis.

136 Dos meus olhos descem rios de água,

porque a tua lei não está a ser cumprida.


Sadé

137 Tu és justo, ó Senhor,

e as tuas sentenças são retas.

138 Estabeleceste os teus preceitos com justiça

e com inteira fidelidade.

139 O meu zelo me consome,

porque os meus inimigos desprezam as tuas palavras.

140 A tua promessa foi comprovada;

por isso o teu servo lhe tem amor.

141 Eu sou ainda jovem e pouco estimado,

mas não me esqueço dos teus preceitos.

142 A tua justiça é justiça para sempre

e a tua lei é a verdade.

143 A aflição e a angústia atingiram-me,

mas as minhas delícias estão nos teus mandamentos.


144 A justiça das tuas ordens é para sempre;

ajuda-me a compreendê-las e viverei.


Qof

145 Eu clamo por ti, Senhor, com todo o coração;

responde-me, pois quero cumprir os teus decretos.

146 Clamo por ti, salva-me,

e cumprirei os teus preceitos.

147 De manhã cedo vou implorar o teu auxílio,

porque tenho confiança na tua palavra.

148 Os meus olhos antecipam as vigílias da noite,

para meditar na tua promessa.

149 Ouve a minha voz, Senhor, pela tua misericórdia,

dá-me vida, conforme a tua sentença.

150 Aproximam-se os que correm atrás da iniquidade

e se afastam da tua lei.

151 Tu estás próximo, Senhor,

e todos os teus mandamentos são verdade.

152 Desde muito cedo conheço os teus preceitos;

pois Tu os estabeleceste para sempre.


Resh

153 Vê a minha aflição e livra-me,

pois não esqueci a tua lei.

154 Defende a minha causa e resgata-me;

dá-me vida, segundo a tua promessa.

155 A salvação está longe dos malfeitores,

porque não procuram os teus decretos.

156 Grande é a tua compaixão, Senhor,

dá-me vida, conforme a tua sentença.

157 Muitos são os inimigos que me perseguem,

mas eu não me desvio dos teus preceitos.

158 Vi os traidores e fiquei desgostoso,

porque não guardaram a tua palavra.

159 Vê como eu amo os teus decretos:

Senhor, dá-me vida pela tua misericórdia.

160 A verdade é o princípio da tua palavra;

são eternos os decretos da tua justiça.


Sin

161 Os poderosos perseguem-me sem razão,

mas o meu coração só teme a tua palavra.

162 Sinto-me tão feliz com a tua promessa,

como quem encontrou grandes despojos.

163 Detesto e abomino a mentira,

mas tenho muito amor à tua lei.

164 Sete vezes por dia eu te louvo[295]

pelos teus decretos de justiça.

165 Grande paz espera os que amam a tua lei;

não há nada onde possam tropeçar.

166 Aguardo a tua salvação, Senhor,

e cumpro os teus mandamentos.

167 A minha alma observa os teus preceitos,

e amo-os profundamente.

168 Observo os teus preceitos e as tuas leis,

pois todos os meus caminhos estão diante de ti.


Tau

169 Senhor, que o meu clamor se aproxime da tua presença,

dá-me entendimento, conforme a tua palavra.

170 Que a minha súplica chegue à tua presença;

livra-me, conforme a tua promessa.

171 Dos meus lábios brota o louvor,

pois tu me ensinas os teus preceitos.

172 Que a minha língua responda à tua palavra,

porque todos os teus mandamentos são de justiça.

173 Esteja a tua mão pronta para me ajudar,

pois eu escolhi os teus preceitos.

174 Anseio pela tua salvação, Senhor!

Na tua lei estão as minhas delícias.

175 Que a minha alma tenha vida e possa louvar-te,

e que os teus decretos me ajudem.

176 Andei errante, como ovelha perdida[296];

vem procurar o teu servo,
pois não me esqueci dos teus mandamentos.


120(119)Súplica contra os maldizentes


1 Cântico das peregrinações


Na minha angústia, clamei ao Senhor[297],

e Ele me respondeu.

2 Livra a minha alma, Senhor,

dos lábios de mentira e das línguas de traição.

3 Que é que Deus te há de dar em paga

e que te há de acrescentar[298], ó língua traiçoeira?

4 São setas agudas de guerreiro

com carvões acesos de giesta!


5 Ai de mim, que vivo como estrangeiro em Méchec,

acampado junto às tendas de Quedar[299]!

6 Há muito que a minha alma vive

entre gente que odeia a paz.

7 Por mim é a paz e assim o proclamo;

mas por eles é apenas a guerra.


121(120) Deus, auxílio e proteção


1 Cântico das peregrinações.


Levanto os meus olhos[300] para as montanhas[301]:

de onde me pode vir o auxílio?

2 O meu auxílio vem do Senhor,

que fez o céu e a terra.


3 Ele não vai permitir que o teu pé tropece;

aquele que te guarda não se deixa adormecer.

4 Pois não vai dormir nem dormitar

aquele que é guarda de Israel.

5 O Senhor é quem te guarda,

o Senhor é tua sombra protetora:
está presente ao teu lado direito.

6 Durante o dia, o Sol não te fará mal,

nem a Lua, durante a noite[302].

7 O Senhor guarda-te de todo o mal;

é Ele que guarda a tua alma.

8 O Senhor guarda as tuas saídas e as tuas entradas[303],

desde agora e para sempre.


122(121)Em louvor de Jerusalém


1 Cântico das peregrinações. De David.


Exultei com quantos[304] me diziam[305]:

«Vamos para a casa do Senhor!».

2 Os nossos passos paravam finalmente

às tuas portas, Jerusalém!:

3 Jerusalém, construída como uma cidade,

toda ela bem articulada[306].


4 Para lá sobem as tribos, as tribos do Senhor,

como é de norma em Israel,
para louvar o nome do Senhor[307].

5 Ali foram instalados os tribunais da justiça[308],

os tribunais da casa de David.


6 Desejai paz a Jerusalém[309]:

«Estejam em segurança os que te amam.

7 Haja paz dentro das tuas muralhas,

segurança nos teus palácios».

8 Por bem dos meus irmãos e dos meus amigos,

proclamo que haja paz dentro de ti.

9 Por bem da casa do Senhor, nosso Deus,

peço para ti o bem-estar.


123(122)Oração de confiança em Deus


1 Cântico das peregrinações.


Para ti levanto os meus olhos[310],

para ti, que estás entronizado nos céus.

2 Como os olhos dos servos nas mãos dos seus senhores,

como os olhos da serva nas mãos da sua senhora,

assim os nossos olhos estão postos no Senhor[311], nosso Deus,

até que tenha piedade de nós.

3 Tem piedade de nós, Senhor, tem piedade de nós,

porque estamos saturados de desprezo.

4 Saturada está também a nossa alma,

com o escárnio dos arrogantes e o desprezo dos orgulhosos.


124(123)Libertação de Israel


1 Cântico das peregrinações. De David.


Se não fosse o Senhor, que estava por nós[312],

que o diga agora Israel[313];

2 se não fosse o Senhor, que estava por nós,

quando os homens se levantaram contra nós,

3 ter-nos-iam, então, engolido vivos[314],

quando a sua fúria ardia contra nós.

4 Então as águas ter-nos-iam submergido[315],

a torrente teria passado sobre nós.

5 Então, sim, teriam passado sobre nós

as águas turbulentas!


6 Bendito seja o Senhor,

que não nos entregou
como presa para os seus dentes!

7 A nossa alma foi resgatada,

como um pássaro do laço dos caçadores;
o laço foi quebrado e nós fomos libertados.

8 O nosso auxílio está no nome do Senhor,

que fez os céus e a terra.


125(124)Confiança em tempo de opressão


1 Cântico das peregrinações.


Aqueles que confiam no Senhor são como o monte Sião[316]

que não vacila e está firme para sempre.

2 Jerusalém tem as montanhas à sua volta;

assim o Senhor se mantém à volta do seu povo,
desde agora e para sempre.

3 O cetro do malfeitor não pesará sobre o lote dos justos,

para que os justos não estendam as mãos para a maldade.


4 Sê bondoso, Senhor, para com os que são bons

e para os que são retos em seus corações.

5 Mas aos que se desviam por seus atalhos tortuosos,

que o Senhor os expulse com os que praticam o mal[317].
Haja paz em Israel.


126(125)Cântico de restauração


1 Cântico das peregrinações.


Quando o Senhor restabeleceu o destino de Sião[318],

estávamos como que a sonhar.

2 A nossa boca encheu-se de sorrisos,

e a nossa língua de canções de júbilo.

Até se dizia entre os povos:

«O Senhor fez por eles grandes coisas!».

3 Sim. O Senhor fez por nós grandes coisas;

por isso exultamos de alegria.

4 Restabelece, Senhor, o nosso destino[319]

como as torrentes no deserto do Négueb[320].

5 Aqueles que semeavam entre lágrimas[321]

hão de recolher com alegria.

6 Ao ir, ele vai caminhando a chorar,

carregando e lançando a semente;

ao regressar, vem com canções de júbilo,

carregando os seus feixes de espigas.


127(126)A Providência divina


1 Cântico das peregrinações. De Salomão.


Se o Senhor não edificar a casa[322],

em vão se esforçam os construtores.

Se o Senhor não guardar a cidade,

em vão vigiam os guardas.

2 De nada vos serve levantar mais cedo e deitar mais tarde,

para comerem o pão das canseiras,
pois Ele o dá ao seu amigo, enquanto dorme[323].

3 Olhai! os filhos são herança do Senhor[324];

o fruto das entranhas é recompensa.

4 Como flechas na mão de um guerreiro,

assim são os filhos da juventude.

5 Feliz o homem que deles encheu a sua aljava!

Esses não se envergonharão,

quando tiverem que discutir em tribunal

com os seus adversários, à porta da cidade[325].


128(127)Bênçãos da família


1 Cântico das peregrinações.


Feliz todo aquele que teme o Senhor[326]

e anda pelos seus caminhos.


2 Comerás do trabalho das tuas mãos.

Feliz e afortunado és tu!

3 A tua esposa será como videira produtiva

na intimidade do teu lar.

Os teus filhos serão como rebentos de oliveira

ao redor da tua mesa.

4 É assim que há de ser abençoado

o homem que teme o Senhor.

5 Que o Senhor te abençoe de Sião,

e possas ver a prosperidade de Jerusalém,
todos os dias da tua vida.

6 Possas tu ver os filhos dos teus filhos!

Haja paz em Israel!


129(128)O libertador de Israel


1 Cântico das peregrinações.


Muito me atacaram desde a minha juventude[327].

Que o diga Israel agora[328].

2 Muito me atacaram desde a minha juventude[329],

mas não conseguiram vencer-me.:

3 Sobre as minhas costas lavraram os lavradores

e prolongaram os seus sulcos[330].

4 Mas o Senhor, que é justo, libertou-me

das cadeias dos malfeitores.

5 Sejam humilhados e obrigados a retroceder

todos os que odeiam Sião.

6 Sejam como a erva dos telhados,

que, antes de ser arrancada, já está seca[331],

7 de modo que não dá uma mão cheia para o ceifeiro,

nem um braçado para quem ata os feixes.

8 Nem poderão dizer os que passam pelo caminho[332]:

«Que a bênção do Senhor desça sobre vós;
nós vos abençoamos em nome do Senhor».


130(129)Cântico de esperança


1 Cântico das peregrinações.


Do fundo do abismo[333] clamo a ti, Senhor[334].

2     Senhor, ouve a minha voz!

Estejam os teus ouvidos atentos

à voz da minha súplica.

3 Se Tu, Senhor, tiveres em conta os pecados,

ó Senhor, quem poderá resistir?

4 Pois junto de ti está o perdão;

por isso é que infundes temor[335].

5 Eu espero no Senhor. Sim, a minha alma espera!

E confio na sua palavra!

6 A minha alma volta-se para o Senhor,

mais do que as sentinelas para a manhã[336].

Mais do que as sentinelas esperam pela manhã,

7    que Israel ponha a esperança no Senhor.

Pois é junto do Senhor que há misericórdia

e com Ele é abundante a redenção.:8 É Ele que há de redimir Israel
de todos os seus pecados.


131(130)Oração de humilde confiança


1 Cântico das peregrinações. De David.


Senhor, o meu coração não é orgulhoso[337]

nem os meus olhos são altivos.

Não corro atrás de grandezas

ou coisas demasiado grandiosas para mim.

2 Pelo contrário! Estou sossegado e de alma tranquila.

Como criança saciada ao colo da mãe
está a minha alma saciada no meu colo[338].

3 Que Israel espere no Senhor,

desde agora e para sempre.

132(131)Promessas de Deus a David


1 Cântico das peregrinações.


Senhor, lembra-te de David[339]

e de todos os seus trabalhos.

2 Ele fez um juramento ao Senhor,

um voto ao Poderoso de Jacob[340]:

3 «Não entrarei no abrigo da minha casa,

nem subirei para o meu leito de repouso;

4 não concederei sono aos meus olhos

nem descanso às minhas pálpebras,

5 enquanto não encontrar um lugar para o Senhor,

uma digna morada[341] para o Poderoso de Jacob».


6 Ouvíamos dizer que a arca[342] estava em Efrata[343],

encontrámo-la nos campos de Jaar.

7 Entremos na sua morada!

Prostremo-nos junto ao estrado dos seus pés!


8 Levanta-te e vem, Senhor, para o teu lugar de repouso,

Tu e a arca do teu poder!

9 Que os teus sacerdotes se revistam de justiça,

e os teus fiéis exultem de alegria.

10 Por amor de David, teu servo,

não deixes de acolher o teu ungido[344].


11 O Senhor fez um juramento a David[345],

promessa firme, da qual não volta atrás:

«Será um dos teus descendentes

que Eu hei de colocar no trono por ti.

12 Se os teus filhos guardarem a minha aliança

e os preceitos que Eu lhes ensino,

também os filhos deles, para sempre,

hão de sentar-se no trono por ti».


13 Pois o Senhor escolheu Sião

e desejou que fosse ali a sua morada:

14 «Este será para sempre o meu lugar de repouso,

aqui hei de habitar, porque assim o desejei.

15 Abençoarei, sim, abençoarei as suas provisões,

saciarei de pão os seus pobres.

16 Revestirei de esplendor[346] os seus sacerdotes,

e os seus fiéis hão de exultar de alegria.

17 Ali farei germinar o poder de David[347],

pois preparei uma lâmpada[348] para o meu ungido.

18 Aos seus inimigos cobrirei de vergonha,

mas sobre ele florirá o seu diadema[349]».


133(132)A união fraterna


1 Cântico das peregrinações. De David.


Eis como é bom e agradável[350]

viverem os irmãos bem unidos!

2 É como óleo perfumado sobre a cabeça,

que desce pela barba, a barba de Aarão,
que desce pela gola das suas vestes.

3 É como orvalho do monte Hermon,

que desce pelas colinas de Sião.

É ali que o Senhor estabelece a sua bênção,

a vida para a eternidade.


134(133)Convite ao louvor de Deus


1 Cântico das peregrinações.


Vinde! Bendizei o Senhor[351],

todos vós, os servos do Senhor

que permaneceis na casa do Senhor,

durante as vigílias da noite.

2 Erguei as vossas mãos para o santuário

e bendizei o Senhor!

3 Que o Senhor te abençoe de Sião,

Ele que fez os céus e a terra.


135(134)As maravilhas de Deus


1 Aleluia!

Louvai o nome do Senhor[352];

louvai-o, ó servos do Senhor,

2 vós que permaneceis no templo do Senhor,

nos átrios da casa do nosso Deus.

3 Louvai o Senhor, porque o Senhor é bom;

cantai ao seu nome, porque é agradável.

4 Pois o Senhor escolheu para si Jacob,

escolheu Israel como sua propriedade.


5 Sim, eu sei que o Senhor é grande,

o nosso Senhor é mais que todos os deuses.

6 Tudo aquilo que o Senhor quer, Ele o faz,

nos céus e na terra, nos mares e em todos os abismos.

7 Dos confins da terra, faz subir as nuvens;

com os relâmpagos produz a chuva
e dos seus reservatórios faz sair o vento.

8 Foi Ele que atingiu os primogénitos do Egito[353],

tanto dos homens como dos animais.

9 Enviou sinais e prodígios para dentro de ti, ó Egito,

contra o faraó e todos os seus servos.

10 Foi Ele que atingiu grandes nações

e matou reis poderosos:

11 Seon, rei dos amorreus, e Og, rei de Basan,

e todos os reinos de Canaã.

12 E entregou a terra deles como herança,

como herança a Israel, seu povo.


13 Ó Senhor, o teu nome é para sempre,

a tua memória, Senhor, de geração em geração.


14 Pois o Senhor defende a causa do seu povo[354]

e deixa-se compadecer em favor dos seus servos.

15 Os ídolos dos povos são apenas prata e ouro[355],

são obra das mãos do homem.

16 Têm boca, mas não falam;

têm olhos, mas não veem;

17 têm ouvidos, mas não ouvem;

nem sequer há sopro na sua boca.

18 Sejam iguais a eles aqueles que os fazem

e todo aquele que neles confia.


19 Casa de Israel, bendizei o Senhor[356]!

Casa de Aarão, bendizei o Senhor!

20 Casa de Levi, bendizei o Senhor!

Vós que temeis o Senhor, bendizei o Senhor!

21 Bendito seja o Senhor, de Sião,

Ele que habita em Jerusalém!
Aleluia[357]!


136(135) Hino de ação de graças

1 Dai graças ao Senhor, porque Ele é bom[358],

porque é eterna a sua misericórdia!

2 Dai graças ao Deus dos deuses,

porque é eterna a sua misericórdia!

3 Dai graças ao Senhor dos senhores,

porque é eterna a sua misericórdia!

4 Pois só Ele faz grandes maravilhas,

porque é eterna a sua misericórdia!

5 Ele fez os céus com sabedoria,

porque é eterna a sua misericórdia!

6 Estendeu a terra sobre as águas,

porque é eterna a sua misericórdia!

7 Fez os grandes luzeiros,

porque é eterna a sua misericórdia!

8 Fez o Sol para governar o dia,

porque é eterna a sua misericórdia!

9 Fez a Lua e as estrelas para governar a noite,

porque é eterna a sua misericórdia!

10 Ele atingiu o Egito nos seus primogénitos[359],

porque é eterna a sua misericórdia!

11 Fez sair Israel do meio dos egípcios,

porque é eterna a sua misericórdia!

12 Atuou com mão forte e braço estendido,

porque é eterna a sua misericórdia!

13 Dividiu o Mar Vermelho em duas partes,

porque é eterna a sua misericórdia!

14 Fez passar Israel pelo meio do mar,

porque é eterna a sua misericórdia!

15 E precipitou o faraó e o seu exército no Mar Vermelho,

porque é eterna a sua misericórdia!

16 Fez caminhar o seu povo pelo deserto,

porque é eterna a sua misericórdia!


17 Ele atingiu grandes reis[360],

porque é eterna a sua misericórdia!

18 E deu morte a reis poderosos,

porque é eterna a sua misericórdia!

19 Seon, rei dos amorreus,

porque é eterna a sua misericórdia!

20 E Og, rei de Basan,

porque é eterna a sua misericórdia!

21 E deu a terra deles como herança,

porque é eterna a sua misericórdia!

22 Como herança a Israel, seu servo,

porque é eterna a sua misericórdia!

23 Pois lembrou-se de nós, na nossa pequenez[361],

porque é eterna a sua misericórdia!

24 E livrou-nos dos nossos inimigos,

porque é eterna a sua misericórdia!

25 Ele dá alimento a todos os seres vivos,

porque é eterna a sua misericórdia!

26 Dai graças ao Deus dos céus[362],

porque é eterna a sua misericórdia!

137(136)Junto aos rios da Babilónia


1 Junto aos rios da Babilónia[363],::ali mesmo nos sentámos e chorámos,::ao lembrar-nos de Sião[364].

2 Dos salgueiros, no meio dela,

suspendemos as nossas harpas.

