Difference between revisions of "Evangelho segundo São João"
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Testemunho de João Batista<ref name="ftn49">João, para além da sua missão específica em relação a Jesus, também representa aqui o judaísmo profético e ascético.</ref> – <span style="color:red"><sup>22</sup></span>Depois disto, Jesus e os seus discípulos foram para o território da Judeia. Ali se demorou com eles e batizava. <span style="color:red"><sup>23</sup></span>Ora, também João estava a batizar em Enón, perto de Salim, porque as águas ali eram abundantes; eles acorriam e eram batizados, <span style="color:red"><sup>24</sup></span>pois João não fora ainda lançado na prisão. | Testemunho de João Batista<ref name="ftn49">João, para além da sua missão específica em relação a Jesus, também representa aqui o judaísmo profético e ascético.</ref> – <span style="color:red"><sup>22</sup></span>Depois disto, Jesus e os seus discípulos foram para o território da Judeia. Ali se demorou com eles e batizava. <span style="color:red"><sup>23</sup></span>Ora, também João estava a batizar em Enón, perto de Salim, porque as águas ali eram abundantes; eles acorriam e eram batizados, <span style="color:red"><sup>24</sup></span>pois João não fora ainda lançado na prisão. | ||
− | <span style="color:red"><sup>25</sup></span>Surgiu, então, uma controvérsia entre alguns discípulos de João e um judeu, acerca da purificação. | + | <span style="color:red"><sup>25</sup></span>Surgiu, então, uma controvérsia entre alguns discípulos de João e um judeu, acerca da purificação. <span style="color:red"><sup>26</sup></span>Foram ter com João e disseram-lhe: «Rabi, aquele que estava contigo na outra margem do Jordão, do qual tu deste testemunho, eis que Ele está a batizar e todos vão ter com Ele». <span style="color:red"><sup>27</sup></span>Respondeu João e disse: «Um homem nada pode receber, se não lhe tiver sido dado do céu. <span style="color:red"><sup>28</sup></span>Vós próprios dais testemunho de mim, de que disse que eu não sou o Cristo, mas que fui enviado adiante dele. <span style="color:red"><sup>29</sup></span>Quem tem a noiva é noivo. O amigo do noivo<ref name="ftn50">Responsável por preparar tudo para o casamento.</ref>, que está presente e o ouve, exulta de alegria<ref name="ftn51">Lit.: ''com alegria se alegra''.</ref> por causa da voz do noivo. Pois bem, esta minha alegria está completa! <span style="color:red"><sup>30</sup></span>É necessário que Ele cresça e eu diminua<ref name="ftn52">O discurso do Batista parece acabar aqui; os vv. 31-36 têm mais sentido ligados ao v. 21, na continuidade do discurso de Jesus.</ref>. |
<span style="color:red"><sup>31</sup></span>Aquele que vem do alto<ref name="ftn53">Cf. v. 3 nota.</ref> está acima de todos; aquele que é da terra, da terra é, e da terra fala. Aquele que vem do céu está acima de todos; <span style="color:red"><sup>32</sup></span>o que viu e ouviu, disso dá testemunho, mas ninguém acolhe o seu testemunho! <span style="color:red"><sup>33</sup></span>Quem acolhe o seu testemunho certifica<ref name="ftn54">Lit.: ''selou'' (forma de autenticar os documentos).</ref> que Deus é verdadeiro, <span style="color:red"><sup>34</sup></span>pois aquele que Deus enviou diz as palavras de Deus. De facto, Ele<ref name="ftn55">''Ele'' é acrescento da tradução; o sujeito, no grego, é dúbio: Deus ou Jesus? Tal como noutras passagens, a ambiguidade parece intencional, pois o Espírito Santo é dado pelo Pai (14,26), mas também pelo Filho (15,26).</ref> dá o Espírito sem medida. <span style="color:red"><sup>35</sup></span>O Pai ama o Filho e tudo entregou na sua mão. <span style="color:red"><sup>36</sup></span>Quem acredita no Filho tem a vida eterna; mas quem desobedece ao Filho não verá a vida; pelo contrário, a ira de Deus permanece sobre ele». | <span style="color:red"><sup>31</sup></span>Aquele que vem do alto<ref name="ftn53">Cf. v. 3 nota.</ref> está acima de todos; aquele que é da terra, da terra é, e da terra fala. Aquele que vem do céu está acima de todos; <span style="color:red"><sup>32</sup></span>o que viu e ouviu, disso dá testemunho, mas ninguém acolhe o seu testemunho! <span style="color:red"><sup>33</sup></span>Quem acolhe o seu testemunho certifica<ref name="ftn54">Lit.: ''selou'' (forma de autenticar os documentos).</ref> que Deus é verdadeiro, <span style="color:red"><sup>34</sup></span>pois aquele que Deus enviou diz as palavras de Deus. De facto, Ele<ref name="ftn55">''Ele'' é acrescento da tradução; o sujeito, no grego, é dúbio: Deus ou Jesus? Tal como noutras passagens, a ambiguidade parece intencional, pois o Espírito Santo é dado pelo Pai (14,26), mas também pelo Filho (15,26).</ref> dá o Espírito sem medida. <span style="color:red"><sup>35</sup></span>O Pai ama o Filho e tudo entregou na sua mão. <span style="color:red"><sup>36</sup></span>Quem acredita no Filho tem a vida eterna; mas quem desobedece ao Filho não verá a vida; pelo contrário, a ira de Deus permanece sobre ele». | ||
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<span style="color:red"><sup>25</sup></span>Ao encontrá-lo na outra margem do mar, disseram-lhe: «Rabi, quando chegaste aqui?». <span style="color:red"><sup>26</sup></span>Respondeu-lhes Jesus e disse: «Amen, amen vos digo: procurais-me não porque vistes sinais, mas porque comestes dos pães e ficastes saciados. <span style="color:red"><sup>27</sup></span>Trabalhai não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece para a vida eterna e que o Filho do Homem vos dará; pois foi a Ele que Deus, o Pai, marcou com o selo». | <span style="color:red"><sup>25</sup></span>Ao encontrá-lo na outra margem do mar, disseram-lhe: «Rabi, quando chegaste aqui?». <span style="color:red"><sup>26</sup></span>Respondeu-lhes Jesus e disse: «Amen, amen vos digo: procurais-me não porque vistes sinais, mas porque comestes dos pães e ficastes saciados. <span style="color:red"><sup>27</sup></span>Trabalhai não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece para a vida eterna e que o Filho do Homem vos dará; pois foi a Ele que Deus, o Pai, marcou com o selo». | ||
− | <span style="color:red"><sup>28</sup></span>Disseram-lhe, então: «Que havemos de fazer para realizar as obras de Deus?». <span style="color:red"><sup>29</sup></span>Respondeu Jesus e disse-lhes: «Esta é a obra de Deus: que acrediteis naquele que Ele enviou». <span style="color:red"><sup>30</sup></span>Disseram-lhe: «Que sinal fazes Tu, para que vejamos e acreditemos em ti? Que obra realizas? | + | <span style="color:red"><sup>28</sup></span>Disseram-lhe, então: «Que havemos de fazer para realizar as obras de Deus?». <span style="color:red"><sup>29</sup></span>Respondeu Jesus e disse-lhes: «Esta é a obra de Deus: que acrediteis naquele que Ele enviou». <span style="color:red"><sup>30</sup></span>Disseram-lhe: «Que sinal fazes Tu, para que vejamos e acreditemos em ti? Que obra realizas? <span style="color:red"><sup>31</sup></span>Os nossos pais comeram o maná no deserto<ref name="ftn90">Cf. Ex 16,4ss.</ref>, como está escrito: ''Deu-lhes a comer pão do céu''<ref name="ftn91">Sl 78,24; cf. Ex 16,4.15.</ref>». <span style="color:red"><sup>32</sup></span>Disse-lhes, então, Jesus: «Amen, amen vos digo: não foi Moisés que vos deu o pão do céu, mas o meu Pai é que vos dá o verdadeiro pão do céu. <span style="color:red"><sup>33</sup></span>Pois o pão de Deus é o que desce do céu e dá vida ao mundo». <span style="color:red"><sup>34</sup></span>Disseram-lhe, então: «Senhor, dá-nos sempre esse pão!». <span style="color:red"><sup>35</sup></span>Disse-lhes Jesus: «Eu sou o pão da vida: quem vem a mim jamais terá fome; quem acredita em mim jamais terá sede. <span style="color:red"><sup>36</sup></span>No entanto, disse-vos: vistes-me e não acreditais. <span style="color:red"><sup>37</sup></span>Tudo o que o Pai me dá, virá a mim, e o que vem a mim jamais o expulsarei, <span style="color:red"><sup>38</sup></span>porque desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. <span style="color:red"><sup>39</sup></span>E a vontade daquele que me enviou é esta: que nada perca do que me deu, mas o ressuscite no último dia. <span style="color:red"><sup>40</sup></span>Pois esta é a vontade do meu Pai: que todo aquele que vê o Filho e acredita nele tenha vida eterna; e Eu o ressuscitarei no último dia». |
<span style="color:red"><sup>41</sup></span>Então os judeus começaram a murmurar contra Ele, porque tinha dito: «Eu sou o pão que desceu do céu». <span style="color:red"><sup>42</sup></span>E diziam: «Este não é Jesus, o filho de José? Não conhecemos nós o pai e a mãe? Como é que agora diz: "Eu desci do céu"?». | <span style="color:red"><sup>41</sup></span>Então os judeus começaram a murmurar contra Ele, porque tinha dito: «Eu sou o pão que desceu do céu». <span style="color:red"><sup>42</sup></span>E diziam: «Este não é Jesus, o filho de José? Não conhecemos nós o pai e a mãe? Como é que agora diz: "Eu desci do céu"?». | ||
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− | Entrada messiânica em Jerusalém (Mt 21,1-11; Mc 11,1-11; Lc 19,29-40) – | + | Entrada messiânica em Jerusalém (Mt 21,1-11; Mc 11,1-11; Lc 19,29-40) – <span style="color:red"><sup>12</sup></span>No dia seguinte, a numerosa multidão que tinha vindo para a festa, ao ouvir dizer que Jesus estava a chegar a Jerusalém, <span style="color:red"><sup>13</sup></span>apanhou ramos de palmeira, saiu ao seu encontro, e gritava: |
''Hossana! '' | ''Hossana! '' | ||
