Difference between revisions of "Lc 3"

From Biblia: Os Quatro Evangelhos e os Salmos
Jump to navigation Jump to search
 
(2 intermediate revisions by the same user not shown)
Line 1: Line 1:
<center>II</center>
+
<center><span style="color:red">'''II'''</span></center>
 +
<center><span style="color:red">'''O prelúdio da missão salvífica de Jesus'''</span></center>
 +
<center><span style="color:red">(3,1-4,13)</span></center>
  
<center>O prelúdio </center>
 
  
<center>da missão salvífica de Jesus (3,1-4,13) </center>
+
<span style="color:red">João, o Batista (Mt 3,1-12; Mc 1,1-8) – </span><span style="color:red"><sup>1</sup></span>No décimo quinto ano do reinado de Tibério César<ref name="ftn65">Lc situa a missão de João e a de Jesus (v. 23) na história do mundo pagão (império romano) e na do povo judeu (1,5 e 2,1-2). Tibério, que sucede a César Augusto, foi imperador romano entre 14 e 37 d.C. O décimo quinto ano do seu reinado será o ano 28 ou 29 da era cristã. Pôncio Pilatos foi governador da Judeia, Idumeia e Samaria, entre 26 e 36 da era cristã. Herodes Ântipas governou a Galileia e a Pereia, de 4 a.C. a 39 d.C.. Filipe foi governador de alguns distritos a nordeste do Lago de Tiberíades, de 4 a.C. a 34 d.C.. Lisânias é pouco conhecido e dependeria do rei Herodes Agripa II. Talvez Lc o inclua aqui pelo facto de o seu território ser pagão, num aceno à universalidade da salvação.</ref>, quando Pôncio Pilatos governava a Judeia e Herodes era tetrarca<ref name="ftn66">Príncipe dependente de uma autoridade estrangeira ocupante, governante inferior a um rei.</ref> da Galileia, Filipe, seu irmão, era tetrarca das regiões da Itureia e da Traconítide, e Lisânias era tetrarca de Abilene, <span style="color:red"><sup>2</sup></span>sendo sumo-sacerdote Anás<ref name="ftn67">Anás foi deposto do cargo de sumo-sacerdote, no ano 15 d.C.. É aqui nomeado porque, sendo sogro de Caifás, continuava a exercer uma grande influência (Jo 18,13-24; At 4,6). Caifás foi sumo-sacerdote entre 18 e 36 d.C. Era o chefe do povo de Israel e é nomeado por último em contraposição com o imperador romano. O chamamento de João tem muito a ver com o de Jeremias (Jr 1,1). Assim se realça o seu caráter profético.</ref> e Caifás, a palavra de Deus foi dirigida a João, filho de Zacarias, no deserto.
 
 
 
 
3 João, o Batista (Mt 3,1-12; Mc 1,1-8) – <span style="color:red"><sup>1</sup></span>No décimo quinto ano do reinado de Tibério César<ref name="ftn65">Lc situa a missão de João e a de Jesus (v. 23) na história do mundo pagão (império romano) e na do povo judeu (1,5 e 2,1-2). Tibério, que sucede a César Augusto, foi imperador romano entre 14 e 37 d.C. O décimo quinto ano do seu reinado será o ano 28 ou 29 da era cristã. Pôncio Pilatos foi governador da Judeia, Idumeia e Samaria, entre 26 e 36 da era cristã. Herodes Ântipas governou a Galileia e a Pereia, de 4 a.C. a 39 d.C.. Filipe foi governador de alguns distritos a nordeste do Lago de Tiberíades, de 4 a.C. a 34 d.C.. Lisânias é pouco conhecido e dependeria do rei Herodes Agripa II. Talvez Lc o inclua aqui pelo facto de o seu território ser pagão, num aceno à universalidade da salvação.</ref>, quando Pôncio Pilatos governava a Judeia e Herodes era tetrarca<ref name="ftn66">Príncipe dependente de uma autoridade estrangeira ocupante, governante inferior a um rei.</ref> da Galileia, Filipe, seu irmão, era tetrarca das regiões da Itureia e da Traconítide, e Lisânias era tetrarca de Abilene, <span style="color:red"><sup>2</sup></span>sendo sumo-sacerdote Anás<ref name="ftn67">Anás foi deposto do cargo de sumo-sacerdote, no ano 15 d.C.. É aqui nomeado porque, sendo sogro de Caifás, continuava a exercer uma grande influência (Jo 18,13-24; At 4,6). Caifás foi sumo-sacerdote entre 18 e 36 d.C. Era o chefe do povo de Israel e é nomeado por último em contraposição com o imperador romano. O chamamento de João tem muito a ver com o de Jeremias (Jr 1,1). Assim se realça o seu caráter profético.</ref> e Caifás, a palavra de Deus foi dirigida a João, filho de Zacarias, no deserto.
 