3 Pois os que ali nos tinham cativos pediam-nos um cântico;

e os nossos opressores[365], uma canção de alegria:
«Cantai para nós algum cântico de Sião».

4 Como poderíamos cantar um cântico do Senhor,

numa terra estrangeira?


5 Se eu me esquecer de ti, Jerusalém[366],

fique esquecida a minha mão direita.

6 Fique a minha língua colada ao paladar,

se eu não me lembrar de ti,

se eu não elevar Jerusalém

acima da minha felicidade.

7 Lembra-te, Senhor, como os filhos de Edom[367]

gritavam no dia de Jerusalém:

«Arrasai-a! Arrasai-a

até aos seus alicerces!».

8 Ó cidade da Babilónia devastadora,

feliz de quem te retribuir a ti
as maldades com que nos trataste a nós[368].

9 Feliz de quem agarrar e despedaçar

as tuas criancinhas contra um rochedo!


138(137)Hino de ação de graças


1 De David.


Eu te dou graças, Senhor, de todo o meu coração[369],

na presença dos anjos, cantarei para ti[370].

2 Inclinar-me-ei diante do teu santo templo

e darei graças ao teu nome,

pela tua misericórdia e pela tua fidelidade,

pois com a tua promessa ultrapassas a fama do teu nome.

3 No dia em que te invoquei, logo me respondeste

e aumentaste-me as forças da alma.


4 Todos os reis da terra te darão graças, Senhor,

porque escutaram as palavras da tua boca.

5 Celebrarão os caminhos do Senhor, dizendo:

«É grande a glória do Senhor!».

6 Pois o Senhor é excelso, mas repara no humilde

e desde longe reconhece quem é soberbo.


7 Quando caminho no meio dos perigos, conservas-me a vida.

Estendes a mão contra a fúria dos meus inimigos,
e a tua mão direita me salva.

8 O Senhor fará tudo por mim.

A tua misericórdia é eterna, ó Senhor!
Não abandones a obra das tuas mãos!


139(138)A sabedoria de Deus


1 Ao diretor. De David. Salmo.


Tu me examinaste, Senhor, e me conheces[371].

2 Tu sabes quando me sento e quando me levanto[372];

de longe, percebes os meus pensamentos.:

3 Distingues o meu caminho e o meu descanso,

estás atento a todos os meus passos.

4 Pois ainda a palavra não está na minha língua,

já Tu, Senhor, a conheces por inteiro.

5 Tu me envolves por detrás e pela frente

e colocas sobre mim a tua mão.

6 É uma sabedoria demasiado profunda para mim,

tão sublime que não tenho capacidade para ela.


7 Para onde poderia eu ir, longe do teu espírito?

Para onde poderia fugir da tua presença?

8 Se subir até aos céus, Tu ali estás;

se me deito no mundo dos mortos, ali estás.

9 Se me erguer nas asas da aurora

e for viver para além do mar,

10 também ali a tua mão desceria sobre mim

e a tua direita me seguraria.

11 Se pedir à escuridão para me esconder

ou à luz para ser noite à minha volta[373],

12 para ti a escuridão não é escura

e a noite brilhará como o dia;
a escuridão é como a luz.

13 Pois Tu formaste as minhas entranhas,

teceste-me no ventre de minha mãe.


14 Dou-te graças, ó Altíssimo,

que me impressionas com tantas maravilhas;

são maravilhosas as tuas obras.

Tu conheces profundamente a minha alma[374].

15 Nenhum dos meus ossos estava escondido de ti,

quando estava a ser formado em segredo,
entretecido nas profundezas da terra.

16 Os teus olhos viram-me ainda em embrião[375];

os meus dias estavam descritos no teu livro.

Todos eles estavam modelados,

antes mesmo de um só deles existir.

17 Como são preciosos para mim os teus desígnios!

Como é profundo o seu sentido, ó Deus!

18 Se os contasse, seriam mais numerosos que a areia.

Despertei e ainda estou contigo[376]!


19 Ó Deus, oxalá desses a morte ao malfeitor,

e os homens sanguinários se afastassem de mim!

20 Pois eles acusam-te sem motivo

e erguem-se contra ti[377] sem ter razão.

21 Não haveria eu de odiar os que te odeiam, ó Senhor?

Não haveria de aborrecer os que se erguem contra ti?

22 Tenho por eles um ódio implacável,

e tornaram-se meus inimigos.


23 Examina-me, ó Deus, para conheceres o meu coração;

põe-me à prova para conheceres as minhas preocupações.

24 Vê se existe em mim algum rasto de ídolos

e conduz-me pelo caminho da eternidade.

140(139)A ajuda contra os maus


1 Ao diretor. Salmo. De David.


2 Livra-me, Senhor, do homem malvado[378];

protege-me dos homens violentos.

3 Eles planeiam maldades no seu coração

e todos os dias provocam discórdias.

4 Eles afiam a sua língua como serpentes

e têm veneno de víbora nos seus lábios[379].

5 Guarda-me, ó Senhor, das mãos do malfeitor;

livra-me dos homens violentos,
que planearam armadilhar meus passos.

6 Os insolentes esconderam laços contra mim

e os perversos estenderam uma rede;
colocaram-me tropeços ao longo do caminho.


7 E eu disse ao Senhor: «Tu és o meu Deus;

escuta, Senhor, a voz da minha súplica.

8 Ó Senhor, meu Senhor, minha força e salvação,

Tu me protegeste a cabeça no dia do combate.

9 Não concedas, Senhor, aos malfeitores o que desejam;

não deixes que os seus planos tenham êxito.

10 Ao erguerem a cabeça aqueles que me cercam,

recaia sobre eles a perfídia dos seus lábios.

11 Amontoem-se sobre eles carvões em brasa,

que os atirem ao fosso para não mais se erguerem.

12 Que quem é de má língua não subsista na terra[380];

e que a desgraça persiga o violento até à ruína.


13 Eu sei que o Senhor há de fazer cumprir

o direito do oprimido e a justiça dos pobres.

14 Por isso, os justos louvarão o teu nome

e os honestos habitarão na tua presença.


141(140)Súplica na adversidade


1 Salmo. De David.


Por ti eu clamo, Senhor, vem depressa junto a mim[381];

escuta a minha voz, quando te invoco.

2 Seja a minha oração como incenso na tua presença[382],

e as minhas mãos erguidas como a oferta da tarde.

3 Põe, Senhor, uma guarda à minha boca

e uma defesa à porta dos meus lábios.

4 Não deixes que o meu coração se incline para coisas más,

nem se envolva em delitos de malfeitores.

Que eu não me junte com criminosos,

nem tome parte em seus lautos banquetes.

5 Castigue-me aquele que é justo,

e aquele que é piedoso me repreenda.

Mas que o óleo dos maus não me perfume a cabeça;

e que, ao fazerem o mal, eu permaneça em oração.

6 Quando forem atirados para as mãos duras dos seus juízes,

hão de ouvir como são amáveis as minhas palavras.

7 Como quando se cava e se lavra a terra,

os seus ossos[383] dispersos foram engolidos pela morte[384].

8 É para ti, Senhor, que se voltam os meus olhos;

Senhor, em ti me refugio, não desampares a minha alma.::

9 Guarda-me do laço que estenderam contra mim,

das armadilhas dos que praticam a iniquidade.

10 Que os malfeitores caiam nas suas ciladas,

enquanto eu vou prosseguindo o meu caminho.


142(141)Oração de um justo perseguido


1 Poema. De David, quando estava na caverna[385]. Oração.


2 Com a minha voz, eu clamo ao Senhor[386];

com a minha voz, ao Senhor eu suplico.

3 Exponho diante dele o meu lamento,

diante dele apresento a minha angústia.

4 É então que o meu espírito desfalece dentro de mim,

mas Tu conheces os meus passos.

Neste caminho por onde avanço,

esconderam armadilhas contra mim.::

5 Olha para a direita e repara

que não há ninguém meu conhecido[387].

Qualquer refúgio se acabou para mim,

ninguém se interessa pela minha vida!


6 Por ti eu clamo, Senhor, e digo:

«Tu és o meu refúgio,
a minha herança na terra dos vivos!»[388].

7 Presta atenção à minha súplica,

pois estou reduzido a grande miséria.

Livra-me dos meus perseguidores,

que são muito mais fortes do que eu.

8 Liberta a minha alma desta prisão,

a fim de dar graças ao teu nome.

Os justos farão roda em torno a mim[389],

porque foste bondoso para comigo.

143(142)Súplica na aflição


1 Salmo. De David.


Escuta, Senhor, a minha oração[390],

pela tua fidelidade, atende a minha súplica;
responde-me, pela tua justiça.

2 Não leves o teu servo a julgamento,

pois ninguém[391] é justo na tua presença.


3 O inimigo perseguiu a minha alma

e atirou a minha vida para a terra;

obrigou-me a habitar na escuridão

como os mortos de há muito tempo[392].

4 O meu espírito desfalece dentro de mim;

o meu coração está desolado no meu peito.:

5 Recordo os dias de outrora,

medito em todas as tuas ações
e penso na obra das tuas mãos.

6 Estendo para ti as minhas mãos;

como terra seca, a minha alma tem sede de ti.


7 Senhor, responde-me depressa;

o meu espírito está a definhar.

Não escondas de mim a tua face,

pois eu seria como os que descem à sepultura.

8 Deixa-me ouvir pela manhã a tua misericórdia,

porque é em ti que eu confio.

Dá-me a conhecer o caminho que hei de seguir,

porque para ti elevo a minha alma.

9 Livra-me, Senhor, dos meus inimigos;

é junto de ti que eu me refugio.:

10 Ensina-me a cumprir a tua vontade,

pois Tu és o meu Deus.

Que o teu espírito bondoso me conduza

por terrenos planos.


11 Para honra do teu nome, Senhor, dá-me a vida!

Pela tua justiça, tira a minha alma da angústia!

12 Pela tua fidelidade esmaga os meus inimigos;

leva à perdição todos os que angustiam a minha alma,
porque eu sou o teu servo.


144(143)Ação de graças pela vitória


1 De David.


Bendito seja o Senhor, meu rochedo[393],

que exercita as minhas mãos para a luta
'e os meus dedos para o combate.

2 Ele é meu aliado fiel e minha fortaleza,

o meu baluarte e meu refúgio;

Ele é o meu escudo e nele confio,

é Ele que submete os povos aos meus pés[394].


3 Que é o homem, Senhor, para te preocupares com ele?

O que é um ser humano, para nele pensares?

4 O homem é semelhante a um sopro;

os seus dias são como a sombra que passa.


5 Senhor, abaixa os teus céus e desce;

toca nos montes e que eles fumeguem.

6 Faz brilhar os relâmpagos e espalha-os,

prepara as tuas setas e dispara-as.

7 Do alto, estende a tua mão: salva-me e livra-me

das águas ameaçadoras e da mão dos estranhos.

8 A sua boca profere mentiras

e com a sua mão direita juram falsidade.


9 Quero cantar-te, ó Deus, um cântico novo;

e tocar para ti com a harpa de dez cordas.

10 Tu és aquele que dá aos reis a vitória,

aquele que livra David, seu servo[395].

11 Livra-me da espada cruel,

liberta-me da mão dos estranhos.

A sua boca profere mentiras

e com a sua mão direita juram falsidade.


12 Sejam os nossos filhos como plantas novas,

que vão crescendo desde a sua juventude.

Que as nossas filhas sejam colunas bem talhadas[396],

como na construção de um palácio.

13 Que os nossos celeiros estejam repletos,

a transbordar de uma ponta à outra.

Multipliquem-se por milhares os nossos rebanhos,

por dezenas de milhar nos nossos campos.

14 Que os nossos bois venham bem carregados;

e não haja brechas nem fugas,
nem gritos de alarme nas nossas praças.

15 Feliz o povo a quem assim acontece!

Feliz o povo, cujo Deus é o Senhor!


145(144)Louvor ao rei providente


1 Hino. De David.


Alef

Eu quero enaltecer-te, ó meu Deus e rei[397],

e bendizer o teu nome para sempre.

Bet

2 Todos os dias te hei de bendizer;

e louvarei o teu nome para sempre.:

Guimel

3 O Senhor é grande e digno de todo o louvor,

e a sua grandeza é insondável.


Dalet

4 Uma geração transmite à outra o louvor das tuas obras,

e todos proclamam os teus prodígios.

He

5 Eles aclamam o esplendor da tua majestade[398],

e eu meditarei sobre as tuas maravilhas.

Wau

6 Eles falam do poder dos teus prodígios impressionantes,

e eu anunciarei a tua grandeza.

Zain

7 Assim exprimem a memória da tua imensa bondade

e cantam a tua justiça.


Het

8 O Senhor é clemente e compassivo,

é paciente e cheio de misericórdia.

Tet

9 O Senhor é bom para com todos,

e a sua compaixão envolve todas as suas criaturas.


Yod

10 Louvem-te, Senhor, todas as tuas criaturas[399];

que todos os teus fiéis te bendigam.

Kaf

11 Difundam a glória do teu reino

e proclamem as tuas proezas,

Lamed

12 dando a conhecer aos humanos as proezas de Deus

e o glorioso esplendor do seu reino.

Mem

13 O teu reino é um reino para todos os séculos,

e o teu domínio estende-se por todas as gerações.


Samek

14 O Senhor ampara todos os que caem[400]

e reanima todos os abatidos.

Ayin

15 Todos têm os olhos postos em ti,

e Tu lhes dás o alimento, a seu tempo.

Pe

6 Tu abres a tua mão

e sacias todos os seres vivos com generosidade[401].


Sadé

17 O Senhor é justo em todos os seus caminhos

e fiel para com todas as suas obras.

Qof

18 O Senhor está perto para todos os que o invocam,

para todos os que o invocam em verdade.

Resh

19 Ele realiza a vontade dos que o temem;

escuta os seus gritos e salva-os.

Shin

20 O Senhor guarda todos os que o amam,

mas extermina todos os malfeitores.


Tau

21 Que a minha boca proclame os louvores do Senhor,

e todo o ser vivo bendiga o seu santo nome,
por toda a eternidade.


146(145)Hino ao Deus de misericórdia


1 Aleluia.


Louva, ó minha alma, o Senhor[402]!

2    Hei de louvar o Senhor na minha vida

e cantar ao meu Deus, enquanto existir.:

3 Não confieis nos poderosos,

num ser humano que não dispõe de salvação.

4 Mal sai dele o seu espírito, regressa à terra que é sua,

e nesse mesmo dia se desfazem os seus projetos.


5 Feliz de quem tem o Deus de Jacob como seu auxílio

e cuja esperança está no Senhor, seu Deus.

6 Ele fez os céus e a terra,

o mar e tudo o que neles existe.
Ele guarda fidelidade para sempre.

7 Faz justiça aos oprimidos, dá pão aos famintos,

o Senhor liberta os prisioneiros.:

8 O Senhor abre os olhos aos cegos,

o Senhor levanta os abatidos,
o Senhor ama os justos.

9 O Senhor guarda os forasteiros,

ampara o órfão e a viúva,
mas barra o caminho aos malfeitores.


10 O Senhor reinará eternamente,

o teu rei, ó Sião, reinará de geração em geração.


Aleluia!


147(146-147)Maravilhas de Deus por Israel


1 Aleluia!


Louvai o Senhor[403],

porque é bom cantar ao nosso Deus,
porque é agradável e justo o seu louvor.

2 O Senhor reconstrói Jerusalém

e faz regressar os dispersos de Israel.

3 Ele cura os de coração despedaçado

e liga as suas feridas.

4 Ele estabelece um número para as estrelas

e dá um nome a cada uma delas[404].

5 Grande é o nosso Senhor e todo-poderoso,

a sua sabedoria não tem limites.

6 O Senhor ampara os humildes,

mas rebaixa os malfeitores até ao chão.


7 Cantai ao Senhor em ação de graças,

entoai hinos ao nosso Deus, ao som da lira.

8 Ele cobre de nuvens os céus

e para a terra prepara a chuva,
que faz brotar as ervas nos montes[405].

9 Ele dá aos animais o seu alimento

e aos filhotes dos corvos[406], quando gritam.

10 Não é o vigor do cavalo que Ele mais aprecia[407],

nem dá valor aos músculos no homem.

11 O Senhor aprecia aqueles que o temem,

aqueles que confiam na sua misericórdia.


12 Glorifica, Jerusalém, o Senhor[408];

louva o teu Deus, ó Sião.

13 Pois Ele reforçou os ferrolhos das tuas portas

e abençoou os teus filhos dentro de ti.

14 Ele coloca em paz as tuas fronteiras

e alimenta-te com a flor da farinha.


15 Ele envia a sua mensagem para a terra[409]

e a sua palavra corre sempre veloz[410];

16 Ele concede a neve como se fosse lã,

espalha a geada como cinza.

17 Atira o seu granizo como se fossem migalhas.

Com o seu frio, quem pode resistir?

18 Ele envia a sua palavra e o gelo derrete;

faz soprar o seu vento e as águas correm.

19 Ele anuncia os seus planos a Jacob,

os seus preceitos e as suas ordens a Israel.

20 Não fez assim com nenhum outro povo,

não lhes deu a conhecer as suas ordens[411].


Aleluia!

148Louvor do universo


1 Aleluia!


Louvai o Senhor do alto dos céus[412],

louvai-o nas alturas!


2 Louvai-o, todos os seus mensageiros;

louvai-o, todos os seus exércitos[413]!:

3 Louvai-o, Sol e Lua;

louvai-o, todos os astros luminosos!

4 Louvai-o, alturas dos céus

e águas que estais acima dos céus[414]!

5 Louvai o nome do Senhor,

pois Ele deu uma ordem e todos foram criados.

6 Ele os estabeleceu nos seus lugares para todo o sempre;

estabeleceu uma lei que não passará.


7 Desde a terra, louvai o Senhor,

monstros do mar e todos os abismos;

8 raios de fogo e granizo, neve e nevoeiro,

vento da tempestade que realiza a sua palavra;

9 montanhas e todas as colinas,

árvores de fruto e todos os cedros;

10 animais selvagens e todo o gado,

répteis e aves que voam.


11 Louvai-o, reis da terra e todos os povos,

príncipes e todos os governantes da terra;

12 os jovens e também as donzelas,

os velhos com as crianças!


13 Louvem todos o nome do Senhor,

porque só o seu nome é excelso,
e a sua majestade está acima da terra e dos céus.

14 Ele engrandece o poder do seu povo[415].

Isto é honra para todos os seus fiéis,
para os filhos de Israel, povo que lhe é próximo.


Aleluia!:


149Hino de vitória


1 Aleluia!


Cantai ao Senhor um cântico novo[416];

esteja o seu louvor na assembleia dos fiéis!

2 Alegre-se Israel pelo seu criador;

que os filhos de Sião se regozijem pelo seu rei!

3 Louvem o seu nome com danças;

cantem-lhe ao som de tambores e harpas!

4 Pois o Senhor quer o bem do seu povo

e honra os humildes com a salvação.

5 Que os fiéis celebrem a sua glória

e cantem jubilosos em seus leitos[417]!


6 Na sua garganta estejam as grandezas de Deus,

nas suas mãos, espadas de dois gumes[418],

7 para realizarem a vingança contra as nações

e darem o castigo aos povos;

8 para prenderem os seus reis com correntes,

e os seus nobres, com algemas de ferro;

9 para lhes aplicarem a sentença registada[419].

Ele é glória para todos os seus fiéis[420].


Aleluia!


150Louvor final


1 Aleluia!


Louvai a Deus no seu santuário[421];

louvai-o no firmamento do seu poder[422].

2 Louvai-o pelos seus prodígios;

louvai-o na medida da sua imensa grandeza!

3 Louvai-o ao som da trombeta[423];

louvai-o com a harpa e a lira!

4 Louvai-o com tambores e danças;

louvai-o com instrumentos de corda e flautas!

5 Louvai-o com címbalos sonoros;

louvai-o com címbalos de aclamação!