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− | 13 O lava-pés – <span style="color:red"><sup>1</sup></span>Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a sua hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até à consumação<ref name="ftn181">A consumação (''télos'': ''fim/consumação'') realizar-se-á na cruz (''tetélestai'': ''está consumado'' – 19,28.30). De notar a insistência no ''saber'' de Jesus (vv. 1.3): a consciência de que regressa ao Pai (cf. 3,13), levando à consumação o seu amor salvífico (cf. 3,14-16), depois da recíproca entrega da Mãe e do Discípulo Amado. Então poderá declarar: ''Está consumado'' (cf. 19,27 nota).</ref>. <span style="color:red"><sup>2</sup></span>Durante a ceia, quando o Diabo já tinha lançado no coração de Judas, filho de Simão Iscariotes, a decisão de o entregar, <span style="color:red"><sup>3</sup></span>Jesus, sabendo que o Pai tudo lhe colocara nas mãos e que de Deus saíra e para Deus voltava, <span style="color:red"><sup>4</sup></span>levantou-se da ceia, tirou as vestes e, tomando uma toalha, atou-a à cintura. <span style="color:red"><sup>5</sup></span>Depois deitou água na bacia e começou a lavar os pés dos discípulos e a secá-los com a toalha que tinha atado à cintura<ref name="ftn182">Lavar os pés a outros era próprio de escravos não judeus. Daí a repulsa de Pedro. Trata-se de um gesto simbólico, que antecipa a morte de Jesus e representa toda a sua vida: despojou-se da sua dignidade (significada nas vestes) para manifestar o seu amor; o próprio Jesus interpreta o gesto e apresenta-o como um exemplo que os discípulos devem assumir (vv. 12-15).</ref>. <span style="color:red"><sup>6</sup></span>Chegou, então, a Simão Pedro, que lhe disse: «Senhor, Tu vais lavar-me os pés?». <span style="color:red"><sup>7</sup></span>Respondeu Jesus e disse-lhe: «O que Eu estou a fazer, tu não o compreendes agora; entenderás depois». <span style="color:red"><sup>8</sup></span>Disse-lhe Pedro: «Jamais me lavarás os pés!»<ref name="ftn183">Lit.: ''Jamais me lavarás os pés para sempre''.</ref>. Respondeu-lhe Jesus: «Se não te lavar, não terás parte comigo»<ref name="ftn184">A expressão ''ter parte com'' é um semitismo que significa participação; aqui, no amor salvífico de Jesus. Para que tal aconteça, é preciso Pedro mudar de mentalidade e de critérios.</ref>. <span style="color:red"><sup>9</sup></span>Disse-lhe Simão Pedro: «Senhor, então não só os meus pés, mas também as mãos e a cabeça».<span style="color:red"><sup>10</sup></span>Disse-lhe Jesus: «Quem tomou banho não tem necessidade de lavar senão os pés, pois está inteiramente puro<ref name="ftn185">O grego ''katharós'' tem um duplo sentido, ambos presentes na declaração de Jesus: ''limpo'' e ''puro''.</ref>. E vós estais puros, mas não todos». | + | 13 O lava-pés – <span style="color:red"><sup>1</sup></span>Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a sua hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até à consumação<ref name="ftn181">A consumação (''télos'': ''fim/consumação'') realizar-se-á na cruz (''tetélestai'': ''está consumado'' – 19,28.30). De notar a insistência no ''saber'' de Jesus (vv. 1.3): a consciência de que regressa ao Pai (cf. 3,13), levando à consumação o seu amor salvífico (cf. 3,14-16), depois da recíproca entrega da Mãe e do Discípulo Amado. Então poderá declarar: ''Está consumado'' (cf. 19,27 nota).</ref>. <span style="color:red"><sup>2</sup></span>Durante a ceia, quando o Diabo já tinha lançado no coração de Judas, filho de Simão Iscariotes, a decisão de o entregar, <span style="color:red"><sup>3</sup></span>Jesus, sabendo que o Pai tudo lhe colocara nas mãos e que de Deus saíra e para Deus voltava, <span style="color:red"><sup>4</sup></span>levantou-se da ceia, tirou as vestes e, tomando uma toalha, atou-a à cintura. <span style="color:red"><sup>5</sup></span>Depois deitou água na bacia e começou a lavar os pés dos discípulos e a secá-los com a toalha que tinha atado à cintura<ref name="ftn182">Lavar os pés a outros era próprio de escravos não judeus. Daí a repulsa de Pedro. Trata-se de um gesto simbólico, que antecipa a morte de Jesus e representa toda a sua vida: despojou-se da sua dignidade (significada nas vestes) para manifestar o seu amor; o próprio Jesus interpreta o gesto e apresenta-o como um exemplo que os discípulos devem assumir (vv. 12-15).</ref>. <span style="color:red"><sup>6</sup></span>Chegou, então, a Simão Pedro, que lhe disse: «Senhor, Tu vais lavar-me os pés?». <span style="color:red"><sup>7</sup></span>Respondeu Jesus e disse-lhe: «O que Eu estou a fazer, tu não o compreendes agora; entenderás depois». <span style="color:red"><sup>8</sup></span>Disse-lhe Pedro: «Jamais me lavarás os pés!»<ref name="ftn183">Lit.: ''Jamais me lavarás os pés para sempre''.</ref>. Respondeu-lhe Jesus: «Se não te lavar, não terás parte comigo»<ref name="ftn184">A expressão ''ter parte com'' é um semitismo que significa participação; aqui, no amor salvífico de Jesus. Para que tal aconteça, é preciso Pedro mudar de mentalidade e de critérios.</ref>. <span style="color:red"><sup>9</sup></span>Disse-lhe Simão Pedro: «Senhor, então não só os meus pés, mas também as mãos e a cabeça».<span style="color:red"><sup>10</sup></span>Disse-lhe Jesus: «Quem tomou banho não tem necessidade de lavar senão os pés, pois está inteiramente puro<ref name="ftn185">O grego ''katharós'' tem um duplo sentido, ambos presentes na declaração de Jesus: ''limpo'' e ''puro''.</ref>. E vós estais puros, mas não todos». <span style="color:red"><sup>11</sup></span>De facto, Ele sabia quem o haveria de entregar; por isso, disse: «Nem todos estais puros». |
<span style="color:red"><sup>12</sup></span>Depois de lhes ter lavado os pés, tomou as suas vestes, reclinou-se de novo à mesa, e disse-lhes: «Entendeis o que vos fiz? <span style="color:red"><sup>13</sup></span>Vós chamais-me "o Mestre" e "o Senhor" e dizeis bem, porque sou. <span style="color:red"><sup>14</sup></span>Ora, se Eu, "o Senhor" e "o Mestre", vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. <span style="color:red"><sup>15</sup></span>Dei-vos o exemplo, para que, assim como Eu vos fiz, vós façais também. <span style="color:red"><sup>16</sup></span>Amen, amen vos digo: um servo não é maior do que o seu senhor, nem um apóstolo maior do que aquele que o enviou. <span style="color:red"><sup>17</sup></span>Se compreendeis isto, felizes sereis se o fizerdes. <span style="color:red"><sup>18</sup></span>Não falo de todos vós; Eu conheço aqueles que escolhi. Mas é para que se cumpra a Escritura: ''O que come o meu pão, ''levantou'' contra mim o ''seu'' calcanhar''<ref name="ftn186">Sl 41,10.</ref>. <span style="color:red"><sup>19</sup></span>Desde já vo-lo digo, antes de acontecer, para que, quando acontecer, acrediteis que ''Eu Sou''<ref name="ftn187">Evocação do nome divino revelado a Moisés; cf. 8,24.28.58; 18,5 (e provavelmente 4,26).</ref>. <span style="color:red"><sup>20</sup></span>Amen, amen vos digo: quem recebe aquele que Eu enviar, a mim recebe; e quem me recebe, recebe aquele que me enviou». | <span style="color:red"><sup>12</sup></span>Depois de lhes ter lavado os pés, tomou as suas vestes, reclinou-se de novo à mesa, e disse-lhes: «Entendeis o que vos fiz? <span style="color:red"><sup>13</sup></span>Vós chamais-me "o Mestre" e "o Senhor" e dizeis bem, porque sou. <span style="color:red"><sup>14</sup></span>Ora, se Eu, "o Senhor" e "o Mestre", vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. <span style="color:red"><sup>15</sup></span>Dei-vos o exemplo, para que, assim como Eu vos fiz, vós façais também. <span style="color:red"><sup>16</sup></span>Amen, amen vos digo: um servo não é maior do que o seu senhor, nem um apóstolo maior do que aquele que o enviou. <span style="color:red"><sup>17</sup></span>Se compreendeis isto, felizes sereis se o fizerdes. <span style="color:red"><sup>18</sup></span>Não falo de todos vós; Eu conheço aqueles que escolhi. Mas é para que se cumpra a Escritura: ''O que come o meu pão, ''levantou'' contra mim o ''seu'' calcanhar''<ref name="ftn186">Sl 41,10.</ref>. <span style="color:red"><sup>19</sup></span>Desde já vo-lo digo, antes de acontecer, para que, quando acontecer, acrediteis que ''Eu Sou''<ref name="ftn187">Evocação do nome divino revelado a Moisés; cf. 8,24.28.58; 18,5 (e provavelmente 4,26).</ref>. <span style="color:red"><sup>20</sup></span>Amen, amen vos digo: quem recebe aquele que Eu enviar, a mim recebe; e quem me recebe, recebe aquele que me enviou». | ||
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Jesus e a nova comunidade: a Mãe e o Discípulo Amado (Mt 27,55s; Mc 15,40s; Lc 23,49) – <span style="color:red"><sup>25</sup></span>Junto à cruz de Jesus, estavam de pé a sua Mãe, a irmã da sua Mãe, Maria, mulher de Clopas, e Maria Madalena. <span style="color:red"><sup>26</sup></span>Então Jesus, ao ver a Mãe e, próximo, o discípulo que amava<ref name="ftn260">Sobre o Discípulo Amado, cf. 13,23 nota.</ref>, disse à Mãe: «Mulher, eis o teu filho». <span style="color:red"><sup>27</sup></span>Depois disse ao discípulo: «Eis a tua Mãe». E, a partir daquela hora<ref name="ftn261">Segundo alguns, tem sentido causativo: ''por causa daquela hora'', ou seja, na hora de Jesus nasce a sua nova família, a nova comunidade, representada na Mãe e no Discípulo Amado (cf. notas a 2,4 e 12,23).</ref>, o discípulo recebeu-a entre os seus. | Jesus e a nova comunidade: a Mãe e o Discípulo Amado (Mt 27,55s; Mc 15,40s; Lc 23,49) – <span style="color:red"><sup>25</sup></span>Junto à cruz de Jesus, estavam de pé a sua Mãe, a irmã da sua Mãe, Maria, mulher de Clopas, e Maria Madalena. <span style="color:red"><sup>26</sup></span>Então Jesus, ao ver a Mãe e, próximo, o discípulo que amava<ref name="ftn260">Sobre o Discípulo Amado, cf. 13,23 nota.</ref>, disse à Mãe: «Mulher, eis o teu filho». <span style="color:red"><sup>27</sup></span>Depois disse ao discípulo: «Eis a tua Mãe». E, a partir daquela hora<ref name="ftn261">Segundo alguns, tem sentido causativo: ''por causa daquela hora'', ou seja, na hora de Jesus nasce a sua nova família, a nova comunidade, representada na Mãe e no Discípulo Amado (cf. notas a 2,4 e 12,23).</ref>, o discípulo recebeu-a entre os seus. | ||