  
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>E ele percorreu toda a região à volta do Jordão a proclamar um batismo de conversão para perdão dos pecados, <span style="color:red"><sup>4</sup></span>como está escrito no livro das palavras do profeta Isaías<ref name="ftn68">Is 40,3-5.</ref>:
 
<span style="color:red"><sup>3</sup></span>E ele percorreu toda a região à volta do Jordão a proclamar um batismo de conversão para perdão dos pecados, <span style="color:red"><sup>4</sup></span>como está escrito no livro das palavras do profeta Isaías<ref name="ftn68">Is 40,3-5.</ref>:
Line 36: Line 34:
 
<span style="color:red"><sup>15</sup></span>Estando o povo na expectativa e pensando todos nos seus corações se João não seria o Cristo<ref name="ftn71">De origem grega (''khristós''), este título significa ''ungido'' e corresponde ao hebraico ''māchîah, Messias'' (em Israel eram ungidos os sacerdotes, os profetas e os reis). Era entendido, por esta altura, em sentido eminentemente político (20,41; 22,67; 23,2.35.39). Não raras vezes os discípulos de João se interrogam se o seu mestre não será o messias (Jo 1,19-20; 3,28).</ref>, <span style="color:red"><sup>16</sup></span>João respondeu, dizendo a todos: «Eu batizo-vos na água<ref name="ftn72">''Hýdati ''também pode ter um sentido instrumental (''com água'').</ref>, mas vem aquele que é mais forte<ref name="ftn73">''Forte'' é um título messiânico ao qual Lc vai voltar, em 11,22 (cf. Is 9,5; 11,2). Lc contrapõe o batismo de João ao de Jesus (At 1,5; 11,16). </ref> do que eu, ao qual eu não sou digno de desatar a correia das suas sandálias: Ele batizar-vos-á no Espírito Santo e no fogo<ref name="ftn74">Desatar as correias'' ''das sandálias era uma atitude de escravo que um hebreu não podia permitir a um membro do seu povo (Jo 8,33). Os Profetas usam as imagens da ceifa, da pá de joeirar (Jr 15,7; 51,2) e do fogo aplicado à palha (Is 5,24; 47,14; Jl 2,5; Na 1,10) para falar do juízo de Deus. Ao referir que se trata de um fogo inextinguível (cf. Is 66,24; Mc 9,43.48), João dá um colorido escatológico à sua imagem. Sobre o juízo divino e o dia do Senhor, cf. Sl 7,8; Is 13,9; Ez 13,5; Dn 8,19; Am 5,18-20; Mt 25,31-46; 1Cor 3,13.15; 1Ts 2,19.</ref>. <span style="color:red"><sup>17</sup></span>Tem a pá na sua mão para limpar a sua eira e recolher o trigo para o seu celeiro, e queimará a palha num fogo que não se apaga». <span style="color:red"><sup>18</sup></span>E com muitas outras exortações anunciava ao povo a boa nova.
 
