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From Biblia: Os Quatro Evangelhos e os Salmos
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Introdução (1,1-13)
 
 
Título (1,1)
 
 
Vinda de Jesus (1,2-13)
 
 
I.A missão de Jesus na Galileia e arredores (1,14-8,26)
 
 
II.O «caminho» para a morte e ressurreição (8,27-16,8)
 
 
A. O caminho (8,27-10,52)
 
 
B. Em Jerusalém (11,1-13,37)
 
 
C. Paixão, morte e ressurreição (14,1-16,8)
 
 
Segunda conclusão (16,9-20)
 
 
 
<center>INTRODUÇÃO </center>
 
<center>INTRODUÇÃO </center>
  

Revision as of 10:46, 13 December 2019

INTRODUÇÃO
(1,1-13)


Título
(1,1)


11Princípio do evangelho de Jesus, Cristo, Filho de Deus[1].


Vinda de Jesus
(1,2-13)


João, o Batista (Mt 3,1-6.11; Lc 3,3-6.15s) – 2Tal como está escrito no profeta Isaías –

Eis que envio o meu mensageiro à tua frente[2],

que há de preparar o teu caminho[3].

3Uma voz que clama no deserto:

«Preparai o caminho do Senhor,

endireitai as suas veredas»[4]

4apareceu João Batista no deserto a proclamar um batismo de conversão[5] para perdão dos pecados. 5Acorria a ele toda a região da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém, e eram batizados por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados.

6João estava vestido com peles de camelo e com uma correia de couro à volta dos rins e alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre[6]. 7E proclamava, dizendo: «Atrás de mim vem aquele que é mais forte[7] do que eu; eu não sou digno de me inclinar para desatar[8] a correia das suas sandálias. 8Eu batizei-vos na água, mas Ele batizar-vos-á no Espírito Santo».


Batismo de Jesus (Mt 3,13-17; Lc 3,21s) – 9E aconteceu que, naqueles dias, veio Jesus de Nazaré da Galileia e foi batizado no rio Jordão por João. 10E imediatamente[9], ao sair da água, viu os céus rasgados e o Espírito, como uma pomba, a descer sobre[10] Ele. 11E uma voz surgiu dos céus: «Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo»[11].


Tentação de Jesus no deserto (Mt 4,1-11; Lc 4,1-13) – 12Imediatamente o Espírito o impeliu para o deserto, 13e no deserto esteve quarenta dias, sendo tentado por Satanás. Estava com os animais selvagens e os anjos serviam-no[12].


I
A MISSÃO DE JESUS NA GALILEIA E ARREDORES (1,14-8,26)


Início e conteúdo da missão (Mt 4,12-17; Lc 4,14s) – 14Depois de João ter sido preso, Jesus foi para a Galileia, proclamando o evangelho de Deus, 15dizendo: «Cumpriu-se o tempo e está próximo o reino de Deus; convertei-vos e acreditai no evangelho»[13].

Chamamento dos primeiros discípulos (Mt 4,18-22; Lc 5,1-11; Jo 1,35-51) – 16Ao passar junto ao mar da Galileia, viu Simão e André, irmão de Simão, lançando as redes no mar, pois eram pescadores. 17E disse-lhes Jesus: «Vinde atrás de mim, e farei com que vos torneis pescadores de homens»[14]. 18E imediatamente, deixando as redes, seguiram-no.

19Avançando um pouco, viu Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, que estavam no barco a consertar as redes, 20e imediatamente os chamou. Deixando o seu pai Zebedeu no barco com os assalariados, partiram atrás dele.

O dia típico de Jesus
(1,21-39)[15]


Na sinagoga de Cafarnaum. Cura de um endemoniado (Lc 4,31-37) – 21Entraram, então, em Cafarnaum. No sábado, tendo entrado na sinagoga, Ele começou imediatamente a ensinar, 22e estavam perplexos com o seu ensinamento, pois ensinava-os como quem tem autoridade e não como os doutores da lei.

23Ora, estava na sinagoga deles[16] um homem com um espírito impuro[17] e gritou, 24dizendo: «O que há entre nós e ti[18], Jesus de Nazaré? Vieste para nos destruir[19]? Sei quem Tu és: o Santo de Deus». 25Jesus repreendeu-o severamente, dizendo: «Cala-te e sai dele»[20]. 26Então o espírito impuro, sacudindo-o com violência e gritando com voz forte, saiu dele. 27Ficaram todos de tal modo estupefactos, que debatiam entre si, dizendo: «Que é isto? Um ensinamento novo, feito com autoridade! Dá ordens aos espíritos impuros e eles obedecem-lhe!». 28E a sua fama espalhou-se imediatamente por toda a parte, em toda a região da Galileia.


Em comunidade. Cura da sogra de Pedro (Mt 8,14s; Lc 4,38s) – 29Tendo saído da sinagoga, foram imediatamente para a casa de Simão e André, com Tiago e João[21]. 30Ora, a sogra de Simão estava deitada com febre, e imediatamente lhe falaram dela. 31Aproximando-se e agarrando-lhe a mão, levantou-a. A febre deixou-a, e ela começou a servi-los.


À porta. Curas e exorcismos (Mt 8,16; Lc 4,40s) – 32Ao cair da tarde, quando o sol se pôs, traziam-lhe todos os que tinham algum mal e os endemoniados. 33A cidade inteira estava reunida junto à porta. 34Curou muitos que tinham algum mal de vários tipos de doenças e expulsou muitos demónios, mas não permitia que os demónios falassem, porque o conheciam.


Com o Pai. Em oração (Mt 4,23; Lc 4,42-44) – 35De manhã muito cedo, ainda escuro, levantou-se, saiu e retirou-se para um lugar deserto, e aí rezava. 36Simão e os que estavam com ele foram à sua procura 37e, quando o encontraram, disseram-lhe: «Todos te procuram!». 38Ele disse-lhes: «Vamos a outra parte, às povoações vizinhas, a fim de proclamar aí também, pois foi para isso que Eu saí».

39E foi, pregando nas sinagogas deles por toda a Galileia e expulsando os demónios.

Jesus,
os pecadores e a Lei (1,40-3,6)


Purificação e cura de um leproso (Mt 8,2-4; Lc 5,12-16) – 40Veio ter com Ele um leproso[22], que, suplicando e caindo de joelhos, lhe disse: «Se quiseres, podes purificar-me». 41E Ele, profundamente compadecido[23], estendendo a sua mão, tocou-lhe e disse-lhe: «Quero: fica purificado!».42E imediatamente a lepra o deixou e ficou purificado. 43Advertindo-o severamente, imediatamente o despediu 44e disse-lhe: «Toma atenção, não digas nada a ninguém! Mas vai mostrar-te ao sacerdote e oferece pela tua purificação o que Moisés prescreveu, como testemunho para eles». 45Mas ele, depois de se ir embora, começou a proclamá-lo incessantemente, e o acontecimento divulgou-se de tal forma que Jesus já não podia entrar abertamente em nenhuma cidade. Ficava fora, em lugares desertos, e de toda a parte vinham ter com Ele.


2 Perdão e cura de um paralítico (Mt 9,1-8; Lc 5,17-26) – 1Tendo entrado de novo em Cafarnaum, depois de alguns dias, ouviu-se dizer que estava em casa. 2Reuniu-se tanta gente que já não havia lugar, nem sequer junto à porta, e Ele anunciava-lhes a palavra[24]. 3Trouxeram-lhe, então, um paralítico transportado por quatro homens[25]. 4Mas, ao não conseguirem levá-lo a Jesus, por causa da multidão, removeram o teto no lugar onde Ele se encontrava e, feita uma abertura, desceram a enxerga onde o paralítico estava deitado. 5Jesus, ao ver a fé deles, disse ao paralítico: «Filho, os teus pecados estão perdoados».

6Estavam ali sentados alguns dos doutores da lei e pensavam nos seus corações: 7«Porque fala este assim? Está a blasfemar! Quem pode perdoar pecados senão Deus somente?». 8E imediatamente, ao perceber no seu espírito que eles assim pensavam, Jesus disse-lhes: «Porque pensais essas coisas nos vossos corações? 9O que é mais fácil: dizer ao paralítico: “Os teus pecados estão perdoados”, ou dizer: “Levanta-te, toma a tua enxerga e anda”? 10Mas, para que saibais que o Filho do Homem[26] tem autoridade para perdoar os pecados sobre a terra» – disse Ele ao paralítico: 11«Eu te digo: levanta-te, toma a tua enxerga e vai para a tua casa». 12Então ele levantou-se e, tomando imediatamente a enxerga, saiu diante de todos, de tal modo que todos estavam espantados e glorificavam Deus, dizendo: «Nunca vimos nada assim!».


Chamamento de Levi. Os publicanos e pecadores (Mt 9,9-13; Lc 5,27-32) – 13Saiu de novo para junto do mar, e toda a multidão ia ter com Ele, e ensinava-os. 14Ao passar, viu Levi[27], filho de Alfeu, sentado no posto de cobrança de impostos, e disse-lhe: «Segue-me». E ele, levantando-se, seguiu-o.

15E aconteceu que, estando Ele reclinado à mesa na casa dele[28], muitos publicanos e pecadores estavam também reclinados à mesa com Jesus e os seus discípulos. Eram, de facto, muitos e seguiam-no. 16Os doutores da lei, da parte dos fariseus, ao verem que comia com os pecadores e publicanos, diziam aos discípulos dele: «Porque come com os publicanos e pecadores?». 17Ouvindo isto, Jesus disse-lhes: «Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas os que têm algum mal. Não vim chamar os justos, mas os pecadores».


O jejum (Mt 9,14s; Lc 5,33-35) – 18Estavam os discípulos de João e os fariseus a jejuar; vieram e disseram-lhe: «Por que razão os discípulos de João e os discípulos dos fariseus jejuam, e os teus discípulos não jejuam?». 19Disse-lhes Jesus: «Poderão os convidados da boda[29] jejuar, enquanto o noivo está com eles? Durante o tempo em que têm o noivo consigo, não podem jejuar. 20Mas dias virão em que o noivo lhes será tirado e, então naquele dia[30], hão de jejuar».


O velho e o novo (Mt 9,16s; Lc 5,36-38) – 21«Ninguém cose remendo de tecido cru[31] em veste velha, senão o acrescento novo repuxa o velho e o rasgão torna-se pior. 22E ninguém deita vinho novo em odres velhos, senão o vinho romperá os odres e perder-se-á o vinho e também os odres. Pelo contrário, vinho novo em odres novos»[32].


Espigas arrancadas ao sábado (Mt 12,1-8; Lc 6,1-5) – 23Aconteceu que, ao passar Ele num sábado pelas searas, os seus discípulos começaram a arrancar espigas enquanto caminhavam[33]. 24Os fariseus, porém, diziam-lhe: «Vê! Porque fazem ao sábado o que não é permitido?». 25Ele disse-lhes: «Nunca lestes o que fez David quando teve necessidade e sentiu fome, ele e os que estavam com ele? 26Como entrou na casa de Deus, no tempo do sumo-sacerdote Abiatar[34], e comeu os pães da oferenda[35], que não é permitido comer senão aos sacerdotes, e os deu também aos que estavam com ele?».

27E dizia-lhes: «O sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado. 28Assim, o Filho do Homem é senhor também do sábado»[36].


3 Cura ao sábado. Decisão de matar Jesus (Mt 12,9-14; Lc 6,6-11) – 1Entrou de novo na sinagoga, e estava lá um homem que tinha a mão paralisada[37]. 2Observavam-no para verem se o curaria ao sábado, a fim de poderem acusá-lo. 3Disse, então, ao homem que tinha a mão paralisada: «Levanta-te e vem para o meio»[38]. 4E disse-lhes: «É permitido ao sábado fazer bem ou fazer mal, salvar uma vida ou matá-la?». Eles, porém, ficaram calados. 5Então, olhando-os com ira, entristecido pela dureza dos seus corações, disse ao homem: «Estende a mão». Ele estendeu-a, e a sua mão ficou recuperada.

6Os fariseus, ao sair dali, reuniram-se imediatamente com os herodianos em conselho contra Ele[39], a fim de o matar.

Jesus forma uma nova família (3,7-35)


A multidão junto ao lago (Mt 4,23-25; 12,15s; Lc 6,17-19) – 7Jesus retirou-se com os seus discípulos para junto do mar, e seguiu-o uma grande multidão da Galileia. Também da Judeia, 8de Jerusalém, da Idumeia e de além Jordão, da região de Tiro e de Sídon, veio ter com Ele uma grande multidão, ao ouvir tudo o que fazia. 9Disse, então, aos seus discípulos que lhe preparassem um pequeno barco, por causa da multidão, para que o não apertassem. 10De facto, tinha curado muitos; por isso, todos os que tinham tormentos lançavam-se sobre Ele, para lhe tocar. 11E os espíritos impuros, quando o viam, caíam diante dele e gritavam dizendo: «Tu és o Filho de Deus». 12Mas Ele repreendia-os severamente para que não o dessem a conhecer[40].

Instituição dos Doze (Mt 10,1-4; Lc 6,12-16) – 13Subiu, então, para o monte e chamou a si aqueles que Ele queria, e foram ter com Ele[41]. 14Constituiu Doze, aos quais também chamou apóstolos[42], para estarem com Ele e para os enviar a proclamar 15e terem autoridade para expulsar os demónios[43]. 16Constituiu, pois, os Doze[44]: Simão, a quem pôs o nome de Pedro;17Tiago, filho de Zebedeu, e João, o irmão de Tiago, aos quais pôs o nome Boanerges, que significa «filhos do trovão»; 18André, Filipe, Bartolomeu, Mateus, Tomé, Tiago, filho de Alfeu, Tadeu, Simão, o Cananeu, 19e Judas Iscariotes, que o entregou[45].

20Foi, então, para casa, e a multidão juntou-se de novo, ao ponto de eles nem sequer pão poderem comer.


Reação dos familiares de Jesus – 21Tendo ouvido isto, os seus familiares[46] saíram para o agarrarem, pois diziam: «Está fora de si!».


Reação dos doutores da lei (Mt 12,24-29.31s; Lc 11,15-22; 12,10) – 22Os doutores da lei que tinham descido de Jerusalém diziam: «Ele tem Belzebu!»[47] e ainda: «É pelo chefe dos demónios que expulsa os demónios!». 23Mas Ele, chamando-os a si, dizia-lhes em parábolas: «Como pode Satanás expulsar Satanás? 24Se um reino estiver dividido contra si mesmo, tal reino não pode subsistir! 25E se uma casa estiver dividida contra si mesma, tal casa não poderá subsistir. 26Ora, se Satanás se levanta contra si mesmo e se divide, não pode subsistir; pelo contrário, chegou ao fim. 27Ninguém pode entrar na casa daquele que é forte e roubar os seus bens, se primeiro não amarrar aquele que é forte; e, então, roubar-lhe-á a casa[48]. 28Amen vos digo: tudo será perdoado aos filhos dos homens, os pecados e as blasfémias que tiverem proferido; 29mas aquele que blasfemar contra o Espírito Santo jamais terá perdão; é réu de pecado eterno». 30Porque diziam: «Tem um espírito impuro»[49].


A verdadeira família de Jesus (Mt 12,46-50; Lc 8,19-21) – 31Chegaram, então, a sua mãe e os seus irmãos e, permanecendo fora, mandaram chamá-lo. 32A multidão estava sentada em volta dele. E disseram-lhe: «Eis que a tua mãe, os teus irmãos e as tuas irmãs[50] estão lá fora à tua procura». 33Mas Ele, em resposta, disse-lhes: «Quem é a minha mãe e os meus irmãos?». 34E, olhando em redor para os que estavam sentados em círculo à sua volta, disse: «Eis a minha mãe e os meus irmãos! 35Pois aquele que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe»[51].

Revelação em parábolas (4,1-34)


4 Parábola do semeador (Mt 13,1-9; Lc 8,4-8) – 1E de novo começou a ensinar junto ao mar. Reuniu-se junto dele uma tão grande multidão que Ele teve de entrar num barco e sentar-se, no mar. Toda a multidão estava em terra, junto ao mar. 2Ensinava-lhes muitas coisas em parábolas e dizia-lhes no seu ensinamento:

3«Ouvi! Eis que saiu o semeador a semear. 4E aconteceu que, ao semear, uma parte caiu junto ao caminho: vieram as aves e devoraram-na. 5Outra parte caiu em terreno pedregoso, onde não havia muita terra, e imediatamente germinou, por não ter profundidade de terra; 6mas, quando despontou o sol, queimou-se e, por não ter raiz, secou. 7Outra parte caiu entre os espinhos: os espinhos cresceram, sufocaram-na e não deu fruto. 8Outra parte caiu em terra boa e deu fruto: germinando e crescendo, produziu uma, trinta; outra, sessenta; e outra, cem». 9E dizia: «Quem tem ouvidos para ouvir, ouça».