6 Tudo o que respira[424]

louve o Senhor!


Aleluia!



  1. Este salmo faz parte do conjunto designado como salmos ou cânticos de Sião. Nele se nota o eco de alguma vitória obtida pelos israelitas. Vários acontecimentos históricos poderiam ter contribuído para enriquecer os temas e as metáforas pertinentes, como, por exemplo, as imagens da batalha relatada em 2Sm 5,17-24. Mas estas referências ao passado que servem para criar a linguagem reconhecível transformam-se, na verdade, em paradigmas de futuro. Um outro acontecimento político e militar que seguramente está em condições de poder servir de referência a este salmo é o assédio de Senaquerib a Jerusalém no ano de 701 a.C. (2Rs 18,13-19,36).
  2. Salém, estando em paralelo com Sião, refere-se evidentemente a Jerusalém. É possível que o mesmo nome seja o que aparece em Gn 14,18; Jdt 4,4; e que Heb 7,1s refere. O conteúdo do salmo celebra a vitória sobre os exércitos invasores e a destruição das suas armas. O autor do salmo pode estar a aproveitar, para contraste, o significado de «paz» (chalom) que a literatura bíblica se habituou a associar com o nome de Jerusalém.
  3. O tema da destruição das armas de guerra é frequente na Bíblia (Sl 46,10; Is 2,4; Ez 39,9; Os 2,8; Zc 9,10).
  4. As metáforas dos vv. 5-7 podem aludir à catástrofe que atingiu o exército de Senaqueribe, quando pretendia atacar Jerusalém, conforme consta em 2Rs 19,35.
  5. Ou: e com os que sobrevivem à ira farás uma cintura. Esta imagem significaria a união entre Deus e os sobreviventes da ira (Jr 13,11; Sl 109,19).
  6. Já na antiguidade houve quem entendesse a expressão acima traduzida como ao que é temível (lammora’) por uma alternativa: ao dador da lei (lammoreh).
  7. Cf. Sl 39,1.
  8. Trata-se de um salmo coletivo de súplica. Começa com as referências explícitas aos gestos e atitudes de uma súplica dirigida a Deus. Entretanto, surgem queixas e experiências que parecem traduzir a sensação de algum abandono por parte de Deus, tanto mais que o ponto de comparação são os prodígios dos tempos antigos que soam já demasiado distantes.
  9. A expressão literal hebraica fechar as suas entranhas é equivalente a fechar o seu coração.
  10. Sobre as diferenças que se podem verificar no modo de agir de Deus (cf. Jr 18,1-12).
  11. Hebraico consonântico: Lembrarei os prodígios. As traduções antigas e a vocalização massorética (qere’) consideram que é o próprio salmista que se recorda. Esta é a opção que vai em texto. Segundo o texto hebraico consonântico (ketib) o que se afirma é a intenção do salmista em lembrar aos outros.
  12. As memórias evocadas neste salmo concentram-se na saída do Egito. Por isso os antepassados nomeados são os de Jacob, que seguiram com ele de Canaã para o Egito, e os de José, que já lá estavam com ele (Gn 46,26-27; Ex 1,1-5).
  13. Alguns destes prodígios são reflexos da literatura oriental sobre a luta contra o caos que envolve o mar e outras forças cósmicas. Estas manifestações do poder de Deus aparecem aplicadas ao período de transição radical que medeia entre o Egito e o Sinai (Sl 68,8s; Jb 7,12s; Ex 19,16-18).
  14. Este salmo histórico propõe uma longa exposição sobre o significado do passado de Israel, segundo o modelo sapiencial. O convite a prestar bem atenção, feito logo ao início, é um sinal claro deste gosto sapiencial. A visão da história passada que se propõe divide-se entre a grandeza dos prodígios de Deus, a marcar as etapas decisivas da vida do povo, e os pontos baixos do comportamento do mesmo povo, que se revolta e desobedece às diretivas vindas da parte de Deus. Estão inclusivamente presentes os ecos de lutas e problemas ocorridos entre as várias tribos dos hebreus. É referida, em concreto, uma rejeição da tribo de Efraim por parte de Deus, daí resultando a primazia atribuída à tribo de Judá. Com esta particular maneira de analisar e sintetizar a história de Israel, este salmo partilha posições semelhantes àquelas que encontramos no Deuteronómio e na historiografia bíblica que nele se inspira.
  15. Lit.: a minha lei. O termo usado é mesmo torah, que é a mais importante das palavras usadas para designar lei, mas que significa realmente instrução. Neste lugar, a palavra dá a todo o salmo um estatuto equivalente a um tratado normativo sobre a fé de Israel.
  16. Não temos outros dados históricos concretos sobre um episódio que esteja por trás deste texto. Eventualmente, pode tratar-se de atribuir a Efraim, como principal tribo do Reino do Norte, a responsabilidade dos males que aconteceram a Israel.
  17. É a cidade egípcia de Tânis, situada num dos canais orientais do delta do Nilo, zona habitualmente associada com a estadia dos hebreus no Egito (Ex 5-11).
  18. As águas do grande abismo cósmico que aqui se chama tehom, tal como em Gn 1,2 não têm só conotações negativas como caos e ameaça. Também são fonte de vida. Nesse abismo não só há as águas salgadas, mas também as doces.
  19. As difíceis condições de vida no deserto fizeram com que se aprofundasse a memória de um produto alimentar específico daquele ambiente, que os beduínos continuaram a usar. O próprio nome de maná tem raízes mais ligadas ao árabe que ao hebraico. O seu sabor a mel era outro aspeto que contribuía para construir a memória de um alimento providencial e milagroso (Ex 16,13-21; Nm 11,7-9).
  20. Ou: dos anjos, conforme a interpretação que vem da tradução dos LXX e continuou na Vg. Estes fortes representam as personagens poderosas que, na cultura religiosa semítica, fazem parte da corte divina (Sl 103,20; 105,40).
  21. Nos vv. 26-29 é recordado o episódio das codornizes que caíram à volta do acampamento para alimento dos israelitas (Ex 16,13; Nm 11,31-34).
  22. Em Nm 11,33, este episódio é relatado quase com as mesmas palavras.
  23. Ou: e de novo, madrugando, o procuravam. Os atos de culto no templo tendem a privilegiar as horas mais matinais. Por outro lado, estes ciclos de pecado e arrependimento estão bem espelhados no livro dos Juízes (Jz 2,11-23; 3,7-15; etc.).
  24. O termo para redentor é go’ el, que designa aquele que, segundo a lei do levirato, tem capacidade e obrigação de resgatar ou redimir a mulher viúva e sem filhos que caía numa condição social desprotegida (Dt 25,5s).
  25. Nos vv. 43-50, aparecem resumidas as várias pragas que Deus fez cair sobre os egípcios (Ex 7-11).
  26. Os primogénitos que morreram (Gn 49,3; Dt 21,17) são considerados descendentes de Cam, porque este, na Bíblia, é declarado como segundo filho de Noé e como pai de Misraim, que é o Egito (Gn 10,6).
  27. O território da terra prometida é identificado como se fosse uma única montanha. O significado desta identificação é múltiplo: os hebreus identificavam-se sobretudo com a parte montanhosa da Palestina; a montanha de Sião era simbolicamente o coração da terra e a montanha (Ex 15,17) é sempre a metáfora preferida para morada simbólica de Deus.
  28. Lugares altos é o nome que se dá aos santuários das religiões de Canaã que continuaram a existir, depois de os hebreus ali se terem instalado (1Sm 9,12; 1Rs 3,2).
  29. É uma alusão à captura da arca da aliança que estava em Silo. A arca era considerada a morada de Deus e não voltaria mais a Silo (1Sm 4,3-7,1; Jr 7,12-15).
  30. A sua fortaleza é a arca da aliança que funciona como morada de Deus.
  31. Alude ao castigo contra os filisteus (1Sm 5,6.9).
  32. Os vv. 67-68 referem-se ao facto de a arca da aliança ter deixado de estar em Silo, que se encontrava na tribo de Efraim e pertencia à família de José, tendo sido definitivamente transportada para o território da tribo de Judá.
  33. Com tonalidade compreensível de lamentação por situações de ataque contra Jerusalém (Sl 74), este é um salmo coletivo de súplica. O pedido consiste principalmente em que os males e desgraças infligidos à cidade pelos inimigos sejam vingados por uma intervenção do próprio Deus. Como fundo histórico para acontecimentos deste género, pode pensar-se em 2Rs 24-25 e Ez 36,5. Mais uma vez a destruição do templo em 587 ou 586 pelo exército neobabilónico e a sua profanação pelos selêucidas em 170 a.C. são os contextos de grande catástrofe que se prestam a servir de pano de fundo para estes salmos.
  34. Herança, templo e Jerusalém têm muito de sinónimo entre si. Com níveis de pertinência diferentes, o conceito de herança de Deus pode aplicar-se a cada um deles (Ex 15,17; Sl 74,7; Jr 51,51).
  35. A razão da ira de Deus e o pedido de castigo não é por não conhecerem a Deus. A razão é a dos maus tratos a que sujeitam a «morada de Jacob».
  36. O termo hebraico que significa seus domínios (nawehu) serve para indicar vários tipos de propriedade, sejam campos, pastagens ou residências.
  37. A conceção moral de que as culpas dos pais poderiam motivar castigos contra os filhos (Ex 20,5; Lm 5,7) era recebida com alguma incomodidade.
  38. Neste salmo coletivo de súplica, o contexto que justifica o pedido deverá ser algum perigo que ameaça o reino do Norte. Com efeito, o grupo humano que sofre ameaça e por causa dela dirige a Deus este pedido aparece representado pela menção das três principais tribos daquele reino, nomeadamente Efraim, Benjamim e Manassés. A data de composição plausível, nesta perspetiva, teria sido nas proximidades da invasão assíria que acabou por pôr fim ao reino da Samaria, em 721 a.C..
  39. O título de pastor é também aplicado a Deus (Sl 23,1s; Is 40,11).
  40. José representa sobretudo o grupo de tribos da Samaria, Efraim e Manassés. No entanto, numa leitura segundo o interesse dos israelitas em geral, José poderia ter alguma representatividade e sentido para o povo todo, pelo destaque que tem na associação com o patriarca Jacob e pelo ascendente que a memória da estadia no Egito lhe deixou.
  41. Estas tribos são as três descendentes de Raquel, i.e., estamos na linha preferida da descendência de Jacob (Nm 2,17-24; Jr 31,15).
  42. O pedido para que Deus volte é utilizado neste salmo à maneira de um refrão (vv. 4,8,15,20). Há quem traduza esta expressão como faz-nos voltar. No entanto, a tradução proposta, sendo inteiramente justificada do ponto de vista gramatical, parece enquadrar-se bem melhor no contexto e na dinâmica de pensamento do salmo.
  43. A alegoria da videira, que serve para suportar a exposição entre os vv. 9 e 18, é bastante comum na literatura profética (cf. Is 5,1-5; Jr 2,21; 12,10; e ainda Mc 12,1-12; Jo 15,1-8). A passagem do Egito para a terra prometida é vista metaforicamente como se a videira fosse transplantada (Ex 23,31; Dt 4,37-38).
  44. Lit.: Os cedros de Deus. A expressão tem o valor de um superlativo.
  45. O mar aqui referido é seguramente o Mediterrâneo e o rio deve ser o Eufrates, visto como uma espécie de fronteira ideal de Israel: Gn 15,18; Dt 11,24; 2Rs 24,7; Zc 9,10. Isto significa que os israelitas integram na sua imagem de identidade cultural a Síria até ao Eufrates, que nunca lhes pertenceu como realidade política.
  46. Estes animais ameaçadores são metáforas das nações, as mais poderosas como a Assíria ou a Babilónia, ou as vizinhas mais modestas, cuja força e ambições colocam Israel continuamente em perigo (Sl 83,7s; 137,7; Abd 11).
  47. Mesmo continuando a desenvolver a metáfora da videira, o texto acaba por se referir explicitamente a Israel, tratando-o como filho.
  48. Como o salmo tem a atenção concentrada na Samaria, este homem da tua direita pode ser uma maneira de se referir a Benjamim, cujo nome significa filho da direita. Com esta expressão pode estar a tomar a parte pelo todo, i.e., a tribo de Benjamim pela totalidade do reino do Norte, ao qual esta tribo pertence. Associando esta expressão com o Sl 110,1, em que quem está à direita de Deus é o rei, poderia perceber-se aqui alguma ressonância de tipo messiânico. O salmo dá a entender que se trata de uma personalidade concreta muito importante. A referência poderia ser para Zorobabel (Esd 3,2; Ag 1,1).
  49. Este salmo obedece às caraterísticas de uma exortação profética. Começa com um hino (vv. 1-6), convidando para a festa, e integra seguidamente um oráculo divino (vv. 7-17), que recorda os mandamentos e as experiências vividas pelo povo no deserto.
  50. Lit.: o chofar, trombeta feita de um chifre de carneiro e utilizada pelo sumo-sacerdote para anunciar as festas de grande solenidade.
  51. A lua nova e a lua cheia eram os dois momentos mais significativos do movimento mensal da lua e representavam os dias festivos mais importantes do mês. Elas definiam um ciclo quinzenal de festas, num mês dividido pelas fases da lua em quatro semanas (Lv 23,33-34; Nm 28,11-15; 29,12-39; Am 8,5).
  52. Os salmos de Asaf manifestam especial atrativo pela personagem de José (Sl 77,16; 78,67; 80,2). Pelo que diz respeito a este salmo, esse facto poderia sugerir alguma intencionalidade de convite destinado à população do norte de Israel.
  53. Desde as mais antigas traduções se tem sentido a dificuldade em saber se esta última frase do v. 6 pertence ou não ao discurso direto que preenche todo o resto do salmo. O facto de nesta frase os verbos estarem já na primeira pessoa parece apontar para esse entendimento. Assim, toda a secção final seria uma espécie de declaração ou testemunho posto na boca de Deus como mensagem a conservar desde a saída do Egito. A opção de deixar esta primeira frase fora do discurso de Deus é mais habitual, mas é também mais difícil de enquadrar na sequência do texto.
  54. O texto pretende sublinhar que antes de Deus ter escolhido Israel como seu povo, enquanto estava no Egito era como se o não conhecesse. É isso que dá a entender o texto de Am 3,1s.
  55. Ou: Então Eu os alimentaria com a flor da farinha / e os saciaria com o mel dos rochedos. Esta tradução colocando o segundo hemistíquio na terceira pessoa do plural já aparece na tradução dos LXX e é seguida na Vg e na NVg.
  56. Este é um salmo coletivo de súplica. Além do pedido que formula, tem dados que o assemelham a uma exortação profética. Deus é apresentado como um juiz que preside ao funcionamento do universo como presidente supremo de uma corte divina, segundo a conceção geral das culturas de Canaã. Nas religiões semíticas a corte divina é formada por todos os deuses.
  57. As várias tradições religiosas da região de Canaã tinham como caraterística comum o facto de representarem os deuses como formando uma assembleia presidida por um deus supremo. De acordo com este quadro, Deus é aqui apresentado numa posição de superioridade e autoridade acima dos restantes deuses (Sl 86,8; 136,2; Ex 18,11; Dt 10,17). Isto parece, no entanto, uma imagem para justificar a interpelação aos que têm de administrar a justiça, para o fazerem com inteira equidade (v. 2). Quem se encontra aqui debaixo de mira são muito provavelmente reis, governantes e chefes responsáveis por que seja assegurada justiça no exercício das suas funções. E estas autoridades são metaforicamente designadas por deuses (v. 6; Sl 45,7; 58,2 e ainda Ex 21,6; Jo 10,33-36).
  58. Esta interpelação aos responsáveis pela justiça é frequente nos profetas: Is 1,17ss; Jr 5,28; 21,12; 22,3; Ez 22,27.29; Mi 3,1-11; Za 7,9s; cf. Jb 29,12; Pr 18.5; 24,11s.
  59. Segundo a Bíblia, a importância do conceito de justiça ultrapassa a simples ordem social; ela é de tal modo abarcante e profunda que lhe cabe assegurar a consistência de todas as coisas.
  60. Esta frase também poderia ser lida como uma interrogação para sublinhar a crítica.
  61. Este salmo coletivo de súplica dirige-se a Deus para que proteja o povo de Israel. O inimigo principal cujas ameaças se pressentem poderiam ser os assírios. Na verdade, o salmo dá indícios de ter sido composto antes do exílio. Como acontece sistematicamente com textos deste género, os argumentos e imagens aduzidos para justificar a proteção de Deus consistem numa revisão dos prodígios realizados por Ele no passado. O que serve para processar esta recordação são os nomes dos inimigos que sofreram as consequências da intervenção divina.
  62. Nos vv. 7-9 aparece a lista dos inimigos ordenados em vários grupos. O primeiro é caraterizado como gente das tendas. São povos a sul da Palestina, vários deles ainda nómadas, tais como edomitas, ismaelitas, agarenos, descendentes de Agar, guebalitas e amalecitas. Os filhos de Lot já não são conhecidos em tempo histórico dos hebreus, mas seriam mais um grupo do sul. Outro grupo é o dos filisteus e fenícios de Tiro que viviam na costa do Mediterrâneo.
  63. A quantidade de povos referidos nos vv. 7 a 9 serve para configurar a variedade de inimigos que se contrapõem a Deus e ao seu povo. Trata-se de um aglomerado simbólico em que se sintetizam todas as recordações de guerra com os povos seus vizinhos que os israelitas conservavam. A associação dos assírios com os filhos de Lot, que seriam os moabitas e amonitas, não nomeados no texto, pode servir o aspeto simbólico pretendido. Este conjunto de povos também poderia sugerir leituras para uma época mais recente, como a dos selêucidas. Nesse caso, o nome de assírios poderia fazer lembrar os sírios, pois o reino selêucida situava-se na Síria.
  64. Os acontecimentos e as personagens referidas nos vv. 10-12 correspondem ao que vem relatado em Jz 4,7s. Estes nomes recordam grandes vitórias ocorridas no passado e que aqui servem como modelo para desenhar as coordenadas da intervenção divina que se solicita.
  65. Ou: os melhores campos.
  66. Este é mais um dos salmos de Sião (cf. Sl 46,2 nota). Nele se manifesta o enlevo que produz sobre o peregrino o facto de pensar no santuário do Senhor, em Sião. A morada de Deus no santuário é descrita com recurso a palavras no plural, como no v. 2, o qual, na tradição de Canaã, sublinha a grandeza de quem ali habita e a amplidão dos palácios. Assim se usava engrandecer os palácios dos reis no antigo Oriente. Ora, Deus é aqui apresentado como um rei em Sião (1Rs 6). A referência às primeiras chuvas no v. 7 poderia ser uma alusão ao tempo da festa das Tendas que ocorria no início do outono. Tem algumas semelhanças com os salmos de peregrinação, que acompanhavam a viagem para as grandes festas a celebrar em Jerusalém (Ex 23,17; Dt 16,16).
  67. A referência ao vale do pranto pode corresponder ao vale de Gué Hinom, situado a oeste de Jerusalém, por onde os peregrinos entravam na cidade e onde se encontravam os caminhos vindos do norte, do sul e do oeste. Se o salmo se enquadra na festa das Tendas, esta entrada acontece no outono, que é realmente o tempo das primeiras chuvas.
  68. A referência ao escudo e ao ungido sugerem que uma proteção especial de Deus era pedida para o rei, personagem a quem aqueles dois conceitos correspondem de forma especial. Se o salmo for de depois do exílio, o ungido pode ser o sumo-sacerdote, uma vez que se tornara o centro da comunidade e do templo. Aos retornados está reservada uma espécie de paz messiânica prometida por Isaías e Zacarias.
  69. Ou: em lugar por mim escolhido. Há quem leia baħarti como início da frase seguinte: Já escolhi.
  70. Este salmo coletivo de súplica procura valorizar todos os sinais possíveis de recuperação e de esperança. Este espírito e estas expetativas parecem adequar-se particularmente bem a um tempo de recomeço, depois do exílio. De qualquer maneira, estes sentimentos podem ter lugar em qualquer época da história, segundo a conceção bíblica.