<span style="color:red"><sup>15</sup></span>Estando o povo na expectativa e pensando todos nos seus corações se João não seria o Cristo<ref name="ftn71">De origem grega (''khristós''), este título significa ''ungido'' e corresponde ao hebraico ''māchîah, Messias'' (em Israel eram ungidos os sacerdotes, os profetas e os reis). Era entendido, por esta altura, em sentido eminentemente político (20,41; 22,67; 23,2.35.39). Não raras vezes os discípulos de João se interrogam se o seu mestre não será o messias (Jo 1,19-20; 3,28).</ref>, <span style="color:red"><sup>16</sup></span>João respondeu, dizendo a todos: «Eu batizo-vos na água<ref name="ftn72">''Hýdati ''também pode ter um sentido instrumental (''com água'').</ref>, mas vem aquele que é mais forte<ref name="ftn73">''Forte'' é um título messiânico ao qual Lc vai voltar, em 11,22 (cf. Is 9,5; 11,2). Lc contrapõe o batismo de João ao de Jesus (At 1,5; 11,16). </ref> do que eu, ao qual eu não sou digno de desatar a correia das suas sandálias: Ele batizar-vos-á no Espírito Santo e no fogo<ref name="ftn74">Desatar as correias'' ''das sandálias era uma atitude de escravo que um hebreu não podia permitir a um membro do seu povo (Jo 8,33). Os Profetas usam as imagens da ceifa, da pá de joeirar (Jr 15,7; 51,2) e do fogo aplicado à palha (Is 5,24; 47,14; Jl 2,5; Na 1,10) para falar do juízo de Deus. Ao referir que se trata de um fogo inextinguível (cf. Is 66,24; Mc 9,43.48), João dá um colorido escatológico à sua imagem. Sobre o juízo divino e o dia do Senhor, cf. Sl 7,8; Is 13,9; Ez 13,5; Dn 8,19; Am 5,18-20; Mt 25,31-46; 1Cor 3,13.15; 1Ts 2,19.</ref>. <span style="color:red"><sup>17</sup></span>Tem a pá na sua mão para limpar a sua eira e recolher o trigo para o seu celeiro, e queimará a palha num fogo que não se apaga». <span style="color:red"><sup>18</sup></span>E com muitas outras exortações anunciava ao povo a boa nova.
  
Prisão de João (Mt 14,3s; Mc 6,17s) – <span style="color:red"><sup>19</sup></span>O tetrarca Herodes, que era repreendido por ele por causa de Herodíade<ref name="ftn75">Herodíade era neta de Herodes, o Grande. Deixou o marido e tio, Filipe, para se unir a Herodes Ântipas (Mt 14,3; Mc 6,17-18).</ref>, a mulher de seu irmão, e por todas as maldades que havia cometido, <span style="color:red"><sup>20</sup></span>a todas essas acrescentou esta: encerrou João na prisão<ref name="ftn76">Assim se encerra a missão de João, ainda antes do batismo de Jesus. Deste modo, Lc distingue a missão de um e de outro, assinalando dois períodos distintos da história da salvação. Só em 9,7-9 fará uma referência breve à morte de João.</ref>.
+
 
 +
<span style="color:red">Prisão de João (Mt 14,3s; Mc 6,17s) – </span><span style="color:red"><sup>19</sup></span>O tetrarca Herodes, que era repreendido por ele por causa de Herodíade<ref name="ftn75">Herodíade era neta de Herodes, o Grande. Deixou o marido e tio, Filipe, para se unir a Herodes Ântipas (Mt 14,3; Mc 6,17-18).</ref>, a mulher de seu irmão, e por todas as maldades que havia cometido, <span style="color:red"><sup>20</sup></span>a todas essas acrescentou esta: encerrou João na prisão<ref name="ftn76">Assim se encerra a missão de João, ainda antes do batismo de Jesus. Deste modo, Lc distingue a missão de um e de outro, assinalando dois períodos distintos da história da salvação. Só em 9,7-9 fará uma referência breve à morte de João.</ref>.
  