Porque fala Jesus em parábolas (Mt 13,10-17; Lc 8,9s) – 10Quando ficou sozinho, os que estavam à sua volta com os Doze interrogavam-no acerca das parábolas. 11E dizia-lhes: «A vós foi dado o mistério do reino de Deus, mas àqueles que estão fora tudo acontece em parábolas,

12para que, olhando, olhem

e não vejam,

ouvindo, ouçam e não entendam,

não aconteça que voltem atrás

e lhes seja perdoado»[52].


Explicação da parábola (Mt 13,18-23; Lc 8,11-15) – 13E disse-lhes: «Não compreendeis esta parábola; como haveis de perceber todas as parábolas? 14O semeador semeia a palavra[53]. 15Os que estão junto ao caminho, onde a palavra é semeada, são aqueles que ouvem, mas imediatamente vem Satanás e arranca a palavra neles semeada. 16Os que foram semeados em terreno pedregoso são aqueles que, quando ouvem a palavra, a recebem imediatamente com alegria, 17mas, como não têm raiz em si mesmos, duram pouco[54]; ao surgir uma tribulação ou perseguição por causa da palavra, imediatamente caem por motivo de escândalo.18Outros são semeados entre os espinhos: estes são os que ouviram a palavra, 19mas as preocupações do mundo, a sedução da riqueza e os desejos acerca das restantes coisas, entrando neles, sufocam a palavra, e não produz fruto. 20E os que são semeados em boa terra são aqueles que ouvem a palavra, a acolhem e dão fruto: um, trinta; outro, sessenta; e outro, cem».


Parábolas da candeia e da medida (Lc 8,16-18) – 21E dizia-lhes: «Traz-se a candeia para ser colocada debaixo do alqueire ou debaixo da cama? Não será para ser colocada no candelabro? 22Pois nada há escondido que não se torne visível, nem nada aconteceu em secreto que não venha a ser visível. 23Se alguém tem ouvidos para ouvir, ouça».

24Dizia-lhes ainda: «Tomai cuidado com o que ouvis! Com a medida com que medirdes sereis medidos e vos será acrescentado. 25Pois àquele que tem, ser-lhe-á dado; e àquele que não tem, até o que tem lhe será tirado».


Parábola da semente que cresce por si – 26E dizia: «Assim é o reino de Deus: como um homem que, tendo lançado a semente à terra, 27dorme e levanta-se, de noite e de dia, e a semente germina e cresce, sem ele saber como. 28A terra produz fruto por si mesma: primeiro erva, a seguir espiga e depois trigo abundante na espiga. 29E, quando o fruto está pronto, lança-se imediatamente a foice[55], porque chegou a ceifa».


Parábola do grão de mostarda (Mt 13,31s; Lc 13,18s) – 30E dizia: «Como havemos de comparar o reino de Deus ou em que parábola o podemos apresentar? 31É como um grão de mostarda que, quando é semeado na terra, é a mais pequena de todas as sementes que há sobre a terra; 32mas, quando é semeado, cresce e torna-se a maior de todas as plantas da horta e desenvolve grandes ramos, de tal modo que as aves do céu podem habitar debaixo da sua sombra».


Conclusão (Mt 13,34) – 33E, com muitas parábolas deste género, anunciava-lhes a palavra[56], conforme eram capazes de entender. 34Nada lhes dizia sem ser em parábolas, mas a sós tudo explicava aos seus discípulos.


Revelação em obras
O poder de Jesus sobre as forças do mal
(4,35-6,6)[57]


A tempestade acalmada (Mt 8,18.23-27; Lc 8,22-25) – 35E disse-lhes, naquele dia, ao cair da tarde: «Atravessemos para a outra margem». 36E, deixando a multidão, levaram-no no barco tal como estava[58]. Havia outros barcos com ele[59]. 37Surgiu, então, uma grande tempestade de vento, e as ondas arremessavam-se contra o barco, de tal modo que o barco já se estava a encher de água. 38Ele estava na popa a dormir, com a cabeça sobre a almofada. Acordaram-no, então, e disseram-lhe: «Mestre, não te importa que morramos?». 39E Ele, levantando-se, repreendeu severamente o vento e disse ao mar: «Cala-te! Fica quieto». O vento amainou e fez-se grande bonança. 40Depois disse-lhes: «Porque estais assustados? Ainda não tendes fé?». 41Sentiram um grande temor e diziam uns aos outros: «Quem é este que até o vento e o mar lhe obedecem?».

5 Cura do endemoniado de Gérasa (Mt 8,28-34; Lc 8,26-39) – 1Foram, então, para a outra margem do mar, para a região dos gerasenos[60]. 2Ao sair do barco, veio imediatamente ao seu encontro, saído dos sepulcros, um homem com um espírito impuro[61], 3que tinha a sua morada nos sepulcros. Já ninguém conseguia prendê-lo, nem com correntes, 4pois estivera preso muitas vezes com grilhões e correntes, mas ele rebentava os grilhões e despedaçava as correntes. Ninguém era capaz de o dominar. 5Andava sempre, noite e dia, nos sepulcros e nos montes, a gritar e a ferir-se com pedras. 6Ao ver Jesus de longe, correu e prostrou-se diante dele 7e, gritando com voz forte, disse: «Que há entre mim e ti[62], Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Conjuro-te por Deus: não me atormentes!». 8De facto, Jesus dizia-lhe: «Espírito impuro, sai do homem»[63]. 9E interrogou-o: «Qual é o teu nome?». Ele disse-lhe: «O meu nome é Legião, porque somos muitos»[64]. 10E suplicava-lhe com insistência que não os enviasse para fora da região. 11Ora, estava ali junto ao monte uma grande vara de porcos a pastar, 12e suplicaram-lhe, dizendo: «Manda-nos para os porcos, para que entremos neles».13Ele permitiu-lhes. E, ao saírem, os espíritos impuros entraram nos porcos, e a vara lançou-se pelo precipício para o mar. Eram cerca de dois mil e afogaram-se no mar. 14Os que os apascentavam fugiram e foram anunciá-lo para a cidade e para os campos; e vieram para ver o que tinha acontecido.15Foram ter com Jesus e viram o endemoniado sentado, vestido e de perfeito juízo, o mesmo que tivera a Legião, e ficaram com medo.16Os que tinham visto explicaram-lhes como tinha aquilo acontecido ao endemoniado e o que se passara com os porcos. 17Começaram, então, a suplicar-lhe que se afastasse do seu território. 18E, quando Ele estava a subir para o barco, o que tinha sido endemoniado suplicava-lhe que o deixasse ficar com Ele. 19Não lho consentiu, mas disse-lhe: «Vai para a tua casa, para junto dos teus, e anuncia-lhes quanto o Senhor te fez e a misericórdia que teve para contigo». 20Então ele partiu e começou a proclamar na Decápole o quanto Jesus lhe fizera, e todos ficavam admirados.


Cura da mulher que sofria de hemorragias e ressurreição da filha de Jairo (Mt 9,18-26; Lc 8,40-56) – 21Depois de Jesus ter atravessado no barco de novo para a outra margem, reuniu-se junto dele uma numerosa multidão. Ele estava junto ao mar. 22Veio, então, um dos chefes da sinagoga, de nome Jairo. Ao vê-lo, caiu a seus pés 23e suplicou-lhe com insistência, dizendo: «A minha filhinha está a morrer! Vem impor-lhe as mãos, para que seja salva e viva». 24Foi, então, com ele, seguido por uma numerosa multidão, que o apertava.

25Entretanto, uma mulher, que tinha um fluxo de sangue havia doze anos[65] 26e que muito padecera nas mãos de muitos médicos, tendo gasto tudo o que tinha sem qualquer proveito – pelo contrário, piorava cada vez mais –, ao ouvir falar de Jesus, veio por trás, entre a multidão, e tocou na sua veste, 28pois dizia: «Se tocar nas suas vestes, ficarei salva». 29E imediatamente se lhe estancou o fluxo de sangue e percebeu no corpo que estava curada do tormento. 30Jesus, ao ter-se imediatamente apercebido do poder que dele saíra, voltando-se para a multidão, dizia: «Quem tocou nas minhas vestes?». 31Diziam-lhe os seus discípulos: «Vês a multidão que te aperta e perguntas: “Quem me tocou?”». 32Mas Ele olhava em redor, para ver aquela que o tinha feito. 33A mulher, com medo e a tremer, sabendo o que lhe tinha acontecido, veio, caiu diante dele e disse-lhe toda a verdade. 34Ele disse-lhe: «Filha, a tua fé te salvou. Vai em paz e fica curada do teu tormento».

35Ainda Ele falava, vieram da casa do chefe da sinagoga, dizendo: «A tua filha morreu. Porque incomodas ainda o Mestre?». 36Mas Jesus, ao escutar o que diziam, disse ao chefe da sinagoga: «Não tenhas medo! Acredita[66] apenas». 37E não deixou que ninguém o acompanhasse[67], a não ser Pedro, Tiago e João, o irmão de Tiago[68]. 38Ao chegarem à casa do chefe da sinagoga, viu um alvoroço, com gente[69] que chorava e soltava muitos gritos de dor. 39Ao entrar, disse-lhes: «Porque estais alvoroçados e chorais? A criança não morreu, mas está a dormir». 40Riam-se dele. Mas Ele, depois de expulsar todos, tomou consigo o pai e a mãe da criança e os que estavam com Ele e entrou no local onde se encontrava a criança. 41Agarrando a mão da criança, disse-lhe: «Talitha kum», que significa: «Menina, Eu te digo: levanta-te». 42A menina levantou-se imediatamente e começou a andar, pois tinha doze anos. E eles ficaram espantados[70], com grande assombro. 43Admoestou-os, então, com insistência, para que ninguém tivesse conhecimento disto, e disse para lhe darem de comer.


6 Jesus desprezado em Nazaré (Mt 13,53-58; Lc 4,16-30) – 1Saiu, então, dali e foi para a sua terra natal, e os seus discípulos seguiram-no[71]. 2Quando chegou o sábado, começou a ensinar na sinagoga. Muitos ouvintes estavam perplexos e diziam: «De onde lhe vêm todas estas coisas? Que sabedoria é esta que lhe foi dada? E que poderes são estes que se manifestam pelas suas mãos[72]? 3Não é este o carpinteiro, o filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? E não estão as suas irmãs aqui entre nós?». E escandalizavam-se com Ele[73]. 4Então Jesus dizia-lhes: «Um profeta não é desprezado senão na sua terra natal, entre os seus parentes e na sua casa». 5E não podia fazer ali nenhuma ação poderosa[74]; apenas curou alguns enfermos, impondo-lhes as mãos. 6Estava admirado com a sua falta de fé. E percorria as povoações em redor a ensinar.


Uma missão começa (os Doze)
e outra termina (o Batista)
(6,7-33)


Missão dos Doze (Mt 9,35; 10,1.5-14; Lc 9,1-6) – 7Chamou, então, a si os Doze e começou a enviá-los dois a dois. Deu-lhes autoridade sobre os espíritos impuros 8e ordenou-lhes que nada levassem para o caminho, a não ser um único bastão: nem pão, nem bolsa, nem dinheiro na cintura[75]; 9mas que tivessem as sandálias calçadas e que não vestissem duas túnicas[76]. 10E dizia-lhes: «Quando entrardes numa casa, permanecei lá até de lá sairdes; 11e se num lugar não vos acolherem nem vos ouvirem, ao sairdes de lá, sacudi o pó debaixo dos vossos pés como testemunho contra eles». 12Então, tendo saído, proclamavam para que se convertessem. 13Expulsavam muitos demónios e ungiam com azeite muitos enfermos e curavam-nos[77].


Martírio de João Batista (Mt 14,1-12; Lc 9,7-9; 3,19s) – 14O rei Herodes ouviu falar de Jesus[78], pois o seu nome tornara-se conhecido e diziam: «João Batista ressuscitou dos mortos, e por isso os poderes atuam nele». 15Outros diziam: «É Elias». E outros diziam: «É profeta, como um dos profetas». 16Mas Herodes, ao ouvir isto, dizia: «João, a quem eu decapitei, foi ele que ressuscitou».

17De facto, o próprio Herodes mandara prender João[79] e acorrentá-lo na prisão, por causa de Herodíade, a mulher do seu irmão Filipe, que ele desposara[80]. 18Pois João dizia a Herodes: «Não te é permitido ter a mulher do teu irmão». 19Ora, Herodíade guardava-lhe rancor e queria matá-lo, mas não podia, 20pois Herodes temia João, sabendo que era um homem justo e santo, e protegia-o. Quando o ouvia, ficava muito perturbado, mas ouvia-o com gosto. 21Entretanto chegou o dia oportuno, quando Herodes, no seu aniversário, realizou uma ceia para os seus nobres, oficiais e principais personalidades da Galileia. 22Tendo entrado a filha de Herodíade[81], dançou e agradou a Herodes e aos que estavam reclinados à mesa. Disse o rei à jovem: «Pede-me o que desejares, e eu to darei». 23E jurou-lhe muitas vezes: «Aquilo que me pedires, dar-te-ei, até metade do meu reino»[82]. 24Saindo, perguntou à mãe: «Que hei de pedir?». Ela respondeu: «A cabeça de João Batista». 25E, entrando imediatamente e correndo para o rei[83], fez o pedido, dizendo: «Quero que me dês agora mesmo, numa bandeja, a cabeça de João Batista». 26O rei ficou muito consternado, mas, por causa dos juramentos e dos que estavam reclinados à mesa, não quis recusar-lho. 27E imediatamente o rei enviou um guarda, ordenando-lhe que trouxesse a cabeça de João. Ele foi, decapitou-o na prisão 28e trouxe a sua cabeça numa bandeja; deu-a à jovem, e a jovem deu-a à sua mãe. 29Quando os seus discípulos o souberam, foram buscar o seu cadáver e depositaram-no num sepulcro.

Regresso dos Doze (Lc 9,10; 10,17) – 30Os apóstolos[84] reuniram-se junto de Jesus e anunciaram-lhe tudo quanto tinham feito e ensinado. 31E Ele disse-lhes: «Vinde a sós para um lugar deserto e descansai um pouco». De facto, eram tantos os que chegavam e partiam que eles nem tinham tempo para comer. 32Partiram, então, a sós no barco, para um lugar deserto. 33Porém, viram-nos partir e muitos perceberam para onde iam[85]; e de todas as cidades para lá acorreram a pé e chegaram antes deles.


Jesus alimenta judeus e pagãos
(6,34-8,26)[86]


Primeira multiplicação dos pães (Mt 14,13-21; Lc 9,11-17; Jo 6,1-13) – 34Ao sair, viu uma numerosa multidão e compadeceu-se profundamente deles, porque eram como ovelhas que não têm pastor[87], e começou a ensinar-lhes muitas coisas. 35Como a hora já estava adiantada, os seus discípulos foram ter com Ele e diziam: «O lugar é deserto e a hora já vai adiantada. 36Manda-os embora, para irem aos campos e povoações em redor comprar para si alguma coisa para comer». 37Mas Ele, em resposta, disse-lhes: «Dai-lhes vós de comer». Disseram-lhe: «Havemos de ir comprar duzentos denários de pão para lhes darmos de comer?». 38Ele disse-lhes: «Quantos pães tendes? Ide ver». E, tendo-o sabido, disseram: «Cinco, e dois peixes». 39Ordenou-lhes, então, que os fizessem reclinar a todos, por grupos de comensais[88], sobre a erva verde[89]. 40Eles reclinaram-se, por grupos de cem e de cinquenta. 41Tomando, então, os cinco pães e os dois peixes e levantando os olhos ao céu, pronunciou a bênção, partiu os pães e deu-os aos seus discípulos, para que os distribuíssem. E dividiu por todos os dois peixes[90].42Todos comeram e ficaram saciados,43e recolheram os pedaços: doze cestas cheias de pão e de peixe[91]. 44Os que comeram os pães eram cinco mil homens.