− | A morte de Jesus (Mt 27,48-50; Mc 15,36s; Lc 23,46) – | + | A morte de Jesus (Mt 27,48-50; Mc 15,36s; Lc 23,46) – <span style="color:red"><sup>28</sup></span>Depois disto, sabendo Jesus que já tudo estava consumado, para que fosse consumada a Escritura<ref name="ftn262">Toda a Escritura e não apenas determinada passagem.</ref>, disse: «Tenho sede!»<ref name="ftn263">Cf. Sl 69,22; 63,2; 42,3.</ref>. <span style="color:red"><sup>29</sup></span>Estava ali um vaso cheio de vinagre; pondo, então, uma esponja cheia de vinagre num ramo de hissopo, levaram-lha à boca<ref name="ftn264">Cf. Sl 22,16; 69,22.</ref>. <span style="color:red"><sup>30</sup></span>Quando tomou o vinagre, Jesus disse: «Está consumado!». E, inclinando a cabeça, entregou o espírito<ref name="ftn265">Jesus entrega o seu espírito, o seu hálito de vida, ao Pai (cf. 3,8 nota). Mas o evangelista, com a expressão, sublinha que a morte de Jesus, tal como Ele prometera, é também o momento da dádiva do Espírito Santo (cf. 7,37-39; 16,7) à comunidade aqui representada na Mãe de Jesus e no Discípulo Amado (19,25-27.34), dom que se renova em todas as comunidades reunidas no primeiro dia da semana (20,22).</ref>. |
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− | Encontro do Ressuscitado com Maria Madalena (Mt 28,9s; Mc 16,9-11) – <span style="color:red"><sup>11</sup></span>Maria, porém, estava de pé junto ao sepulcro, do lado de fora, a chorar. Então, enquanto chorava, debruçou-se para o sepulcro <span style="color:red"><sup>12</sup></span>e viu dois anjos em vestes brancas, sentados um à cabeceira e outro aos pés do lugar onde tinha sido deposto o corpo de Jesus. <span style="color:red"><sup>13</sup></span>Disseram-lhe eles: «Mulher, porque choras?». Disse-lhes: «Tiraram o meu Senhor, e não sei onde o puseram». | + | Encontro do Ressuscitado com Maria Madalena (Mt 28,9s; Mc 16,9-11) – <span style="color:red"><sup>11</sup></span>Maria, porém, estava de pé junto ao sepulcro, do lado de fora, a chorar. Então, enquanto chorava, debruçou-se para o sepulcro <span style="color:red"><sup>12</sup></span>e viu dois anjos em vestes brancas, sentados um à cabeceira e outro aos pés do lugar onde tinha sido deposto o corpo de Jesus. <span style="color:red"><sup>13</sup></span>Disseram-lhe eles: «Mulher, porque choras?». Disse-lhes: «Tiraram o meu Senhor, e não sei onde o puseram». <span style="color:red"><sup>14</sup></span>Tendo dito isto, voltou-se para trás e viu Jesus de pé, mas não sabia que era Jesus. <span style="color:red"><sup>15</sup></span>Disse-lhe Jesus: «Mulher, porque choras? A quem procuras?». Ela, pensando que era o jardineiro, disse-lhe: «Senhor, se foste Tu que o levaste, diz-me onde o puseste, e eu irei buscá-lo». <span style="color:red"><sup>16</sup></span>Disse-lhe Jesus: «Maria!». Ela, voltando-se, disse-lhe em hebraico: «Rabúni!» – que significa «Mestre»<ref name="ftn277">Maria não reconhece Jesus pelo aspeto corporal (é o mesmo corpo, embora diferente) e nem sequer pela voz, mas pelo modo como Jesus a chama (cf. 10,3s.14s).</ref>.<span style="color:red"><sup>17</sup></span>Disse-lhe Jesus: «Não me toques, pois ainda não subi para o Pai! Mas vai aos meus irmãos e diz-lhes: "Subo para o meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus"». <span style="color:red"><sup>18</sup></span>Maria Madalena foi anunciar aos discípulos: «Vi o Senhor!», e as coisas que a ela tinha dito<ref name="ftn278">O testemunho sobre o Ressuscitado é antes de mais uma experiência pessoal (''vi'') e só depois um anúncio. O verbo ''anunciar'' que rege os dois momentos sublinha a sua indissociabilidade.</ref>. |
<center>Jesus e os discípulos: </center> | <center>Jesus e os discípulos: </center> | ||
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<span style="color:red"><sup>4</sup></span>Já ao surgir da manhã, Jesus estava de pé na margem, mas os discípulos não sabiam que era Jesus. <span style="color:red"><sup>5</sup></span>Disse-lhes, então, Jesus: «Rapazes<ref name="ftn290">Ou ''Filhinhos''. A pergunta, retórica, sublinha onde está o segredo de uma pesca (pastoral) bem sucedida: na obediência à palavra de Jesus.</ref>, tendes alguma coisa para comer?». Responderam-lhe: «Não». <span style="color:red"><sup>6</sup></span>Mas Ele disse-lhes: «Lançai a rede para a parte direita do barco e encontrareis». Lançaram então; e já nem a conseguiam puxar<ref name="ftn291">Lit.: ''já nem a conseguiam atrair'': é o mesmo verbo ''hélkō ''de 12,32, onde Jesus prometera que, na sua morte e ressurreição, atrairia todos a si; por isso, as redes são atraídas para a margem, onde Ele se encontra.</ref>, por causa da quantidade dos peixes. | <span style="color:red"><sup>4</sup></span>Já ao surgir da manhã, Jesus estava de pé na margem, mas os discípulos não sabiam que era Jesus. <span style="color:red"><sup>5</sup></span>Disse-lhes, então, Jesus: «Rapazes<ref name="ftn290">Ou ''Filhinhos''. A pergunta, retórica, sublinha onde está o segredo de uma pesca (pastoral) bem sucedida: na obediência à palavra de Jesus.</ref>, tendes alguma coisa para comer?». Responderam-lhe: «Não». <span style="color:red"><sup>6</sup></span>Mas Ele disse-lhes: «Lançai a rede para a parte direita do barco e encontrareis». Lançaram então; e já nem a conseguiam puxar<ref name="ftn291">Lit.: ''já nem a conseguiam atrair'': é o mesmo verbo ''hélkō ''de 12,32, onde Jesus prometera que, na sua morte e ressurreição, atrairia todos a si; por isso, as redes são atraídas para a margem, onde Ele se encontra.</ref>, por causa da quantidade dos peixes. | ||
− | <span style="color:red"><sup>7</sup></span>Então o discípulo, aquele que Jesus amava, disse a Pedro: «É o Senhor!». Quando Simão Pedro ouviu: «É o Senhor!», cingiu as vestes, pois estava nu, e lançou-se ao mar. | + | <span style="color:red"><sup>7</sup></span>Então o discípulo, aquele que Jesus amava, disse a Pedro: «É o Senhor!». Quando Simão Pedro ouviu: «É o Senhor!», cingiu as vestes, pois estava nu, e lançou-se ao mar. <span style="color:red"><sup>8</sup></span>Os outros discípulos foram no barco, arrastando a rede dos peixes, pois não estavam longe da terra, mas a cerca de duzentos cúbitos<ref name="ftn292">C. 100 metros.</ref>. |
Revision as of 15:54, 13 December 2019
Os livros do NT foram escritos de acordo com as necessidades concretas da comunidade a que se destinavam. A finalidade do Quarto Evangelho é expressa na sua primeira conclusão: Muitos outros sinais realizou Jesus diante dos seus discípulos, que não foram escritos neste livro. Mas estes foram escritos para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, acreditando, tenhais vida no seu nome (Jo 20,30s). Dirige-se, portanto, a cristãos com uma cristologia deficitária, cujos efeitos têm consequências na unidade da comunidade. Daí a exortação a permanecer em Jesus (ou seja, na cristologia tal como foi testemunhada e transmitida pelo Discípulo Amado: 8,31.39; 14,21.23s; 15,4-10) e no amor mútuo (13,34s; 15,12.17). Assim, o autor pretende não apenas relembrar a vida e o ministério de Jesus, já conhecidos, mas também iluminar a situação vital da comunidade, convidando-a a fortalecer a fé em Jesus, tal como a recebeu.
Trata-se de uma comunidade complexa, com problemas internos e externos. A nível externo: a expulsão de membros seus das sinagogas judaicas, resultante de conflitos locais com o judaísmo farisaico, dominante depois da destruição de Jerusalém no ano 70 (situação a que parece fazer referência a expressão expulso da sinagoga de 9,22; 12,42; 16,2). A nível interno: a constituição da comunidade por cristãos provenientes do mundo cultural tanto judaico como helenista (7,35; 12,20s), duas culturas com efeitos na compreensão da pessoa e mensagem de Jesus. Entre os de origem judaica, havia quem tivesse dificuldade em aceitar a pré-existência de Jesus e o discurso eucarístico (6,60-71; 8,31-59), e outros que, por medo, não testemunhavam a fé (os chamados cripto-cristãos: 12,42). Entre os de cultura grega, a influência de filosofias helenistas levava a que se acentuasse de tal forma a divindade de Jesus, que a sua natureza humana ficava diluída. A uns e outros o evangelista recorda que é necessário receber um Jesus inteiro (cf. 19,23.33.36), na sua condição humana e divina, como Messias e Filho de Deus (20,30s); só assim se poderá manter a unidade da comunidade, condição para se poder receber os dons salvíficos (o Espírito Santo, a vida divina, que, no Quarto Evangelho, corresponde à salvação).
O Quarto Evangelho regista uma alta cristologia, que apresenta Jesus não apenas como o Cristo no qual se cumprem as Escrituras, mas também e sobretudo como o Filho de Deus, que redimensiona todas as expectativas veterotestamentárias, assim como o tempo e os espaços sacros de Israel, o que é percetível na própria estrutura do livro que apresentamos. Neste âmbito, este evangelho oferece-nos, ainda, o princípio de uma reflexão sobre o Espírito Santo e do seu papel na vida da Igreja.
Segundo 21,24, o autor é o Discípulo Amado (cf. 21,20), ou seja, aquele que está na origem da tradição presente na obra (não necessariamente o escritor). De modo explícito, fala-se dele pela primeira vez em 13,23, como o discípulo que reclinou a cabeça sobre o peito/seio de Jesus (cf. 21,20). A afirmação utiliza a mesma expressão de 1,18, mas aqui referida à relação única de Jesus com o Pai, criando um paralelismo óbvio: tal como Jesus revela o Pai, assim o Discípulo Amado revela Jesus, garantindo a verdade da mensagem teológica do seu evangelho. Esta garantia está fundamentada não só no seu testemunho ocular, como também na sua fidelidade. De facto, é o discípulo que se mantém fiel até ao fim, estando presente na cruz com a Mãe de Jesus e, com ela, constituindo a nova comunidade (19,25-27); é o primeiro a acreditar na ressurreição de Jesus (20,8), independentemente do testemunho da Escritura (20,9); é quem reconhece o Ressuscitado nas margens do lago de Tiberíades (21,7); provavelmente é a ele a referência em 18,15s e 19,35, bem como em 1,40, onde, dos dois discípulos de João Batista, só André é identificado, o que conduz o leitor à intuição de que o outro seja o Discípulo Amado.