  
Batismo de Jesus (Mt 3,13-17; Mc 1,9-11) – <span style="color:red"><sup>21</sup></span>Aconteceu que, ao ser batizado todo o povo, tendo também Jesus sido batizado<ref name="ftn77">De forma solidária, Jesus participa no processo da conversão do seu povo e dá-lhe sentido. A oração de Jesus é um tema caro a Lc (5,16; 6,12; 9,18.28-29; 10,21; 11,1; 22,32.40-46; 23,34.46). Sobre os céus que se rasgam, cf. Is 63,19.</ref> e estando a rezar, abriu-se o céu, <span style="color:red"><sup>22</sup></span>e desceu sobre Ele o Espírito Santo em figura corpórea, como uma pomba. E do céu surgiu uma voz: «Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo».
+
<span style="color:red">Batismo de Jesus (Mt 3,13-17; Mc 1,9-11) – </span><span style="color:red"><sup>21</sup></span>Aconteceu que, ao ser batizado todo o povo, tendo também Jesus sido batizado<ref name="ftn77">De forma solidária, Jesus participa no processo da conversão do seu povo e dá-lhe sentido. A oração de Jesus é um tema caro a Lc (5,16; 6,12; 9,18.28-29; 10,21; 11,1; 22,32.40-46; 23,34.46). Sobre os céus que se rasgam, cf. Is 63,19.</ref> e estando a rezar, abriu-se o céu, <span style="color:red"><sup>22</sup></span>e desceu sobre Ele o Espírito Santo em figura corpórea, como uma pomba. E do céu surgiu uma voz: «Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo».
  
  
Origem humana de Jesus. Genealogia (Mt 1,1-17) – <span style="color:red"><sup>23</sup></span>Quando Jesus iniciou o seu ministério<ref name="ftn78">Ao contrário de Mt, que coloca a genealogia no início do evangelho, Lc apresenta-a depois de Jesus ter sido revelado como Filho de Deus. Além disso, Mt parte de Abraão para Jesus, e Lc de Jesus para Adão e Deus, realçando a universalidade de Jesus e da sua mensagem. A genealogia pretende fundamentar a ascendência davídica de Jesus e a sua legitimidade messiânica.</ref>, tinha cerca de trinta anos<ref name="ftn79">Lc é o único a referir os trinta anos de Jesus. Pode tratar-se de uma alusão a David que começou a reinar com a mesma idade (2Sm 5,4). ''Era tido como filho de José'' é uma forma de sublinhar a conceção virginal de Jesus.</ref>, sendo filho – assim se pensava – de José, filho de Elí, <span style="color:red"><sup>24</sup></span>filho de Matát, de Leví, de Melquí, de Janai, de José, <span style="color:red"><sup>25</sup></span>de Matatias, de Amós, de Naúm, de Eslí, de Nagai, <span style="color:red"><sup>26</sup></span>de Maat, de Matatias, de Simei, de Josec, de Jodá, <span style="color:red"><sup>27</sup></span>de Joanan, de Ressa, de Zorobabel, de Salatiel, de Nerí, <span style="color:red"><sup>28</sup></span>de Melquí, de Adí, de Cosám, de Elmadám, de Er, <span style="color:red"><sup>29</sup></span>de Jesua, de Eliézer, de Jorím, de Matát, de Leví, <span style="color:red"><sup>30</sup></span>de Simeão, de Judá, de José, de Jonám, de Eliaquim, <span style="color:red"><sup>31</sup></span>de Meleá, de Mená, de Matatá, de Natán, de David, <span style="color:red"><sup>32</sup></span>de Jessé, de Obed, de Boóz, de Salá, de Nachon, <span style="color:red"><sup>33</sup></span>de Aminadab, de Admín, de Arní, de Hesrón, de Peres, de Judá, <span style="color:red"><sup>34</sup></span>de Jacob, de Isaac, de Abraão, de Téra, de Naor, <span style="color:red"><sup>35</sup></span>de Serug, de Reú, de Péleg, de Éber, de Chéla, <span style="color:red"><sup>36</sup></span>de Quenán, de Arpacsad, de Seme, de Noé, de Lamec, <span style="color:red"><sup>37</sup></span>de Matusalém, de Henóc, de Jaréd, de Malaliel, de Quenán, de Enós, de Set, de Adão, de Deus.
+
<span style="color:red">Origem humana de Jesus. Genealogia (Mt 1,1-17) – </span><span style="color:red"><sup>23</sup></span>Quando Jesus iniciou o seu ministério<ref name="ftn78">Ao contrário de Mt, que coloca a genealogia no início do evangelho, Lc apresenta-a depois de Jesus ter sido revelado como Filho de Deus. Além disso, Mt parte de Abraão para Jesus, e Lc de Jesus para Adão e Deus, realçando a universalidade de Jesus e da sua mensagem. A genealogia pretende fundamentar a ascendência davídica de Jesus e a sua legitimidade messiânica.</ref>, tinha cerca de trinta anos<ref name="ftn79">Lc é o único a referir os trinta anos de Jesus. Pode tratar-se de uma alusão a David que começou a reinar com a mesma idade (2Sm 5,4). ''Era tido como filho de José'' é uma forma de sublinhar a conceção virginal de Jesus.</ref>, sendo filho – assim se pensava – de José, filho de Elí, <span style="color:red"><sup>24</sup></span>filho de Matát, de Leví, de Melquí, de Janai, de José, <span style="color:red"><sup>25</sup></span>de Matatias, de Amós, de Naúm, de Eslí, de Nagai, <span style="color:red"><sup>26</sup></span>de Maat, de Matatias, de Simei, de Josec, de Jodá, <span style="color:red"><sup>27</sup></span>de Joanan, de Ressa, de Zorobabel, de Salatiel, de Nerí, <span style="color:red"><sup>28</sup></span>de Melquí, de Adí, de Cosám, de Elmadám, de Er, <span style="color:red"><sup>29</sup></span>de Jesua, de Eliézer, de Jorím, de Matát, de Leví, <span style="color:red"><sup>30</sup></span>de Simeão, de Judá, de José, de Jonám, de Eliaquim, <span style="color:red"><sup>31</sup></span>de Meleá, de Mená, de Matatá, de Natán, de David, <span style="color:red"><sup>32</sup></span>de Jessé, de Obed, de Boóz, de Salá, de Nachon, <span style="color:red"><sup>33</sup></span>de Aminadab, de Admín, de Arní, de Hesrón, de Peres, de Judá, <span style="color:red"><sup>34</sup></span>de Jacob, de Isaac, de Abraão, de Téra, de Naor, <span style="color:red"><sup>35</sup></span>de Serug, de Reú, de Péleg, de Éber, de Chéla, <span style="color:red"><sup>36</sup></span>de Quenán, de Arpacsad, de Seme, de Noé, de Lamec, <span style="color:red"><sup>37</sup></span>de Matusalém, de Henóc, de Jaréd, de Malaliel, de Quenán, de Enós, de Set, de Adão, de Deus.
  