Jesus caminha sobre as águas (Mt 14,22-33; Jo 6,16-21) – 45E imediatamente obrigou os seus discípulos a entrar no barco e a ir à sua frente para a outra margem, para Betsaida, enquanto Ele despedia a multidão. 46Depois de os ter despedido, foi para o monte rezar.

47Ao cair da tarde, o barco estava no meio do mar e Ele, sozinho, em terra. 48Vendo-os atormentados a remar, pois o vento lhes era contrário, pela quarta vigília da noite foi ter com eles, caminhando sobre o mar, e queria passar à sua frente. 49Mas eles, ao vê-lo caminhar sobre o mar, pensaram que era um fantasma e começaram a gritar; 50de facto, todos o tinham visto e ficaram muito perturbados. Mas Ele imediatamente falou com eles e disse-lhes: «Tende coragem, sou Eu; não tenhais medo!». 51Subiu, então, para o barco, para junto deles, e o vento amainou. No seu íntimo, ficaram extremamente espantados, 52pois não tinham entendido o episódio dos pães; pelo contrário, o seu coração estava endurecido.


Curas em Genesaré (Mt 14,34-36) – 53Feita a travessia, chegaram a terra em Genesaré e aportaram. 54Ao saírem do barco, imediatamente o reconheceram; 55percorreram toda aquela região e começaram a trazer em enxergas, para onde ouviam dizer que Ele estava, os que tinham algum mal. 56E onde quer que Ele entrasse, nas povoações, cidades ou campos, colocavam os que estavam doentes nas praças públicas e suplicavam-lhe que os deixasse tocar na franja da sua capa. E todos quantos lhe tocavam eram salvos.


7 Jesus e as tradições farisaicas (Mt 15,1-9) – 1Reuniram-se junto dele os fariseus e alguns dos doutores da lei vindos de Jerusalém. 2Ao verem que alguns dos seus discípulos comiam os pães com mãos impuras, isto é, sem as lavar, 3– de facto, os fariseus e todos os judeus não comem sem terem lavado as mãos até ao punho[92], agarrados à tradição dos antigos[93], 4e, ao voltar da praça pública, não comem sem se terem lavado; e agarram-se por tradição a muitas outras coisas, como a lavagem de copos, vasos, utensílios de cobre e camas[94] – 5os fariseus e doutores da lei interrogaram-no: «Por que razão não procedem[95] os teus discípulos de acordo com a tradição dos antigos, mas comem o pão com mãos impuras?». 6Ele, porém, disse-lhes: «Bem profetizou Isaías acerca de vós, hipócritas, como está escrito:

Este povo honra-me com os lábios,

mas o coração deles está longe

de mim;

7em vão me prestam culto,

ensinando doutrinas que são

mandamentos de homens[96].

8Tendo abandonado o mandamento de Deus, estais agarrados à tradição dos homens».

9E dizia-lhes: «Que bem sabeis rejeitar o mandamento de Deus, para manterdes a vossa tradição! 10Pois Moisés disse: Honra o teu pai e a tua mãe[97] e Quem maldisser o pai ou a mãe seja punido com a morte[98]; 11mas vós dizeis: “Se alguém disser ao pai ou à mãe: ‘aquilo com que poderias ser ajudado por mim é korbán’ – isto é, oferta a Deus –”[99], 12já não lhe permitis fazer nada pelo pai ou pela mãe. 13Tornais inválida a palavra de Deus com a vossa tradição, que transmitis, e fazeis muitas outras coisas semelhantes».


Ensinamento sobre o puro e o impuro (Mt 15,10-20) – 14E, chamando de novo a si a multidão, dizia-lhes: «Ouvi-me todos e entendei: 15nada há fora do homem que, entrando nele, o possa tornar impuro. Pelo contrário, as coisas que saem do homem é que tornam o homem impuro». [16][100]

17Quando entrou em casa, deixando a multidão, os seus discípulos interrogaram-no sobre a parábola. 18Ele disse-lhes: «Será que também vós estais privados de inteligência? Não compreendeis que tudo o que de fora entra no homem não pode torná-lo impuro, 19pois não entra no seu coração, mas no ventre, e depois sai para a fossa?». Assim, Ele tornou puros todos os alimentos. 20E dizia: «O que sai do homem é que torna o homem impuro, 21pois é de dentro, do coração dos homens, que saem os maus pensamentos, promiscuidades, roubos, homicídios, 22adultérios, ganâncias, maldades, mentira, devassidão, inveja[101], blasfémia[102], soberba, insensatez. 23Todas estas coisas más saem de dentro e tornam o homem impuro».


A fé da mulher sirofenícia e cura da sua filha (Mt 15,21-28) – 24Retirando-se dali, partiu para as regiões de Tiro[103]. Tendo entrado numa casa, não queria que ninguém o soubesse, mas não foi possível passar despercebido. 25Imediatamente uma mulher cuja pequena filha tinha um espírito impuro, tendo ouvido falar dele, veio cair a seus pés. 26A mulher era grega[104], sirofenícia de nascimento, e pedia-lhe que expulsasse o demónio de sua filha. 27Ele dizia-lhe: «Deixa que primeiro sejam saciados os filhos, pois não está bem tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos»[105]. 28Mas ela, em resposta, disse-lhe: «Senhor, também os cachorrinhos, debaixo da mesa, comem das migalhas das crianças». 29Ele disse-lhe: «Por causa dessas palavras, vai; o demónio saiu da tua filha». 30E, tendo ela partido para a sua casa, encontrou a menina recostada na cama; o demónio tinha saído.


Cura de um surdo-gago na Decápole – 31Saindo de novo da região de Tiro e passando por Sídon, foi na direção do mar da Galileia, atravessando os territórios da Decápole. 32Trouxeram-lhe, então, um surdo que mal conseguia falar, e suplicaram-lhe que lhe impusesse a mão. 33Afastando-o da multidão, a sós, pôs-lhe os dedos nas orelhas e com saliva tocou-lhe na língua[106]; 34e, levantando os olhos ao céu, suspirou e disse-lhe: «Effathá», que significa «Abre-te». 35De imediato se lhe abriram os ouvidos, soltou-se-lhe a corrente que lhe prendia a língua e começou a falar corretamente. 36Jesus admoestou-os para que não dissessem nada a ninguém; mas, quanto mais os admoestava, mais intensamente eles o proclamavam. 37Profundamente perplexos, diziam: «Tudo o que faz é bem feito: faz os surdos ouvir e os mudos falar».


8 Segunda multiplicação dos pães (Mt 15,32-39) – 1Naqueles dias, havendo de novo uma numerosa multidão, que não tinha o que comer, Jesus chamou a si os discípulos e disse-lhes: 2«Estou profundamente compadecido da multidão, porque há já três dias que permanecem junto a mim e não têm o que comer. 3Se os despedir em jejum para as suas casas, desfalecerão no caminho, pois alguns deles vieram de longe». 4Responderam-lhe os seus discípulos: «Como poderá alguém saciá-los com pães aqui, neste deserto?». 5Perguntou-lhes Ele: «Quantos pães tendes?». Eles disseram: «Sete». 6Ordenou, então, à multidão que se reclinasse sobre a terra. E, tomando os sete pães e dando graças, partiu-os e deu-os aos seus discípulos para que os distribuíssem, e eles distribuíram-nos à multidão. 7Tinham também alguns pequenos peixes. Pronunciando, então, a bênção sobre eles, disse que os distribuíssem também. 8Comeram e ficaram saciados; e recolheram sete cestos dos pedaços que sobraram. 9Eram cerca de quatro mil. Então despediu-os 10e, subindo imediatamente para o barco com os seus discípulos, foi para a região de Dalmanutá[107].

Os fariseus pedem um sinal do céu (Mt 16,1-4) – 11Saíram, então, os fariseus e começaram a debater com Ele, pedindo-lhe um sinal do céu, para o pôr à prova. 12E Ele, suspirando profundamente[108], disse: «Porque procura esta geração um sinal? Amen vos digo: nenhum sinal será dado a esta geração!». 13E, deixando-os, embarcou de novo e partiu para a outra margem.


O fermento dos fariseus e de Herodes. Incompreensão dos discípulos (Mt 16,5-12) – 14Esqueceram-se de levar pão e não tinham senão um único pão consigo no barco. 15E ele admoestava-os, dizendo: «Vede bem: tomai cuidado[109] com o fermento dos fariseus e com o fermento de Herodes!». 16Mas eles discutiam uns com os outros, porque não tinham pão. 17Ele, sabendo-o, disse-lhes: «Porque discutis por não terdes pão? Ainda não compreendeis nem entendeis? Tendes o vosso coração endurecido? 18Tendo olhos não vedes, e tendo ouvidos não ouvis[110]? Não vos lembrais, 19quando parti os cinco pães para os cinco mil, de quantas cestas cheias de pedaços recolhestes?». Disseram-lhe: «Doze». 20«E quando parti os sete para os quatro mil, quantos cestos cheios de pedaços recolhestes?». Disseram-lhe: «Sete». 21Dizia-lhes, então: «Ainda não entendeis?».


O cego de Betsaida – 22Foram, então, para Betsaida e trouxeram-lhe um cego, suplicando-lhe que lhe tocasse. 23Tomando o cego pela mão, levou-o para fora da povoação. E, tendo-lhe posto saliva nos olhos[111] e impondo-lhe as mãos, perguntou-lhe: «Vês alguma coisa?». 24Ao voltar a ver, dizia: «Vejo os homens; vejo-os como árvores a andar». 25Em seguida, impôs-lhe de novo as mãos sobre os olhos, e começou a ver claramente; ficou restabelecido e via tudo com nitidez. 26Enviou-o, então, para sua casa, dizendo: «Não entres sequer na povoação».

II
O CAMINHO PARA A MORTE
E RESSURREIÇÃO
(8,27-16,8)


A. O CAMINHO
(8,27-10,52)


Declaração messiânica de Pedro (Mt 16,13-20; Lc 9,18-21) – 27Jesus saiu com os seus discípulos para as povoações de Cesareia de Filipe. E, no caminho, interrogava os seus discípulos, dizendo-lhes: «Quem dizem os homens que Eu sou?». 28Eles disseram-lhe[112]: «João Batista; outros, Elias; e outros, um dos profetas». 29E Ele interrogava-os: «Vós, porém, quem dizeis que Eu sou?». Respondendo, Pedro disse-lhe: «Tu és o Cristo». 30Então repreendeu-os severamente para que não falassem acerca dele a ninguém.


Primeiro anúncio da paixão e ressurreição, e reação de Pedro (Mt 16,21-23; Lc 9,22) – 31E começou a ensinar-lhes: «É necessário o Filho do Homem sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos chefes dos sacerdotes e pelos doutores da lei, ser morto e, depois de três dias, ressuscitar». 32E dizia-lhes isto[113] com clareza.

Então Pedro, tomando-o à parte, começou a repreendê-lo severamente. 33Mas Ele, voltando-se e vendo os seus discípulos, repreendeu Pedro severamente e disse: «Vai para trás de mim[114], Satanás, porque não tens em mente as coisas de Deus, mas as dos homens!».


Condições para seguir Jesus (Mt 16,24-28; Lc 9,23-27) – 34E, chamando a si a multidão com os seus discípulos, disse-lhes: «Se alguém quer seguir atrás de mim, renegue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. 35Pois aquele que quiser salvar a sua vida há de perdê-la, mas aquele que perder a sua vida por causa de mim e do evangelho há de salvá-la. 36Pois que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se arruinar a sua vida? 37Pois que daria um homem em troca da sua vida? 38Portanto, aquele que se envergonhar de mim e das minhas palavras nesta geração adúltera e pecadora, também o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na glória do seu Pai, com os anjos santos».


91E dizia-lhes: «Amen vos digo: alguns dos que aqui estão não provarão a morte[115], até que vejam o reino de Deus chegar com poder».


Transfiguração de Jesus (Mt 17,1-9; Lc 9,28-36) – 2Seis dias depois, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e fê-los subir, a sós, a um alto monte. Transfigurou-se, então, diante deles: 3as suas vestes tornaram-se resplandecentes, tão brancas que nenhum lavadeiro sobre a terra as poderia assim branquear. 4Apareceu-lhes, então, Elias com Moisés; estavam a conversar com Jesus.

5Em resposta, Pedro disse a Jesus: «Rabi, que bom é nós estarmos aqui! Façamos três tendas: uma para ti, uma para Moisés e uma para Elias». 6Na verdade, não sabia o que havia de responder, pois estavam com muito medo. 7Surgiu, então, uma nuvem que os cobriu de sombra, e da nuvem surgiu uma voz: «Este é o meu Filho amado: escutai-o!».8Mas de repente, olhando em redor, já não viram ninguém, a não ser Jesus, sozinho com eles. 9E, enquanto eles desciam do monte, admoestou-os para que não contassem a ninguém o que tinham visto, senão quando o Filho do Homem ressuscitasse dos mortos. 10Eles retiveram para si estas palavras, debatendo o que seria ressuscitar dos mortos.


O regresso de Elias (Mt 17,10-13) – 11E interrogavam-no, dizendo: «Porque dizem os doutores da lei que é necessário que Elias venha primeiro?». 12Ele disse-lhes: «Elias, de facto, ao vir primeiro, restaura todas as coisas[116]; mas, então, como é que está escrito acerca do Filho do Homem que há de sofrer muito e ser desprezado[117]? 13Mas digo-vos que também Elias veio, e fizeram-lhe tudo o que quiseram, tal como está escrito acerca dele»[118].


Cura de um jovem endemoniado (Mt 17,14-21; Lc 9,37-42) – 14Ao irem ter com os discípulos, viram uma numerosa multidão à sua volta e uns doutores da lei a debater com eles. 15E imediatamente toda a multidão, ao vê-lo, ficou estupefacta e correu a saudá-lo. 16Ele interrogou-os: «O que estais a debater com eles?». 17Respondeu-lhe alguém da multidão: «Mestre, trouxe-te o meu filho, que tem um espírito mudo. 18Quando se apodera dele, atira-o ao chão, e ele começa a espumar, range os dentes e fica rígido. Disse aos teus discípulos que o expulsassem, mas não foram capazes». 19Ele, em resposta, disse-lhes: «Ó geração descrente! Até quando estarei junto de vós? Até quando vos hei de suportar? Trazei-mo». 20E eles levaram-lho. Ao vê-lo, imediatamente o espírito sacudiu com violência[119] o menino, que, caindo por terra, se revolvia espumando. 21Interrogou, então, o pai dele: «Há quanto tempo isto lhe acontece?». Ele disse: «Desde a infância. 22E muitas vezes o lançou também ao fogo e à água, para o matar. Mas se podes fazer alguma coisa, ajuda-nos, compadece-te de nós!». 23Jesus disse-lhe: «Se podes? Tudo é possível àquele que acredita». 24Imediatamente o pai do menino, bradando, dizia[120]: «Acredito! Ajuda-me na minha falta de fé!». 25Ao ver que uma multidão acorria em massa, Jesus repreendeu severamente o espírito impuro, dizendo-lhe: «Espírito mudo e surdo, Eu te ordeno: sai dele e nunca mais entres nele». 26Então, gritando e sacudindo-o com violência, o espírito saiu. E o menino ficou como morto, a ponto de muitos dizerem que tinha morrido. 27Mas Jesus, agarrando-lhe a mão, levantou-o, e ele pôs-se de pé.

28Quando Ele entrou em casa, os seus discípulos perguntaram-lhe, a sós: «Porque não conseguimos nós expulsá-lo?». 29Disse-lhes: «Este género de espíritos[121] de modo nenhum se consegue expulsar, a não ser com oração»[122].


Segundo anúncio da paixão e ressurreição (Mt 17,22s; Lc 9,43b-45) – 30Saindo dali, caminharam através da Galileia, mas Jesus não queria que ninguém o soubesse, 31pois ensinava os seus discípulos e dizia-lhes: «O Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos homens; matá-lo-ão, e, tendo sido morto, três dias depois ressuscitará». 32Eles, porém, não compreendiam tal coisa e tinham medo de o interrogar.

Discussão entre os discípulos: quem é o maior (Mt 18,1-5; Lc 9,46-48) – 33Foram, então, para Cafarnaum. E, estando em casa, interrogou-os: «O que discutíeis no caminho?». 34Eles ficaram calados, pois tinham discutido uns com os outros no caminho[123] sobre quem era o maior. 35Sentando-se, então, chamou os Doze e disse-lhes: «Se alguém quer ser o primeiro, será o último de todos e servidor de todos». 36E, tomando uma criança, colocou-a no meio deles e, abraçando-a, disse-lhes: 37«Aquele que acolher uma destas crianças em meu nome, é a mim que acolhe; e aquele que me acolher, não me acolhe a mim, mas àquele que me enviou».