Em suma, o Discípulo Amado terá sido alguém com as seguintes características: aparece sempre ligado a Pedro; acompanhou Jesus desde o início da vida pública, o que constitui, para a comunidade primitiva, um critério importantíssimo no testemunho acerca de Jesus (At 1,21s; 1Jo 1,1ss); foi sempre fiel, mesmo na paixão, assistindo a tudo o que se passou e garantindo, assim, a verdade do que transmite; é o revelador do verdadeiro mistério de Jesus, tal como este o é do Pai; é modelo de discípulo para todos os membros da comunidade; o seu testemunho, guardado no evangelho, garante a fidelidade à verdade integral sobre Jesus.
Segundo uma antiga tradição, que remonta a S. Ireneu, este discípulo, que está na origem da tradição do Quarto Evangelho, seria João, filho de Zebedeu. E, por isso, o livro cedo passou a ser conhecido pelo seu nome: Evangelho segundo S. João.
Há várias notas no evangelho que permitem perceber duas grandes partes (1,19-12,50 e 13,1-20,29), precedidas de um prólogo hínico (1,1-18) e seguidas de uma primeira conclusão (20,30s) e de um epílogo (cap. 21,1-23) que inclui uma segunda conclusão (21,24s). A primeira parte abre com uma semana inaugural, que serve de prólogo narrativo, na medida em que apresenta a pessoa e a missão de Jesus (1,19-51; 2,1-12).
Na primeira conclusão faz-se referência à importância dos sinais e da sua relação com a fé em Jesus (20,30). Ora, a palavra sinal aparece dezassete vezes, todas na primeira parte (com exceção da conclusão), e a sua relação com a fé dos discípulos em Jesus é assinalada logo em 2,11.23. Daí que se atribua à primeira parte o título de Livro dos Sinais. Nela é também anunciada a hora de Jesus, a hora da sua glorificação (2,4; 7,30; 8,20), e, a terminar, afirma-se que finalmente essa hora chegou (12,23.27), expressão que se repete no início da segunda parte e em que se revela tratar-se da hora de passar deste mundo para o Pai (13,1). Por isso, podemos intitular esta segunda parte (13-20) como A hora da peregrinação gloriosa para o Pai.
Esta divisão em dois blocos percebe-se ainda pelos destinatários dos discursos de Jesus: até final do cap. 12 o Senhor dirige-se ao mundo, aos judeus e à multidão; nos caps. 13-16 e 20-21 fala aos seus discípulos (e no cap. 17 fala dos discípulos ao Pai).
A transição entre as duas partes é feita em 11,1-12,50: o Livro dos Sinais termina com um balanço da vida pública de Jesus (12,37-43[44-50]), mas, ao mesmo tempo, abre o pórtico da segunda parte, com a peregrinação de Jesus para a celebração da Páscoa derradeira (que se prolonga até 19,42), viagem antecipada pela morte de Lázaro (11,1), tal como a sua ressurreição antecipa e ilumina a morte e ressurreição de Jesus.
O andamento da obra está pontuado pelas quatro viagens de Jesus a Jerusalém por ocasião das festas judaicas: em 2,13, para a primeira Páscoa; em 5,1, para a festa não identificada (provavelmente o Pentecostes, embora a questão introduzida seja a da festa semanal: o sábado); em 7,2, para os Tabernáculos e para a Dedicação/Consagração do Templo (na última Jesus já se encontra em Jerusalém: 10,22); em 11,1ss, para a terceira Páscoa (viagem antecipada pela morte de Lázaro), festa novamente recordada em 11,55; 12,1 (onde começa uma cronologia: seis dias antes da Páscoa) e 13,1 (que inicia a segunda parte e cuja afirmação serve de enquadramento à viagem derradeira: a hora de passar deste mundo para o Pai). A segunda Páscoa (6,4) interrompe este esquema, visto que Jesus não se dirige a Jerusalém, mas profere o chamado discurso do pão da vida, anunciando que a sua carne e o seu sangue serão oferecidos como verdadeiras comida e bebida e, apresentando desta forma a chave hermenêutica em que a última Páscoa deve ser entendida. Esta ideia é reforçada pelo tema da realeza, que, rejeitada por Jesus depois da multiplicação dos pães (6,15), é solenemente afirmada na última Páscoa (18,37; 19,2-3.15.20-22).
Embora a Páscoa derradeira seja particularmente preparada e tudo pareça tender para ela, nada acontece nesse dia (Jesus está no sepulcro). A ênfase é colocada no primeiro dia da semana, que marca o ritmo narrativo de todo o cap. 20: a expressão enquadra a descoberta do sepulcro vazio, a aparição a Maria Madalena (20,1-10.11-18) e a aparição aos discípulos (20,19-23), que se repete oito dias depois, isto é, em cada domingo (20,24-29). Deste modo, o evangelista, depois de ter preparado o leitor para a festa da antiga Páscoa, acaba por lhe apresentar, com a sua típica ironia narrativa, uma festa completamente nova: a da presença do Ressuscitado na comunidade dos seus discípulos no primeiro dia da semana, que, por isso, cedo passará a chamar-se dia do Senhor (Ap 1,10). Com a ressurreição de Jesus, o tempo entra na dimensão escatológica da nova criação.
Em 21,1ss acontece uma terceira e última aparição de Jesus aos discípulos. Depois da conclusão em 20,30s, trata-se de uma espécie de epílogo, sobre a presença do Ressuscitado na vida e missão da sua Igreja, um epílogo provavelmente acrescentado numa segunda edição do evangelho, mas presente em todos os textos que chegaram até nós.
Assim, o evangelho segundo S. João pode estruturar-se da seguinte forma:
Prólogo hínico (1,1-18)
Livro dos Sinais (1,19-12,50)
I.Prólogo narrativo: a semana inaugural
Apresentação da pessoa e da missão de Jesus (1,19-2,12)
II. Peregrinação para a primeira Páscoa (2,13-4,54)
III.Peregrinação para uma festa
O sábado, a festa semanal (5,1-47)
IV.A «não peregrinação» para a segunda Páscoa: o Pão da Vida (6,1-71)
V.Peregrinação para a Festa das Tendas e Festa da Dedicação do Templo (7,1-10,42)
– Festa das Tendas (7,1-10,21)
– Festa da Dedicação do Templo (10,22-42)
VI.Peregrinação para a terceira e derradeira Páscoa (11,1-12,50)
Secção de transição: a antecipação pela morte de Lázaro (11,1-12,36)
Conclusão do Livro dos Sinais: a incredulidade dos judeus (12,37-43.44-50)
Livro da hora da peregrinação gloriosa para o Pai (13,1-20,29)
Jesus e os discípulos: a última ceia (13-14; 15-17)
Paixão, morte e ressurreição (18,1-20,18)
Jesus e os discípulos: a comunidade dominical (20,19-29)
Conclusão (20,30s)
Epílogo: a presença do Ressuscitado na vida e missão da Igreja (21,1-23)
Segunda conclusão (21,24s)
1 1No princípio era a Palavra[2] e a Palavra estava junto de Deus e a Palavra era Deus. 2Ela estava, no princípio, junto de Deus. 3Por meio dela todas as coisas surgiram, e sem ela nem uma só coisa do que existe surgiu[3]. 4Nela estava a vida e a vida era a luz dos homens[4]; 5a luz brilha nas trevas e as trevas não se apoderaram dela[5].
6Surgiu um homem, enviado por Deus[6]: o seu nome era João. 7Ele veio para um testemunho: para dar testemunho da luz, para que todos, por meio dele, acreditassem. 8Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz.
9A Palavra era a luz verdadeira[7], que ilumina todo o homem que vem ao mundo[8]. 10Estava no mundo e o mundo por meio dela[9] surgiu; mas o mundo[10] não a conheceu. 11Veio para o que era seu[11], mas os seus não a acolheram. 12Mas a todos quantos a receberam deu-lhes poder de se tornarem filhos de Deus: àqueles que acreditam no seu nome[12]. 13Estes não nasceram do sangue[13], nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus.
14E a Palavra fez-se carne: estabeleceu a tenda entre nós[14] e contemplámos a sua glória[15]; glória como unigénito do Pai, cheio de graça e de verdade.
15João dá testemunho acerca dele e clama, dizendo: «Foi deste que eu disse: "O que atrás de mim vem, adiante de mim surgiu, porque antes de mim existia"».
16Da sua plenitude todos nós recebemos: graça sobre graça[16]. 17Porque a Lei foi dada por meio de Moisés; a graça e a verdade surgiram por meio de Jesus Cristo.
18A Deus jamais alguém viu; o unigénito divino[17], que está no seio do Pai, Ele o deu a conhecer[18].
João Batista e as autoridades – 19Foi este o testemunho de João, quando os judeus[20] enviaram, de Jerusalém, sacerdotes e levitas para lhe perguntarem: «Tu quem és?». 20Ele confessou e não negou; confessou: «Eu não sou o Cristo»[21]. 21Perguntaram-lhe: «O quê, então? Tu és Elias?». Disse ele: «Não sou». «Tu és o Profeta?». E ele respondeu: «Não». 22Disseram-lhe: «Quem és? Para podermos dar uma resposta aos que nos enviaram, que dizes acerca de ti próprio?». 23Ele afirmou:
«Eu sou a voz do que clama no deserto:
endireitai o caminho do Senhor,
como disse o profeta Isaías»[22]. 24Ora, os que tinham sido enviados eram dos fariseus. 25Perguntaram-lhe e disseram-lhe: «Então porque batizas, se não és o Cristo, nem Elias, nem o Profeta?». 26João respondeu-lhes, dizendo: «Eu batizo na água[23]. No meio de vós está quem vós não conheceis: 27o que atrás de mim vem, a quem eu não sou digno de desatar a correia da sandália».
28Isto aconteceu em Betânia, na outra margem do Jordão, onde João estava a batizar.
João Batista e Jesus – 29No dia seguinte, viu Jesus, que vinha ter com ele, e disse: «Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo[24]. 30Este é aquele acerca de quem eu disse: "Atrás de mim vem um homem, que adiante de mim surgiu, porque antes de mim existia". 31Também eu não o conhecia, mas foi para que se manifestasse a Israel que eu vim batizar na água»[25]. 32E João deu testemunho, dizendo: «Vi o Espírito descer do céu como uma pomba, e permaneceu sobre Ele. 33Também eu não o conhecia, mas aquele que me enviou a batizar na água disse-me: "Aquele sobre quem vires o Espírito descer e sobre Ele permanecer, é Ele o que batiza no[26] Espírito Santo". 34Ora, eu vi e dou testemunho: este é o Filho de Deus»[27].