  

Latest revision as of 19:30, 23 December 2019

II
O prelúdio da missão salvífica de Jesus
(3,1-4,13)


João, o Batista (Mt 3,1-12; Mc 1,1-8) – 1No décimo quinto ano do reinado de Tibério César[1], quando Pôncio Pilatos governava a Judeia e Herodes era tetrarca[2] da Galileia, Filipe, seu irmão, era tetrarca das regiões da Itureia e da Traconítide, e Lisânias era tetrarca de Abilene, 2sendo sumo-sacerdote Anás[3] e Caifás, a palavra de Deus foi dirigida a João, filho de Zacarias, no deserto.

3E ele percorreu toda a região à volta do Jordão a proclamar um batismo de conversão para perdão dos pecados, 4como está escrito no livro das palavras do profeta Isaías[4]:

Uma voz clama, no deserto:

"Preparai o caminho do Senhor,

endireitai as suas veredas.

5Todo o vale será preenchido

e todo o monte e colina serão abatidos;

o que é sinuoso tornar-se-á direito

e os caminhos pedregosos tornar-se-ão planos,

6e toda a carne[5] verá a salvação de Deus".

7Dizia, então, às multidões que acorriam para serem batizadas por ele: «Geração de víboras, quem vos mostrou como fugir da ira que está prestes a chegar? 8Produzi frutos dignos da conversão; e não comeceis a dizer entre vós: "Temos por pai Abraão", pois digo-vos que Deus é capaz de fazer surgir destas pedras filhos de Abraão. 9O machado já está à raiz das árvores, e toda a árvore que não dá bom fruto será cortada e lançada ao fogo».

10As multidões interrogavam-no, dizendo[6]: «Que devemos fazer, então?». 11Respondendo, dizia-lhes: «Quem tem duas túnicas distribua por quem não tem, e quem tem comida faça o mesmo».