Uso do nome de Jesus (Lc 9,49s) – 38Disse-lhe João: «Mestre, vimos alguém a expulsar demónios em teu nome e tentámos impedi-lo, porque não nos segue». 39Mas Jesus disse: «Não o impeçais, pois ninguém fará uma ação poderosa em meu nome e poderá logo de seguida dizer mal de mim; 40quem não é contra nós, é a nosso favor. 41Pois aquele que vos der de beber um copo de água por serdes de Cristo[124], amen vos digo: jamais perderá a sua recompensa.


A gravidade dos escândalos (Mt 18,6-9; Lc 17,1s) – 42E aquele que for motivo de escândalo para um destes pequeninos que acreditam em mim[125], melhor seria para ele se lhe atassem uma mó de moinho[126] à volta do pescoço e fosse lançado ao mar.

43Se a tua mão for para ti motivo de escândalo, corta-a; é melhor para ti entrar estropiado na vida do que, tendo as duas mãos, ir para a Geena, para o fogo que não se apaga[127]. [44][128].

45Se o teu pé for para ti motivo de escândalo, corta-o; é melhor para ti entrar coxo na vida do que, tendo os dois pés, ser lançado na Geena. [46].

47Se o teu olho for para ti motivo de escândalo, deita-o fora; é melhor para ti com um só olho entrar no reino de Deus, do que, tendo dois olhos, ser lançado na Geena, 48onde o verme deles não morre e o fogo não se apaga[129].

49De facto, todos serão salgados pelo fogo[130]. 50O sal é bom; mas, se o sal se tornar insípido, com que o haveis de temperar? Tende sal em vós mesmos e vivei em paz uns com os outros».


10 Questão do divórcio (Mt 19,1-9; 5,32; Lc 16,18) – 1Levantando-se dali, foi para a região da Judeia, na outra margem do Jordão. De novo se aglomeravam multidões junto dele e de novo as ensinava, como costumava fazer.

2Aproximando-se, uns fariseus perguntaram-lhe, para o pôr à prova, se é permitido a um homem repudiar a sua mulher. 3Respondendo, Ele disse-lhes: «Que vos ordenou Moisés?». 4Eles disseram: «Moisés permitiu escrever uma declaração de repúdio e repudiar»[131]. 5Jesus, porém, disse-lhes: «Foi por causa da dureza do vosso coração que ele vos escreveu essa regra. 6Mas, desde o princípio da criação, Ele os fez macho e fêmea[132]; 7por isso, o homem deixará o seu pai e a sua mãe, unir-se-á à sua mulher 8e serão os dois uma só carne[133], de modo que já não são dois, mas uma só carne. 9Portanto, o que Deus uniu, não separe o homem».

10De novo em casa, os discípulos interrogavam-no acerca disto, 11e Ele disse-lhes: «Aquele que repudiar a sua mulher e casar com outra comete adultério contra ela; 12e se ela, repudiando o seu marido, casar com outro comete adultério»[134].


Jesus e as crianças (Mt 19,13-15; Lc 18,15-17) – 13Traziam-lhe, então, algumas[135] crianças para que lhes tocasse, mas os discípulos repreenderam-nas severamente. 14Ao ver isto, Jesus indignou-se e disse-lhes: «Deixai as crianças vir a mim; não as impeçais, pois dos que são como elas é o reino de Deus. 15Amen vos digo: aquele que não acolher o reino de Deus como uma criança, jamais nele entrará». 16E, abraçando-as, abençoava-as, impondo as mãos sobre elas.


O homem rico (Mt 19,16-22: Lc 18,18-23) – 17Quando Ele estava a sair para o caminho, veio a correr um homem que, caindo de joelhos diante dele, lhe perguntou: «Bom Mestre, que devo fazer para herdar a vida eterna?». 18Jesus disse-lhe: «Porque me chamas bom? Ninguém é bom senão um, que é Deus. 19Sabes os mandamentos: Não mates, não cometas adultério, não roubes, não levantes falso testemunho, não cometas fraudes, honra o teu pai e a tua mãe»[136]. 20Ele disse-lhe: «Mestre, tudo isso tenho observado desde a minha juventude». 21Jesus, fixando nele o olhar, amou-o e disse-lhe: «Falta-te uma coisa: vai, vende tudo o que tens, dá aos pobres e terás um tesouro no céu. Então vem e segue-me». 22Ele ficou chocado com estas palavras e foi-se embora triste, pois tinha muitas posses.


Os ricos e o reino de Deus (Mt 19,23-26; Lc 18,24-27) – 23Olhando em redor, Jesus disse aos seus discípulos: «Como será difícil aos que têm riquezas entrar no reino de Deus!». 24Os discípulos ficaram extremamente perplexos com as suas palavras[137]. Mas Jesus, em resposta, disse-lhes de novo: «Filhos, como é difícil[138] entrar no reino de Deus! 25É mais fácil passar um camelo pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino de Deus». 26Eles estavam extremamente perplexos, dizendo uns aos outros: «Quem pode, então, ser salvo?». 27Fixando neles o olhar, Jesus disse: «Aos homens é impossível, mas não a Deus, pois tudo é possível a Deus».


Recompensa pelo desprendimento (Mt 19,27-30; Lc 18,28-30) – 28Pedro começou a dizer-lhe: «Eis que nós deixámos tudo e seguimos-te!». 29Afirmou Jesus: «Amen vos digo: não há ninguém que tenha deixado casa, ou irmãos, ou irmãs, ou mãe, ou pai, ou filhos, ou campos por causa de mim e por causa do evangelho, 30que não receba, já neste tempo, cem vezes mais casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, juntamente com perseguições e, no tempo que há de vir, a vida eterna. 31Porém, muitos primeiros serão últimos, e os últimos primeiros».


Terceiro anúncio da paixão e ressurreição (Mt 20,17-19; Lc 18,31-33) – 32Estavam no caminho, subindo para Jerusalém, e Jesus seguia à frente deles. Estavam estupefactos e os que o seguiam tinham medo. Então, tomando de novo os Doze consigo, começou a dizer-lhes o que estava prestes a acontecer-lhe: 33«Eis que subimos para Jerusalém, e o Filho do Homem será entregue aos chefes dos sacerdotes e aos doutores da lei; hão de condená-lo à morte e entregá-lo aos pagãos, 34escarnecê-lo, cuspir-lhe, chicoteá-lo e matá-lo, e, três dias depois, ressuscitará».


Pedido de Tiago e João (Mt 20,20-23) – 35Aproximaram-se dele Tiago e João, os filhos de Zebedeu, dizendo-lhe: «Mestre, queríamos que nos fizesses o que te vamos pedir»[139]. 36Ele disse-lhes: «Que quereis que Eu vos faça?». 37Eles disseram-lhe: «Concede-nos que nos sentemos um à tua direita e outro à tua esquerda na tua glória». 38Mas Jesus disse-lhes: «Não sabeis o que estais a pedir! Podeis beber o cálice que Eu bebo, ou ser batizados no batismo com que Eu sou batizado?»[140]. 39Eles disseram-lhe: «Podemos». Mas Jesus disse-lhes: «Ireis beber o cálice que Eu bebo e sereis batizados com o batismo com que Eu sou batizado,40mas sentar-se à minha direita ou à minha esquerda não me cabe a mim concedê-lo; é para aqueles para quem foi preparado»[141].


Os chefes devem servir (Mt 20,24-28; Lc 22,24-27) – 41Ao ouvir isto, os outros[142] dez começaram a indignar-se contra Tiago e João. 42Então, chamando-os a si, Jesus disse-lhes: «Sabeis que aqueles que pensam ser chefes dos pagãos têm domínio sobre eles e os seus grandes exercem sobre eles o poder. 43Mas não é assim entre vós. Pelo contrário, aquele que quiser tornar-se grande entre vós, será vosso servidor, 44e aquele que quiser entre vós ser o primeiro, será servo de todos. 45Pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos».


Cura do cego de Jericó (Mt 20,29-34; Lc 18,35-43) – 46E foram para Jericó. Quando Ele ia a sair de Jericó com os seus discípulos e uma considerável multidão, o filho de Timeu, Bartimeu, um cego mendigo, estava sentado junto ao caminho. 47Ao ouvir dizer que era Jesus, o Nazareno, começou a gritar e a dizer: «Filho de David, Jesus, tem misericórdia de mim!». 48Muitos repreendiam-no severamente para que se calasse, mas ele gritava ainda mais: «Filho de David, tem misericórdia de mim!». 49Parando, Jesus disse: «Chamai-o». Chamaram o cego, dizendo-lhe: «Tem coragem, levanta-te! Ele chama-te». 50Ele, atirando a sua capa, deu um salto e foi ter com Jesus. 51Em resposta[143], Jesus disse: «Que queres que te faça?». O cego disse-lhe: «Rabúni[144], que eu volte a ver!». 52Jesus disse-lhe: «Vai, a tua fé te salvou». Imediatamente voltou a ver e seguia-o no caminho.

B. JESUS EM JERUSALÉM
(11,1-13,37)


11 Entrada messiânica em Jerusalém (Mt 21,1-10; Lc 19,28-38; Jo 12,12-19) – 1Quando se aproximaram de Jerusalém, Betfagé[145] e Betânia, junto ao Monte das Oliveiras, enviou dois dos seus discípulos 2e disse-lhes: «Ide à povoação que está na vossa frente e imediatamente, ao entrardes nela, encontrareis um jumentinho preso, no qual ainda ninguém se sentou. Soltai-o e trazei-o. 3E, se alguém vos disser: “Porque fazeis isso?”, dizei: “O Senhor tem necessidade dele e imediatamente o enviará de volta para aqui”».

4Eles partiram e encontraram o jumentinho preso junto a uma porta, do lado de fora, na rua, e soltaram-no. 5Alguns dos que ali estavam diziam-lhes: «Que estais a fazer, soltando o jumentinho?». 6Eles disseram-lhes como Jesus tinha dito, e deixaram-nos ir.

7Levaram, então, o jumentinho a Jesus, lançaram-lhe por cima as suas capas, e sentou-se nele. 8Muitos estenderam as suas capas pelo caminho, e outros, ramos que tinham cortado nos campos. 9E tanto os que iam à frente como os que o seguiam gritavam:

«Hossana!

Bendito o que vem em nome do Senhor[146]!

10Bendito o reino que chega, do nosso pai David!

Hossana nas alturas!».

11E entrou em Jerusalém, no templo. Tendo observado tudo à sua volta, e sendo já tardia a hora, saiu para Betânia com os Doze.


A maldição da figueira (Mt 21,18s) – 12No dia seguinte, ao saírem de Betânia, sentiu fome. 13Ao ver de longe uma figueira com folhas, foi ver se por acaso encontraria nela alguma coisa, mas, quando chegou junto dela, nada encontrou senão folhas. De facto, não era tempo de figos. 14Então, em resposta, disse-lhe: «Que nunca mais e para sempre alguém de ti possa comer fruto!». E os seus discípulos ouviam[147].


Expulsão dos vendedores do templo (Mt 21,12s; Lc 19,45-48; Jo 2,13-16) – 15Chegaram, então, a Jerusalém. Entrando no templo, começou a expulsar os que vendiam e os que compravam no templo; derrubou as mesas dos cambistas e os assentos dos que vendiam as pombas, 16e não permitia que ninguém transportasse vasos pelo templo[148]. 17Ensinava, então, e dizia-lhes: «Não está escrito: A minha casa será chamada casa de oração para todos os povos[149]? Mas vós tendes feito dela um antro de salteadores[150]».

18Os chefes dos sacerdotes e os doutores da lei ouviram isto[151] e procuravam modo de o matar, pois tinham medo dele, porque toda a multidão estava perplexa com o seu ensinamento.

19E, quando a noite caiu, saíram da cidade.


A figueira seca e o poder da oração (Mt 21,20-22) – 20De manhã cedo, ao passarem perto, viram a figueira seca desde as raízes. 21Ao lembrar-se, Pedro disse-lhe: «Rabi, olha: a figueira que amaldiçoaste secou». 22Em resposta, Jesus disse-lhes: «Tende fé em Deus! 23Amen vos digo: aquele que disser a este monte: “Levanta-te e lança-te ao mar”, e não hesitar no seu coração, mas acreditar que acontecerá o que diz, assim lhe há de suceder. 24Por isso vos digo: tudo quanto rezais e pedis, acreditai que já o recebestes, e assim vos acontecerá. 25E, quando estiverdes a rezar, se tiverdes alguma coisa contra alguém, perdoai, para que também o vosso Pai que está nos céus vos perdoe as vossas transgressões». [26][152].

Controvérsia sobre a autoridade de Jesus (Mt 21,23-27; Lc 20,1-8) – 27Foram de novo para Jerusalém. E, enquanto Ele caminhava no templo, foram ter com Ele os chefes dos sacerdotes, os doutores da lei e os anciãos 28e diziam-lhe: «Com que autoridade fazes estas coisas? Ou quem te deu tal autoridade para as fazeres?».

29Mas Jesus disse-lhes: «Vou perguntar-vos uma coisa; respondei-me e dir-vos-ei com que autoridade faço estas coisas. 30O batismo de João era do céu ou dos homens? Respondei-me». 31Eles discutiam entre si, dizendo: «Se dissermos: “Do céu”, dirá: “Então, por que razão não acreditastes nele?”; 32mas se dissermos: “Dos homens”?...» – tinham medo da multidão, pois todos consideravam que João era realmente um profeta. 33E, respondendo a Jesus, disseram: «Não sabemos». Então Jesus disse-lhes: «Nem Eu vos digo com que autoridade faço estas coisas».


12 Parábola dos vinhateiros homicidas (Mt 21,33-46; Lc 20,9-19) – 1Começou, então, a falar-lhes em parábolas[153]: «Um homem plantou uma vinha, cercou-a com uma sebe, cavou um lagar, edificou uma torre[154], arrendou-a a uns agricultores e partiu de viagem. 2Enviou um servo aos agricultores, no tempo oportuno, para que recebesse dos agricultores parte dos frutos da vinha. 3Eles, porém, agarrando-o, espancaram-no e enviaram-no de volta sem nada. 4Enviou-lhes de novo outro servo; também a este bateram na cabeça e ultrajaram. 5Enviou ainda outro e também a este mataram. E enviou muitos outros: espancaram uns e mataram outros.

6Tinha ainda um, o filho amado. Enviou-lho, por último, dizendo: “Hão de respeitar o meu filho”. 7Mas aqueles agricultores disseram uns aos outros: “Este é o herdeiro; vamos, matemo-lo, e a herança será nossa”. 8E, apoderando-se dele, mataram-no e lançaram-no para fora da vinha.

9Ora, que fará o senhor da vinha? Virá, destruirá os agricultores e dará a vinha a outros.

10Não lestes na Escritura:

A pedra que rejeitaram

os construtores

tornou-se pedra angular;

11ela veio do Senhor

e é admirável aos nossos olhos[155].

12Procuravam, então, prendê-lo, mas tiveram medo da multidão; de facto, perceberam que tinha sido para eles que dissera a parábola. E, deixando-o, foram-se embora.


O imposto a César (Mt 22,15-22; Lc 20,20-26) – 13Enviaram-lhe, então, alguns dos fariseus e dos herodianos, para o apanharem em falso em alguma palavra. 14Ao chegar, disseram-lhe: «Mestre, sabemos que és verdadeiro e que não tens preferência por ninguém, pois não olhas para a aparência dos homens[156], mas ensinas o caminho de Deus, de acordo com a verdade. É permitido ou não pagar imposto a César? Devemos ou não pagar?». 15Mas Ele, conhecendo a sua hipocrisia, disse-lhes: «Porque me pondes à prova[157]? Trazei-me um denário para que o veja». 16Eles trouxeram-no. Perguntou-lhes, então: «De quem é esta imagem e a inscrição?». Eles disseram-lhe: «De César». 17Jesus disse-lhes: «Devolvei a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus». E ficaram muito admirados com Ele.