Formação da nova comunidade (Mt 4,18-22; Mc 1,16-20; 3,13-19; Lc 5,1-11) – 35No dia seguinte, João estava ali de novo, com dois dos seus discípulos, 36e, fixando o olhar em Jesus, que caminhava, disse: «Eis o Cordeiro de Deus». 37Os seus dois discípulos ouviram-no falar e seguiram Jesus. 38Então Jesus, voltando-se e vendo que eles o seguiam, disse-lhes: «Que procurais?». Eles disseram-lhe: «Rabi – que, traduzido, significa "Mestre" –, onde moras?». 39Disse-lhes Ele: «Vinde e vereis!». Foram, então; viram onde morava e permaneceram[28] junto dele naquele dia. Era por volta da hora décima[29].
40André, o irmão de Simão Pedro, era um dos dois que tinham ouvido João e o seguiram[30]. 41Este encontrou primeiro o seu irmão Simão e disse-lhe: «Encontrámos o Messias» – que, traduzido, significa «Cristo». 42E conduziu-o a Jesus. Fixando nele o olhar, Jesus disse: «Tu és Simão, o filho de João; tu serás chamado Kefas» – que significa «Pedro»[31].
43No dia seguinte, Jesus quis partir para a Galileia. Encontrou Filipe e disse-lhe: «Segue-me!». 44Filipe era de Betsaida, da cidade de André e de Pedro.
45Filipe encontrou Natanael[32] e disse-lhe: «Encontrámos aquele sobre quem escreveram Moisés, na Lei, e os Profetas: Jesus, filho de José, de Nazaré». 46Disse-lhe Natanael: «De Nazaré pode vir algo de bom?». Disse-lhe Filipe: «Vem e vê!». 47Jesus viu Natanael, que vinha ter com Ele, e disse acerca dele: «Eis um verdadeiro israelita, no qual não há falsidade». 48Disse-lhe Natanael: «De onde me conheces?». Respondeu Jesus e disse-lhe: «Antes de Filipe te ter chamado, quando estavas debaixo da figueira, Eu vi-te». 49Respondeu-lhe Natanael: «Rabi, Tu és o Filho de Deus, Tu és o rei de Israel!»[33]. 50Respondeu Jesus e disse-lhe: «Porque te disse que te vi sob a figueira acreditas? Verás coisas maiores que estas». 51E disse-lhe: «Amen, amen vos digo: vereis o céu aberto e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do Homem»[34].
2 Bodas de Caná. Princípio dos sinais – 1Ao terceiro dia houve uma boda em Caná da Galileia e a Mãe de Jesus estava lá[35]. 2Também Jesus e os seus discípulos foram chamados para a boda. 3Tendo faltado vinho, a Mãe de Jesus disse-lhe: «Não têm vinho». 4Disse-lhe Jesus: «Que há entre mim e ti, mulher[36]? Ainda não chegou a minha hora!»[37]. 5A sua Mãe disse aos serventes: «O que Ele vos disser, fazei-o».
6Ora, estavam ali colocadas seis talhas de pedra para a purificação dos judeus, cada uma com capacidade para duas ou três medidas[38]. 7Disse-lhes Jesus: «Enchei as talhas de água». E encheram-nas até cima. 8E disse-lhes: «Tirai agora e levai ao chefe de mesa». E eles levaram. 9Quando o chefe de mesa provou a água tornada vinho – ele não sabia de onde era, mas sabiam os serventes, que tinham tirado a água –, o chefe de mesa chamou o noivo 10e disse-lhe: «Todos[39] põem primeiro o vinho bom e, quando estão embriagados, o inferior. Tu guardaste o vinho bom até agora!».
11Foi este o princípio dos sinais[40] que Jesus realizou em Caná da Galileia; manifestou a sua glória e os seus discípulos acreditaram nele.
12Depois disto desceu para Cafarnaum, Ele, a sua Mãe, os seus irmãos e os seus discípulos, mas não permaneceram ali muitos dias.
Expulsão dos vendedores e dos animais do templo (Mt 21,12s; Mc 11,15-17; Lc 19,45s) – 13Estava próxima a Páscoa dos judeus, e Jesus subiu a Jerusalém.
14Encontrou no templo os vendedores de bois, ovelhas e pombas e os cambistas sentados. 15Então, depois de fazer um chicote de cordas, expulsou todos do templo, e também as ovelhas e os bois; deitou por terra o dinheiro dos cambistas e derrubou-lhes as mesas; 16e disse aos vendedores das pombas: «Tirai isto daqui! Não façais da casa do meu Pai casa de comércio!»[41]. 17Recordaram-se os seus discípulos do que está escrito: O zelo pela tua casa devorar-me-á[42].
Primeiro anúncio da morte e ressurreição de Jesus – 18Responderam-lhe, então, os judeus e disseram-lhe: «Que sinal nos mostras para fazeres estas coisas?». 19Respondeu Jesus e disse-lhes: «Destruí este templo, e em três dias o levantarei». 20Disseram-lhe, então, os judeus: «Este templo foi edificado em quarenta e seis anos, e Tu em três dias o levantarás?». 21Ele, porém, falava acerca do templo do seu corpo. 22Por isso, quando ressuscitou dos mortos[43], os seus discípulos recordaram-se de que tinha dito isto e acreditaram na Escritura e na palavra que Jesus dissera.
23Enquanto Ele estava em Jerusalém, durante a festa da Páscoa, muitos acreditaram no seu nome[44], ao verem os sinais que Ele realizava. 24Porém, o próprio Jesus não acreditava neles, por os conhecer a todos 25e porque não tinha necessidade de que alguém lhe desse testemunho acerca do homem, pois Ele conhecia o que havia no homem.
3 Encontro com Nicodemos[45] – 1Havia um homem entre os fariseus, de seu nome Nicodemos, um chefe dos judeus. 2Este veio ter com Ele, de noite, e disse-lhe: «Rabi, sabemos que vieste de Deus como mestre, pois ninguém pode realizar estes sinais que Tu realizas, se Deus não estiver com ele».3Respondeu Jesus e disse-lhe: «Amen, amen te digo: se alguém não nascer de novo[46], não pode ver o reino de Deus». 4Disse-lhe Nicodemos: «Como pode um homem nascer, sendo velho? Poderá entrar para o ventre da sua mãe pela segunda vez e nascer?». 5Respondeu Jesus: «Amen, amen te digo: se alguém não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. 6Quem nasceu da carne é carne, e quem nasceu do Espírito é espírito. 7Não te admires porque te disse: "É necessário que vós nasçais de novo". 8O Espírito sopra onde quer[47]: ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai. Assim é todo aquele que nasceu do Espírito». 9Respondeu Nicodemos e disse-lhe: «Como podem tais coisas acontecer?». 10Respondeu Jesus e disse-lhe: «Tu és mestre de Israel e não conheces estas coisas?
11Amen, amen te digo: dizemos o que sabemos e damos testemunho do que vimos; mas não acolheis o nosso testemunho! 12Se vos falei das coisas da terra e não acreditais, como acreditareis se vos falar das coisas do céu? 13Ninguém subiu ao céu, senão aquele que do céu desceu: o Filho do Homem. 14E, tal como Moisés elevou a serpente no deserto, assim é necessário que o Filho do Homem seja elevado, 15para que todo aquele que acredita tenha nele a vida eterna[48]. 16De tal modo amou Deus o mundo que deu o seu Filho unigénito, para que todo aquele que acredita nele não pereça, mas tenha vida eterna. 17Pois Deus não enviou o Filho ao mundo para julgar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por meio dele. 18Quem acredita nele não é julgado; mas quem não acredita já está julgado, porque não acreditou no nome[49] do Filho unigénito de Deus. 19E o julgamento é este: a luz veio ao mundo, mas os homens amaram mais as trevas do que a luz, pois eram más as suas obras. 20De facto, quem faz coisas malévolas odeia a luz e não vai ao encontro da luz, para que as suas obras não sejam denunciadas. 21Mas quem pratica a verdade vai ao encontro da luz, para que as suas obras se manifestem como tendo sido realizadas em Deus».
Testemunho de João Batista[50] – 22Depois disto, Jesus e os seus discípulos foram para o território da Judeia. Ali se demorou com eles e batizava. 23Ora, também João estava a batizar em Enón, perto de Salim, porque as águas ali eram abundantes; eles acorriam e eram batizados, 24pois João não fora ainda lançado na prisão.
25Surgiu, então, uma controvérsia entre alguns discípulos de João e um judeu, acerca da purificação. 26Foram ter com João e disseram-lhe: «Rabi, aquele que estava contigo na outra margem do Jordão, do qual tu deste testemunho, eis que Ele está a batizar e todos vão ter com Ele». 27Respondeu João e disse: «Um homem nada pode receber, se não lhe tiver sido dado do céu. 28Vós próprios dais testemunho de mim, de que disse que eu não sou o Cristo, mas que fui enviado adiante dele. 29Quem tem a noiva é noivo. O amigo do noivo[51], que está presente e o ouve, exulta de alegria[52] por causa da voz do noivo. Pois bem, esta minha alegria está completa! 30É necessário que Ele cresça e eu diminua[53].
31Aquele que vem do alto[54] está acima de todos; aquele que é da terra, da terra é, e da terra fala. Aquele que vem do céu está acima de todos; 32o que viu e ouviu, disso dá testemunho, mas ninguém acolhe o seu testemunho! 33Quem acolhe o seu testemunho certifica[55] que Deus é verdadeiro, 34pois aquele que Deus enviou diz as palavras de Deus. De facto, Ele[56] dá o Espírito sem medida. 35O Pai ama o Filho e tudo entregou na sua mão. 36Quem acredita no Filho tem a vida eterna; mas quem desobedece ao Filho não verá a vida; pelo contrário, a ira de Deus permanece sobre ele».
4 Encontro com os samaritanos[57] – 1Assim que Jesus soube que os fariseus tinham ouvido dizer: «Jesus faz mais discípulos e batiza mais do que João» – 2embora não fosse o próprio Jesus a batizar, mas os seus discípulos –, 3deixou a Judeia e partiu de novo para a Galileia.
4Ora, era necessário que Ele atravessasse a Samaria. 5Chegou, assim, a uma cidade da Samaria, chamada Sicar[58], próxima do terreno que Jacob tinha dado ao seu filho José. 6Ficava ali a fonte de Jacob. Então Jesus, fatigado da caminhada, sentou-se junto à fonte. Era por volta da hora sexta[59].