  71. Ou: fizeste regressar Jacob do exílio.
  72. Ou, segundo os LXX: aos que se voltam para Ele de coração.
  73. Ou: porque a sua glória habita na nossa terra. Se o salmo se enquadrar em tempo de regresso do exílio, seria a própria glória de Deus que regressa, depois de ter abandonado o templo ao ser destruído (Ez 11,23; 43,2; Ag 2,9).
  74. Duas duplas de conceitos caraterizam neste v. o agir de Deus e o mundo ideal. Deus é misericórdia e verdade; a perfeição do mundo humano é paz e justiça. O ideal é encontrarem-se e funcionarem juntas.
  75. Entre o céu e a terra, o divino e o humano, a norma de funcionamento é de perfeita harmonia.
  76. Ou: e a paz pelo caminho dos seus passos. Há quem proponha esta tradução alternativa, com base na associação entre justiça e paz no v. 11. A tradução dos LXX sugere uma tradução mais fiel ao estado atual do texto hebraico. Em conclusão, toda a prioridade é atribuída à justiça.
  77. Este salmo individual de súplica refere motivos de perigo e perseguição, alguns dos quais aparecem iguais em outros salmos ( v. 14 e Sl 54,5), mas concentra-se principalmente em manifestar sentimentos de serenidade e em recolher motivos de esperança. Parece até preocupado em juntar neste género literário tudo o que sejam motivos de confiança. A promessa de ação de graças, natural neste tipo de orações, ocupa a parte central do salmo. Em suma, é um salmo prestável para ser rezado em muitas ocasiões.
  78. A convicção generalizada entre os profetas de que todos os povos hão de reconhecer o seu Deus quer dizer que o significado que atribuem a Deus e a maneira como veem a sua relação com ele é prestável para a generalidade dos humanos. O sentido com que o fazem é de harmonia universal. Quando está articulado com a correção de injustiças cometidas por outros povos, envolve conotações de castigo infligido por Deus contra as más ações.
  79. Lit.: do Cheol.
  80. Este salmo parece ser um caso característico dos cânticos de Sião (Cf. Sl 46). Nele ressoam os oráculos proféticos sobre a grandeza de Jerusalém. A realeza universal de Deus que dali se afirma faz com que Sião seja vista como a meta de peregrinação, e mais ainda se afirme como sendo a origem dos mais variados povos do mundo. Parece ressoar neste salmo um certo espírito da festa de Pentecostes, por ocasião da qual se juntavam muitos peregrinos de longe em Jerusalém. O que o salmo proclama é o entusiasmo vivido por todos os que consideram Sião como capital espiritual do mundo.
  81. Raab é um dos nomes dados a um monstro marinho identificado com o caos, tal como acontece com outros monstros (Sl 89,11; Is 51,9; Jb 9,13; 26,12). Aqui deve referir-se ao Egito (Is 30,7), que partilha a mesma imagem, ainda que neste salmo não pareça tão negativo.
  82. Lit.: Cuche. Era uma população africana situada a sul do Egito, na região que depois se chamou Etiópia.
  83. A tradução dos LXX com alguns mss. leem: Tanto príncipes como crianças.
  84. Sobre Heman, o ezraita, pode ver-se Sl 89,1; 1Rs 5,11; 1Cr 6,18. Ezraíta significa nativo, autóctone.
  85. Este salmo individual de súplica descreve de uma forma ampla, pormenorizada e intensa as queixas que sustentam o seu pedido. São males que o apoquentam desde muito jovem e que o deixam às portas da morte. Pela modalidade quase biográfica que mostra do sofrimento e da sua interferência na vida espiritual do orante, este salmo bem como o salmo 39 apresentam fortes analogias com o caso de Job. O título do salmo parece ter sofrido alguma duplicação.
  86. Este abismo da morte traduz o termo Cheol, espaço imaginário onde se localiza a referência aos mortos. Cf. v. 6; Sl 6,6; 9,18; 86,13; Nm 15,33; Am 9,1-4.
  87. Os vv. 5-7 e 11-13 exprimem bem o que os hebreus sentem relativamente às condições dos humanos no mundo do Cheol.
  88. Por este v. se pode avaliar qual a sensação com que a cultura dos semitas, de que os hebreus fazem parte, olhava para a condição dos mortos e o tipo de vida desvalorizada que lhes restava no Cheol. Ali, estavam longe de Deus.
  89. Último traço da descrição do mundo dos mortos, este termo de perdição (’abaddon) não significa a ideia de condenação, mas tem o sentido de ruína, destruição e quase aniquilamento. Cf. Jb 26,5; 28,22; Pr 15,11.
  90. Etan era um sábio (1Rs 5,11), cujo nome andava ligado aos domínios da música no templo de Jerusalém (cf. 1Cr 6,27-29; 15,17-19). O qualificativo ezraíta significa nativo, autóctone.
  91. Este salmo real começa por celebrar o próprio Deus como rei do universo e de Israel. Recorda-se em discurso direto (vv. 4-5) a aliança que Deus estabelecera com a casa de David (2Sm 7), prometendo que a tornaria firme para sempre. Daí a classificação de salmo messiânico que se lhe atribui. Este entusiasmo não anula o tom de lamentação e de súplica com que o salmo termina (vv. 39-53). Isto significa que a época em que o salmo foi composto estava marcada por acontecimentos trágicos, vividos no presente ou relembrados do passado. As imagens da destruição de Jerusalém parecem pairar no seu horizonte.
  92. Ou nos céus.
  93. Este discurso direto poderia originalmente ter como introdução: Tu disseste, que, no texto hebraico atual, aparece no início do v. 3 e que desde a antiguidade sempre deixou a impressão de que o contexto pediria uma segunda pessoa (Deus) e não uma primeira (salmista).
  94. Esta assembleia dos santos é uma expressão para designar o conjunto dos deuses, segundo a tradição religiosa de Canaã. Os hebreus acabaram por aproveitar a expressão para diversos usos metafóricos e, mais tarde, para designar a assembleia de Deus com os seus anjos (Jb 1,6; 5,1; 15,15; Dn 4,14; Zc 14,5).
  95. Lit.: filhos de Deus.
  96. Os vv. 10-14 tratam do poder que Deus exerce sobre o mundo e sobre as principais forças da natureza.
  97. Raab é um monstro mítico que personifica o caos (Sl 87,4; Jb 7,14; 9,13; Is 51,9). Tal como no Sl 87,4, aqui poderia referir-se ao Egito e, sendo assim, a referência histórica vai para o tema omnipresente da saída do Egito. Mas pode simplesmente tratar-se de uma referência geral à vitória de Deus sobre as forças do caos.
  98. Os montes Tabor e Hermon são montanhas famosas no norte de Israel que tinham grande simbolismo religioso (Sl 42,7; Os 5,1).
  99. Temos aqui a hierarquização dos atributos de Deus: a sua essência é justiça e retidão; a verdade e a misericórdia são critérios prioritários na aplicação da justiça.
  100. Os vv. 20-30 propõem uma explicação ampliada da promessa que os vv. 4-5 continham em forma essencial.
  101. Esta declaração parece ter sido feita ao profeta Natan e ao juiz Samuel, que tiveram papel significativo na ascensão de David ao trono (Sl 2,7; 18,31; 22,11; 1Sm 16,1; 2Sm 7,3-5.12-17.27).
  102. Se se tomar em consideração o paralelismo do v. 40, que parece fazer pendão com este v., poderíamos traduzir: Coloquei uma coroa na cabeça de um herói.
  103. Ou: O inimigo não o há de surpreender.
  104. Do mar Mediterrâneo ao rio Eufrates e afluentes é o espaço do Israel ideal, que aparece associado ao reino de David e provavelmente nunca passou de um ideal para os hebreus.
  105. Os vv. 39-52 tratam de uma situação completamente diferente. O destino do povo e do seu rei encontra-se numa fase de angústia. Preocupações semelhantes se encontram em Sl 39,5s; 79,5; 80,13-17.
  106. O salmista preocupa-se com o destino do povo como uma criança que ele traz ao colo, interiorizando uma expressão usada pelo próprio Moisés em diálogo com Deus: Nm 11,12.
  107. Este v. é uma doxologia com a qual termina o terceiro livro dos salmos (cf. Sl 41,14; 72,19).
  108. Esta atribuição a Moisés pode dever-se às analogias do texto deste salmo com algumas passagens do Génesis e especialmente com o cântico de Moisés em Dt 32.
  109. Este salmo coletivo de súplica está composto segundo o espírito e os modelos dos salmos sapienciais. Vários dos seus temas apontam para o domínio da meditação sapiencial. Os temas mais concretos que costumam enquadrar as orações de súplica são aqui menos notórios. A situação espelhada é uma expressão mais genérica da experiência humana. O facto de recolher vários temas do passado poderia eventualmente sugerir uma data de composição razoavelmente recente.
  110. Poderia perceber-se aqui uma referência a Gn 3,19.
  111. A vigília é uma terça parte da noite, marcada pela mudança de turno das sentinelas: Jz 7,19.
  112. Dadas as dificuldades de sintaxe reconhecidas neste texto, vemos em lbb a preposição le (para) e o termo bab, conhecido no semítico geral como porta ou pórtico. Poderia ser a porta da casa onde a sabedoria acolhe e recebe aqueles que a procuram (Pr 9,1-6). A tradução alternativa tradicional é: para chegarmos ao coração da sabedoria.
  113. Este é um salmo de modelo sapiencial, com o qual se propõe uma meditação sobre o que pressupõe e significa a confiança em Deus. O modelo de vida sobre o qual incide esta meditação é o de alguém que vive acolhido no templo (vv. 1-2). Alguém que tem por missão propor as verdades da sabedoria, segundo a relação mestre-discípulo, dirige-se a ele na segunda pessoa, pormenorizando o que significa encontrar-se sob proteção de Deus (vv. 3-13). No final, há uma espécie de oráculo em que Deus confirma e acentua o pensamento que o mestre de sabedoria tinha exposto (vv. 14-16). O destinatário desta lição de sabedoria é literariamente uma pessoa singular, mas o espírito que se incute projeta-se sobre a experiência da nação inteira.
  114. A estrofe constituída pelos dois primeiros vv. junta quatro maneiras de designar a Deus: Altíssimo (‘elyon), Omnipotente (’el-chadday), Senhor (yahweh) e Deus (’elohim).
  115. As consoantes do hebraico que os massoretas vocalizaram para significar flagelo ou peste podem igualmente ser vocalizadas como dabar, significando palavra ou coisa. E assim foi entendida por algumas traduções antigas, bem como por outras modernas.
  116. Os termos da expressão flagelo que devasta ganharam na tradição hebraica conotações demoníacas. Por isso, algumas traduções antigas entendiam o demónio do meio dia.
  117. Os anjos são personagens superiores encarregadas de determinadas funções em nome de Deus. Aqui é a função de proteger os seres humanos.
  118. Conhecer o nome de Deus significa reconhecer e aceitar os seus atributos e a sua intervenção.
  119. Este salmo tem os recortes de um hino de ação de graças individual. Com efeito, os benefícios agradecidos são referidos na primeira pessoa. O título hebraico do salmo sublinha que se trata de um cântico destinado ao sábado. Um cântico de ação de graças no templo poderia sempre alcançar ressonâncias nacionais, válidas para todo o povo. O facto de no v. 11 se fazer referência a uma unção com óleo perfumado poderia acentuar mais este sentido nacional, vendo ali uma referência ao rei. No entanto, o termo em hebraico não é o que se usa tecnicamente para a unção de consagração real. O tom geral didático sobre os comportamentos humanos dá-lhe igualmente algumas ressonâncias sapienciais.
  120. Os dois hemistíquios deste v. podem ler-se em paralelo, dirigindo-se ambos a Deus na segunda pessoa. Lendo um lamed vocativo em layawheh o primeiro hemistíquio seria: Como é bom dar graças, ó Senhor.
  121. Os dois tempos maiores de oração eram a manhã e o fim da tarde. No entanto, o hebraico usa para o segundo momento baleylot, que se pode traduzir como nas vigílias da noite. Esta leitura é possível aqui e ainda nos Sl 16,7 e 134,1. Com efeito, esta última passagem parece referir-se a um programa de oração que se prolonga ao longo da noite.
  122. Na Bíblia, o búfalo é símbolo de força e coragem (Nm 23,22).
  123. Ou: as desventuras.
  124. A palmeira e o cedro do Líbano, altos e vicejantes, exprimem o entusiasmo do justo, contrastando com a pequenez do mau referida no v. 8.
  125. Este salmo é uma fórmula concentrada de hino sobre a realeza de Javé. Outros hinos semelhantes aparecem até ao Sl 100. Os Sl 93,97 e 99 iniciam igualmente com a proclamação de que Javé é rei. Esta era uma fórmula de aclamação para um novo rei (2Sm 15,10; 2Rs 9,13). Tal realeza extravasa o tempo histórico e manifesta-se no domínio sobre o universo e sobre as forças de caos que resistem ao seu crescimento ordeiro e eficaz. A visão do mundo que representa as culturas de Canaã está aqui retomada e integrada na conceção do Deus único que se define na Bíblia.
  126. O poder de Deus que governa o mundo é o que lhe dá consistência e solidez.
  127. Ou: O teu trono está firme desde o início, / que a tua casa seja um espaço de santidade, / ó Senhor, por longos dias sem fim. Com uma ou outra alternativa de tradução, este v. olha para o templo e para a história do povo que nele se concentra como uma realidade estável e persistente.
  128. O texto tem as caraterísticas de um salmo individual de súplica. No entanto, a amplidão das situações de injustiça que aparecem lamentadas e a grande ressonância que, desde início, é atribuída à ação de Deus como vingador de todo o mal podem sugerir que se trate de uma súplica de interesse coletivo perante uma desgraça nacional. A convicção essencial aqui expressa é claramente a de uma confiança inabalável em que a justiça, exercida por Deus, é a norma de convívio entre todos e a garantia da plena satisfação dos direitos de cada um.
  129. Literalmente, a expressão hebraica significa: Deus das vinganças. O conceito de vingança tem na Bíblia a conotação forte de uma justiça devida que é aplicada diretamente e de forma eficaz por alguém a quem se reconhece o direito e o dever de a exercer. Essa função compete a alguém que para isso tem especiais relações de solidariedade para com o ofendido. Por isso se evita o termo de Deus vingador, por vezes usado neste contexto.
  130. As malfeitorias descritas nos vv. 5-6 são o resumo essencial dos males que podem ofender a qualidade da vida social e que os profetas vituperam com frequência (Is 1,23; 10,1s; Ez 22,7; Zc 7,10).
  131. Neste v. e no v. 12, o Senhor aparece expresso sob a forma de Yah, mais abreviada do que o habitual Yahweh.
  132. A palavra aqui traduzida por ilusão é a mesma que aparece quase como um refrão ao longo do livro do Coélet ou Eclesiastes.
  133. A lei é, neste caso, designada com a expressão mais nobre que se conhece na Bíblia, a torah.
  134. A justiça exercida por Deus não se foca exclusivamente nas necessidades de um indivíduo, mas enquadra-se nos interesses que dizem respeito a todo o povo.
  135. Ou: O justo voltará a ser tratado com justiça.
  136. O silêncio é aqui uma expressão equivalente ao Cheol, i.e., o lugar onde residem os mortos (Sl 88,11; 115,17).
  137. Lit.: e condenam o sangue inocente.
  138. Este salmo de exortação profética exprime igualmente uma grande intencionalidade litúrgica. O hino inicial sublinha que os motivos para louvar a Deus são o seu domínio absoluto sobre o universo, a sua transcendência criadora e a sua aliança com o povo de Israel (vv. 1-7). O final é um oráculo divino, no sentido de despertar atitudes de fé e docilidade à voz de Deus. A estreita ligação com a piedade litúrgica é o motivo que justifica o frequente uso deste salmo como introdução a diversos ofícios litúrgicos e também a outros exercícios de piedade individual.
  139. Além da referência genérica à proteção de Deus, este rochedo, tendo em conta a parte final do salmo, pode ser uma referência ao rochedo de onde, no deserto, brotaram águas providenciais, numa calamidade de sede (Ex 17,1s).
  140. Com a metáfora do pastoreio para exprimir o governo do povo, o salmista está, para maior garantia, a colocar nas mãos de Deus a função de governar eficazmente o mesmo povo, tarefa que na vida quotidiana devia ser bem exercida pelos reis e outros responsáveis (Sl 74,1; 79,13; 80,1; 100,3).
  141. O hoje sublinha a intenção do salmista em sugerir que os hebreus seus contemporâneos mostrem melhor acolhimento aos planos de Deus que os seus antepassados no deserto. O texto dos vv. 8-11 aparece como discurso direto de Deus a repropor uma meditação sobre aquilo que se tinha passado no deserto.
  142. Meribá, que significa discussão e Massá, provocação, são uma imagem da rebeldia contra as orientações e planos de Deus (Nm 20,1-13; Ex 17,1-7; Dt 6,16; 9,22; 33,8; Sl 81,8). Esta imagem vem de uma época emblemática da história bíblica, e aquilo que o salmista pretende é que o povo não volte a repetir a mesma rebeldia.
  143. Os quarenta anos são o tempo apontado para a permanência dos hebreus no deserto, depois da saída do Egito (Nm 14,34).
  144. A expressão hebraica dá a entender que se trata de um lugar que é de Deus e serve de repouso para o povo. A terra prometida é aqui a alusão mais provável. Haveria ainda a hipótese de ser uma referência ao templo como lugar de repouso de Deus.
  145. Este salmo da realeza de Javé é todo ele um hino litúrgico, muito bem enquadrado no contexto do templo de Jerusalém e provavelmente num período já posterior ao do exílio na Babilónia. O seu conteúdo assemelha-se ao do Sl 47 e o seu texto aparece quase por inteiro no livro das Crónicas (1Cr 16,8-36). O contexto ali descrito é o do transporte da arca da aliança para Jerusalém.
  146. A ideia que distingue Javé dos outros deuses é a de que este, pelo facto de ter criado os céus que significam a totalidade do universo, mostra ser um Deus eficaz e não um simples ídolo.
  147. Beleza e poder é por alguns entendida como referência à arca da aliança (Sl 71,8; 78,61).
  148. Este é mais um salmo da realeza de Javé. O hino apresenta em primeiro lugar a entrada solene do grande rei (vv. 1-6). As consequências da sua instalação no templo são a derrota de todos os outros deuses com os seus seguidores e uma confiança imensa por parte dos que são justos e fiéis a Deus.
  149. Os vv. 2-5 descrevem a entrada de Deus com o seu cortejo na qualidade de juiz universal. Os grandes fenómenos da natureza são a expressão da sua intervenção e as realidades cósmicas reagem com respeito e temor a tão portentosa manifestação de poder.
  150. Os vv. 6-7 exprimem a ambivalência de posicionamentos que resulta da intervenção soberana de Deus. Os céus transformam-se em porta-voz da gloriosa manifestação e os deuses que representavam a alternativa contraposta de poder saem envergonhados do confronto.
  151. Os vv. 8-9 mostram que para os hebreus o espetáculo é de triunfo e de regozijo (Sl 48,12).
  152. Se, em vez de ’or (luz), se ler ’ur (campo) poderia traduzir-se por: Há uma terra fértil (lit.: de semente) para o justo / e a felicidade para os retos de coração. Qualquer das leituras poderia conter a alusão a uma visão de um além de imortalidade, diferente daquele que se perspetiva no mundo dos mortos.
  153. Este é mais um salmo da realeza de Javé, que mantém grandes pontos de analogia com o Sl 96. Os temas sublinhados são, mais uma vez, a ideia de que Deus é rei e, de todo o universo, povos e nações se juntam em grande festa. É grande o entusiasmo universalista e pode traduzir o novo espírito que marca o regresso do exílio.