12Vieram também os publicanos para serem batizados e disseram-lhe: «Mestre, que devemos fazer?». 13Ele respondeu-lhes: «Não exijais mais do que vos foi estabelecido».

14Também os soldados o interrogavam, dizendo: «E nós, que devemos fazer?». Disse-lhes: «Não exturcais nem denuncieis falsamente ninguém, e contentai-vos com os vossos salários».

15Estando o povo na expectativa e pensando todos nos seus corações se João não seria o Cristo[7], 16João respondeu, dizendo a todos: «Eu batizo-vos na água[8], mas vem aquele que é mais forte[9] do que eu, ao qual eu não sou digno de desatar a correia das suas sandálias: Ele batizar-vos-á no Espírito Santo e no fogo[10]. 17Tem a pá na sua mão para limpar a sua eira e recolher o trigo para o seu celeiro, e queimará a palha num fogo que não se apaga». 18E com muitas outras exortações anunciava ao povo a boa nova.


Prisão de João (Mt 14,3s; Mc 6,17s) – 19O tetrarca Herodes, que era repreendido por ele por causa de Herodíade[11], a mulher de seu irmão, e por todas as maldades que havia cometido, 20a todas essas acrescentou esta: encerrou João na prisão[12].


Batismo de Jesus (Mt 3,13-17; Mc 1,9-11) – 21Aconteceu que, ao ser batizado todo o povo, tendo também Jesus sido batizado[13] e estando a rezar, abriu-se o céu, 22e desceu sobre Ele o Espírito Santo em figura corpórea, como uma pomba. E do céu surgiu uma voz: «Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo».


Origem humana de Jesus. Genealogia (Mt 1,1-17) – 23Quando Jesus iniciou o seu ministério[14], tinha cerca de trinta anos[15], sendo filho – assim se pensava – de José, filho de Elí, 24filho de Matát, de Leví, de Melquí, de Janai, de José, 25de Matatias, de Amós, de Naúm, de Eslí, de Nagai, 26de Maat, de Matatias, de Simei, de Josec, de Jodá, 27de Joanan, de Ressa, de Zorobabel, de Salatiel, de Nerí, 28de Melquí, de Adí, de Cosám, de Elmadám, de Er, 29de Jesua, de Eliézer, de Jorím, de Matát, de Leví, 30de Simeão, de Judá, de José, de Jonám, de Eliaquim, 31de Meleá, de Mená, de Matatá, de Natán, de David, 32de Jessé, de Obed, de Boóz, de Salá, de Nachon, 33de Aminadab, de Admín, de Arní, de Hesrón, de Peres, de Judá, 34de Jacob, de Isaac, de Abraão, de Téra, de Naor, 35de Serug, de Reú, de Péleg, de Éber, de Chéla, 36de Quenán, de Arpacsad, de Seme, de Noé, de Lamec, 37de Matusalém, de Henóc, de Jaréd, de Malaliel, de Quenán, de Enós, de Set, de Adão, de Deus.