Os saduceus e a ressurreição (Mt 22,23-33; Lc 20,27-38) – 18Foram ter com Ele uns saduceus – que afirmam não haver ressurreição – e interrogaram-no, dizendo: 19«Mestre, Moisés deixou-nos escrito: Se o irmão de alguém morrer e deixar mulher, mas não deixar filhos, o seu irmão case[158] com a mulher e dê descendência ao seu irmão[159]. 20Ora, havia sete irmãos. O primeiro casou-se com uma mulher e, ao morrer, não deixou descendência. 21O segundo casou com ela e morreu, não deixando descendência. O mesmo aconteceu ao terceiro. 22E os sete não deixaram descendência. Por fim, depois de todos, também a mulher morreu. 23Na ressurreição, quando ressuscitarem[160], de qual deles será ela mulher? É que os sete a tiveram como mulher». 24Disse-lhes Jesus: «Não será por isto que andais enganados, por não conhecerdes as Escrituras nem o poder de Deus? 25Pois, quando ressuscitarem dos mortos, nem se casam nem se dão em casamento; pelo contrário, são como anjos nos céus. 26E, quanto aos mortos ressuscitarem, não lestes no Livro de Moisés, no episódio da sarça, quando Deus lhe disse: Eu sou o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacob[161]? 27Não é Deus de mortos, mas de vivos. Andais muito enganados».


O primeiro mandamento (Mt 22,34-40; Lc 10,25-28) – 28E, aproximando-se um dos doutores da lei, que os tinha ouvido debater, ao ver que Ele lhes tinha respondido bem, interrogou-o: «Qual é o primeiro de todos os mandamentos?». 29Jesus respondeu: «O primeiro é: Escuta, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor; 30amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com toda a tua força[162]. 31O segundo é este: Amarás o teu próximo como a ti mesmo[163]. Não há outro mandamento maior que estes». 32Disse-lhe o doutor da lei: «Muito bem, Mestre, disseste a verdade: É único e não existe outro além dele; 33amá-lo com todo o coração, com toda a inteligência e com toda a força, e amar o próximo como a si mesmo vale mais do que todos os holocaustos e sacrifícios»[164]. 34Então Jesus, ao ver que ele respondera com inteligência, disse-lhe: «Não estás longe do reino de Deus». E já ninguém ousava interrogá-lo.


O Messias, Senhor de David (Mt 22,41-45; Lc 20,41-44) – 35Em resposta, Jesus dizia, ao ensinar no templo: «Como podem os doutores da lei dizer que o Cristo é filho de David? 36O próprio David disse, no Espírito Santo:

Disse o Senhor ao meu Senhor:

“Senta-te à minha direita,

até que ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés”[165].

37O próprio David lhe chama “Senhor”. De que modo pode ser seu filho?». E a numerosa multidão ouvia-o com gosto.


Crítica aos doutores da lei (Mt 23,1.5-7.14; Lc 20,46) – 38E no seu ensinamento dizia: «Tomai cuidado com os doutores da lei, que têm prazer em caminhar com vestes longas, em saudações nas praças públicas, 39nos primeiros assentos nas sinagogas e nos primeiros lugares nos banquetes; 40eles que devoram as casas das viúvas, usando longas orações como pretexto. Estes receberão uma condenação mais severa».


A generosidade da viúva pobre (Lc 21,1-4) – 41Sentado diante da arca do tesouro[166], observava como a multidão deitava moedas na arca e como muitos ricos deitavam muitas. 42Ora, ao vir uma viúva pobre, deitou duas pequenas moedas, ou seja, um quadrante. 43Chamando a si os seus discípulos, disse-lhes: «Amen vos digo: esta viúva pobre deitou na arca mais do que todos, 44pois todos deitaram do que lhes sobrava, mas esta, na sua penúria, deitou tudo quanto tinha, toda a sua vida».


Discurso escatológico
(Mt 24; Lc 21)


13 Anúncio da destruição do templo (Mt 24,1s; Lc 21,5s) – 1Ao sair do templo, disse-lhe um dos seus discípulos: «Mestre, vê que pedras e que edifícios!». 2Jesus disse-lhe: «Vês estes edifícios grandiosos? Não ficará aqui pedra sobre pedra que não seja derrubada».


Sinais antecedentes do fim: falsos messias, guerras e perseguições aos discípulos (Mt 24,3-14; Lc 21,7-19) – 3Quando Ele estava sentado no Monte das Oliveiras diante do templo, Pedro, Tiago, João e André interrogaram-no a sós: 4«Diz-nos: quando será isso e qual o sinal, quando todas essas coisas estiverem prestes a consumar-se?».

5Jesus começou a dizer-lhes: «Tomai cuidado para que ninguém vos engane! 6Muitos virão em meu nome, dizendo: “Sou eu”, e a muitos hão de enganar. 7Quando ouvirdes falar de guerras e de rumores de guerras, não vos assusteis; é necessário que isto aconteça, mas ainda não será o fim. 8Pois há de levantar-se povo contra povo e reino contra reino; haverá tremores de terra por todo o lado e haverá fome. Estas coisas serão o princípio das dores de parto[167].

9Mas vós, tomai cuidado convosco! Hão de entregar-vos aos sinédrios e às sinagogas, sereis açoitados[168] e levados à presença de governadores e reis por causa de mim, para lhes dar testemunho[169]. 10Mas primeiro é necessário que a todos os povos seja proclamado o evangelho. 11E, quando vos levarem para serdes entregues, não vos preocupeis com o que dizer, mas dizei o que naquela hora vos for indicado[170], pois não sereis vós a falar, mas o Espírito Santo. 12O irmão entregará o irmão à morte, e o pai o filho; os filhos hão de levantar-se contra os pais e causar-lhes a morte; 13sereis odiados por todos por causa do meu nome. Mas o que perseverar até ao fim, esse será salvo».


Sinais antecedentes do fim: destruição de Jerusalém (Mt 24,15-22; Lc 21,20-24) – 14«Quando virdes a abominação da desolação[171] posta onde não devia – quem lê que compreenda! –, então os que estiverem na Judeia fujam para os montes, 15quem estiver no terraço não desça nem entre para apanhar nada da sua casa, 16e quem estiver no campo não volte atrás para apanhar a sua capa. 17Ai[172] daquelas que tiverem um filho no ventre e das que amamentarem naqueles dias! 18Rezai para que isto não aconteça no inverno, 19pois esses dias serão de uma tribulação tal, como não aconteceu desde o princípio da criação, que Deus fez[173], até agora[174], nem jamais acontecerá. 20E, se o Senhor não abreviasse esses dias, ninguém[175] se salvaria. Mas por causa dos eleitos que escolheu, abreviou os dias».


Sinais antecedentes do fim: os falsos messias (Mt 24,23-25) – 21«Então, se alguém vos disser: “Eis aqui o Cristo”, ou: “Ei-lo ali!”, não acrediteis, 22pois hão de erguer-se falsos cristos e falsos profetas que oferecerão sinais e prodígios para, se possível, enganar os eleitos. 23Vós, porém, tomai cuidado; Eu vos predisse tudo!».


Vinda gloriosa do Filho do Homem (Mt 24,29-31; Lc 21,25-28) – 24«Mas, naqueles dias, depois daquela tribulação, o sol ficará escuro, a lua não dará o seu brilho, 25as estrelas cairão do céu e os poderes que há nos céus serão abalados[176].

26Verão, então, o Filho do Homem vir entre as nuvens[177] com grande poder e glória. 27E enviará, então, os anjos e reunirá os seus eleitos dos quatro ventos, da extremidade da terra até à extremidade do céu».


Parábola da figueira (Mt 24,32-36; Lc 21,29-33) – 28«Aprendei com a parábola da figueira: quando os seus ramos ficam tenros e brotam as folhas, sabeis que o verão está próximo; 29assim também vós, quando virdes estas coisas acontecer, sabei que está próximo, mesmo à porta[178]. 30Amen vos digo: não passará esta geração sem que todas estas coisas aconteçam. 31O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras jamais passarão.

32Quanto a esse dia ou a essa hora, ninguém sabe, nem os anjos no céu, nem o Filho; apenas o Pai».


Necessidade de estar vigilante (Mt 24,42; 25,13-30; Lc 12,39-46) – 33«Tomai cuidado; estai despertos[179], pois não sabeis quando será o momento! 34Será como um homem que, ao partir de viagem e ao deixar a sua casa, deu autoridade aos seus servos e a cada um a sua tarefa. Ao porteiro ordenou que estivesse vigilante. 35Portanto, estai vigilantes, pois não sabeis quando virá o senhor da casa: se ao entardecer, se à meia-noite, se ao cantar do galo ou de manhã cedo; 36não aconteça que, ao vir inesperadamente, vos encontre a dormir. 37O que vos digo, digo a todos: estai vigilantes!».


C. PAIXÃO, MORTE E RESSURREIÇÃO (14,1-16,8)


14 Determinação em matar Jesus (Mt 26,3-5; Lc 22,1s) – 1A dois dias da Páscoa e dos Ázimos, os chefes dos sacerdotes e os doutores da lei procuravam o modo de o matar, depois de o prenderem à traição, 2pois diziam: «Não durante a festa, para que não haja alvoroço do povo».


Unção em Betânia (Mt 26,6-13; Lc 7,36-50; Jo 12,1-8) – 3Encontrando-se Ele em Betânia, na casa de Simão, o leproso, enquanto estava reclinado à mesa, veio uma mulher que tinha um frasco de alabastro com bálsamo de nardo puro, muito caro. Partindo o frasco de alabastro, derramou-lho sobre a cabeça. 4Alguns ficaram indignados e diziam entre si: «Para quê este desperdício de bálsamo? 5Podia vender-se este bálsamo por mais de trezentos denários e dar-se aos pobres». E criticavam-na com dureza. 6Mas Jesus disse: «Deixai-a! Porque a importunais? Praticou uma boa ação para comigo. 7Pois pobres sempre os tendes convosco e, quando quiserdes, podeis fazer-lhes bem; mas a mim nem sempre tereis. 8Ela fez o que podia: antecipou-se a ungir o meu corpo para a sepultura. 9Amen vos digo: onde quer que seja proclamado o evangelho, por todo o mundo, também o que ela fez será contado em sua memória.


Traição de Judas (Mt 26,14-16; Lc 22,3-6) – 10Então Judas Iscariotes, um dos Doze[180], foi ter com os chefes dos sacerdotes para lhes entregar Jesus[181]. 11Ao ouvi-lo, eles alegraram-se e prometeram dar-lhe dinheiro. E ele procurava o momento oportuno para o entregar.


Preparação da ceia pascal (Mt 26,17-19; Lc 22,7-13) – 12No primeiro dia dos Ázimos, quando se imolava a Páscoa[182], disseram-lhe os seus discípulos: «Onde queres que vamos fazer os preparativos para comeres a Páscoa?». 13Enviou, então, dois dos seus discípulos e disse-lhes: «Ide à cidade, e virá ao vosso encontro um homem carregando uma bilha de água. Segui-o 14e, onde ele entrar, dizei ao senhor da casa: “O Mestre diz: ‘Onde é a minha sala, em que hei de comer a Páscoa com os meus discípulos?’”. 15Ele vos mostrará no andar superior uma sala grande, mobilada e pronta. Preparai-a ali para nós». 16Os discípulos saíram, foram à cidade, encontraram tudo tal como lhes dissera e prepararam a Páscoa.


A ceia do Senhor (Mt 26,20-29; Lc 22,14-23; Jo 13,2.21-26; 1Cor 11,23-25) – 17Ao cair da tarde, chegou com os Doze. 18E, enquanto estavam reclinados à mesa e comiam, Jesus disse: «Amen vos digo: um de vós, que come comigo[183], me há de entregar». 19Começaram a entristecer-se e a dizer-lhe, um após outro: «Não sou eu, pois não?». 20Mas Ele disse-lhes: «É um dos Doze, o que põe comigo a mão no prato[184]. 21Porque o Filho do Homem parte, tal como está escrito acerca dele, mas ai daquele homem por quem o Filho do Homem é entregue! Melhor seria para esse homem não ter nascido».

22Enquanto eles comiam, tomou um pão e, pronunciando a bênção, partiu-o, deu-lho e disse: «Tomai, este é o meu corpo».

23Tomando, então, um cálice e dando graças, deu-lho e todos beberam dele. 24E disse-lhes: «Este é o meu sangue da aliança[185], derramado em favor de muitos[186]. 25Amen vos digo: não mais beberei do fruto da videira, até àquele dia em que o hei de beber, novo, no reino de Deus».


Anúncio da negação de Pedro (Mt 26,30-35) – 26Depois de terem entoado os hinos, saíram para o Monte das Oliveiras.

27Disse-lhes Jesus: «Todos caireis em escândalo, porque está escrito: Ferirei o pastor, e as ovelhas serão dispersas[187]. 28Mas, depois de Eu ter ressuscitado, irei à vossa frente para a Galileia».

29Pedro disse-lhe: «Ainda que todos caiam em escândalo, eu não». 30Disse-lhe Jesus: «Amen te digo: Tu, hoje, esta noite, antes que o galo cante duas vezes, três vezes me negarás». 31Mas ele dizia com grande insistência: «Ainda que seja necessário eu morrer contigo, jamais te negarei». E todos diziam o mesmo.


Oração de Jesus no Getsémani (Mt 26,36-46; Lc 22,39-46) – 32Foram, então, para uma propriedade chamada Getsémani[188] e disse aos seus discípulos: «Sentai-vos aqui, enquanto vou rezar». 33Tomou consigo Pedro, Tiago e João e começou a sentir-se apavorado e a angustiar-se. 34Disse-lhes: «Profundamente entristecida está a minha alma até à morte[189]; permanecei aqui e estai vigilantes». 35E, indo um pouco adiante, caiu por terra e rezava para que, se fosse possível, se apartasse dele aquela hora. 36E dizia: «Abbá, Pai! Tudo te é possível: afasta de mim este cálice! Mas não se faça o que Eu quero, mas o que Tu queres». 37Depois veio, encontrou-os a dormir e disse a Pedro: «Simão, estás a dormir? Nem uma hora foste capaz de estar vigilante? 38Estai vigilantes e rezai, para que não entreis em tentação, pois o espírito está pronto, mas a carne é fraca». 39Afastando-se de novo, rezou dizendo as mesmas palavras. 40Ao vir de novo, encontrou-os a dormir, pois os seus olhos estavam pesados e não sabiam o que responder-lhe. 41Veio pela terceira vez e disse-lhes: «Ireis dormir e descansar o resto da noite[190]? Basta! Chegou a hora: eis que o Filho do Homem é entregue nas mãos dos pecadores. 42Levantai-vos! Vamos! Eis que se aproxima o que me vai entregar».


Prisão de Jesus (Mt 26,47-56; Lc 22,47-53; Jo 18,3-12) – 43E imediatamente, ainda Ele falava, apareceu Judas, um dos Doze e, com ele, uma multidão com espadas e varapaus, da parte dos chefes dos sacerdotes, dos doutores da lei e dos anciãos. 44O que o ia entregar tinha-lhes dado um sinal, dizendo: «É aquele que eu beijar; prendei-o e levai-o bem seguro». 45Ao chegar, foi imediatamente ter com Ele e disse: «Rabi!», e beijou-o efusivamente.46Então eles deitaram-lhe as mãos e prenderam-no. 47Mas um dos que estavam perto, puxando da espada, feriu o servo do sumo-sacerdote e cortou-lhe a orelha.

48Em resposta, Jesus disse-lhes: «Como se faz a um salteador, saístes com espadas e varapaus para vos apoderardes de mim? 49Dia após dia estive junto de vós, no templo, a ensinar, e não me prendestes! Mas foi para que se cumprissem as Escrituras».

50Então, abandonando-o, fugiram todos. 51Acompanhava-o um certo jovem envolto apenas num lençol[191]. Agarraram-no, 52mas ele, largando o lençol, fugiu nu.


Jesus diante do Sinédrio (Mt 26,57-68; Lc 22,54s.66-71; Jo 18,13-24) – 53Levaram, então, Jesus ao sumo-sacerdote, e reuniram-se todos os chefes dos sacerdotes, os anciãos e os doutores da lei. 54Pedro tinha-o seguido, de longe, até dentro do pátio do sumo-sacerdote, e estava sentado com os guardas, a aquecer-se junto ao lume[192]. 55Os chefes dos sacerdotes e todo o sinédrio procuravam um testemunho contra Jesus para lhe dar a morte, mas não encontravam nenhum. 56Muitos prestavam falso testemunho contra Ele, mas os testemunhos não eram concordes. 57Alguns, levantando-se, prestavam falso testemunho contra Ele, dizendo: 58«Nós ouvimo-lo dizer: “Eu destruirei este templo, feito por mãos humanas, e em três dias edificarei outro que não será feito por mãos humanas[193]”». 59Mas nem assim o testemunho deles era concorde.