  154. Os hebreus gostam de sublinhar que a obra de salvação conseguida por Deus é uma vitória exclusivamente sua (Is 59,16; 63,5; cf. Lc 1,54; 3,6).
  155. O tema desta primeira estrofe, em que o braço de Deus realiza uma vitória que faz exultar todos os confins da terra, ressoa em grande sintonia com o texto de Is 52,7-10, em que se anuncia solenemente o regresso dos exilados.
  156. Na última estrofe do salmo (vv. 7-9), é toda a natureza que toma parte na manifestação religiosa, como em Is 35,1s; 44,23; 55,12; cf. Sl 96,11-13).
  157. Cf. Sl 96,10.
  158. Este salmo encerra a lista dos hinos que tratam da realeza de Javé e mantém-se fiel aos temas mais caraterísticos deste grupo, nomeadamente: a realeza divina, a importância de Sião, a participação dos povos, o papel da justiça, o temor e o respeito, a festa e a recordação das principais figuras da história de Israel. Sublinha de um modo particular a santidade de Deus, reiterada à maneira de refrão, no final de cada estrofe (vv. 3,5,9).
  159. Os querubins aparecem ainda noutros textos da Bíblia para indicar o lugar onde Deus tem o seu trono (Sl 80,2). Trata-se muito provavelmente de seres superiores que se encontravam representados na cobertura da arca da aliança (Ex 25,18-22; cf. 1Sm 4,4; 2Sm 6,2; 1Rs 8,6; 18,11).
  160. Sobre estes grandes intercessores, cf. Sl 106,23; Ex 32,11; Nm 17,11-13.
  161. Pode referir-se às maldades do povo em geral ou às cometidas pelo grupo dos intercessores (Nm 20,12.24; 27,14; Dt 1,37; 3,23-27).
  162. Este é um hino de ação de graças, que convida todos os povos a louvarem a Deus no santuário (cf. Is 2,3; 56,6s). Do ponto de vista do conteúdo doutrinal, este convite apoia-se em algumas afirmações essenciais a respeito de Deus: Ele criou o seu povo e a sua bondade e misericórdia são eternos. Com este salmo fica encerrada a série de salmos da realeza de Javé, que se iniciou com o Sl 91. Poderia ser um hino de entrada, por ocasião dos sacrifícios de comunhão (cf. Lv 7,11s).
  163. O texto hebraico consonântico das edições críticas normalmente aceites diz: Foi Ele que nos fez e não nós. A tradução dos LXX e outras versões antigas leram desta maneira, no que foram seguidas pela Vg. No entanto, esta leitura parece depender de uma troca de escriba entre (para ele) e lo’ (não). Alguns mss. hebraicos antigos testemunham esta versão textual. A tradução latina aprovada por Pio XII, a NVg e as traduções atuais, de uma forma geral, seguem esta leitura.
  164. Este refrão parece ser bastante apreciado entre os hebreus (Jr 33,11) e muitas vezes usado nos salmos como entrada ou como refrão. O caso mais expressivo é o do Sl 136. Aparece ainda citado em 2Cr 5,13; 7,3; 20,21; Jdt 13,21 Vg; 1Mac 4,24.
  165. Este salmo é por muitos considerado um salmo real, apesar de nenhuma das suas expressões estar exclusivamente ligada aos temas da realeza. O que o salmo apresenta é uma espécie de declaração de princípios destinados a guiar a conduta do rei como figura central e como modelo para o comportamento coletivo. Esta oração tinha provavelmente lugar numa cerimónia litúrgica e poderia até representar um juramento que o rei deveria fazer no dia da sua entronização. Por isto e porque o texto contém ressonâncias de definição para uma sociedade ideal, este salmo aproxima-se dos horizontes do messianismo. O ritmo litúrgico de elegia parece sugerir uma composição tardia.
  166. Os tradutores sentem alguma dificuldade em definir o enquadramento para esta pergunta. Uma alternativa seria lê-la como afirmativa e não interrogativa: Compreendo bem o caminho da honestidade, / quando Tu vens ao meu encontro.
  167. Lit.: coisas de Belial. Podem ser comportamentos não recomendáveis ou práticas religiosas ilegítimas dedicadas a deuses ou outras entidades não reconhecidas (cf. Sl 18,5; Na 2,1).
  168. A versão dos LXX traduz este texto como: Eu não comerei com ele.
  169. O tempo matinal era propício para receber os favores divinos (cf. Sl 17,15ss); era também o tempo para aplicar a justiça (Sl 46,6; 73,14; 2Sm 15,2; Jb 7,18; Is 33,2: Jr 21,12; Sf 3,5).
  170. Este salmo é uma súplica individual em espírito de penitência. No entanto, os vv. 13-23 representam uma súplica coletiva preocupada com o destino de Sião. Isto significa que todo o conjunto do salmo pode representar tanto experiências e preocupações de um indivíduo como as de toda a comunidade. Desta amplitude de sentidos decorre a apetência do salmo para uso litúrgico. A parte relativa à súplica por Sião parece ainda sugerir tonalidades de pós-exílio, sensivelmente análogas àquelas que podemos encontrar em Is 40-66. É, como muitos outros, um salmo de múltiplos sentidos e épocas.
  171. A doença grave que atinge os ossos é uma metáfora bem expressiva do extremo sofrimento a que se está sujeito (Jb 30,30; Lm 1,13).
  172. Por comparação com o Sl 77, a tradução latina aprovada por Pio XII e como ela outras recentes traduzem: Não consigo dormir e suspiro.
  173. Lit.: servem-se de mim como maldição. O sentido pode ser: usam o meu nome como maldição (cf. Is 65,15; Jr 29,22).
  174. Cinza e lágrimas são referências simbólicas de luto e dor (Is 61,3; Lm 3,16).
  175. Cf. Is 41,14-20; 44,24-28; 59,17-21.
  176. O hebraico usa aqui a forma abreviada Yah.
  177. A eternidade de Deus é uma referência que na consciência do homem bíblico serve de comparação e contraste com a brevidade da vida humana (Sl 90,4s). Este olhar comparativo parece também implicar algum desejo de beneficiar ou participar nessa eternidade (cf. Sl 16,11; 21,5; 36,10; 116,8s).
  178. Este salmo apresenta as caraterísticas de um hino em honra de Deus, marcado por um estilo muito pessoal e íntimo que se exprime numa espécie de meditação em diálogo com a própria alma. O texto que agora conhecemos pode ter tido a sua origem num hino de ação de graças individual. Os motivos do louvor dirigido a Deus consistem no seu amor eterno, compassivo e misericordioso. Poderia dizer-se que temos aqui um verdadeiro Te Deum do AT. Neste sentido, o final do salmo estende o convite para um hino universal que deverá ser entoado pelos anjos, pelos astros do céu e por todas as obras de Deus.
  179. A tradução dos LXX entendeu a tua existência como os teus desejos. A palavra hebraica, no entanto, parece ter algo a ver com o advérbio ‘od, o qual se refere à duração, neste caso, da vida, como acontece no Sl 104,33.
  180. Cf. Ex 33,13.
  181. Estes são os atributos de Javé declarados a Moisés (Ex 34,6s), que os salmos desenvolvem sublinhando a misericórdia e a bondade (cf. Sl 17,18 com Ex 20,6).
  182. Esta palavra sugere variados matizes: o pó de que Deus formou o homem (Gn 2,7), as intenções próprias dos humanos (Is 26,3; 1Cr 29,18), os homens maus (Gn 6,5; 8,21; Dt 31,21) e ainda as más inclinações, sugeridas pelo termo yṣr no primeiro hemistíquio (Sir 15,14; cf. 21,11).
  183. A ideia da brevidade e fragilidade da existência humana (Sl 90,5s; Jb 14,2; Is 40,6-8; 51,12) é sublinhada em contraste com a consistência das obras divinas, expressa nos vv. 17-19.
  184. Nas culturas religiosas de Canaã, os deuses tinham ao seu serviço para efeitos de comunicação e mediação figuras quase-divinas a quem encarregavam de missões específicas. Estas conceções continuam a aparecer na linguagem bíblica e acabam por coincidir em muitos sentidos com aquilo que posteriormente se integra no conceito bíblico e teológico de anjos. Alguns matizes posteriores da ideia de anjos, no entanto, não se encontram ainda explícitos nos textos bíblicos mais antigos (cf. Sl 148,2; Lc 2,13; 2Pd 2,11; Ap 5,11).
  185. Este salmo consiste num hino em forma de meditação sapiencial. Ele descreve de maneira pormenorizada como a vida quotidiana do universo é percebida, em resultado da ação e do cuidado com que Deus o governa. Esta leitura compreensiva do significado da vida quotidiana é pedra fundamental da espiritualidade espelhada nas culturas religiosas do antigo Oriente. Estes sentimentos podem encontrar-se de modo muito semelhante em outras literaturas religiosas daquele tempo. Um hino muito semelhante é aquele que o faraó Amenófis IV do Egito, também conhecido como Akenaton, dedicou ao seu deus solar Aton. Ambos os hinos exprimem um fundo de espiritualidade comum das religiões do antigo Oriente.
  186. Os povos do antigo Oriente pensavam que sobre as nuvens do céu havia um grande oceano que, em princípio, seria de água doce, pois era dele que caía a chuva (Gn 1,7; Sl 148,4). São os armazéns de Deus, acima dos quais se encontra a sua morada superior.
  187. Ou: no seu cimo tem a cegonha a sua casa.
  188. Este salmo apresenta o dia como o espaço natural da vida dos seres humanos. Os vv. 20-22 sugerem que o tempo da noite é o contexto natural de vida para os animais selvagens e outros seres semelhantes a eles.
  189. Leviatan, que aparece na literatura de Ugarit como Lotan, é um monstro mitológico do mar, com sete cabeças. Representa o caos primitivo ou as forças de caos que continuam a resistir ao esforço de criação. Na literatura de Canaã e na Bíblia, assume várias formas: serpente tortuosa e fugidia (Jb 25,12-13), dragão do mar (Is 27,1), crocodilo (Jb 40,25-41,26), e pode evocar o Egito como inimigo de Israel (Ex 32,2-8). Em Ap 12,3, aparece como dragão, simbolizando todos os inimigos dos cristãos (cf. Sl 74,14; Jb 3,8; 40,25-26; Is 27,1).
  190. Do rosto de Deus sai a luz que mantém vivos os seres que beneficiam de um espírito de vida.
  191. O espírito de Deus era um elemento essencial na composição do ser vivo, para além do corpo e da alma. O que carateriza este elemento, o espírito, é que ele se encontra sempre em ligação e dependência de Deus. Ele coloca-o num ser para lhe dar vida, mas também o pode retirar e então é a morte.
  192. O salmo integra nesta epifania da vida os grandes fenómenos cósmicos que são os tremores de terra e os vulcões.
  193. O salmo apresenta a visão do mundo e a vida dos humanos com um horizonte de otimismo e felicidade. É quase como uma espécie de esconjuro que surge o desejo final. Num mundo assim equilibrado e feliz não deveriam aparecer aqueles que destoam deste espírito e chocam com o seu bem-estar.
  194. A expressão Aleluia, que significa louvai a Javé, aparece a concluir vários salmos: 105; 106; 113; 115; 116; 117; 135; 146-150. Aparece também no início dos salmos 146-150 e torna-se uma espécie de refrão litúrgico. No NT aparece apenas em Ap 19,1.3.4.6. Acabou por se tornar uma das mais frequentes fórmulas de aclamação na linguagem litúrgica, tanto do judaísmo como do cristianismo.
  195. Este é um salmo didático que se apresenta como uma meditação teológica e sapiencial sobre a experiência histórica dos israelitas. O seu espírito é o de um hino, tal como acontece com o Sl 78. Parte deste salmo, nomeadamente os vv. 1-15 aparecem em 1Cr 16,8-22 e este facto sugere que o salmo era utilizado na liturgia em ligação com a transferência da arca da aliança para o monte Sião. O salmo está quase inteiramente focado nos acontecimentos que marcam a memória dos hebreus e são provenientes da sua história. Os temas principais são: os patriarcas (8-15), José (16-23), Moisés (24-27), as pragas do Egito (28-36) e a chegada a Canaã (44-45). O que se pretende é inculcar a convicção de que é na fidelidade de Deus que assenta a grandeza de toda esta história e só pela fidelidade o povo se pode mostrar digno destes e de outros favores divinos. As referências aos episódios da história relembrada encontram-se nos lugares paralelos indicados para este mesmo salmo.
  196. Referência antecipada à narrativa sobre as pragas do Egito e outros inimigos de Israel nos vv. 28-36.
  197. Os vv. 8-10 resumem o tema da aliança com os patriarcas Abraão (Gn 12,7; 15,18), Isaac (Gn 26,3) e Jacob (Gn 28,13). Esta aliança com os patriarcas apresenta-se como o fundamento da aliança entre Deus e o povo de Israel.
  198. Sobre o tempo em que os patriarcas eram um pequeno número e considerados como estrangeiros, cf. Gn 34,30; 23,4; Heb 11,9.13.
  199. Nos vv. 13-15 há um resumo da vida seminómada dos patriarcas (Gn 12,26) e do castigo aplicado ao faraó (Gn 12,17), bem como a Abimélec (Gn 20,3; 26,11). A importância atribuída aos patriarcas faz com que sejam considerados ungidos ou consagrados a Deus e profetas, que são títulos de grande significado na religião bíblica.
  200. Ou: Um rei mandou que o soltassem. A leitura mais tradicional deste v. é a que se apresenta em nota. Esta interpretação faz do rei ou faraó o sujeito do verbo mandar/enviar. Parece, no entanto, que o sentido que se recolhe do original hebraico é o de que o verbo chalaḥ, que inicia a frase nos vv. 17,20,26,28 e tem sempre Deus como sujeito, o qual, nos momentos cruciais da história, envia agentes seus com uma missão específica, nomeadamente José, o rei-faraó, Moisés e finalmente as trevas. Exprimindo-se desta maneira o salmista está a declarar que todo o desenrolar desta história depende da intervenção de Deus. Com isto, toda a história se transforma em teologia.
  201. Os exegetas estão de acordo em que as narrativas sobre a personagem de José no Génesis têm a intenção de apresentá-lo como uma figura de sábio. Este salmo traduz a mesma perspetiva. Este pormenor é importante porque os próprios hebreus conheciam a fama de que o Egito era um povo de sábios.
  202. Segundo a nova geografia do mundo, repovoado depois do dilúvio, o Egito, que na Bíblia se chama Misraim, é também o nome de um dos filhos de Cam, segundo filho de Noé (Gn 10,6), tal como o próprio Canaã.
  203. O resumo das pragas do Egito segue a narrativa de Ex 7-11, mas numa ordem diferente. Começa pela nona e omite a quinta e a sexta (cf. também Sl 78,43-51).
  204. O sublinhar de vinhas e figueiras como sendo os piores estragos causados pelo granizo parece representar uma sensibilidade palestinense sobre os prejuízos que a referida praga costuma provocar.
  205. Refere-se aos israelitas que estão sempre implícitos no sentido do salmo (cf. Ex 12,35-36).
  206. Cf. Dt 8,4; 29,15.
  207. A conclusão (vv. 44-45) deste hino sobre a experiência histórica é que as obrigações implicadas na aliança (v. 8) foram cumuladas de benefícios pelas riquezas recebidas.
  208. Este é um salmo coletivo de súplica, onde se faz uma revisão dos pecados cometidos pelo povo ao longo da sua história. Daí que se apresente como uma continuação natural da exposição histórica feita no Sl 105 e à semelhança do que acontece também no Sl 78. Sublinha especialmente as vicissitudes dos quarenta anos no deserto (vv. 13-33). A confissão das próprias culpas, passadas e presentes, oferece ao salmista a oportunidade para exaltar a infinita misericórdia de Deus. O v. 6 dá ao salmo o teor de uma confissão pública (cf. Ne 9). Os últimos vv. situam-se provavelmente depois do exílio, concluindo-se com uma doxologia que encerra a quarta parte do saltério.
  209. A tradução grega, alguns mss. antigos e a Vg, seguida pela NVg, leem os pronomes dos vv. 4-5 no plural, referindo-se explicitamente ao povo todo como «nós».
  210. Ou: e enviou alimento para a sua fome. Referência ao episódio das codornizes (Nm 11,33).
  211. Este desprezo refere-se à desconfiança com que foram recebidas as informações prestadas pelos exploradores da terra de Canaã (Nm 13,25-14,38; Dt 1,22-46).
  212. Os vv. 28-31 referem-se aos factos narrados em Nm 25. Pela sua ação Fineias foi constituído sacerdote e, segundo a tradição bíblica, foi o antepassado de Sadoc e da geração de sumos sacerdotes.
  213. Por ter proferido palavras de impaciência e falta de confiança em Deus, Moisés ficou impedido de entrar na terra prometida (Nm 20,12).
  214. Os vv. 34-35 são referência aos episódios narrados em Ex 23,32-33; Dt 7,2-6; Jz 1,21-33; 2,1-3.
  215. Esta prática (Ex 16,20-21) era vista como sendo o máximo das abominações cometidas pelos cananeus (Dt 12,29-31; 18,9-14; cf. 2Rs 16,3; 21,6; Jr 7,31).
  216. Os vv. 39-43 resumem uma sequência de infidelidades de Israel seguidas de castigos da parte de Deus, muito semelhante ao que aparece no livro dos Juízes (Jz 2,11-19; 3,5-15, etc.).
  217. Esta prostituição é uma metáfora caraterística dos profetas para designar a infidelidade do povo de Israel quando se volta para divindades cananaicas (Sl 73,27; Os 1,2ss).
  218. Esta alusão a tratamentos benevolentes por parte de alguns conquistadores poderia ser aplicável a várias situações históricas, nomeadamente às mencionadas em 1Rs 8,50; 2Rs 25,27-29; Esd 1; 7; 9,9: Ne 2; Ne 9,5-31; Jr 42,10-12. Estas referências fazem com que esta parte do salmo possa estar ligada a épocas diferentes da história.
  219. Cf. Sir 36,13.
  220. A tradução grega entendeu que este aleluia constituía o início do salmo seguinte.
  221. Este salmo de ação de graças aparece num contexto de solene ambiente litúrgico. Tal solenidade é percetível na dupla série de refrões (vv. 6,13,19,28; e 8,15,21,31). Celebra a providência de Deus para com os hebreus, quando se encontravam perdidos no deserto, cativos, enfermos e errantes. Segue-se um hino com traços messiânicos, que complementa a satisfação pelo passado com uma expetativa esperançosa para o futuro. Estas ressonâncias apontariam para uma ação de graças coletiva. É, no entanto, frequente vê-lo classificado como salmo individual de ação de graças. Na verdade, a separação entre o individual e o coletivo em matéria de ação de graças, como noutros temas, não é fácil de fazer nem parece ser de grande utilidade.
  222. Esta referência ao regresso de exilados parece enquadrar-se bem com o final do salmo anterior.
  223. Os grandes testemunhos da tradição textual (LXX, TM, Vg e mesmo NVg) insistem em manter a leitura: do Norte e do mar. As traduções insistem em declarar que a lógica dos quatro pontos cardeais aqui suposta sugere uma complementaridade entre Norte e Sul. Não parece que seja necessário corrigir o texto hebraico, pressupondo yamîn (direita) em vez de yam (mar). A referência aos pontos cardeais parece beneficiar da precisão com que a sua lógica se impõe para se permitir alguma variedade no uso dos termos. É o que acontece em Is 43,5s; 49,12. Daí a tradução: e do mar a sul.
  224. O primeiro quadro simbólico parece descrever o exílio como um deserto inóspito.
  225. Neste e no v. 7 a expressão hebraica ‘ir môchab poderia também ser traduzida por cidade habitada. De uma maneira ou de outra parece ser uma alusão a Jerusalém/Sião, cuja imagem fica tanto mais saliente quanto menos nomeada.
  226. O segundo quadro simbólico representa as trevas, que significam perigo, infelicidade e miséria (Is 9,2).
  227. O terceiro quadro simbólico mostra um estado de espírito deprimido que mais parece de agonia.
  228. Algumas traduções modernas interpretam: para os livrar do fosso (cova). Para tal precisam de fazer um correção desnecessária no hebraico. Desde sempre, as traduções entenderam que, segundo o paralelismo de curar, no primeiro hemistíquio se trataria de uma referência a doenças.
  229. O quarto quadro simbólico é o dos náufragos. Não sendo os israelitas muito experimentados em atividades de mar, elas eram bem conhecidas e tinham grande ressonância na cultura da região (Jn 1).
  230. A assembleia do povo era a ação litúrgica; o conselho dos anciãos era o espaço oficial da comunidade. Ambos os lugares são legítimos para a celebração do louvor a Deus pelos benefícios recordados.