  1. Lc situa a missão de João e a de Jesus (v. 23) na história do mundo pagão (império romano) e na do povo judeu (1,5 e 2,1-2). Tibério, que sucede a César Augusto, foi imperador romano entre 14 e 37 d.C. O décimo quinto ano do seu reinado será o ano 28 ou 29 da era cristã. Pôncio Pilatos foi governador da Judeia, Idumeia e Samaria, entre 26 e 36 da era cristã. Herodes Ântipas governou a Galileia e a Pereia, de 4 a.C. a 39 d.C.. Filipe foi governador de alguns distritos a nordeste do Lago de Tiberíades, de 4 a.C. a 34 d.C.. Lisânias é pouco conhecido e dependeria do rei Herodes Agripa II. Talvez Lc o inclua aqui pelo facto de o seu território ser pagão, num aceno à universalidade da salvação.
  2. Príncipe dependente de uma autoridade estrangeira ocupante, governante inferior a um rei.
  3. Anás foi deposto do cargo de sumo-sacerdote, no ano 15 d.C.. É aqui nomeado porque, sendo sogro de Caifás, continuava a exercer uma grande influência (Jo 18,13-24; At 4,6). Caifás foi sumo-sacerdote entre 18 e 36 d.C. Era o chefe do povo de Israel e é nomeado por último em contraposição com o imperador romano. O chamamento de João tem muito a ver com o de Jeremias (Jr 1,1). Assim se realça o seu caráter profético.
  4. Is 40,3-5.
  5. Isto é, toda a criatura; trata-se de uma expressão hebraica (Gn 6,12).
  6. Vv. 10-14. Estes vv. são específicos de Lc. Com a pergunta que devemos fazer? (At 2,37; 16,30; 22,10) realça-se a disponibilidade de todos (as multidões) e particularmente dos pecadores públicos (cobradores de impostos e soldados) para a conversão. Se João não lhes exige que deixem a sua profissão, é porque converter-se apenas exige mudar de estilo de vida, praticando a justiça e a caridade.
  7. De origem grega (khristós), este título significa ungido e corresponde ao hebraico māchîah, Messias (em Israel eram ungidos os sacerdotes, os profetas e os reis). Era entendido, por esta altura, em sentido eminentemente político (20,41; 22,67; 23,2.35.39). Não raras vezes os discípulos de João se interrogam se o seu mestre não será o messias (Jo 1,19-20; 3,28).
  8. Hýdati também pode ter um sentido instrumental (com água).
  9. Forte é um título messiânico ao qual Lc vai voltar, em 11,22 (cf. Is 9,5; 11,2). Lc contrapõe o batismo de João ao de Jesus (At 1,5; 11,16).
  10. Desatar as correias das sandálias era uma atitude de escravo que um hebreu não podia permitir a um membro do seu povo (Jo 8,33). Os Profetas usam as imagens da ceifa, da pá de joeirar (Jr 15,7; 51,2) e do fogo aplicado à palha (Is 5,24; 47,14; Jl 2,5; Na 1,10) para falar do juízo de Deus. Ao referir que se trata de um fogo inextinguível (cf. Is 66,24; Mc 9,43.48), João dá um colorido escatológico à sua imagem. Sobre o juízo divino e o dia do Senhor, cf. Sl 7,8; Is 13,9; Ez 13,5; Dn 8,19; Am 5,18-20; Mt 25,31-46; 1Cor 3,13.15; 1Ts 2,19.
  11. Herodíade era neta de Herodes, o Grande. Deixou o marido e tio, Filipe, para se unir a Herodes Ântipas (Mt 14,3; Mc 6,17-18).
  12. Assim se encerra a missão de João, ainda antes do batismo de Jesus. Deste modo, Lc distingue a missão de um e de outro, assinalando dois períodos distintos da história da salvação. Só em 9,7-9 fará uma referência breve à morte de João.
  13. De forma solidária, Jesus participa no processo da conversão do seu povo e dá-lhe sentido. A oração de Jesus é um tema caro a Lc (5,16; 6,12; 9,18.28-29; 10,21; 11,1; 22,32.40-46; 23,34.46). Sobre os céus que se rasgam, cf. Is 63,19.
  14. Ao contrário de Mt, que coloca a genealogia no início do evangelho, Lc apresenta-a depois de Jesus ter sido revelado como Filho de Deus. Além disso, Mt parte de Abraão para Jesus, e Lc de Jesus para Adão e Deus, realçando a universalidade de Jesus e da sua mensagem. A genealogia pretende fundamentar a ascendência davídica de Jesus e a sua legitimidade messiânica.
  15. Lc é o único a referir os trinta anos de Jesus. Pode tratar-se de uma alusão a David que começou a reinar com a mesma idade (2Sm 5,4). Era tido como filho de José é uma forma de sublinhar a conceção virginal de Jesus.



Capítulos

Lc 1 Lc 2 Lc 3 Lc 4 Lc 5 Lc 6 Lc 7 Lc 8 Lc 9 Lc 10 Lc 11 Lc 12 Lc 13 Lc 14 Lc 15 Lc 16 Lc 17 Lc 18 Lc 19 Lc 20 Lc 21 Lc 22 Lc 23 Lc 24