7Veio uma mulher da Samaria para tirar água. Disse-lhe Jesus: «Dá-me de beber»[60]. 8Os seus discípulos tinham ido à cidade comprar alimentos. 9Disse-lhe, então, a mulher samaritana: «Como é que Tu, sendo judeu, me pedes de beber, sendo eu uma mulher samaritana?». Com efeito, os judeus não se dão com os samaritanos. 10Respondeu Jesus e disse-lhe: «Se conhecesses o dom de Deus e quem é aquele que te diz: "Dá-me de beber", tu é que lhe pedirias, e Ele dar-te-ia água viva». 11Disse-lhe a mulher: «Senhor, não tens nada com que a tirar e o poço é fundo! De onde obténs, então, a água viva? 12Serás Tu maior que o nosso Pai Jacob, que nos deu o poço, do qual ele bebeu, e também os seus filhos e os seus animais?». 13Respondeu Jesus e disse-lhe: «Todo aquele que bebe desta água terá sede novamente; 14mas quem beber da água que Eu lhe darei, jamais terá sede, para sempre. Pelo contrário: a água que lhe darei tornar-se-á, nele, uma fonte de água que jorra para a vida eterna».15Disse-lhe a mulher: «Senhor, dá-me essa água, para que eu não mais tenha sede e nem venha aqui tirá-la». 16Disse-lhe Ele: «Vai chamar o teu marido e volta aqui». 17Respondeu-lhe a mulher e disse-lhe: «Não tenho marido». Disse-lhe Jesus: «Disseste bem: "Não tenho marido"; 18de facto, tiveste cinco maridos e o que agora tens não é teu marido. Nisto disseste a verdade». 19Disse-lhe a mulher: «Senhor, vejo que Tu és um profeta. 20Os nossos pais adoraram neste monte[61]; vós, porém, dizeis que é em Jerusalém o lugar onde é necessário adorar». 21Disse-lhe Jesus: «Acredita em mim, mulher: está a chegar a hora em que nem neste monte, nem em Jerusalém, adorareis o Pai. 22Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus. 23Mas está a chegar a hora – e é agora – em que os verdadeiros adoradores hão de adorar o Pai em espírito e verdade. Pois o Pai procura os que assim o adoram. 24Deus é Espírito; e os que o adoram é necessário que o adorem em espírito e verdade»[62]. 25Disse-lhe a mulher: «Sei que está a chegar o Messias, o chamado Cristo. Quando Ele chegar, há de anunciar-nos todas as coisas». 26Disse-lhe Jesus: «Sou Eu[63], o que fala contigo».
27Nisto, chegaram os seus discípulos e admiravam-se que estivesse a falar com uma mulher. No entanto, nenhum disse: «Que procuras?», ou: «De que falas com ela?».
28Então, a mulher deixou o seu cântaro, partiu para a cidade e disse aos homens: 29«Vinde ver um homem que me disse tudo o que fiz. Não será Ele o Cristo?». 30Eles saíram da cidade e iam ter com Jesus.
31Entretanto, pediam-lhe os discípulos, dizendo: «Rabi, come». 32Mas Ele disse-lhes: «Eu tenho um alimento para comer, que vós não conheceis». 33Diziam, então, os discípulos uns aos outros: «Ter-lhe-á alguém trazido de comer?». 34Disse-lhes Jesus: «O meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou e levar à consumação a sua obra[64]. 35Não dizeis vós: "Mais quatro meses e chega a ceifa"? Eis que vos digo: levantai os vossos olhos e observai os campos; já estão dourados[65] para a ceifa. 36Quem ceifa recebe a recompensa e recolhe fruto para a vida eterna, para que se alegrem juntamente o que semeia e o que ceifa. 37Nisto, de facto, é verdadeiro o dito: "Um é o que semeia, e outro o que ceifa". 38Eu enviei-vos a ceifar aquilo pelo qual não vos afadigastes; outros se afadigaram, e vós entrastes na sua fadiga».
39Muitos samaritanos daquela cidade acreditaram nele, por causa da palavra da mulher, que dava testemunho: «Disse-me tudo o que fiz». 40Por isso, quando os samaritanos vieram ter com Ele, pediram-lhe que permanecesse junto deles. E permaneceu ali dois dias. 41E muitos mais acreditaram por causa da palavra dele 42e diziam à mulher: «Já não é por causa do que disseste[66] que acreditamos, pois nós próprios ouvimos e sabemos que Ele é verdadeiramente o salvador do mundo»[67].
Encontro com um funcionário real[68]. Segundo sinal em Caná (Mt 8,5-13; Lc 7,1-10) – 43Passados os dois dias, saiu dali para a Galileia, 44pois o próprio Jesus tinha dado testemunho de que um profeta não é estimado na sua terra natal. 45Quando chegou à Galileia, os galileus acolheram-no, ao terem visto tudo quanto fizera, durante a festa, em Jerusalém, pois também eles tinham ido à festa.
46Foi, então, de novo a Caná da Galileia, onde da água tinha feito vinho. Ora, havia um funcionário real cujo filho estava doente em Cafarnaum. 47Ele, ao ouvir dizer que Jesus tinha vindo da Judeia para a Galileia, foi ter com Ele e pedia-lhe que descesse e lhe curasse o filho, pois estava prestes a morrer. 48Disse-lhe, então, Jesus: «Se não virdes sinais e prodígios, jamais acreditareis!». 49Disse-lhe o funcionário real: «Senhor, desce, antes que o meu filho morra». 50Disse-lhe Jesus: «Vai; o teu filho vive». O homem acreditou na palavra que Jesus lhe dissera e partiu. 51Já ele descia, quando os seus servos lhe vieram ao encontro, dizendo que o seu filho estava vivo. 52Procurou, então, saber junto deles a hora em que começara a melhorar. Disseram-lhe: «A febre deixou-o ontem, à hora sétima»[69]. 53O pai percebeu que fora àquela hora que Jesus lhe dissera: «O teu filho vive». E acreditou, ele e toda a sua casa.
54Este foi o segundo sinal que Jesus realizou quando foi da Judeia para a Galileia.
5 Cura de um doente ao sábado – 1Depois disto, havia uma festa dos judeus[70] e Jesus subiu a Jerusalém. 2Ora, em Jerusalém, junto à Porta das Ovelhas[71], há uma piscina, chamada em hebraico Betzatá, que tem cinco pórticos. 3Nestes estava deitado um grande número de doentes, cegos, coxos e paralíticos[72]. (4)[73]
5Estava ali um certo homem, que tinha uma enfermidade havia trinta e oito anos[74]. 6Quando Jesus o viu deitado e soube que estava assim havia já muito tempo, disse-lhe: «Queres ficar são?». 7Respondeu-lhe o doente: «Senhor, não tenho ninguém que me lance na piscina, quando a água é agitada; enquanto eu vou, outro desce antes de mim». 8Disse-lhe Jesus: «Levanta-te, toma a tua enxerga e anda». 9E imediatamente o homem ficou são, tomou a sua enxerga e começou a andar.
Discussão sobre o sábado – Ora, aquele dia era sábado. 10Diziam, então, os judeus àquele que tinha sido curado: «É sábado; por isso não te é permitido levar a tua enxerga». 11Mas ele respondeu-lhes: «Aquele que me pôs são disse-me: "Leva a tua enxerga e anda"». 12Perguntaram-lhe: «Quem é o homem que te disse: "Leva e anda"?». 13Mas o que tinha sido curado não sabia quem era, pois Jesus tinha-se arredado da multidão que estava no lugar.
14Depois disto, Jesus encontrou-o no templo e disse-lhe: «Eis que ficaste são; não peques mais, para que não te aconteça algo pior». 15O homem partiu e informou os judeus de que tinha sido Jesus quem o pusera são. 16Por causa disto, os judeus começaram a perseguir Jesus: porque fazia estas coisas ao sábado[75]. 17Mas Jesus respondeu-lhes: «O meu Pai até agora[76] trabalha, e Eu também trabalho»[77]. 18Por causa disto, ainda mais os judeus o procuravam matar, porque não só quebrava o sábado, como também chamava a Deus seu Pai, fazendo-se igual a Deus.
O julgamento perante Jesus – 19Respondeu, então, Jesus e dizia-lhes: «Amen, amen vos digo: o Filho nada pode fazer por si mesmo, senão o que vê o Pai fazer; o que este fizer, também o Filho o faz de igual modo. 20Pois o Pai é amigo[78] do Filho e mostra-lhe tudo o que Ele próprio faz. E há de mostrar-lhe obras maiores do que estas, para que vós fiqueis admirados!
21De facto, tal como o Pai ressuscita os mortos e os faz viver, assim também o Filho faz viver aqueles que quer. 22Pois o Pai não julga ninguém; pelo contrário, deu ao Filho todo o julgamento, 23para que todos honrem o Filho tal como honram o Pai. Quem não honra o Filho não honra o Pai que o enviou.
24Amen, amen vos digo: quem ouve a minha palavra e acredita naquele que me enviou tem a vida eterna e não vai a julgamento; pelo contrário, passou da morte para a vida.
25Amen, amen, vos digo: está a chegar a hora – e é agora – em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus, e os que a ouvirem viverão. 26Pois, tal como o Pai tem vida em si mesmo, assim também concedeu ao Filho ter vida em si mesmo. 27E deu-lhe poder para exercer o julgamento, porque é Filho do Homem. 28Não vos admireis com isto: está a chegar a hora em que todos os que estão nos sepulcros ouvirão a sua voz 29e sairão: os que fizeram o bem, para uma ressurreição de vida; os que praticaram coisas malévolas, para uma ressurreição de julgamento[79].
30Eu nada posso fazer por mim mesmo; julgo tal como ouço. E o meu julgamento é justo, porque não procuro a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou».
As testemunhas de Jesus – 31«Se Eu der testemunho acerca de mim mesmo, o meu testemunho não é verdadeiro. 32É outro que dá testemunho acerca de mim, e sei que é verdadeiro o testemunho que dá acerca de mim. 33Vós enviastes emissários[80] a João, e ele deu testemunho da verdade. 34Não que Eu receba o testemunho de um homem, mas digo isto para que vós sejais salvos. 35Ele era a candeia que ardia e iluminava; mas vós quisestes alegrar-vos por pouco tempo na sua luz.
36Eu, porém, tenho um testemunho maior do que o de João: as obras que o Pai me deu para que as consumasse[81]; as próprias obras que faço dão testemunho acerca de mim, de que o Pai me enviou. 37E o Pai que me enviou, Ele próprio deu testemunho acerca de mim. Nunca ouvistes a sua voz, nem vistes o seu aspeto, 38e a sua palavra não permanece em vós, porque naquele que Ele enviou, nesse vós não acreditais. 39Investigais as Escrituras, porque vós pensais ter nelas a vida eterna. Ora, são elas que dão testemunho acerca de mim. 40E não quereis vir a mim para terdes vida!