  231. Ou: Ele mesmo protege o pobre no seu refúgio.
  232. Este é um salmo coletivo de súplica. Nele se apresenta o destino do povo sempre ligado com o destino da cidade de Jerusalém, representada pelo santuário do monte Sião, santuário de Deus. É dali que se afirma o seu domínio sobre as terras em volta. Os vv. 2-7 coincidem com o texto do Sl 57,8-12; e os vv. 8-14 aparecem no Sl 60,7-14. No entanto, o nome de Deus utilizado neste salmo é Elohim e não Javé, como nos Sl 57 e 60. Este facto significa que esta versão deve ser de um tempo mais tardio, quando o mundo hebraico tendia cada vez mais a não usar tanto o nome de Javé.
  233. Lit.: Anima-te, minha glória. A tradição que vem desde os LXX propõe a ideia de despertar já no v. 2. O termo hebraico kebodî pode referir-se à glória de Deus, à glória que sente aquele que salmodia e ainda ser um equivalente da alma do salmista. As simples consoantes do hebraico poderiam ainda ler-se kebedî (meu fígado), significando a pessoa humana. As traduções dividem-se entre estas alternativas.
  234. O texto correspondente do Sl 60,7 diz: responde-nos. E algumas traduções optam por aplicá-lo também neste salmo.
  235. Sobre o conteúdo dos vv. 8-14, cf. as notas aos vv. correspondentes do Sl 60.
  236. É um salmo individual de súplica, por parte de um inocente que apela à justiça divina. Refere as palavras dos seus inimigos no intuito de que elas sirvam de sentença segundo a qual eles devem ser castigados juntamente com as suas famílias. A maldição traduz uma consciência forte de que os comportamentos humanos deviam ser assumidos com seriedade e responsabilidade. A este nível emocional, o castigo dos males sofridos é algo no qual o suplicante põe toda a intensidade e urgência. Nos vv. 21-31 o salmista atinge o nível de serenidade numa oração que exprime a sua confiança em Deus.
  237. O discurso dos vv. 6-15 é normalmente entendido como sendo uma espécie de citação do que dizem os adversários do salmista orante. Contra isto, está o que pensa o salmista a partir do v. 16. O caráter sintético do texto e o jogo de contraposição entre os contextos podem consentir, entretanto, outras maneiras diferentes de compreender o seu alcance.
  238. Segundo o que está implícito no v. 6, à direita punha-se o acusador. Aqui é o Senhor que ocupa esse lugar, mas como defensor. O salmo é bastante sugestivo quanto a esta correção de situações (cf. Sl 16,8; 119,5; 121,5).
  239. Este é um salmo bem caraterístico da realeza. Nele aparecem profundamente articuladas as categorias da realeza com as conceções religiosas de Israel. A expressão meu senhor refere-se naturalmente ao rei. Quanto ao tempo da sua composição, é uma questão bastante difícil de declarar de forma taxativa. O seu teor institucional e formal, bem como algumas expressões arcaicas relativamente à linguagem corrente, poderiam sugerir uma composição bastante antiga, possivelmente dos inícios da monarquia, eventualmente aproveitando mesmo fórmulas de entronização vindas das culturas mais antigas de Canaã. Outros pensariam numa composição de época tardia, tendo em conta algumas ideias que parecem associar realeza, messianismo e sacerdócio. Este salmo foi muito utilizado nos primeiros tempos do cristianismo, pelas ressonâncias messiânicas evidentes que oferecia.
  240. Ou: enquanto Eu ponho os teus inimigos / como estrado para os teus pés. A leitura tradicional assenta na interpretação do termo ‘ad como advérbio, significando enquanto. É reconhecido, no entanto, que o significado de «enquanto» não parece jogar bem com a dinâmica imediata de um oráculo de entronização real nem com a sintaxe da frase. Ora, da literatura cananaica de Ugarit conhecemos um termo com as mesmas consoantes, ‘d, e o significado de assento, trono; esta hipótese dá a um oráculo solene e formal maior ritmo e ressonância. Ao tempo da tradução dos LXX este antigo vocábulo técnico de trono seria já desconhecido.
  241. Ou: como orvalho te gerei. Este salmo e particularmente este v. são muito importantes nas leituras, mas o texto hebraico apresenta dificuldades de tradução, reconhecidas desde a antiguidade. A vocalização massorética de yaldutêka (da tua juventude) parece ser uma maneira de evitar matizes teológicos considerados excessivos. No entanto, algumas traduções de renome seguem ainda esta leitura. A tradução dos LXX leu um verbo, yalad, o qual, quando o sujeito é feminino, se usa na conjugação qal e significa dar à luz; quando o sujeito é masculino como aqui, usa-se o hifil e significa tornar-se pai de alguém. A tradução com o verbo gerar corresponde ao que se usa nas genealogias do NT, onde o termo gerou corresponde ao hebraico holîd. Na fórmula de entronização trata-se de uma filiação adotiva.
  242. Melquisedec era uma figura de rei e sacerdote da cidade de Salém, nome associado com o de Jerusalém, e que aparece muito ligado à história do patriarca Abraão (Gn 14,18). No que diz respeito aos reis hebreus, não são vistos como sacerdotes, mas também é verdade que reis e sacerdotes partilham entre si a caraterística de serem ungidos, i.e., consagrados para uma função que tem sentido religioso. Nas conceções messiânicas do NT voltou a valorizar-se a figura de Melquisedec como sacerdote e rei (Heb 7,1-12).
  243. Ou: O Soberano o colocou no trono, / e assim lhe fará erguer a cabeça. A possibilidade de ler no termo drk mais um equivalente de trono, de algum modo sinónimo do termo ‘d (assento) que aparece no v. 1, dá um sentido mais bem enquadrado no tema do salmo e ultrapassa as dificuldades que a leitura tradicional suscita.
  244. Este salmo de louvor é um hino dirigido a Deus pela maravilha que são as suas obras e que estão sobretudo representadas pelas grandezas da natureza e pelos prodígios realizados ao longo da história. Os motivos invocados, tal como acontece frequentemente nos salmos, incidem de modo especial nas memórias do Êxodo e nos episódios da entrada em Canaã. É um salmo alfabético tal como os Sl 9, 10, 25, 34, 37, 112, 119 e 145.
  245. Estes são os dois espaços mais nobres da comunidade (Sl 107,32; 149,1).
  246. Nos vv. 6-9 aparecem bastante sintetizados os acontecimentos da história de Israel, que fazem a ligação entre a saída do Egito e a entrada na terra prometida, concluindo com a chave da aliança.
  247. No pensamento semita, este conceito de princípio significa a essência. O temor de Deus aparece com frequência definido como a essência da sabedoria (Pr 1,7; 9,10).
  248. A tradução dos LXX leu quem a pratica, que segundo o teor do texto grego se refere à sabedoria.
  249. Este salmo constitui uma meditação sapiencial na qual se propõem as bases fundamentais e mais imediatas para uma vida feliz. Pertence ao género das bem-aventuranças, tal como acontece com o Sl 1 que serve de introdução ao conjunto do saltério. O motivo que presidiu à organização literária do salmo é a ordem das letras do alfabeto hebraico. Isto significa que a par da exposição doutrinal houve igualmente a preocupação de recurso estético com algum requinte lúdico (cf. Sl 9; 111).
  250. Este salmo de louvor é um hino dirigido a Deus, celebrando a sua misericórdia. Este é o primeiro salmo do chamado grupo do Halel, que se prolonga até ao Sl 118. Este conjunto é recitado pelos judeus nas grandes solenidades de peregrinação, nomeadamente na festa da Páscoa (Mt 26,30; Mc 14,26). O contexto que nele se revela é de cariz claramente litúrgico. Apresenta analogias com o cântico de Ana no livro de Samuel (1Sm 2,1-10) e ainda com o cântico de Maria, o Magnificat (Lc 1,46-55).
  251. O salmo aponta para uma reversão completa da situação da mulher hebraica quando se revelava estéril, a qual costumava ser menosprezada e até mesmo rejeitada pelo divórcio. Normalmente, a mulher não se sentava, mas ficava de pé a servir os outros. A esta acontece-lhe como a Sara (Gn 16,1; 17,15-21; 18,9-15; 21,1-7) e a Ana (1Sm 1-2).
  252. Este salmo de louvor é um hino de tema pascal particularmente festivo. Ele descreve a maravilhosa saída do Egito, a passagem do Mar Vermelho e do rio Jordão, assim como o milagre das águas tiradas do rochedo no deserto, em Meribá. O tema da água domina completamente os motivos deste salmo. O estilo é de grande teatralidade e mesmo de um virtuosismo jocoso, que quadra bem com o ambiente de festa em que se insere. Na liturgia judaica, este é o salmo cantado precisamente na oitava da Páscoa. A menção paralela de Israel e Judá para representar a dupla referência complementar da identidade hebraica bíblica parece sugerir que a sua composição se poderia situar antes de 721 a.C., data em que o reino do Norte, Israel, foi conquistado e desapareceu.
  253. Judá aparece aqui como sendo o principal centro de interesse do povo de Israel e é caraterizado sobretudo como um santuário. Este apresenta-se como o motivo essencial de ligação com Deus. O povo de Israel é cada vez mais uma comunidade religiosa.
  254. O Mar Vermelho: Ex 14-15.
  255. O rio Jordão: Js 3.
  256. O monte Sinai: Ex 19,18.
  257. Os vv. 7-8 dão a resposta da natureza às interrogações precedentes (cf. Sl 107,35).
  258. Alusão aos acontecimentos narrados em Ex 17,6; Nm 20,11.
  259. É um salmo coletivo de confiança. Nele se exprime a preocupação de que Deus manifeste aos outros povos as razões que os israelitas sentem para ter confiança em Deus (vv. 1-8; 9-11). É particularmente marcante a definição de contrastes entre o Deus dos hebreus e os outros deuses, sobretudo no modo de sublinhar a inutilidade dos ídolos (vv. 4-8). A crítica aos ídolos é dos temas mais importantes da Bíblia. Bem caraterística do ambiente litúrgico em que se enquadra o salmo é também a longa secção de bênçãos que ocupa os vv. 12-18.
  260. A casa de Aarão é a classe dos sacerdotes, por isso aparece destacada neste hino litúrgico.
  261. Os três grupos referidos nos vv. 9-11 são uma maneira de representar a totalidade daqueles que integram a comunidade religiosa de Israel (cf. Sl 118,2-4): o povo, os sacerdotes e os estrangeiros tementes a Deus. Estes últimos vivem integrados social e religiosamente com o povo de Deus.
  262. Silêncio é um termo que pode também representar o próprio mundo dos mortos. Por isso, não se pode esperar que venha de lá qualquer louvor a Deus, que é expressão de vivos.
  263. Este salmo individual de ação de graças encontra-se bem enquadrado no ambiente litúrgico. Num momento de perigo, o salmista prometeu a Deus um sacrifício de ação de graças (v. 14). O momento preciso do salmo é a altura em que ele se vai apresentar na assembleia litúrgica (vv. 14.18) e ali declara o seu agradecimento, proclamando as lições de fé que são válidas para todos (vv. 5.6.15) e assumindo os propósitos pessoais para o futuro (vv. 15-19). Os LXX e tradição deles derivada dividem o salmo em dois: 1-9 e 10-19.
  264. Ou: Eu amo o Senhor, porque Ele ouviu.
  265. Esta é a tradução segundo o texto consonântico. Alternativa: Pois Tu libertaste a minha alma da morte, a qual representa a tradução segundo a vocalização massorética do texto. Outra alternativa ainda seria: Pois Ele libertou a minha alma da morte. Esta tradução segue traduções antigas e é assumida pela NVg, mas não tem suporte textual consonântico nem vocálico.
  266. Lit.: nas terras dos vivos.
  267. Esta elevação do cálice tem a ver com uma cerimónia que consiste numa libação de vinho que é derramado sobre o altar, para agradecimento, em virtude da salvação que foi alcançada. Em 1 Cor 10,16 é referido um cálice de agradecimento bebido em comunidade de oração.
  268. A expressão hebraica de que é preciosa aos olhos do Senhor pode também ser interpretada como: é dolorosa aos olhos do Senhor.
  269. Este salmo, apesar de ser excecionalmente curto, contém em essência as caraterísticas de um hino dirigido a Deus, tendo como motivação a sua ação que atinge o mundo inteiro e de modo muito particular a história de Israel. É importante por representar um convite a todo o mundo para se associar no louvor a Deus. Este aspeto dá-lhe uma tonalidade messiânica.
  270. A mesma fórmula aparece no Sl 103,11. O sentido da raiz gabar que significa ser forte, ser herói sugere para a fórmula usada nos dois casos a ideia de que a misericórdia de Deus sobre nós é forte e poderosa.
  271. Este é um salmo coletivo de ação de graças e apresenta-se com uma esquematização literária que esboça um percurso ritual bastante pormenorizado. Nos vv. 1-18 o cenário situa-se fora do templo, com o desenvolvimento de uma procissão. Depois de ultrapassadas as portas da justiça (vv. 19-20), é proclamada a ação de graças (vv. 21-25), com uma explicitação bastante sintética dos motivos. Praticamente é o v. 22 o ponto central, com a declaração entusiasta de que uma pedra rejeitada foi colocada por Deus como pedra angular. Segue-se a bênção (vv. 26-27) e um solene convite final que renova o primeiro convite ao louvor com que o salmo se iniciou. O foco mantém-se, portanto, no domínio das ideias fundamentais. Há quem veja a festa de consagração das muralhas de Jerusalém em Ne 6,15; 8,13-18; 12,27-43 como um momento que condiz bem com o teor deste salmo (cf. Esd 3,4.11; Zc 14,16). Com este se termina o grupo de salmos chamados Halel iniciado com o Sl 113.
  272. O convite à intervenção de três coros (vv. 1-4) dirige-se aos israelitas e depois aos da família sacerdotal de Aarão, concluindo com os tementes a Deus.
  273. Literalmente, o hebraico poderia dar a seguinte tradução: Tu bem me empurraste, para eu cair. No entanto, desde as traduções mais antigas se tem optado por entender um sujeito indefinido com este verbo empurravam-me. Aparentemente não se conseguia definir uma identidade para o sujeito de segunda pessoa que o verbo hebraico ainda continua a insinuar. O salmista enfrenta-se em discurso direto com alguém que o empurrou. O paralelismo do v. 18 parece sugerir que se trata de um despique entre morte e salvação. E o salmista faz um relato direto da situação, tratando a morte por tu.
  274. As tendas dos justos pode ser uma metáfora de tipo geral, mas poderia também ser uma referência às tendas ou abrigos da festa das Tendas, que, segundo Ne 8,13-18, se seguiu à inauguração das muralhas de Jerusalém.
  275. Alusão a uma cerimónia de entrada no templo onde se fazia um pedido solene de que fossem abertas as portas (cf. Sl 24,7-10).
  276. Sobre a pedra angular, cf. Jr 51,26.
  277. Ou: Este é o dia que o Senhor fez. Apesar de não ter, no AT, especiais conotações messiânicas, estes dois vv. aparecem no NT com sentido messiânico e usados na definição da identidade cristológica de Jesus (Mt 21,42-44, Mc 13,10; Lc 20,17-18; At 4,11; 1Pd 2,4-7).
  278. É na fórmula hebraica deste grito de socorro («salva-nos, por favor») que tem origem a fórmula litúrgica do hossana, uma das expressões hebraicas que se mantém no vocabulário litúrgico tanto do judaísmo como do cristianismo (cf. Mt 21,9; Mc 11,9s).
  279. Ou: Bendito seja em nome do Senhor aquele que vem.
  280. A festa das Tendas, marcadamente campestre, era celebrada com desfiles em que se transportavam ramos de árvores, como ainda hoje acontece.
  281. Este salmo consiste numa longa meditação de modelo sapiencial. Trata-se realmente do mais longo dos salmos. O esquema literário que nele se desenvolve é razoavelmente sofisticado. As suas vinte e duas estrofes são compostas de oito versos cada uma e cada um desses versos começa com a mesma letra do alfabeto hebraico (cf. Sl 9; 25). Cada uma das estrofes constitui uma unidade literária onde se pode descobrir um tema específico. O tema geral do salmo é simultaneamente de meditação e louvor sobre a maneira como Deus, com a sua lei, definiu os caminhos para o comportamento humano. É sobretudo a dimensão pessoal da ética aquilo que mais se sublinha. A lei não é apenas um conjunto de regras; é principalmente a manifestação de todo o tipo de relações pessoais e subtis, normativas e afetivas entre Deus e o seu povo. A ressonância que é aqui sublinhada situa-se principalmente no íntimo da consciência de cada ser humano. Este núcleo de significados aparece diluído numa grande variedade de sinónimos: leis, mandamentos, preceitos, decretos, sentenças, promessas, palavras...
  282. Provavelmente o salmista não está a falar da vida humana em geral como sendo uma realidade passageira no mundo; o termo peregrino designa a condição de estrangeiro que reside numa terra que não é dele. A sua obrigação é informar-se sobre as leis com que deve governar-se nessa terra. Para o salmista a terra dos israelitas pertence a Deus. Todos eles são, portanto, estrangeiros e peregrinos.
  283. Neste salmo, são estes os grandes inimigos de Deus: vv. 51,69,78,85,122. (cf. Sl 19,14; 86,14; Is 13,11; Ml 3,19).
  284. Esta prostração pode ser entendida como estado de sofrimento ou como atitude de oração.
  285. Ou: guardá-las passo a passo.
  286. Ou: de ídolos vãos.
  287. O verbo procurar (darach) exprime uma preocupação de estudo e também de prática. Este termo está na origem do conceito de midrach, que é um método de estudo e aprofundamento das lições que a Bíblia propõe.
  288. Ou: e observo a tua lei.
  289. Lit.: ficou insensível de gordura. A metáfora da gordura é usada para exprimir insensibilidade ou insensatez e falta de compreensão (cf. Sl 17,10).
  290. Texto de difícil interpretação. Alternativa tradicional: Estou como um odre ao fumo.
  291. Ou: são servos teus.
  292. Estes louvores a Deus ditos naturalmente em palavras são metaforicamente expressos com o nome ritual de um sacrifício espontâneo (cf. Lv 7,16; Heb 13,15).
  293. Lit.: A minha alma está sempre na minha mão. Uma alternativa plausível como: A minha alma está sempre nas tuas mãos seria algo esperado e consoante o referido em Sl 31,6. Faltam, no entanto, evidências textuais claras para esta leitura. A tradução proposta entende tamîd como um adjetivo substantivado significando aquele que é perene e não o simples advérbio sempre.
  294. Cf. v. 33 e nota.
  295. Sete vezes significa, em termos bíblicos, a medida do que está completo ou perfeito (Pr 24,16; Mt 18,21-22). Na prática litúrgica da Igreja, as sete vezes acabaram por se transformar nas sete horas canónicas, número de vezes em que se distribui ao longo do dia a recitação do ofício divino.
  296. O tema profético da ovelha perdida (Is 53,6; Ez 34,5s; Mq 2,12-13; Zc 11,15-17) encontra-se aqui aplicado ao indivíduo.
  297. Este salmo é uma súplica individual, pela forma literária que assume. No entanto, o título de cântico de peregrinação sugere um significado que ultrapassa explicitamente o do simples indivíduo. Os motivos da súplica são apresentados de forma direta e concisa. Esta modalidade de síntese manifesta bem a experiência e sensibilidade coletivas que ele representava. Este é o primeiro de uma série de salmos que se designam como cânticos de peregrinação (Sl 120-134); eram usados na subida para o templo de Jerusalém por ocasião das grandes festas (cf. Ex 23,14-17; Lv 23,1). Em hebraico são designados como cânticos das subidas, porque a ida para o santuário é considerada sempre um caminho de subida, seja no sentido físico seja no sentido simbólico. Na liturgia católica chamava-se salmo gradual (do latim gradus: degrau, subida) a um salmo que se canta entre as leituras da missa. Estes salmos eram igualmente utilizados em situações muito variadas.