60Então o sumo-sacerdote, levantando-se no meio deles, interrogou Jesus, dizendo: «Nada respondes ao que estes testemunham contra ti?». 61Mas Ele mantinha-se em silêncio e nada respondeu. O sumo-sacerdote interrogou-o de novo e disse-lhe: «Tu és o Cristo, o Filho do Bendito?». 62Jesus disse: «Eu sou[194]. E vereis o Filho do Homem sentado à direita do Poderoso[195], a vir com as nuvens do céu»[196].

63Então o sumo-sacerdote, rasgando as suas vestes, disse: «Que necessidade temos ainda de testemunhas? 64Ouvistes a blasfémia. Que vos parece?». E todos eles o condenaram a ser réu de morte.

65Alguns começaram, então, a cuspir-lhe, a vendar-lhe o rosto, a dar-lhe murros e a dizer-lhe: «Profetiza!»[197]; e os guardas davam-lhe bofetadas.


Pedro renega Jesus (Mt 26,69-75; Lc 22,55-62; Jo 18,17.25-27) – 66Entretanto, estando Pedro em baixo, no pátio, veio uma das jovens servas do sumo-sacerdote 67e, ao ver Pedro a aquecer-se, fixou nele o olhar e disse-lhe: «Também tu estavas com o Nazareno, com Jesus». 68Mas ele negou, dizendo: «Não sei, nem entendo o que tu dizes». Foi, então, para fora, para o pátio anterior, e um galo cantou[198]. 69A jovem serva, ao vê-lo, começou de novo a dizer aos que estavam ali perto: «Este é um deles!». 70Mas ele de novo negou. Pouco depois, os que estavam ali perto diziam de novo a Pedro: «É verdade que és um deles, pois também és galileu!»[199]. 71Mas ele começou a dizer anátemas e a jurar: «Não conheço esse homem de quem falais». 72E imediatamente, pela segunda vez, um galo cantou[200]. Pedro lembrou-se, então, daquilo que Jesus lhe dissera: «Antes que um galo cante duas vezes, três vezes me negarás». E irrompeu num pranto.


15 Jesus perante Pilatos (Mt 27,1s.11-26; Lc 22,66; 23,1-4.17-25; Jo 18,29-19,1) – 1E imediatamente, de manhã cedo, os chefes dos sacerdotes, depois de se terem reunido em conselho com os anciãos, os doutores da lei e todo o sinédrio e de terem atado Jesus, levaram-no e entregaram-no a Pilatos.

2Então, Pilatos interrogou-o: «Tu és o rei dos judeus?». Ele, respondendo-lhe, disse: «Tu o dizes». 3Os chefes dos sacerdotes acusavam-no de muitas coisas. 4Pilatos interrogou-o de novo, dizendo: «Não respondes nada? Vê de quantas coisas te acusam!». 5Mas Jesus nada mais respondeu, de tal forma que Pilatos ficou admirado[201].

6Ora, pela festa libertava-lhes sempre[202] um preso, aquele que pedissem. 7Havia um, chamado Barrabás[203], que estava preso com os revoltosos que tinham cometido um assassínio durante a revolta. 8Então a multidão, tendo subido[204], começou a pedir que lhes fizesse como sempre se fizera[205]. 9Pilatos respondeu-lhes, dizendo: «Quereis que vos liberte o rei dos judeus?», 10pois sabia que os chefes dos sacerdotes o tinham entregado por inveja.11Mas os chefes dos sacerdotes incitaram a multidão para que ele lhes libertasse antes Barrabás. 12De novo Pilatos, em resposta, dizia-lhes: «Então que quereis que faça daquele a quem chamais o rei dos judeus?»[206]. 13Eles gritaram de novo: «Crucifica-o!». 14Pilatos dizia-lhes: «Mas que mal fez?». Eles, porém, gritaram ainda mais: «Crucifica-o!».

15Então Pilatos, querendo contentar a multidão, libertou-lhes Barrabás e entregou Jesus, depois de o mandar flagelar, para ser crucificado.


Os soldados ridicularizam Jesus (Mt 27,27-31; Jo 19,2s) – 16Os soldados levaram-no para dentro do pátio, isto é, para o pretório[207], e convocaram toda a coorte. 17Revestiram-no de púrpura, puseram-lhe uma coroa de espinhos que tinham entrelaçado 18e começaram a saudá-lo: «Salve[208], ó rei dos judeus!». 19Batiam-lhe na cabeça com uma cana, cuspiam-lhe e, pondo-se de joelhos, prostravam-se diante dele. 20Depois de terem escarnecido dele, despiram-lhe a púrpura e vestiram-lhe as suas vestes. E levaram-no para fora, para o crucificarem.


Crucificação de Jesus (Mt 27,32-44; Lc 23,26.33-38; Jo 19,17-27) – 21Obrigaram, então, um homem que passava, um certo Simão de Cirene que vinha do campo, o pai de Alexandre e de Rufo, a levar-lhe a cruz. 22Levaram Jesus[209] ao lugar do Gólgota, que quer dizer «Lugar da Caveira», 23e davam-lhe vinho misturado com mirra, mas Ele não o tomou.

24Crucificaram-no, então, e dividiram entre si as suas vestes, lançando sortes sobre elas[210], para verem o que levaria cada um. 25Era a hora tércia[211] quando o crucificaram. 26O letreiro da causa da sua condenação tinha escrito: «O rei dos judeus». 27E com Ele crucificaram dois salteadores, um à sua direita e outro à sua esquerda. [28][212].

29Os que passavam blasfemavam contra Ele, abanando as suas cabeças[213] e dizendo: «Eh! Tu, que destróis o templo e o edificas em três dias, 30salva-te a ti mesmo descendo da cruz!». 31Da mesma forma, também os chefes dos sacerdotes, escarnecendo entre si juntamente com os doutores da lei, diziam: «Salvou outros, mas a si mesmo não se pode salvar! 32O Cristo, o rei de Israel, que desça agora da cruz, para que vejamos e acreditemos!». Até os que estavam crucificados com Ele o insultavam.


Morte de Jesus (Mt 27,45-56; Lc 23,44-49; Jo 19,28-30) – 33À hora sexta fez-se trevas sobre toda a terra até à hora nona. 34E à hora nona, Jesus bradou com voz forte: «Eloí, Eloí, lemá sabakhtáni?», que quer dizer: «Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?»[214]. 35Alguns dos que estavam perto, ao ouvirem isto, diziam: «Vede, está a chamar por Elias!». 36Alguém correu a embeber uma esponja em vinagre e, pondo-a numa cana, dava-lhe de beber dizendo: «Deixai! Vejamos se Elias o vem tirar dali».

37Então Jesus, soltando um forte grito, expirou. 38O véu do templo rasgou-se em dois, de alto a baixo. 39O centurião que estava diante dele, ao vê-lo expirar daquele modo, disse: «Verdadeiramente este homem era Filho de Deus!».

40Estavam também algumas mulheres a observar de longe, entre elas Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago Menor e de José, e Salomé[215], 41que o seguiam e o serviam, quando Ele estava na Galileia, e muitas outras que tinham subido com Ele para Jerusalém.


Sepultura de Jesus (Mt 27,57-61; Lc 23,50-55; Jo 19,38-42) – 42Já ao cair da tarde – visto ser a Preparação, isto é, a véspera do sábado – 43José de Arimateia, proeminente membro do Conselho, que também esperava o reino de Deus, enchendo-se de coragem, foi ter com Pilatos e pediu o corpo de Jesus. 44Pilatos admirou-se de que já estivesse morto[216] e, chamando o centurião, interrogou-o sobre se tinha morrido há muito. 45Ao sabê-lo pelo centurião, concedeu o cadáver a José. 46Tendo comprado um lençol, José[217] desceu-o, envolveu-o no lençol, pô-lo num sepulcro, que tinha sido escavado na rocha, e rolou uma pedra contra a entrada do sepulcro. 47Maria Madalena e Maria, mãe de José, observavam onde tinha sido posto.


Conclusão


16 O sepulcro vazio e anúncio da ressurreição (Mt 28,1-8; Lc 24,1-10; Jo 20,1-13) – 1Passado o sábado, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago[218], e Salomé compraram aromas para o irem ungir. 2E de manhã cedo, no primeiro dia da semana, foram ao sepulcro, ao despontar do sol.

3Diziam entre si: «Quem nos há de rolar a pedra da entrada do sepulcro?». 4Mas, ao levantar os olhos, viram que a pedra tinha sido rolada; e era muito grande.

5Ao entrarem no sepulcro, viram um jovem sentado no lado direito, revestido com uma longa veste branca, e ficaram apavoradas. 6Mas ele disse-lhes: «Não fiqueis apavoradas! Procurais Jesus de Nazaré, o crucificado. Ressuscitou, não está aqui. Vede o lugar onde o tinham posto. 7Mas ide, dizei aos seus discípulos e a Pedro: Ele vai à vossa frente para a Galileia. Lá o vereis, tal como Ele vos disse»[219].

8Elas saíram a fugir do sepulcro, pois estavam a tremer e assombradas. E nada disseram a ninguém, pois tinham medo[220].


Segunda conclusão
(16,9-20)[221]


Jesus aparece a Maria Madalena (Jo 20,11-18) – 9Tendo ressuscitado de manhã cedo, no primeiro dia da semana, apareceu primeiro a Maria Madalena, da qual tinha expulsado sete demónios.10Ela foi anunciá-lo aos que tinham estado com Ele e se encontravam a lamentar-se e a chorar. 11E eles, ao ouvir que estava vivo e que tinha sido visto por ela, não acreditaram.


Jesus aparece a dois discípulos (Lc 24,13-35) – 12Depois disto, manifestou-se sob outra forma a dois deles que iam a caminho do campo[222]. 13E eles partiram para anunciar aos outros, mas nem neles acreditaram.


Jesus aparece aos Onze (Mt 28,18-20; Lc 24,36-49; Jo 20,19-23) – 14Por fim manifestou-se também aos Onze, quando estavam reclinados à mesa, e censurou-os pela sua falta de fé e dureza de coração, porque não acreditaram naqueles que o tinham visto ressuscitado. 15E disse-lhes: «Ide por todo o mundo, proclamai o evangelho a toda a criatura. 16Quem acreditar e for batizado será salvo; mas quem não acreditar será condenado. 17Estes sinais acompanharão quem tiver acreditado: em meu nome expulsarão demónios, falarão línguas novas, 18pegarão em serpentes com as mãos e, se beberem algum veneno mortal, não lhes causará nenhum mal; imporão as mãos sobre os enfermos, e estes ficarão bem».


Ascensão de Jesus (Lc 24,50-53) – 19Assim, o Senhor Jesus, depois de ter falado com eles, foi elevado ao céu e sentou-se à direita de Deus. 20Eles partiram, então, a proclamar por toda a parte. O Senhor cooperava com eles e confirmava a palavra pelos sinais que a acompanhavam.