41Dos homens não recebo glória. 42Aliás, conheço-vos: não tendes o amor de Deus em vós. 43Eu vim em nome do meu Pai, e não me recebeis. Se vier outro no seu próprio nome, recebê-lo-eis. 44Como podeis acreditar, vós que recebeis glória uns dos outros e não procurais a glória do Deus único?
45Não penseis que Eu vos acusarei junto do Pai; o vosso acusador é Moisés, em quem vós depositastes esperança. 46Porque, se acreditásseis em Moisés, acreditaríeis em mim, pois foi acerca de mim que ele escreveu. 47Mas, se não acreditais nos seus escritos, como acreditareis nas minhas palavras?».
6 Multiplicação dos pães e dos peixes (Mt 14,13-21; Mc 6,32-44; 8,1-9; Lc 9,10-17) – 1Depois disto, Jesus partiu para a outra margem do mar da Galileia, ou de Tiberíades[82]. 2Seguia-o uma numerosa multidão, porque viam os sinais que realizava nos doentes. 3Jesus subiu para o monte e ali se sentou com os seus discípulos. 4Estava próxima a Páscoa, a festa dos judeus[83].
5Jesus, então, levantando os olhos e vendo que uma numerosa multidão vinha ter com Ele, disse a Filipe: «Onde compraremos pão para que eles comam?». 6Dizia isto para o pôr à prova, pois Ele sabia o que estava prestes a fazer. 7Respondeu-lhe Filipe: «Duzentos denários de pão não lhes chegam para que cada um receba um pouco». 8Disse-lhe um dos seus discípulos, André, o irmão de Simão Pedro: 9«Está aqui um rapazinho que tem cinco pães de cevada e dois pequenos peixes. Mas que é isso para tanta gente?». 10Disse Jesus: «Fazei-os reclinar-se[84]». Havia muita erva no lugar. Reclinaram-se, então. Os homens eram cerca de cinco mil. 11Jesus tomou os pães e, depois de dar graças, distribuiu-os aos que estavam reclinados, e fez o mesmo com os pequenos peixes, tanto quanto quisessem. 12E quando ficaram saciados, disse aos seus discípulos: «Recolhei os pedaços que sobraram, para que nada se perca». 13Recolheram-nos, pois, e encheram doze cestas com os pedaços dos cinco pães de cevada que sobraram aos que tinham comido.
14Eles[85], ao verem o sinal que tinha realizado, diziam: «Este é, verdadeiramente, o profeta que estava[86] para vir ao mundo». 15Então Jesus, sabendo que estavam prestes a vir apoderar-se dele para o fazer rei, retirou-se de novo sozinho para o monte[87].
Jesus caminha sobre as águas (Mt 14,22-33; Mc 6,45-52) – 16Ao cair da tarde, os seus discípulos desceram até ao mar 17e, subindo para um barco, dirigiram-se para a outra margem do mar, para Cafarnaum. Já havia trevas e Jesus ainda não tinha vindo ter com eles. 18O mar estava agitado, pois soprava um forte vento. 19Então, depois de terem remado cerca de vinte e cinco ou trinta estádios[88], viram Jesus a caminhar sobre o mar e a aproximar-se do barco, e tiveram medo. 20Mas Ele disse-lhes: «Sou Eu[89]; não tenhais medo!». 21Quiseram, então, recebê-lo no barco, e imediatamente o barco chegou à terra para onde iam.
Discurso sobre o pão da vida – 22No dia seguinte, a multidão, que permanecera na outra margem do mar, viu que estava ali apenas um pequeno barco e que Jesus não tinha entrado no barco com os seus discípulos, mas que os seus discípulos tinham partido sozinhos. 23No entanto, chegaram outros pequenos barcos de Tiberíades, de perto do lugar onde eles tinham comido o pão, depois de o Senhor ter dado graças. 24Quando a multidão viu que nem Jesus estava ali, nem os seus discípulos, subiu para os pequenos barcos e foi[90] para Cafarnaum procurar Jesus.
25Ao encontrá-lo na outra margem do mar, disseram-lhe: «Rabi, quando chegaste aqui?». 26Respondeu-lhes Jesus e disse: «Amen, amen vos digo: procurais-me não porque vistes sinais, mas porque comestes dos pães e ficastes saciados. 27Trabalhai não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece para a vida eterna e que o Filho do Homem vos dará; pois foi a Ele que Deus, o Pai, marcou com o selo».
28Disseram-lhe, então: «Que havemos de fazer para realizar as obras de Deus?». 29Respondeu Jesus e disse-lhes: «Esta é a obra de Deus: que acrediteis naquele que Ele enviou». 30Disseram-lhe: «Que sinal fazes Tu, para que vejamos e acreditemos em ti? Que obra realizas? 31Os nossos pais comeram o maná no deserto[91], como está escrito: Deu-lhes a comer pão do céu[92]». 32Disse-lhes, então, Jesus: «Amen, amen vos digo: não foi Moisés que vos deu o pão do céu, mas o meu Pai é que vos dá o verdadeiro pão do céu. 33Pois o pão de Deus é o que desce do céu e dá vida ao mundo». 34Disseram-lhe, então: «Senhor, dá-nos sempre esse pão!». 35Disse-lhes Jesus: «Eu sou o pão da vida: quem vem a mim jamais terá fome; quem acredita em mim jamais terá sede. 36No entanto, disse-vos: vistes-me e não acreditais. 37Tudo o que o Pai me dá, virá a mim, e o que vem a mim jamais o expulsarei, 38porque desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. 39E a vontade daquele que me enviou é esta: que nada perca do que me deu, mas o ressuscite no último dia. 40Pois esta é a vontade do meu Pai: que todo aquele que vê o Filho e acredita nele tenha vida eterna; e Eu o ressuscitarei no último dia».
41Então os judeus começaram a murmurar contra Ele, porque tinha dito: «Eu sou o pão que desceu do céu». 42E diziam: «Este não é Jesus, o filho de José? Não conhecemos nós o pai e a mãe? Como é que agora diz: "Eu desci do céu"?».
43Respondeu Jesus e disse-lhes: «Não murmureis entre vós. 44Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o atrair; e Eu o ressuscitarei no último dia. 45Está escrito nos Profetas: Serão todos ensinados por Deus[93]. Todo aquele que ouviu do Pai e aprendeu vem a mim. 46Não porque alguém tenha visto o Pai, a não ser aquele que existe junto de Deus: este viu o Pai. 47Amen, amen vos digo: quem acredita tem a vida eterna.
48Eu sou o pão da vida. 49Os vossos pais comeram o maná no deserto e morreram. 50Este é o pão que desce do céu, para que quem dele comer não morra. 51Eu sou o pão vivo que desceu do céu: se alguém comer deste pão, viverá para sempre; e o pão que Eu darei é a minha carne pela vida do mundo».
52Altercavam, então, os judeus entre si, dizendo: «Como pode este dar-nos a sua carne a comer?». 53Disse-lhes, então, Jesus: «Amen, amen vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem e beberdes o seu sangue, não tereis vida em vós. 54Quem come[94] a minha carne e bebe o meu sangue tem vida eterna, e Eu o ressuscitarei no último dia. 55Porque a minha carne é verdadeiro alimento, e o meu sangue é verdadeira bebida[95]. 56Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim, e Eu nele. 57Assim como o Pai que vive me enviou, e Eu vivo pelo Pai, também quem me come viverá por mim. 58Este é o pão que desceu do céu. Não é como o que os pais comeram: eles morreram; quem come este pão viverá para sempre»[96].
59Disse estas coisas na sinagoga, ao ensinar em Cafarnaum.
Crise entre os discípulos e profissão de fé de Pedro – 60Ora, muitos dos seus discípulos, depois de ouvirem isto, disseram: «É dura esta palavra! Quem pode ouvi-la?»[97]. 61Jesus, sabendo em si mesmo que os seus discípulos murmuravam por causa disto, disse-lhes: «Isto é para vós motivo de escândalo? 62E se virdes o Filho do Homem subir para onde estava antes? 63É o Espírito que faz viver, a carne de nada serve; as palavras que Eu vos disse são espírito e são vida. 64Mas há alguns entre vós que não acreditam». De facto, Jesus sabia, desde o princípio, quem eram os que não acreditavam e quem era o que o haveria de entregar. 65E dizia: «Por causa disto vos disse que ninguém pode vir a mim, se não lhe for dado pelo Pai».
66Desde então muitos dos seus discípulos voltaram para trás e já não caminhavam com Ele. 67Disse, então, Jesus aos Doze: «Também vós quereis ir embora?». 68Respondeu-lhe Simão Pedro: «Senhor, a quem iremos? Tu tens palavras de vida eterna! 69E nós acreditámos e sabemos[98] que Tu és o Santo de Deus». 70Respondeu-lhes Jesus: «Não fui Eu que vos escolhi, aos Doze? E um de vós é um diabo!». 71Falava de Judas, filho de Simão Iscariotes; de facto, este estava prestes a entregá-lo. E era um dos Doze[99].
7 Falta de fé dos familiares de Jesus – 1Depois disto, Jesus andava pela Galileia. Não queria andar pela Judeia, porque os judeus procuravam matá-lo.
2Ora, estava próxima a festa dos judeus, a festa das Tendas[100]. 3Disseram-lhe, por isso, os seus irmãos: «Parte daqui e vai para a Judeia, para que também os teus discípulos vejam as obras que Tu realizas. 4Pois ninguém faz nada em segredo quando procura ser publicamente conhecido. Se fazes estas coisas, manifesta-te ao mundo!». 5Nem os seus irmãos acreditavam nele. 6Disse-lhes, então, Jesus: «O meu tempo[101] ainda não chegou; o vosso tempo, porém, está sempre pronto! 7O mundo não vos pode odiar; a mim, porém, odeia-me, porque Eu dou testemunho acerca dele: as suas obras são más. 8Subi vós para a festa; Eu não subo para esta festa, porque o meu tempo ainda não se cumpriu». 9Tendo Ele dito isto, permaneceu na Galileia.
Jesus peregrina em segredo – 10Contudo, quando os seus irmãos subiram para a festa, então também Ele subiu, não abertamente, mas quase em segredo[102]. 11Ora, os judeus procuravam-no durante a festa e diziam: «Onde está Ele?». 12E entre as multidões havia uma grande murmuração acerca dele; uns diziam: «Ele é bom!», mas outros diziam: «Não! Pelo contrário, engana a multidão». 13No entanto, ninguém falava publicamente acerca dele, por medo dos judeus.
Ainda o sábado e a cura do doente de Betzatá – 14Já a festa ia a meio, quando Jesus subiu ao templo e começou a ensinar. 15Admiravam-se, então, os judeus e diziam: «Como é que este conhece as letras sem ter estudado?»[103]. 16Respondeu-lhes Jesus e disse: «O meu ensinamento não é meu, mas daquele que me enviou. 17Se alguém quiser fazer a vontade dele, saberá se este ensinamento é de Deus ou se Eu falo por mim mesmo. 18Quem fala por si mesmo, procura a sua própria glória; mas quem procura a glória daquele que o enviou, esse é verdadeiro e nele não há injustiça.