  298. Esta expressão alude a uma fórmula imprecatória em crescendo usada para pedir uma maldição contra alguém: Rt 1,17ss; 1Sm 3,17; 14,44; 20,13; 25,22.
  299. Este v. refere uma coexistência indesejada com grupos de gente muito distante e de estranhos costumes, como seriam os casos de Méchec, situado muito para o norte e onde pertence o mítico rei Gog (Gn 10,2; Ez 27,13; 38,2) e Quedar (Is 21,16), conjunto de tribos árabes que se tinham espalhado até à Síria.
  300. A forma e os conteúdos deste salmo são os de uma oração individual de confiança. Ele sublinha com grande intensidade a ideia de que é Deus quem guarda Israel. Esta metáfora vai sendo repetida como palavra refrão e sugere a ideia de que a confiança proclamada ultrapassa manifestamente o plano individual e abrange todo o povo. O seu conteúdo aproveita alguns dos temas bíblicos mais clássicos, tais como as ideias de criação, segurança, tranquilidade e proteção. A experiência espiritual própria de um texto de oração coletivo exprime-se na estrutura quase de diálogo em que alguém declara as suas preocupações e logo adianta a perspetiva de confiança (vv. 1-2), enquanto outra voz lhe responde longamente a confirmar essa perspetiva de esperança (vv. 3-8).
  301. As montanhas para as quais o salmista desesperado olha podem significar o horizonte distante de onde uma inesperada ajuda pode surgir. Seria a metáfora genérica da esperança distante. Porém, a própria Jerusalém é sentida como estando assente sobre as montanhas que a cultura anterior de Canaã enriquecia de ressonâncias simbólicas. Neste salmo, nem o monte de Sião nem sequer o templo são explicitamente referidos. Porém, o essencial da confiança vem do Senhor e este é amplamente recordado como fonte de auxílio e segurança.
  302. A cultura de Canaã tinha consciência de que o Sol era também causa de seca, morte e sofrimento (Sb 18,3; Is 49,10; Ap 7,16). A Lua serve para fazer paralelismo com o Sol, na construção equilibrada do v., mas também se acreditava que ela podia trazer certos malefícios e doenças, como o caso dos «lunáticos» (Mt 17,15).
  303. As entradas e as saídas representam a totalidade da vida humana (Nm 27,17; 31,2; Js 14,11).
  304. Ou: Exultei quando.
  305. Para além de ser um cântico de peregrinação para Jerusalém, a própria cidade constitui o centro de todo o texto. Sião é olhada com toda a ternura que suscita o facto de ser o lugar do santuário e o símbolo da organização que David deixou para o quotidiano dos hebreus. A beleza física da cidade é valorizada por todos estes aspetos simbólicos. O texto divide-se entre felizes descrições da cidade e convites à participação entusiasta por parte daqueles que se integram na peregrinação.
  306. Os pormenores descritivos da construção e da estética da cidade nem sempre se conseguem definir de forma clara. No entanto, no NT continuamos a encontrar referências ao efeito produzido pelo aspeto arquitetónico e simbólico de Jerusalém: Mc 13,1; 1Pd 2,5; Ap 21,10-27.
  307. Este v. refere-se ao costume, transformado em lei para os israelitas, de peregrinarem a Jerusalém para celebrar as grandes festas: Sl 81,5; Ex 23,14-17; 34,24; Dt 12,4-19; 16,16; Lc 2,41-42.
  308. Cf. 2Sm 15,2-6.
  309. Lit.: Pedi a paz de Jerusalém. Esta é uma fórmula caraterística de saudação, que se adapta bem ao momento da entrada dos peregrinos na cidade. Além disso, é possível que o salmista seja sensível à maneira como os hebreus sentiam o significado do nome de Jerusalém que na última parte (chalem) lhes lembrava o termo «paz» (chalom). O nome pode ter uma origem diferente, mas para a etimologia popular dos hebreus era daquela maneira que soava (Sl 76,3).
  310. Este salmo, que pode ser de súplica ou lamentação coletiva, começa, na verdade, com uma súplica em primeira pessoa do singular, mas abre imediatamente para uma situação coletiva, tanto na expressão da confiança em Deus como na súplica, para que Ele se mostre sensível à situação da comunidade. A situação descrita parece consistir em ameaças e desprezo por parte dos povos vizinhos, segundo o que se depreende dos vv. 3-4. A situação poderia fazer lembrar as referências de Ne 4,1-15.
  311. Pela força e intencionalidade dos olhos dos servos e da serva na mão dos seus senhores o salmista já não explicitou o fixar dos olhares dos piedosos israelitas na mão do Senhor: refere apenas o próprio Senhor, deixando implícito o significado da mão de Deus como metáfora de intervenção e salvação.
  312. Este é um salmo coletivo de ação de graças pela experiência passada. A história vivida é considerada muito positiva. Isso é atribuído ao facto de Deus ter estado ao lado do povo de Israel (v. 1). As fórmulas e o estilo são caraterísticos dos cânticos de peregrinação.
  313. Transparece aqui um convite a que a assembleia repita estas frases mais importantes (cf. Sl 118,2).
  314. Engolir vivo significa uma destruição rápida e total, sem deixar vestígios (cf. Sl 56,16; Nm 16,30; Pr 1,12; Is 5,13-14).
  315. As metáforas dos vv. 4-5 são clássicas na Bíblia para exprimir a catástrofe e o caos (cf. Sl 18,5.17; 69,2).
  316. Expressão de confiança coletiva, onde a segurança do justo é comparada com a do monte Sião, que não vacila e está firme para sempre (vv. 1-2). O salmo é composto ao modo de uma exortação profética, para incutir perseverança na fidelidade a Deus, para os tempos difíceis, marcados pela dominação estrangeira (v. 3). O contexto poderia ser aquele que se exprime em Ne 6.
  317. Esta pode ser uma referência aos israelitas que atraiçoaram o povo, segundo o referido em Ne 6,17-19.
  318. O tema do regresso do exílio e as dificuldades em retomar num ritmo satisfatório os trabalhos de restauração parece ser o contexto e o conteúdo que preenche este salmo coletivo de súplica. A esperança consiste em que Deus ajude a completar a obra de reconstrução encetada, de modo a aproximar-se dos níveis de sucesso que já tinham sido atingidos no passado (cf. Ne 5; Ag 1-2; Zc 3-4).
  319. Ou: Regressa, Senhor, com os nossos exilados.
  320. Négueb é o deserto situado ao sul da Palestina, região árida e seca. Ali não havia fontes de água para uma irrigação permanente. Uma torrente de repente provocada pela chuva surtia o efeito de um verdadeiro milagre (cf. Jb 6,15).
  321. A sucessão de metáforas expressivas de sofrimento e satisfação é uma maneira viva de contabilizar de forma positiva a longa experiência do exílio como sementeira de restauração.
  322. Este salmo segue o modelo de uma meditação sapiencial e celebra, em primeiro lugar, a maneira como Deus está presente por dentro do trabalho humano de criação (vv. 1-2). Tomando a metáfora mais à letra poderia ver-se aqui a dificuldade em reconstituir e reorganizar a comunidade depois do desastre do exílio (Ne 4,9-14; 7,4). Em seguida o salmo exalta a importância dos filhos, sobretudo criados em idade jovem (vv. 3-5). Tal como acontece com o Sl 72, o título classifica este salmo como sendo de Salomão. Neste caso, há quem pense que foi a referência ao seu amigo, no v. 2, que levou a que a referência a Salomão fosse explicitada em título (cf. 2Sm 12,25).
  323. Na sequência da menção de Salomão no título do salmo, há quem veja neste sono uma referência ao sonho de Salomão em Guibeon (1Rs 3,5).
  324. Se as preocupações de criatividade deste salmo tiverem a ver com a reconstrução de Jerusalém, os vv. 3-4 poderiam significar um incentivo ao repovoamento da cidade de Jerusalém (Ne 4,9-17; 11,1s).
  325. As discussões sobre direitos ou prejuízos entre cidadãos, de molde a tomar sobre isso decisões mais ou menos formais, costumavam decorrer em sessões de assembleia pública, que tinham lugar na praça pública, junto da entrada da cidade (cf. Gn 23,3; Rt 4,1; Pr 31,23.31).
  326. Tal como o anterior salmo, também este segue o modelo de composição sapiencial. Ele pretende demonstrar que seguir a lei de Deus é a melhor garantia para se assegurar uma vida próspera e feliz. O padrão de felicidade final referido é o bem-estar de Jerusalém, mas o enquadramento concreto desta harmonia entre bom comportamento e felicidade no quotidiano é o quadro de uma vida familiar em que todos os elementos mostram a sua forma natural de serem produtivos.
  327. Este cântico de confiança e de esperança descreve em primeira pessoa uma experiência que acaba por se alargar a todo o povo de Israel. Esta meditação de estilo sapiencial procura extrair as lições que decorrem da experiência vivida e exprime as aventuras sofridas, servindo-se de uma série de metáforas integradas num sistema de referências que nos remete para as experiências duras do trabalho agrícola.
  328. O convite para que Israel repita a declaração (cf. Sl 118,2) é cumprido logo no v. 2.
  329. As referências à juventude, nos vv. 1 e 2 referem-se aos problemas dos primeiros tempos, no Egito (Ex 1ss), e primeiros tempos na terra prometida (Jz 3; 4; etc.)
  330. Esta imagem, que exprime tradicionalmente o tratamento de escravatura aplicado a alguém, aplica-se bem ao facto de o dorso sobre o qual lavram os lavradores ser o de Israel, cujo solo humilhado por poderes estrangeiros é o motivo que parece ter suscitado este salmo. Cf. Is 50,6; Am 1,3; Hab 3,12.
  331. Ou: que o vento leste faz murchar.
  332. Na ocasião das colheitas, parecia ser costume que os que passavam perto saudavam os ceifeiros, celebrando a boa colheita (cf. Rt 2,4).
  333. Lit. Das profundezas. Este plural traduz os momentos de profundo sofrimento, mas para o exprimir abre a porta para as ressonâncias míticas desta imagem que exprimem o caos visto como o oceano profundo de todos os perigos.
  334. Este salmo individual de súplica integra-se no conjunto de salmos de espírito comunitário como são realmente os cânticos de peregrinação. Neles se encontram normalmente presentes os ingredientes caraterísticos de confiança e de festa. No entanto, o salmo trata de um tema bastante ligado com a experiência pessoal e o sentido expresso desde o princípio sugere um horizonte de grande angústia. Ao longo da história, tornou-se um texto muito representativo da liturgia dos defuntos, sendo conhecido como o De profundis, por causa das palavras iniciais do seu texto em latim, segundo a Vg. Este é um dos salmos penitenciais.
  335. Esta ligação entre o perdão e o temor de Deus é um bom elemento para definir como a ideia de temor de Deus tem na Bíblia conotações positivas.
  336. Trata-se das sentinelas que fazem vigilância na cidade durante a noite. Aquilo por que mais aspiram é começar a descortinar os primeiros sinais do amanhecer.
  337. Este salmo individual de confiança manifesta a serenidade de espírito por parte de alguém que se sente animado pelo Senhor (v. 3). O seu estado de alma, expresso com a metáfora de uma criança no colo da mãe depois de ser amamentada, situa o orante numa tranquilidade de infância espiritual e reconcilia-o consigo mesmo. Com este desdobramento entre si e a sua alma, o salmista está a identificar-se como sendo filho e mãe de si mesmo.
  338. Esta imagem de proteção maternal pode também ser referida a Deus, como acontece em Sl 32,20-22; 130,6s.
  339. Este salmo costuma ser incluído na categoria dos salmos reais. Com efeito, a figura central em todo ele é a do rei David. E isto, por vários motivos. Primeiro, porque tomou a decisão de procurar um lugar para estabelecer o santuário do Senhor. Em segundo lugar, porque Deus fez a promessa de lhe garantir em Sião uma dinastia perene de descendentes. A simbologia da realeza e dos seus agentes, tanto no culto como na política, está relacionada com a aliança entre Deus e o povo. A dúvida de saber se o diadema real, referido no último v., diz respeito a Deus ou ao rei tem marcado a história das traduções desde a antiguidade. Ambas as hipóteses podem fazer algum sentido, tendo em conta o pensamento hebraico e mesmo oriental sobre a realeza. É no realizar de forma eficaz e honesta as funções superiores do poder que o homem mostra ser imagem de Deus. Na fórmula criacional registada em Gn 1,26 os três sinónimos com que se define o humano são: homem, imagem nossa (de Deus), poder.
  340. O Poderoso de Jacob é um título equivalente a um nome de Deus, particularmente associado às tradições do patriarca Jacob (cf. Gn 49,24). O voto expresso nos vv. seguintes não aparece explicitamente na Bíblia, mas os factos referidos correspondem ao que é relatado em 2Sm 6-7 (cf. 1Cr 13-17).
  341. A digna morada é o templo, cuja ideia se atribui a David e cuja construção coube ao seu filho Salomão (cf. 1Cr 28,1-19; 2Cr 1,18-5,1).
  342. Lit.: ela.
  343. As palavras dos vv. 6-10 são postas na boca dos israelitas, seja dos contemporâneos de David seja dos que em qualquer época assumiam em oração este salmo, revivendo o espírito dos acontecimentos referenciados, numa viagem simbólica no interior do território de Efrata, que incluía Belém, terra natal de David (Gn 35,19; Rt 4,11) e Jaar, também conhecida como Quiriat-Iarim. Deste modo se refazia a viagem da arca da aliança, dali até Jerusalém (cf. 1Sm 7,1s; 2Sm 6,3). A viagem simbólica começa com um convite dirigido ao Senhor (v. 8) para aceitar a transferência para Jerusalém.
  344. Lit.: não desvies a face do teu ungido. Este pedido é mais urgente se, depois do fim da primeira monarquia, se referir a uma personagem nova como Zorobabel, para quem se volta a reclamar a linhagem de David (cf. Esd 3,2; Ag 1,1s.6.21; Zc 4).
  345. Esta promessa a David vem mais amplamente relatada em Sl 89,28-38; 2Sm 7.
  346. Lit.: de salvação. Este revestimento é uma bênção de Deus. Quando no v. 9 se convidam os sacerdotes a revestirem-se de justiça é da responsabilidade e da iniciativa deles.
  347. Lit.: um chifre de David. Podendo significar riqueza e abundância, o termo qeren significa principalmente o poder. Em Zc 6,12, Zorobabel é designado como rebento ou gérmen, termo que é da mesma raiz aqui usada para significar germinar.
  348. A lâmpada é símbolo de vida e prosperidade (cf. Sl 18,29; 2Sm 14,7; Pr 24,20).
  349. A tradução dos LXX diz: o meu diadema, o qual também se enquadra bem no simbolismo da ideologia real.
  350. Esta meditação sapiencial fixa-se na vida de Israel em comunidade, vendo-o como uma grande família de irmãos. As imagens do óleo e do orvalho sugerem a fertilidade da terra (Gn 27,28). A personagem de Aarão introduz neste quadro uma referência histórica de encantamento e solenidade; e o monte Hermon ajuda a erguer a modesta colina de Sião aos píncaros das altas montanhas do norte de Canaã, cobertas de antigos mitos e simbolismos religiosos que Israel assume.
  351. Este salmo parece uma simples fórmula de convite carateristicamente litúrgico para se louvar o Senhor. Convida à atitude de louvor, sem sequer introduzir motivações concretas como é costume em tais textos. Na verdade, louvar o Senhor não precisa de motivações; é natural e evidente. Este texto parece um daqueles refrões puramente funcionais de que as liturgias costumam servir-se como fórmulas de cerimónia. Mesmo assim foi integrado no grupo dos cânticos de peregrinação, talvez porque esta categoria recolhia também conotações deste tipo e fazia sempre sentido naquele contexto.
  352. Este salmo é um hino de grande intencionalidade litúrgica, não somente porque se concentra intensamente na ideia do louvor, onde está o sentido e o espírito da adoração e da liturgia, mas também porque apresenta a realidade do povo de Israel segundo as várias casas, com a sua representatividade institucional. Do ponto de vista do conteúdo, este hino está recheado dos mais importantes temas históricos e teológicos da tradição hebraica. A pedra de toque é o Deus que habita em Sião. Relativamente a este Deus, o hino celebra a supremacia sobre a criação (vv. 5-7) e o acompanhamento e defesa do seu povo ao longo da história (vv. 8-14), a partir do tempo do Egito. É ali que o salmo fundamenta a identidade do povo hebreu. E nisto se concentra toda a realidade e todo o sentido da vida. Outros deuses simplesmente não existem. O monoteísmo é assumido de uma forma feliz.
  353. Os vv. 8-9 tratam das pragas do Egito, vistas como sinais benfazejos para os hebreus.
  354. As injustiças e perigos sofridos pelos hebreus no relacionamento com os inimigos são assumidos por Deus como um caso de justiça que lhe diz respeito.
  355. Os vv. 15-18 são semelhantes aos do Sl 115,4-8.
  356. Os vv. 19-21 são uma antífona de gosto tradicional que serve de conclusão a todo o hino (cf. Sl 115,10-13; 118,2-4).
  357. O aleluia final, que também se encontra no Sl 104,35, foi transportado pela tradução dos LXX para o início do salmo seguinte.
  358. Este é mais um hino de louvor a Deus, onde a marca de enquadramento litúrgico se nota sobretudo no refrão que compõe a segunda metade de cada v.. Este refrão é, ele mesmo, um espelho da prática litúrgica de Israel que aparece testemunhada noutros lugares da Bíblia (cf. Sl 106; 107; 118; 2Cr 7,3; Esd 3,11). Os temas regressam aos lugares clássicos da história teológica dos israelitas, tratando da criação do universo e recapitulando, com grande pormenor, o itinerário que vai do Egito à entrada em Canaã, que já aparecia em esboço no salmo anterior (Sl 135,10-14). Com o seu estilo de grande solenidade, este salmo é chamado o «grande Hallel» (hino de louvor) e é cantado pelos judeus na festa da Páscoa. Os dois últimos vv. saem do esquema teológico de base histórica e situam-se num âmbito que é geral e fundamental ao mesmo tempo. Em conclusão, são recapituladas as razões mais práticas, pelas quais é de primeiro interesse para os humanos dar louvor a Deus.
  359. As referências bíblicas para o conteúdo dos vv. 10-16 encontram-se em Ex 17-19.
  360. Sobre estas vitórias contra os reis inimigos, cf. Nm 21,10-33; Dt 29,6s; cf. Sl 135,10-12.
  361. As referências a estes tempos intermitentes de depressão e ressurgimento poderiam trazer à memória períodos como os que são descritos em Jz e 1Sm.
  362. Este título de Deus dos céus é usado para Javé em Gn 24,3 e parece ter estado particularmente em voga a partir da época persa (cf. Esd 1,2; 7,12; Ne 1,4; Dn 2,18-19).
  363. Recorrendo às nomenclaturas mais convencionais de géneros literários, este salmo poderia ser rotulado como súplica coletiva. É claro que podemos enquadrá-lo no ritmo coletivo e geral das orações que se praticavam no templo reconstruído depois do exílio. Os motivos em que assenta a súplica são intensos e claramente circunstanciados. Os temas são a saudade e o desgarramento provocados pelo exílio longe de Jerusalém; a desolação de viver em terra estranha, onde estão impedidas as alegrias que só na terra natal fazem sentido. Os primeiros caps. do livro de Ezequiel, profeta que fez parte dos mesmos exilados, oferecem um contexto bem ilustrativo como pano de fundo para este salmo. A oração de conclusão, que costuma inspirar confiança e segurança, parece olhar para um tipo de castigo que se mistura ainda com sentimentos de vingança e impropério. Por isso, esta parte final não costuma ser transposta para uso coletivo na liturgia. De qualquer modo, este salmo está muito presente na história das literaturas e das artes, sobretudo musicais, como sendo um dos mais reconhecidos poemas da Bíblia.