  1. Este primeiro v. é o título programático da obra: o leitor é convidado a acolher Jesus não só como Cristo (o Messias esperado) mas também como Filho de Deus. Esta é a boa notícia (significado da palavra grega evangelho): em Jesus não só se cumprem, como são superadas as esperanças messiânicas, pois Ele não é apenas filho de David (Messias), mas filho do próprio Deus, tal como o Pai atesta logo no momento do batismo (a enquadrar o ministério de Jesus: 1,11) e na transfiguração (a emoldurar os anúncios da sua paixão, morte e ressurreição: 9,7). A formulação grega é ambígua de modo a possibilitar uma dupla leitura: Jesus é não só o anunciador desta boa notícia, como também o seu conteúdo. A maioria dos mss. apresenta o título Filho de Deus.
  2. Lit.: diante do teu rosto.
  3. Cf. Ml 3,1; Ex 23,20 (LXX).
  4. Is 40,3. Mc segue o texto dos LXX que indica o deserto como o lugar onde se faz ouvir a voz; o TM e o de Qumran apresentam o deserto como lugar onde se deve preparar o caminho.
  5. A ideia principal de conversão (metánoia) é a mudança de mentalidade, de modo de pensar e, consequentemente, de viver (o que vai mais longe do que arrependimento, como por vezes se traduz por causa da palavra latina paenitentia que tem esse significado). Este é também o primeiro e principal convite de Jesus (1,15).
  6. O cinto de couro parece querer ligar João a Elias, que também caminhava no deserto (2Rs 1,8; 1Rs 19,4), o que é confirmado por Jesus em 9,13. A roupa é a característica dos profetas (Zc 13,4). A frugalidade da alimentação apresenta João como um asceta, preocupado com o essencial: preparar o caminho do Senhor. Os diferentes pormenores sublinham a chegada dos tempos escatológicos.
  7. Mais forte é um qualificativo de Deus nos LXX (2Sm 22,32s).
  8. Lit.: de, inclinando-me, desatar.
  9. Advérbio muito frequente em Mc para apresentar Jesus em constante movimento, o que sublinha a urgência do seu ministério e da resposta que lhe é devida (cf. 1,18). É consequência da chegada dos tempos escatológicos (1,15).
  10. A preposição grega eis normalmente expressa o movimento direcionado, mas é usada pelo grego da koiné também com o sentido de sobre.
  11. Trata-se de uma teofania trinitária, que manifesta a presença do Pai e do Espírito Santo na missão de Jesus. A declaração do Pai evoca a imagem e missão do Servo do Senhor em Is 42,1. A pomba foi, para Noé, o sinal de que o castigo do dilúvio tinha terminado, representando a paz e a reconciliação com Deus (Gn 8,8-12). A sua descida da realidade de Deus (céu) à dos homens (terra) significa que, em Jesus, que batiza no Espírito Santo, se realiza em plenitude a reconciliação e a comunhão entre Deus e os homens. Por isso, com a morte de Jesus também o véu do templo, que separava o divino do profano, se rasgou em dois, de alto a baixo (15,38).
  12. A convivência com as feras refere-se à paz messiânica que restabelece a harmonia do Éden (cf. Is 11,6-9).
  13. Este é o conteúdo fundamental do evangelho: o reino de Deus fez-se próximo em Jesus. Por isso, a conversão consiste em acreditar no evangelho (kaí explicativo: convertei-vos, isto é, acreditai no evangelho; cf. 1,4 nota). Ora, tendo presente que Jesus é não só o anunciador do evangelho, mas também o seu conteúdo (1,1), converter-se significa acreditar em Jesus, tornar-se seu discípulo (1,16-20; 2,13-18).
  14. Atrás de Jesus, percorrer o seu caminho, aprender com Ele e fazer como Ele é a vocação primeira do discípulo (1,20; 8,33.34). A finalidade é a de que o Senhor os torne pescadores de homens. O mar não é o mundo natural dos homens, mas das forças demoníacas (5,13); os discípulos são chamados a dar continuidade à missão do Mestre: retirar os seres humanos do mundo onde o Mal é senhor e transportá-los para o reino onde a soberania é de Deus. Por isso, o Mar da Galileia (ou de Tiberíades, ou de Genesaré) é lugar frequente da pregação e ação de Jesus.
  15. O dia típico de Jesus: de manhã na sinagoga, onde revela o poder da sua palavra (1,21-28); à tarde com a comunidade na casa de Simão (1,29-31); ao cair do sol à porta, a curar e expulsar demónios (1,32-34); à noite em oração (1,35-38).
  16. Lit.: E imediatamente estava na sinagoga deles um homem. A expressão sinagoga deles revela que a comunidade de Mc já não se sente ligada à sinagoga judaica.
  17. Expressão judaica para falar dos demónios. Lit.: em espírito impuro, o que sublinha a possessão como despersonalização do homem.
  18. Expressão tipicamente judaica, que permite uma dupla resposta consoante o contexto: normalmente é expectável a negativa (é o caso; cf. 5,7), mas não exclui a possibilidade da positiva (cf. Jo 2,4).
  19. Trata-se de uma pergunta retórica: os demónios sabem quem Jesus é e que veio para destruir a soberania do Mal sobre os seres humanos.
  20. Jesus não admite que os demónios façam afirmações sobre a sua pessoa, pois não têm autoridade existencial e espiritual para tal. O mesmo acontece quando Pedro, embora proclamando Jesus como Cristo, o pretende moldar aos seus critérios (cf. 8,32 nota).
  21. A casa é símbolo da comunidade reunida (7,17; 9,28.33; 10,10); corresponderá à vida da comunidade primitiva em que as casas serviam de lugar de reunião para a catequese e para o culto. Por contraposição aparecem os de fora (4,11).
  22. Sobre a lepra, cf. Lv 13-14.
  23. O verbo grego tem o sentido de comover-se até às entranhas. Jesus sente no mais profundo do seu ser a situação daquele homem cuja lepra, para além do sofrimento físico, implica sofrimento social (os leprosos estavam proibidos de se aproximar das cidades e das pessoas sãs) e religioso (a sua doença era considerada um castigo e tornava-os religiosamente impuros). Daí o pedido: não apenas que Jesus o cure, mas que o torne puro.
  24. Lit.: falava-lhes a palavra.
  25. Homens é acrescento da tradução.
  26. A expressão Filho do Homem, com que normalmente Jesus se refere a si mesmo, é um semitismo que no hebraico e no aramaico significava primeiramente apenas homem, mas que, a partir de Dn 7,13 e da apocalíptica judaica, evoca uma figura misteriosa que, vinda do céu, tem a missão de julgar o mundo e de estabelecer um reino universal e eterno; é sobretudo neste sentido que Jesus a utiliza.
  27. Segundo Mt 9,1 chama-se Mateus.
  28. É ambígua a referência do pronome dele (Levi ou Jesus?), mas percebe-se pelo contexto que se trata da casa de Levi. No entanto, a ambiguidade permite perceber que na casa (comunidade) de Jesus todos são convidados a entrar e têm lugar.
  29. Lit.: os filhos do quarto nupcial ou os filhos da sala nupcial, e pode indicar quer os amigos do noivo, quer os convidados para as núpcias, em sentido geral.
  30. Naquele dia: expressão apocalíptica, referida ao dia do juízo ou da salvação, usada quer no AT (Ml 3,19; Sf 1,15; Am 8,9), quer no NT (cf. Mc 13,32; 14,25; 7,22).
  31. Tecido ainda não amaciado. Sublinha a suprema novidade de Jesus.
  32. A novidade de Jesus implica uma transformação a que o Evangelho chama conversão (1,4.15). O vinho novo é uma referência ao banquete escatológico que acontecerá com a chegada do Messias (Is 25,6; Jo 2,1-12) e que se concretiza na última ceia, a eucaristia (14,23-25).
  33. Lit.: Começaram a fazer caminho, arrancando as espigas.
  34. No tempo do sumo-sacerdote Abiatar: falta em alguns mss., assim como em Mt 12,4 e Lc 6,4, talvez para ultrapassar a dificuldade histórica que Mc levanta, pois o sumo-sacerdote a que se refere é Aquimelec (1Sm 21) pai de Abiatar (1Sm 22,20; 23,6; 30,7).
  35. Ou Pães da Proposição; refere-se aos doze pães doces de farinha que eram colocados no templo, diante do Senhor, como sinal de aliança perpétua. Todos os sábados eram trocados por novos e consumidos pelos sacerdotes (Lv 24,5-9).
  36. O sábado foi criado por Deus para benefício do homem (Ex 20,8-11) e, por isso, David interpretou bem a Lei. Ao afirmar o seu senhorio sobre o sábado, Jesus evoca a sua natureza divina, pois apenas Deus é Senhor do sábado.
  37. Lit.: a mão ressequida.
  38. Lit.: levanta-te para o meio.
  39. Lit.: deram um conselho com os herodianos contra Ele (talvez um latinismo: consilium dederunt). Os herodianos eram, muito provavelmente, um pequeno mas influente grupo, que defendia e sustentava politicamente Herodes.
  40. Lit.: para que o não fizessem visível.
  41. Lit.: partiram para Ele, o que implica deixar para trás a situação vivida até então.
  42. Alguns mss. não apresentam aos quais também chamou apóstolos. A afirmação pretende sublinhar a identidade de os Doze com o grupo apostólico. Doze era o número das tribos que constituíam o povo de Israel; ao escolher doze, Jesus indica que um novo povo eleito surgirá, o povo escatológico.
  43. As finalidades do chamamento têm uma ordem precisa: só depois de estar com Jesus se pode proclamar o evangelho, cuja força expulsa do coração do homem a presença do Maligno. Corresponde à missão de Jesus.
  44. Alguns mss. não apresentam constituiu, pois, os Doze.
  45. A importância de Simão no grupo é relevada por: encabeçar a lista; o seu nome aparecer separado do de André seu irmão; Jesus mudar-lhe o nome para Pedra, o que significa que lhe entrega uma missão especial (Mt 16,18). Pedro aparece sempre como porta-voz dos discípulos (8,29.32; 9,5; 10,28; 11,21; 13,3). A Pedro juntam-se as outras duas colunas da Igreja de Jerusalém, Tiago e João (Gl 2,9), que têm o epíteto de filhos do trovão (talvez pelo seu temperamento impetuoso: cf. Lc 9,52-55). São eles que dão início ao grupo dos discípulos, estão com Jesus desde o início (1,16-20) e acompanham-no nos momentos particularmente importantes (5,37; 9,2-20; 14,33-42). Todos os outros nomes não serão mais referidos, exceto André (13,3). O relato termina com timbre negativo, revelando que no grupo dos mais íntimos há um traidor que se unirá aos adversários de Jesus (3,6), o que não só cria uma grande tensão literária, como coloca o leitor, também ele discípulo, de sobreaviso quanto à forma como segue o Senhor. O verbo entregar também significa trair (paradídōmi).
  46. Familiares é acrescento da tradução.
  47. Belzebu, de Baal-Zebub (senhor das moscas) era o nome de uma divindade síria, que se tornou num dos nomes do chefe dos demónios (2Rs 1,2; Mt 10,25; Lc 11,13).
  48. Lit.: na casa do forte... amarrar o forte. No contexto, o forte poderá referir-se a Satanás. Jesus é mais forte (1,7) e pode retirar do poder de Satanás todos aqueles que estão em sua casa (sob o seu domínio). À casa de Satanás contrapõe-se a casa de Jesus e dos seus discípulos (cf. 1,29 nota).
  49. A ação de Jesus é impelida pelo Espírito Santo (1,10-12), por isso blasfemar contra Ele é fazê-lo contra o Espírito Santo. A acusação dos doutores da lei é grave: feitiçaria (cuja pena era a morte).
  50. Alguns mss. omitem e as tuas irmãs.
  51. À volta de Jesus vai-se constituindo uma nova família, marcada não pelos laços de sangue, mas por acreditar em Jesus e aceitar a sua pregação: a família escatológica (10,30).
  52. Is 6,9s. A citação apresenta a incredulidade dos ouvintes de Jesus como algo já profetizado.
  53. Presente durativo: o semeador semeia constantemente.
  54. Lit.: são para tempo oportuno, isto é, efémeros.
  55. Lit.: envia-se imediatamente a foice.
  56. Lit.: falava-lhes a palavra.
  57. Depois das parábolas, Jesus manifesta o seu poder sobre as forças do Maligno: sobre o mar onde elas habitam (4,35), os possessos (5,1-20), as doenças e a própria morte (5,21-43). Apenas a falta de fé é impedimento para que possa afastar do coração dos homens a força do Mal (6,1-6).
  58. A conjunção pode ser traduzida por como ou quando (estava no barco). Tendo em conta o contexto (4,1) e o uso prevalente que Mc faz dela, preferimos a tradução apresentada: tal como estava referir-se-á à posição de sentado (4,1) com o significado magistral e governativo que o verbo evoca.
  59. A forma do pronome grego usada é igual para o masculino e para o neutro, pelo que alguns autores preferem referi-lo a Jesus (com Ele). Mas o substantivo mais próximo é barco pelo que tem mais sentido que se refira a este. Por outro lado, teologicamente é mais significativo: embora haja vários barcos, é um só o barco onde Jesus se encontra (por isso não mais se fará referência aos outros).
  60. No território da Decápole, considerado pagão. A cidade fica a 154 quilómetros a sudeste do lago, o que é estranho, tendo em conta que o v. 13 implica proximidade. Alguns defendem, por isso, que Gérasa se refere a todo o território da Decápole.
  61. Lit.: em espírito impuro (cf. 1,23 nota).
  62. Cf. 1,24 nota.
  63. A afirmação do homem em vez deste homem parece querer sublinhar a missão de Jesus em relação ao ser humano em geral: libertá-lo do poder do Mal (cf. 1,17 nota).
  64. Legião é um termo latino que corresponde a uma unidade militar de aproximadamente 6000 soldados de infantaria e 120 cavaleiros (quando completa). No NT nunca se refere a homens, mas a um grupo de demónios (Mc 5,9.15par.) ou de anjos (Mt 26,53).
  65. Segundo Lv 15,19-33, a menstruação torna a mulher impura. Para alguns, o fluxo seria desta natureza; sendo contínuo, agravava a sua situação de impureza. Isto explicaria o medo da mulher pela reação de Jesus (estando impura não podia tocar em ninguém).
  66. A forma verbal no imperativo presente significa dar continuidade a uma ação que vem de trás: o chefe da sinagoga já acreditava, mas Jesus pede-lhe que continue a acreditar, apesar de humanamente parecer que nada há a fazer.
  67. Lit.: o acompanhasse com Ele.
  68. São o grupo mais íntimo de Jesus, que testemunha a transfiguração (9,2) e o sofrimento no Horto (14,33).
  69. Gente é acrescento da tradução.
  70. Lit.: E eles ficaram imediatamente espantados (imediatamente falta em vários mss.).
  71. No grego clássico, patrís significa pátria, mas no NT refere-se sempre a terra natal. Os discípulos seguem Jesus: o verbo grego está no presente durativo para sublinhar qual a atitude própria do discípulo (seguir continuamente Jesus).
  72. No sentido de que há poderes (entes) sobrenaturais a atuar através das mãos de Jesus (cf. 6,14; 13,25 onde a palavra aparece também no plural).
  73. Lit.: escandalizados nele. Ao contrário de Mt 13,55 e Lc 4,22 que referem Jesus como filho do carpinteiro e filho de José, Mc apresenta-o como filho de Maria, o que não é usual no mundo judaico, pelo que parece uma referência ao nascimento virginal de Jesus.
  74. Lit.: poder, a mesma palavra do v. 2.
  75. Lit.: moeda de cobre na cintura, pequenas moedas de pouco valor.
  76. No grego, o v. 9 passa o discurso para a segunda pessoa do plural (mas tende as sandálias calçadas e não vistais duas túnicas), o que lhe dá ênfase. A recomendação sobre as sandálias calçadas parece evocar Ex 12, sublinhando a disponibilidade permanente para partir; vestir duas túnicas era comum, como proteção do frio, para quem viajava.
  77. Ungir com azeite era uma prática medicinal comum (cf. Is 1,6; Lc 10,34); aqui parece ter um significado espiritual e simbólico (tal como em Tg 5,14s, onde a oração acompanha a unção).
  78. Lit.: falar de Jesus é acrescento da tradução.
  79. Lit.: O próprio Herodes, enviando, agarrou João.
  80. Lit.: porque a desposara.
  81. Lit.: A filha dele, Herodíade; parece ser um erro corrigido por vários mss., pois isso significaria que seria filha de Herodes Ântipas e, portanto, teria o mesmo nome da mãe (o que não era impossível). Ela, porém, chamava-se Salomé e era filha de outro Herodes, irmão de Herodes Ântipas; Mc chama-lhe Filipe, talvez confundindo-o com o outro irmão destes dois Herodes (cf. Flávio Josefo, Ant. 18,136). Lc 3,19 suprime o nome Filipe, talvez por se ter dado conta da confusão.
  82. A mesma promessa é feita pelo rei Assuero a Ester (Est 5,3.6; 7,2), embora por razões diferentes.
  83. Lit.: e com pressa indo ter com o rei.
  84. É a segunda vez (segundo alguns mss., a única: cf. 3,14 nota) que Mc usa o termo apóstolos (lit.: os enviados) para falar de os Doze, expressão que, juntamente com os discípulos, prefere.
  85. Para onde iam é acrescento da tradução.
  86. Mc apresenta-nos duas multiplicações dos pães, uma no território israelita (6,34-44) e outra em território pagão (8,1-10), o que parece ter uma intenção teológica: o pão de Jesus não se destina apenas a Israel, mas também aos considerados pagãos.
  87. Cf. Nm 27,17.
  88. Lit.: grupo de refeição a grupo de refeição. No mundo antigo as pessoas comiam reclinadas em leitos apropriados; no mundo judaico esta postura evoca a refeição pascal (Mc 14,18). Refeição é a tradução de sympósion que é hápax legómenon (única vez em que ocorre a palavra) no NT; tendo em conta o uso na literatura grega significa banquete, o que no contexto parece evocar o séder pascal (ritual da Páscoa hebraica).
  89. A referência à erva verde parece evocar o Sl 23.
  90. Vocabulário eminentemente eucarístico (Mc 14,17-23par.). Mais do que ver nos pães e peixes um símbolo dos cinco livros da Torá e das duas tábuas da Lei (entre outras interpretações), o que parece importar é a soma: sete, número da perfeição divina. Em e por Jesus, Deus oferece o alimento escatológico, que sacia perfeitamente e que sobeja.