  364. Ou: de ti, Sião. Esta leitura consta no Saltério Romano do séc. IV e permaneceu em textos litúrgicos.
  365. Ou: e os que zombavam de nós. O termo traduzido por opressores é tradicionalmente considerado um termo de uso único na Bíblia e, portanto, de difícil definição. No entanto, poderia pensar-se numa forma derivada da raiz hll¸ que pode significar «escarnecer». Daí a tradução alternativa.
  366. Todo o salmo aponta para uma incapacidade de cantar cânticos de Sião em terra estrangeira. Por isso o castigo referido nos vv. 5-6, para o caso de atraiçoarem a memória de Jerusalém, é o de ficar com a mão tolhida e a língua emudecida.
  367. Esta referência aos povos situados a sul de Judá e designados como filhos de Edom justifica-se não somente porque eles constituíam uma fonte contínua de insegurança para Jerusalém, mas também porque a eles se ligavam memórias de destruição semelhantes a esta, provocada pelos neobabilónicos (cf. Jr 49,7-22; Ez 35,5; Jl 4,19; Abd 2-14). Segundo Lm 4,21, os de Edom estavam entre os mais ferozes participantes no saque de Jerusalém, depois da conquista.
  368. O grito dos vv. 8-9, que não esconde reações de vingança, é na verdade um grito de dor e de protesto, pelo facto de os conquistadores babilónicos de Jerusalém terem adotado práticas selvagens (cf. 2Rs 8,12; Is 13,16; 14,22; Jr 51,22-25; Os 14,1; Lm 3,10-12). A dor dos hebreus leva-os a formular desejos de castigo em ricochete, segundo a medida do que se costuma designar como lei de Talião. As práticas brutais referidas aconteciam realmente por ocasião da conquista de cidades, como maneira radical de impedir que elas se restabelecessem (cf. Is 13,16; Os 14,1; Na 3,10).
  369. Na sua forma literária, este é um salmo individual de ação de graças. Eventualmente, o orante poderia representar a figura de um rei. No entanto, as referências ao rei e às causas que ele representa são preocupação frequente, mesmo em orações de simples orantes individuais.
  370. Ou: em frente dos deuses, significando recusa dos deuses e opção por Javé. A tradução dos LXX, a Vg e a NVg transmitem um texto que intercala entre estes dois hemistíquios um outro que diz: porque ouviste as palavras da minha boca. No último hemistíquio, percebe-se o deslisar de semânticas do termo ’elohim, podendo referir-se a deuses ou a outro tipo de seres superiores, mesmo humanos: deuses, anjos, potentados (cf. Sl 29,1; 58,2; 82,1; 86,8; 89,7; Jb 1,6). Desde a tradução grega seguida pela tradição latina, a escolha do termo anjos fixa evidentemente uma semântica. Outras traduções antigas optaram por traduzir reis ou juízes, valorizando as diferentes possibilidades semânticas do termo ’elohim.
  371. Este salmo apresenta a forma e os conteúdos que fazem normalmente parte dos salmos de súplica. No entanto, ele está construído segundo o modelo bem conhecido de uma reflexão sapiencial sobre a maneira como Deus governa e intervém na condução da vida humana. Ele mostra-se particularmente sensível aos misteriosos caminhos e fases que a vida humana vai percorrendo e bem assim aos dramas e males que a assolam. A atitude sugerida está, mais uma vez, de acordo com aquela que a sabedoria sugere, i.e., de total confiança e entrega, apesar do caráter inacessível dos mistérios implicados.
  372. Expressões polares como o sentar-se e levantar-se, sair e entrar, etc., representam a totalidade da vida humana (cf. Nm 27,17; Dt 31,2).
  373. Ou: E concluo que na escuridão Ele me observa / e de noite é luz à minha volta. Um texto de Qumrân pressupõe para a segunda parte e a noite é uma cintura (’ezor, em vez de ’or) à minha volta.
  374. Ou: Tu conheces a minha alma, desde sempre.
  375. Ou: Os teus olhos viram os tempos da minha vida. / No teu livro, todos eles estavam inscritos. A tradução comumente recebida, que vem pela via dos LXX, Vg e NVg, depende da leitura de golem como significando embrião. Daqui derivou o tema literário da figura indefinida e lendária designada como Golem em certas tradições judaicas antigas e modernas. No entanto, tal palavra não existe em mais nenhum outro lugar da Bíblia e as ocorrências no hebraico posterior derivam exclusivamente da interpretação que se fez desta passagem. A leitura alternativa dada acima deriva de se entender o substantivo gil, que aparece em Dn 1,10 e é possível também ser lido em Sl 43,4. Nesta interpretação, o sufixo possessivo de primeira pessoa estaria com um mem enclítico. Deste modo, a sintaxe da segunda parte deste v. 16 fica sem problemas.
  376. Ou: Quando eu chegar ao fim, ainda estarei contigo, segundo a NVg.
  377. A tradução contra ti fundamenta-se na leitura de ‘adêka, que muitos mss. trazem em vez do ‘arêka do TM.
  378. Neste salmo individual de súplica, por motivo de perseguição, o salmista pede ajuda para ser libertado dos violentos e caluniadores, que armam emboscadas; ele invoca o Senhor, pede castigo e confia em que Deus guiará os justos. A convicção de que Deus garante justiça nos conflitos que ocorrem entre os humanos é o motivo mais profundo para o louvar. A confiança na justiça divina é o fundamento do olhar confiante com que se olha para a vida humana em sociedade.
  379. Estas metáforas são apreciadas para descrever calúnias e maldades (Sl 52,4; 57,5).
  380. Deve entender-se provavelmente que se refere à terra de Israel. Num sentido mais radical poderia também entender-se na terra como mundo.
  381. Neste salmo individual de súplica o choque entre o comportamento dos maus e a situação de perigo que isso representa para o salmista não são tratados somente como uma questão de agressão e de injustiça, mas sobretudo como uma confrontação entre modelos opostos de comportamento. Isso obriga o salmista a uma atitude de amabilidade, por um lado, e de resguardo e afastamento, por outro. O facto de o hebraico aqui usado parecer algo antigo torna difícil conseguir uma tradução mais explícita.
  382. A oração é aqui matizada com várias metáforas recolhidas da vida cultual do templo: o incenso usado em várias cerimónias, o ambiente interior do santuário, o gesto de erguer as mãos e o sacrifício da tarde (Ex 29,38-42; Lv 2,1s,15; Sl 28,2; 63,5; 66,15).
  383. Ou: os meus ossos. A maior dificuldade deste v. consiste em saber de quem são os ossos que descem ao mundo dos mortos. A NVg entende os seus ossos, mas a Vg e os LXX entendiam os nossos ossos. Na primeira hipótese funciona como descrição do castigo dos maus; na segunda, como o sofrimento profundo que atinge os bons. No entanto, em 11QPsª aparece como os meus ossos. Tendo em conta que todo o salmo está declarado na primeira pessoa do singular, a ocorrência de nossos ossos neste v. 7 parece pouco lógico. Normalmente, o estar à boca do abismo da morte faz parte da lamentação do salmista; a primeira pessoa poderia, neste caso, fazer sentido.
  384. Lit.: pelo Cheol. O texto dos vv. 6-7 é de molde a deixar sempre algumas hesitações na tradução.
  385. Esta referência à caverna pode aludir à caverna de Odolam (1Sm 22) ou de En-Guédi (1Sm 24).
  386. Este é um salmo individual de súplica, no qual o salmista não desce a muitos pormenores de descrição sobre as aflições a que se encontra sujeito. Há perseguição e prisão, bem como situações de abandono. Com a esperada intervenção de Deus, a situação final resulta em louvores e celebrações festivas, com muita gente à sua volta.
  387. O defensor de alguém em tribunal colocava-se à sua direita (cf. Sl 109,31; Is 63,12) e a ideia de ser seu conhecido significa que assumia a função de testemunhar em seu favor.
  388. Estas expressões densas sobre a terra dos vivos carregam sempre conotações que contêm alguma intencionalidade tensa entre as dimensões de vida neste mundo e outras mais transcendentes (cf. Sl 16,5; 27,13; 46,2; 52,7; 91,2).
  389. A solidariedade expressa para com quem foi tratado com justiça por parte de Deus é uma celebração festiva sobre o significado desse acontecimento (cf. Sl 64,11; 107,42).
  390. Salmo individual de súplica. Este é o último dos salmos penitenciais, assim chamados apesar de neles se tratar mais frequentemente de perigos que de pecados. Mais uma vez, as queixas sobre as quais está fundamentada a súplica são expressas de uma forma que não é muito concreta. O estado de espírito descrito é o de alguém que se sente às portas da morte. Estas fórmulas têm capacidade para representar uma grande variedade de experiências e de situações. O salmista está consciente de que o acolhimento do seu grito de socorro tem tudo a ver com o seu bom comportamento.
  391. Lit.: nenhum vivente.
  392. Lit.: como os mortos de eternidade.
  393. Trata-se de um salmo real, semelhante ao Sl 18. O seu conteúdo refere-se a aspetos variados das cerimónias que têm a ver com a realeza. A tonalidade geral corresponde ao modelo de meditação sapiencial sobre a precariedade da vida humana, dimensão que afeta igualmente o rei. Inclui uma súplica em favor do êxito das atividades do rei e dos seus empreendimentos. Neste salmo, David já é tratado como um rei que serve como referência e modelo. Depois do esboço de uma liturgia real (vv. 1-10), vem um pedido de bênçãos para toda a coletividade (vv. 11-15). Esta abertura às necessidades de toda a comunidade é uma preocupação que condiz bem com as próprias funções do rei. A variedade de temas focados poderia igualmente dar-nos a sensação de este salmo ser uma espécie de antologia de temas religiosos. Daí a impressão de nos depararmos com uma série de estrofes justapostas. A variedade de sujeitos a que os pronomes pessoais e possessivos se reportam pode ser um dos indícios desta multiplicidade de estrofes.
  394. A primeira pessoa usada nesta estrofe parece fazer do rei o sujeito e ator principal.
  395. A expressão David, seu servo tornou-se um título de cariz messiânico (Jr 33,21; Ez 34,23-24; 37,24).
  396. Na arquitetura dos palácios do Oriente, as colunas elegantes e belas eram um elemento decorativo importante. Nem é forçoso fazer uma ligação muito explícita com a tradição grega da construção de colunas com figuração humana, chamadas as cariátides.
  397. Este salmo é um hino no qual se proclamam os atributos de Deus e o seu reino (vv.11-13). A sua providência diz respeito a todos (vv. 14-17), mas incide muito especialmente sobre os justos. O salmo segue o modelo dos salmos acrósticos alfabéticos (cf. Sl 9; 119). O início dos vv., com efeito, começa por uma letra diferente das anteriores, seguindo a ordem alfabética do hebraico. Falta apenas o v. correspondente à letra nun. Este modelo de escrita condiz com um género literário de tipo sapiencial. Todo o salmo, com efeito, tem o aspeto de uma meditação e o próprio gosto sapiencial.
  398. Nos vv. 5-6 há um jogo de sujeitos entre a proclamação feita por cada grupo geracional e o próprio salmista que repete o eco daquelas vozes.
  399. O governo de Deus sobre o mundo é descrito com as caraterísticas de um reino (vv. 10-13).
  400. O cuidado de Deus em assistir cada criatura dá ao seu governo do mundo uma caraterística de meticulosa e atenta providência (vv. 14-16).
  401. Entende-se aqui o termo raşon como referido à generosidade com que Deus dá e não à sofreguidão daqueles que procuram alimento junto dele.
  402. Este salmo começa e termina com a proclamação de um aleluia, que lhe dá a conotação de um hino. Os salmos seguintes seguem o mesmo modelo e mantêm a mesma intencionalidade. Este Sl 146 sublinha que qualquer humano é demasiado fraco para nele se depositarem quaisquer esperanças de salvação. Só Deus tem possibilidade de responder aos anseios humanos. Os grandes temas do pensamento e da literatura bíblicos estão aqui amplamente representados, nomeadamente a debilidade e incapacidade humana (vv. 3-4) e as razões para olhar para Deus como base de toda a esperança (vv. 5-9). Com este salmo tem início o terceiro grupo de salmos chamados do Hallel (146-150), que os judeus recitam pela manhã. Sobre o termo aleluia, cf. Sl 104,35.
  403. Este salmo é um hino em que insistentemente se convida ao louvor a Deus (vv. 1,7, 12). Cada um destes convites ao louvor dá início a uma nova estrofe do salmo. De 1-6 o louvor a Deus tem como base os seus atributos; de 7-11 é a sua providência; de 12-20 são os benefícios concedidos a Jerusalém e, por ela, a todo o povo. Nos LXX e na Vg esta última estrofe constitui um salmo à parte. Este salmo apresenta-se, desta maneira, como um cântico destinado a manter o espírito e o entusiasmo que, em cada assembleia, o fiel é chamado a reviver. Mesmo apresentando uma intenção genérica, continua a ressaltar que os motivos para sublinhar o louvor, enquanto sentimento religioso fundamental, é a maneira como Deus preside e exprime o funcionamento ordenado do universo. O universo em que o salmista sente que está a viver é, precisamente por esse motivo, contemplado com satisfação, confiança e otimismo.
  404. Dar nome às estrelas é mostrar de que maneira Deus exerce a soberania naquela relação: a soberania significa a eficácia matizada da gestão a não força bruta de comando (cf. Is 40,26-28).
  405. A tradição hermenêutica que vai da tradução dos LXX até à NVg sentiu que a seguir à menção da erva nos montes faltava uma referência paralela ao serviço que esta fertilidade presta aos homens (cf. Sl 104,14) e completou com um hemistíquio que diz: e verdura para serviço do homem.
  406. Os filhotes dos corvos são tomados como exemplo de um ser que, por natureza, corre o risco de se encontrar ao desamparo (cf. Mt 6,26; Lc 12,24). Como seres vivos, eles sentem a falta de alimento e por isso gritam. O verbo gritar é o mesmo que se usa quando os humanos se dirigem a Deus em oração.
  407. O que está principalmente em apreço nestas referências é a agilidade e a velocidade que os cavalos são capazes de atingir (cf. Sl 33,16-18).
  408. É neste v. 12 que começa o Sl 147, segundo a numeração que passou da tradução dos LXX para a Vg e para os textos de uso litúrgico.
  409. Nesta última estrofe (vv. 15-20) a eficácia da gestão que Deus faz da vida do universo está expressa pelos pronomes possessivos que fazem com que todos os fatores ativos e intervenientes no funcionamento do universo sejam vistos como pertencendo a Deus e aparecendo a funcionar sob o seu comando direto.
  410. A palavra de Deus aparece aqui personificada como um dos seus mensageiros (cf. Sl 107,20; Is 55,10-11; Jo 1,14).
  411. A maneira como os hebreus se sentem conhecedores deste maravilhoso funcionamento do universo é um privilégio e uma mais valia que os torna felizes e que verificam não existir em outros povos.
  412. Este hino constitui um convite generalizado e pormenorizado a todas as criaturas do universo, no céu (vv. 1-6) e na terra (vv. 7-14), para que se juntem como um duplo coro a contracenar, e com todo o entusiasmo louvem a Deus. Uma grande parte dos vv. assenta diretamente sobre uma forma imperativa do verbo louvar. Como acontece geralmente nos hinos por todo o mundo bíblico, uma parte dos vv. constitui uma narrativa sobre as grandes obras de Deus, pelas quais o louvor se justifica. É a motivação e base essencial para os hinos, assentes na feliz contemplação do mundo.
  413. A qualidade de mensageiros e de exércitos de Deus é partilhada tanto por seres como os anjos como pelos astros do céu. Ambos se encontram na função de cumprir as tarefas que lhes são atribuídas (cf. 1Rs 22,19; Jb 38,7; Ne 9,6).
  414. Na conceção dos orientais o céu tinha vários níveis e as águas que de lá caíam como chuva vinham do armazenamento de águas situado acima do firmamento (cf. Gn 1,6-8; Sl 104,3).
  415. Ou: Ele faz subir a prosperidade do seu povo. O termo hebraico qeren (chifre) é uma metáfora que significa poder e também abundância.
  416. Este salmo é mais um hino que celebra a realeza de Deus em Sião. O contexto é o da máxima solenidade, i.e., a assembleia dos fiéis. O convite ao louvor é tão insistente que poderia deixar passar despercebida a parte narrativa que os hinos costumam integrar. Esta concentra-se principalmente nos vv. 7-9, em que os habitantes de Sião, sob o comando do seu rei divino, se sentem como que capacitados para exercer domínio e governar os poderosos que anteriormente os assolavam.
  417. Num hino que se movimenta entre a grandiosidade do louvor universal a Deus e as tarefas políticas de confrontação com as nações inimigas, esta recomendação para um solene louvor nos leitos, apesar do seu caráter inesperado, é uma indicação de que a grandiosidade de uma manifestação de fé mantém significado, mesmo quando transposta da grande assembleia dos fiéis para a intimidade doméstica. Há quem pense que poderia tratar-se de tapetes de oração, usados mesmo nas cerimónias. O Sl 4,5 poderia conter mais uma referência a este assunto.
  418. Mesmo que referidas de forma tão material e concreta, estas ações de domínio sobre outros povos (vv. 6-9) apresentam um matiz simbólico, que lhes vem do contexto de efusiva solenidade que o ambiente do salmo define. O paralelismo do v. 6 mostra bem a cumplicidade existente entre as duas dimensões: a do louvor e a do gesto militar.
  419. Esta referência a uma sentença registada coloca estas ações de domínio sobre os outros povos no lado de Deus. É portanto mais uma descrição da razão e da justiça, que Deus representa, e não tanto a referência a uma intervenção prática.
  420. Os salmos 148 e 149 terminam ambos com uma proclamação de orgulho e satisfação, que lhes vem da especial proximidade que têm com o santuário de Deus.
  421. Este salmo é um hino que se concentra exclusivamente no tema do convite universal ao louvor, insistindo repetitivamente no ato de louvor com recurso a um variado instrumental. Nem sequer se sente necessidade de esboçar a parte narrativa dos prodígios que justificariam todos estes convites ao louvor. Apenas o v. 2 faz alusão aos prodígios. Louvar é, aqui, de uma evidência absoluta; é o estado imediato e natural da própria relação com Deus. Este hino serve de doxologia final e apoteótica para todo o saltério, da mesma maneira que a meditação sapiencial (Sl 1), abrindo, de forma simples e ponderada, a reflexão sobre as coordenadas fundamentais para orientação da vida, lhe serviu de abertura.
  422. O templo em Jerusalém e a fortaleza no firmamento são os dois santuários de Deus. Esta coordenada do duplo santuário é um conceito que encontramos nas religiões orientais desde a Suméria até Canaã, onde a religião dos hebreus se enquadra de igual modo.
  423. Os instrumentos referidos são sobretudo de corda e percussão. Era sobretudo com eles que se compunha o instrumental de música, mostrando, portanto, um grande pendor para o ritmo.
  424. O louvor de Deus está na voz. Este último convite aberto a tudo o que respira não é no sentido de aumentar a lista de instrumentos de sopro. Tudo o que respira é convite à voz de seres vivos. O termo aqui usado, nechamah, é um dos que se usam para dizer alma, identificando o ser vivo com a sua voz.



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