  91. Lit.: doze cestas cheias e também dos peixes.
  92. O termo grego pygmḗ, que traduzimos por punho, é de difícil interpretação. Alguns mss. omitem-no e outros substituem-no por pykná (muitas vezes). Mantemos a lectio difficilior que concorda com a Michná: limpam-se as mãos [derramando água sobre elas] até ao punho (mYad. 2,3).
  93. A tradição dos antigos é uma referência às leis transmitidas oralmente, paralelamente à Escritura, que os fariseus atribuíam a Moisés (e que os saduceus não aceitavam).
  94. Alguns mss. não apresentam e camas. O verbo grego traduzido por lavar é baptízō e o substantivo lavagem é baptismós; trata-se de uma ironia: os fariseus não recebem o batismo de conversão e o do Espírito, mas batizam-se para comer, batizam os utensílios e até o próprio leito.
  95. Lit.: Por que razão não andam.
  96. Is 29,13 (LXX).
  97. Ex 20,12; Dt 5,16.
  98. Ex 21,17; Lv 20,9. Lit.: que com morte pereça.
  99. Lit.: Korbán – que é oferta – o que de mim te aproveitaria. Etimologicamente o hebraico korbán significa aquilo que é aproximado de Deus ou do altar, e é usado para falar das ofertas ao templo. Ao ser declarada korbán, a oferta já não pode ter outro destino, de acordo com a interpretação farisaica de Nm 30,2-4. Cf. Mt 23,18-22.
  100. Se alguém tem ouvidos para ouvir, ouça: este v. 16 falta nos mss. mais importantes e deve ser uma glossa secundária inspirada em 4,9 ou 4,23.
  101. Lit.: olho mau. Todos os vícios apresentados por Mc aparecem noutras listas do NT, exceto más intenções e olho mau.
  102. O termo blasfémia também pode significar calúnia, boato.
  103. Alguns mss. acrescentam e Sídon, o que parece uma harmonização com 7,31 (cf. 3,8) e Mt 15,21. Trata-se de uma cidade sirofenícia, a norte da Galileia, importante entreposto comercial.
  104. Grega significa pagã (refere-se à cultura e não à naturalidade, pois diz-se que era sirofenícia).
  105. Para os israelitas, apenas os judeus eram destinatários da salvação, porque filhos da promessa feita a Abraão; todos os outros eram considerados infiéis e tratados com dureza (cães). Ao usar esta linguagem comum, Jesus, com ironia, sublinha que há mais fé naqueles que são considerados cães do que entre os que se consideram filhos.
  106. Lit.: E cuspindo tocou-lhe a língua.
  107. Dalmanutá é um lugar desconhecido (Mt 15,39 apresenta Magadán).
  108. Lit.: E suspirando no seu espírito.
  109. Lit.: Vede, olhai de [longe].
  110. Jr 5,21; Ez 12,2. No contexto, Jesus recorda a condenação dos de fora (4,12) com as palavras de Is 6,9s.
  111. Lit.: tendo cuspido nos olhos dele.
  112. Lit.: Eles disseram-lhe, dizendo.
  113. Lit.: falava a palavra.
  114. É a mesma expressão com que Jesus chamou Pedro junto ao mar da Galileia (1,17). O lugar do discípulo é atrás de Jesus, percorrendo o mesmo caminho do seu Senhor, que implica a glória da ressurreição, mas também a paixão e morte. Pedro não quer e atravessa-se (tal como o Diabo) no caminho do Mestre e nos desígnios de Deus; tem a ousadia de repreender severamente Jesus (o verbo usado é o mesmo que expressa as ordens que Jesus dá aos espíritos impuros). Jesus recorda-lhe qual é o seu lugar, voltando, com a mesma expressão, a chamá-lo ao discipulado fiel, e deixa bem claro à multidão e aos que o seguem (também ao leitor) o que implica ser seu discípulo: seguir atrás dele (repare-se no pleonasmo, que enfatiza o lugar do discípulo), abandonando os critérios humanos e abraçando a cruz.
  115. Provar a morte é uma expressão que não se encontra no AT, mas nos paralelos de Mt 16,28 e Lc 9,27, em Jo 8,52 e Hb 2,9, e na primeira sentença (lógion) do apócrifo Evangelho de Tomé: Quem encontrar a interpretação destas palavras não provará a morte.
  116. Cf. Ml 3,23s, sobre a vinda de Elias antes do Dia do Senhor.
  117. Refere-se à Escritura no seu conjunto, pois nenhuma passagem específica refere o sofrimento do Filho do Homem; nem os salmos do Justo sofredor (por ex.: Sl 22; 41; 69), nem as passagens sobre o Servo sofredor do Deutero-Isaías (Is 50,4-9; 52,13-53,12) usam a expressão filho do homem.
  118. Refere-se a João Batista, embora em nenhuma passagem da Escritura se fale sobre o sofrimento do Elias escatológico; apenas 1Rs 19,1s.10.14 fala da perseguição que Elias, tal como João, sofreu por parte do rei Acaz e da esposa Jezabel.
  119. Lit.: partiu em pedaços.
  120. Alguns mss. acrescentam com lágrimas.
  121. De espíritos é acrescento da tradução.
  122. Vários mss. acrescentam e jejum.
  123. Alguns mss. não apresentam no caminho por ser uma redundância, que, no entanto, parece propositada, tendo em conta a importância da expressão (cf. 8,33 nota; 1,12 nota).
  124. Lit.: um copo de água, no [meu] nome porque sois de Cristo.
  125. Em mim está ausente de alguns mss..
  126. Lit.: uma mó de jumento; refere-se às mós de moinho movidas pelos jumentos.
  127. Geena é usada em Mc apenas nesta perícope (vv. 43.45.47). A palavra é resultado da evolução do hebraico  ben-hinnom que significa Vale do Filho de Hinnom, localizado a sul de Jerusalém. A sua ligação com o fogo explica-se, segundo alguns, por aí se encontrarem os fornos para cozer barro (Jr 19,2) ou, segundo outros, por ser a lixeira de Jerusalém, onde o fogo consumia continuamente os detritos (e por isso não se apaga). Na literatura intertestamentária, a Geena é contraposta ao paraíso das delícias (4Esd 7,36; 1Hen 90,26s).
  128. Os vv. 44 e 46 não se encontram nos melhores testemunhos do texto; reproduzem o v. 48, por influência do qual parece terem entrado em alguns mss..
  129. Cf. Is 66,24. Verme deles refere-se aos cadáveres de que fala Isaías.
  130. V. enigmático. Não se trata do fogo referido no v. anterior, mas de um fogo escatológico. A imagem parece fazer referência aos sacrifícios do AT: Lv 2,9-10,13; cf. Ez 43,24. O sentido poderá ser: tal como algumas vítimas eram salgadas para serem oferecidas a Deus, assim todos os homens o serão pelo fogo escatológico.
  131. Dt 24,1-4.
  132. Gn 1,27.
  133. Gn 2,24. Alguns mss. não apresentam unir-se-á à sua mulher: pode ser acrescento do copista para melhor se conformar com o texto completo de Gn 2,24.
  134. Atualização das palavras de Jesus (Mt 5,32) para o contexto greco-romano (no mundo hebraico a mulher não podia repudiar o marido).
  135. Algumas é acrescento da tradução.
  136. Ex 20,12-16; Dt 5,16-20. Não roubes, não dês falso testemunho falta em alguns mss., assim como nos paralelos de Mt 19,18 e Lc 18,20. Cf. Sir 4,1; Dt 24,14.
  137. Para a mentalidade hebraica, as riquezas eram um sinal de bênção divina: Gn 13,2; 24,35; 26,13s; 30,43; 32,6; 33,11; Lv 26,3-10; Dt 28,3-6.11s; 1Rs 3,13; 10,14-25; Sl 112,3.
  138. Alguns mss. acrescentam aos que confiaram nas riquezas, e outros um rico.
  139. Em Mt 20,20-23 é a mãe de Tiago e João a fazer o pedido, que tem na sua base uma conceção messiânico-política.
  140. O uso do presente significa que o processo da paixão já decorre.
  141. Alguns mss. acrescentam pelo meu Pai, mas parece tratar-se de harmonização com Mt 20,23.
  142. Outros é acrescento da tradução.
  143. Lit.: Em resposta a ele.
  144. Aramaico: Meu Mestre.
  145. Betfagé significa Casa dos Figos. A referência enquadra a maldição da figueira nos vv. 12ss.
  146. Sl 118,25s. A expressão hossana poderá ser uma forma aramaica da invocação hebraica hōchī῾ā-nāh do Sl 118,25, que significa salva-nos, mas que no tempo do NT parece ter já perdido este sentido original para se tornar numa expressão aclamativa.
  147. Este episódio é enquadrado no início do capítulo pela referência a Betfagé (Casa dos Figos) e tem um claro sabor profético: na tradição bíblica, a figueira é símbolo de Israel (Jr 8,13; Is 28,3s; Os 9,10.16), e a falta de figos (ou de uvas, quando a imagem é a videira) da sua esterilidade (Mq 7,1s; cf. Is 5,1s). Visto que Mc apresenta a ação simbólica de Jesus como moldura para a expulsão dos vendedores do templo, aquela parece significar a declaração da esterilidade das instituições e, de modo particular, do culto de Israel.
  148. Refere-se provavelmente aos recipientes usados para ritos religiosos.
  149. Is 56,7.
  150. Jr 7,11.
  151. Isto é acrescento da tradução.
  152. O v. 26 – Mas se vós não perdoardes, também o vosso Pai celeste não perdoará as vossas transgressões – não aparece nos códices mais importantes e parece ser uma harmonização com Mt 6,15.
  153. A parábola é dirigida aos membros do Sinédrio (11,27).
  154. Is 5,1s.
  155. Sl 118,22s.
  156. Lit.: e não te importas acerca de ninguém, pois não olhas para o rosto dos homens.
  157. Em Mc, o verbo pôr à prova ou tentar apenas tem como sujeito Satanás (1,13) e os fariseus (10,2; 12,15: aqui também os herodianos).
  158. Lit.: tomou a mulher, na aceção de desposar (assim também nos vv. ss.).
  159. Lit.: Tome a mulher e produza semente (assim também nos vv. ss.). Citação de Dt 25,5, da chamada lei do levirato (Dt 25,5-10). Cf. Gn 38,8.
  160. Alguns mss. não apresentam quando ressuscitarem.
  161. Ex 3,6.
  162. Dt 6,4s.
  163. Lv 19,18.
  164. Dt 4,35s; 6,4s. Cf. Is 45,21s; Ex 8,6.
  165. Sl 110,1. A esperança de um rei messiânico da dinastia davídica está presente nos profetas (Is 9,5s; 11,1; Jr 23,5; 33,15-17; Ez 34,23s;), na tradição rabínica (é a décima quarta das Dezoito Bênçãos) e também em Qumran (4QPatr 3-4; 4QFlor 1,11-13; 4Q 285,5). Jesus anuncia que o cumprimento ultrapassa todas as esperanças: o Messias não é filho de David, mas de Deus, tal como o próprio Pai o proclama (1,9; 9,7; cf. 1,1 nota).
  166. O termo grego refere-se à sala do tesouro do templo e, por isso, não acessível; visto o contexto, percebe-se que se refere a uma das treze arcas onde as ofertas eram colocadas, situadas no primeiro pátio interior do templo, próximo do Pátio das Mulheres, onde também estas podiam entrar.
  167. Estes sinais aparecem em vários textos da literatura apocalíptica judaica: guerras (4Esd 13,31; ApEsd 3,13), terramotos (Is 13,13; 1Hen 1,5ss; 4Esd 6,14) e fome (Is 14,30; 2Bar 70,8).
  168. Ou: Hão de entregar-vos aos sinédrios e nas sinagogas sereis açoitados.
  169. Lit.: para testemunho a eles.
  170. Lit.: for dado.
  171. A abominação da desolação é uma expressão de Dn (11,31; 12,11; cf. 9,27) para designar a estátua do deus sírio Baal Chamayim (Senhor dos céus, Zeus) que Antíoco IV Epifânio mandou colocar no templo de Jerusalém em 167 a.C. (cf. 1Mac 1,54.59; 6,7; 2Mac 6,2). O uso da expressão poderá ter sido motivado pelo sacrilégio idêntico ocorrido em 39-42 d.C., quando Calígula ordenou que a sua estátua fosse colocada no templo, ou então, com maior probabilidade, pela profanação e destruição do templo no ano 70 d.C. às mãos de Tito.
  172. Um dos dois ai! de Mc (cf. 14,21); Mt e Lc apresentam vários.
  173. Lit.: que Deus criou.
  174. Dn 12,1; Jl 2,2.
  175. Lit.: nenhuma carne.
  176. Is 13,10; 34,4. Cf. Jl 2,10; Ag 2,6.21; 2Pd 3,10.
  177. Dn 7,13s.
  178. O sujeito é o Filho do Homem, como se percebe pelo contexto.
  179. Alguns mss. acrescentam e rezai.
  180. Judas é sempre recordado como um dos Doze, o que acentua ainda mais a gravidade da sua traição.
  181. Lit.: para o entregar a eles. O verbo grego paradídōmi tem um duplo sentido (entregar e trair) que a tradução não consegue manter.
  182. O cordeiro pascal.
  183. Sl 41,10.
  184. Lit.: molha comigo no prato. O prato é possivelmente o do composto de frutos e azeite (harōset) onde se molhavam as ervas amargas.
  185. Alguns mss. apresentam nova aliança, possivelmente por harmonização com Lc 22,20 e 1Cor 11,25.
  186. Em favor de muitos, de acordo com o que Jesus anunciara em 10,45: o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos. O sentido é inclusivo e não excludente; o grego parece fazer eco do hebraico hārabbîm (os muitos), que, quer no AT, quer em Qumran, tem o sentido de multidão ou mesmo de todos (cf. Is 53,11s). Jesus entrega a vida por todos, mas nem todos aceitam a aliança que no seu sangue é selada e oferecida.
  187. Zc 13,7.
  188. Getsémani significa Lagar de Azeite e está localizado no sopé do Monte das Oliveiras (embora as fontes judaicas antigas não refiram o topónimo).
  189. Sl 6,3; 42,6.12; 43,5. Encontramos uma expressão semelhante em Sir 37,2: Não é porventura uma tristeza de morte que um companheiro ou amigo se torne um inimigo?.
  190. As frases são de difícil interpretação. Alguns traduzem a primeira: Dormi agora e descansai, mas o imperativo não tem sentido no contexto (cf. v. 42). A NVg interpreta como uma interrogação no presente. O verbo grego apékhō é hápax (ocorre apenas aqui) e uma crux interpretum, ou seja, com várias hipóteses de interpretação: Basta! (interpretação de S. Jerónimo, referindo-se à tríplice oração de Jesus e à tríplice incapacidade dos discípulos); Está porventura longe? (pergunta retórica, com resposta imediatamente a seguir: Não, a hora chegou).
  191. Lit.: Envolto num lençol sobre a nudez. Várias são as tentativas de identificar este jovem: para uns seria o apóstolo João (opinião mais difundida), para outros, Tiago, irmão do Senhor, ou alguém que residia na casa da última ceia, ou ainda Marcos. Nenhuma delas encontra fundamento suficiente no texto. Outros apresentam uma explicação simbólica (cristológica ou batismal).
  192. Lit.: junto à luz.
  193. Humanas é acrescento da tradução, nas duas ocorrências do v..
  194. Possível evocação do nome divino revelado no Sinai (cf. Ex 3,14).
  195. Lit.: do Poder.
  196. A citação resulta da confluência de Dn 7,13 e do Sl 110,1.
  197. Alguns mss.: Profetiza para nós, ó Cristo: quem é que te bateu?, o que parece ser uma harmonização com Mt 26,68.
  198. Alguns mss. não apresentam e um galo cantou.
  199. Alguns mss. acrescentam e o teu modo de falar é parecido, o que parece ser uma harmonização com Mt 26,73.
  200. Alguns mss. não apresentam pela segunda vez, talvez para harmonizar com Mt 26,74; Lc 22,60; Jo 18,27.
  201. Como o Servo anunciado por Isaías, Jesus não abre a boca diante daqueles que o maltratam (Is 53,7).
  202. Sempre é acrescento da tradução.
  203. Em aramaico bar-‘abbas, que literalmente significa filho do pai.
  204. Possível referência ao facto de o pretório se localizar num lugar elevado.
  205. Lit.: que assim lhes fizesse.
  206. Outros mss. apresentam: Então que farei ao rei dos judeus?.
  207. Pretório designava a residência do governador (procurador) romano.
  208. Lit.: Alegra-te, que corresponde à saudação helénica.
  209. Jesus é acrescento da tradução.
  210. Sl 22,19, embora com diferenças textuais (LXX).
  211. A hora não aparece nos outros sinópticos e é de difícil conciliação com a hora sexta indicada por Jo 19,14 para a entrega de Jesus por Pilatos para ser crucificado. A diferença pode ter a sua origem na transmissão independente do texto. Alguns defendem que a hora tércia se refira a todo o período das nove horas (tércia) às doze (sexta).
  212. O v. 28 – E cumpriu-se a Escritura que diz: Foi contado entre os malfeitores – falta nos mss. mais importantes (talvez seja influência de Lc 22,37 citando Is 53,12).
  213. Sl 22,8.
  214. Cf. Sl 22,2; apresenta um texto muito próximo dos LXX (21,2).
  215. Tiago Menor para distinguir de Tiago, filho de Zebedeu e irmão de João. Salomé é provavelmente a que Mt 27,56 identifica como mãe de Tiago e João.
  216. A morte na cruz era muito lenta, podendo levar dias.
  217. José é acrescento da tradução.
  218. Lit.: Maria, a de Tiago.
  219. O regresso à Galileia, onde tudo começou, é um convite a recomeçar o discipulado, mas agora relendo à luz da Páscoa tudo o que Jesus disse e fez.
  220. As mulheres são as mesmas que presenciaram a morte de Jesus (15,40), a sua sepultura (15,47) e agora a ressurreição: os três momentos que constituem o querigma, o núcleo fundamental da fé cristã (cf. 1Cor 15,3ss; At 2,23s; 4,10; 10,39s). O facto de o evangelho terminar com o silêncio temeroso das mulheres que receberam o anúncio da ressurreição parece ser uma técnica narrativa de Mc para desafiar o leitor a não cair na mesma tentação de ter medo de anunciar a boa nova que recebeu de Jesus. Tendo em conta o final truncado (termina com a conjunção grega gar: tinham medo pois...), alguns mss. de pouco peso acrescentam, com um vocabulário que não é típico de Mc: Mas anunciaram aos que estavam à volta de Pedro tudo o que lhes fora ordenado. Depois disto, o próprio Jesus enviou através deles, do oriente ao ocidente, o sagrado e incorruptível anúncio da salvação eterna.
  221. Estes vv. (a chamada conclusão longa) estão presentes em muitos mss., mas faltam nos dois grandes códices do séc. IV: o Vaticano e o Sinaítico (e ainda no minúsculo 304 do séc. XII, na versão siríaca sinaítica e em outros). No entanto, a sua canonicidade não foi posta em causa nem por S. Jerónimo, que os incluiu na Vg, nem pelo Concílio de Trento. Percebe-se que dependem dos outros evangelhos: a aparição a Maria Madalena de Jo 20,11-18; o episódio dos discípulos que iam a caminho do campo de Lc 24,13-35; a aparição aos Onze enquanto estão à mesa de Lc 24,41-43 e Jo 21,5.9-13.
  222. Lit.: Depois disto, a dois deles que caminhavam manifestou-se sob outra forma indo eles para o campo.