19Não vos deu Moisés a Lei? E nenhum de vós cumpre a Lei! Porque procurais matar-me?». 20Respondeu a multidão: «Tens um demónio! Quem é que te procura matar?». 21Respondeu Jesus e disse-lhes: «Realizei uma só obra[104], e todos vos admirais. 22Por isso Moisés vos deu a circuncisão – não que ela venha de Moisés, mas dos Patriarcas –, e vós circuncidais um homem ao sábado. 23Se um homem recebe a circuncisão ao sábado para que não seja quebrada a Lei de Moisés, porque vos irritais comigo por ao sábado ter posto um homem inteiramente são? 24Não julgueis pela aparência; pelo contrário, julgai com um julgamento justo».
Discussão sobre a origem de Jesus – 25Diziam, então, alguns dos habitantes[105] de Jerusalém: «Não é este aquele que procuram matar? 26E eis que fala publicamente e nada lhe dizem! Terão os chefes, na verdade, reconhecido que este é o Cristo? 27Mas este sabemos de onde é; o Cristo, porém, quando vier, ninguém saberá de onde é».
28Então Jesus, ao ensinar no templo, clamou, dizendo: «Conheceis-me e sabeis de onde sou! Porém, não vim de mim mesmo; mas é verdadeiro aquele que me enviou, que vós não conheceis. 29Eu conheço-o, porque dele[106] sou e foi Ele que me enviou».
30Procuravam, então, prendê-lo, mas ninguém lhe pôs a mão em cima, porque ainda não chegara a sua hora[107]. 31Da multidão, porém, muitos acreditaram nele e diziam: «Será que o Cristo, quando vier, realizará sinais maiores do que aqueles que este tem realizado?».
Anúncio da morte e ressurreição – 32Os fariseus ouviram a multidão a murmurar estas coisas acerca dele, e os chefes dos sacerdotes e os fariseus enviaram guardas para que o prendessem.
33Disse-lhes, então, Jesus: «Por pouco tempo ainda estou convosco; parto para aquele que me enviou. 34Procurar-me-eis e não me encontrareis; e aonde Eu estou, vós não podeis ir». 35Disseram, então, os judeus entre si: «Para onde estará este prestes a ir, que nós não o possamos encontrar? Será que está prestes a ir para a diáspora dos gregos, ensinar os gregos[108]? 36Que palavra é esta que nos disse: "Procurar-me-eis e não me encontrareis" e: "Aonde Eu estou, vós não podeis ir"?».
Anúncio do dom da água viva: o Espírito Santo – 37No último dia, o mais importante da festa, Jesus pôs-se de pé e clamou, dizendo: «Se alguém tem sede, venha a mim; e beba 38quem acredita em mim. Como diz a Escritura: Do seu ventre brotarão rios de água viva»[109]. 39Disse isto acerca do Espírito, que estavam prestes a receber os que nele acreditaram; de facto, ainda não havia Espírito[110], porque Jesus não fora ainda glorificado.
Nova discussão sobre a origem e natureza de Jesus – 40Ao ouvirem estas palavras, alguns de entre a multidão diziam: «Este é verdadeiramente o Profeta». 41Outros diziam: «Este é o Cristo». Outros, porém, diziam: «Será que o Cristo vem da Galileia? 42Não disse a Escritura que o Cristo vem da descendência de David e de Belém, povoação de onde era David?»[111]. 43Surgiu, assim, uma divisão entre a multidão por causa dele. 44Alguns deles queriam prendê-lo, mas ninguém lhe pôs as mãos em cima.
45Os guardas foram, então, ter com os chefes dos sacerdotes e com os fariseus, e estes disseram-lhes: «Por que razão não o trouxestes?». 46Responderam os guardas: «Jamais homem algum falou assim!». 47Responderam-lhes os fariseus: «Será que também vós fostes enganados? 48Porventura algum dos chefes, ou dos fariseus, acreditou nele? 49Mas esta multidão, que não conhece a Lei: são uns malditos!». 50Disse-lhes Nicodemos, aquele que antes tinha ido ter com Ele e que era um deles: 51«Será que a nossa Lei julga um homem sem antes o ouvir e saber o que faz?». 52Responderam e disseram-lhe: «Será que também tu és da Galileia? Investiga e verás que da Galileia não surge nenhum profeta». 53E foi cada um para sua casa[112].
8 A mulher adúltera – 1Jesus foi para o Monte das Oliveiras. 2Mas, ao amanhecer, foi de novo ao templo, e todo o povo ia ter com Ele. E, tendo-se sentado, ensinava-os. 3Então os doutores da lei e os fariseus levaram uma mulher apanhada em adultério e, colocando-a no meio, 4disseram-lhe: «Mestre, esta mulher foi apanhada em flagrante adultério. 5Na Lei, Moisés ordenou-nos apedrejar tais mulheres. Ora, Tu que dizes?». 6Diziam isto para o pôr à prova e para que tivessem com que o acusar. Mas Jesus, inclinando-se, pôs-se a escrever com o dedo na terra. 7Como insistiam em interrogá-lo, levantou-se e disse-lhes: «Aquele que de vós está sem pecado seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra». 8E, inclinando-se de novo, continuou a escrever na terra. 9Eles, ao ouvirem isto, foram saindo, um após outro, a começar pelos mais velhos; e Jesus[113] foi deixado só, continuando a mulher no meio. 10Jesus levantou-se e disse-lhe: «Mulher, onde estão eles? Nenhum te condenou?». 11Ela disse: «Nenhum, Senhor». Disse-lhe Jesus: «Nem Eu te condeno. Vai, e a partir de agora não peques mais».
Testemunho de Jesus: «Eu sou a luz do mundo» – 12Então, falou-lhes de novo Jesus, dizendo: «Eu sou a luz do mundo[114]. Quem me segue jamais caminhará nas trevas, mas terá a luz da vida». 13Disseram-lhe os fariseus: «Tu dás testemunho acerca de ti mesmo: o teu testemunho não é verdadeiro!». 14Respondeu Jesus e disse-lhes: «Ainda que Eu dê testemunho acerca de mim mesmo, o meu testemunho é verdadeiro, porque sei de onde vim e para onde vou. Vós, porém, não sabeis de onde venho ou para onde vou. 15Vós julgais segundo a carne; Eu não julgo ninguém. 16E, se Eu julgar, o meu julgamento é verdadeiro, porque não estou só; pelo contrário, estou Eu e o Pai que me enviou. 17E na vossa Lei está escrito que o testemunho de dois homens é verdadeiro. 18Sou Eu que dou testemunho acerca de mim mesmo, e acerca de mim dá testemunho também o Pai que me enviou». 19Diziam-lhe, então: «Onde está o teu Pai?». Respondeu Jesus: «Nem a mim nem ao meu Pai conheceis. Se me conhecêsseis, conheceríeis também o meu Pai». 20Disse estas palavras junto à arca do tesouro[115], ao ensinar no templo. E ninguém o prendeu, porque ainda não chegara a sua hora.
Novo anúncio da morte de Jesus – 21Disse-lhes, então, de novo: «Eu vou partir e procurar-me-eis, e morrereis no vosso pecado. Para onde Eu vou, vós não podeis ir». 22Diziam, então, os judeus: «Será que se vai matar, visto que diz: "Para onde Eu vou, vós não podeis ir"?». 23Mas Ele dizia-lhes: «Vós sois aqui de baixo, Eu sou do alto; vós sois deste mundo, Eu não sou deste mundo. 24Por isso vos disse que morrereis nos vossos pecados, pois, se não acreditardes que Eu sou[116], morrereis nos vossos pecados». 25Diziam-lhe então: «Tu quem és?». Disse-lhes Jesus: «O que desde o princípio vos digo[117]! 26Muito tenho a dizer e julgar acerca de vós! Mas aquele que me enviou é verdadeiro e Eu, o que dele ouvi, isso digo ao mundo». 27Não compreenderam que lhes falava do Pai. 28Disse-lhes, então, Jesus: «Quando elevardes o Filho do Homem, nesse momento sabereis que Eu sou[118], e que nada faço por mim mesmo, mas como o Pai me ensinou, assim o digo. 29Aquele que me enviou está comigo; não me deixou só, porque Eu faço sempre o que lhe agrada». 30Ao dizer estas coisas, muitos acreditaram nele.
Declaração a alguns discípulos: «tendes por pai o Diabo» – 31Dizia, então, Jesus aos judeus que tinham acreditado nele[119]: «Se vós permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos; 32conhecereis a verdade e a verdade vos libertará». 33Responderam-lhe: «Somos descendência de Abraão e nunca fomos escravos de ninguém! Como é que Tu dizes: "Tornar-vos-eis livres"?». 34Respondeu-lhes Jesus: «Amen, amen vos digo: todo aquele que pratica o pecado é escravo do pecado. 35Ora, o escravo não permanece na casa para sempre; o filho é que permanece para sempre. 36Portanto, se o Filho vos libertar, sereis realmente livres. 37Sei que sois descendência de Abraão; no entanto, procurais matar-me, porque a minha palavra não encontra lugar em vós. 38Eu digo aquilo que vi junto do Pai; e vós fazeis aquilo que ouvistes junto do vosso pai»[120]. 39Responderam e disseram-lhe: «O nosso pai é Abraão!». Disse-lhes Jesus: «Se sois filhos de Abraão, faríeis as obras de Abraão. 40Mas agora procurais matar-me, a um homem que vos disse a verdade que ouvi junto de Deus. Abraão não fez isso! 41Vós fazeis as obras do vosso pai». Disseram-lhe: «Nós não nascemos da promiscuidade! Temos um só Pai: Deus». 42Disse-lhes Jesus: «Se Deus fosse vosso Pai, amar-me-íeis, pois Eu de Deus saí e vim; não vim por mim mesmo, mas foi Ele que me enviou. 43Por que razão não compreendeis a minha linguagem? Porque não sois capazes de ouvir a minha palavra. 44Vós sois do vosso pai, o Diabo, e quereis realizar os desejos do vosso pai. Ele foi homicida desde o princípio e não se manteve na verdade, porque nele não há verdade. Quando diz o que é mentira, fala a partir do que lhe é próprio, porque é mentiroso e é o seu pai. 45Mas em mim, porque Eu digo a verdade, não acreditais! 46Quem de vós me acusa de pecado? Se digo a verdade, por que razão vós não acreditais em mim? 47Quem é de Deus ouve as palavras de Deus. É por isso que vós não ouvis: porque não sois de Deus».
48Responderam os judeus e disseram-lhe: «Não dizemos nós, com razão, que Tu és samaritano e tens um demónio?». 49Respondeu Jesus: «Eu não tenho um demónio; pelo contrário, honro o meu Pai, mas vós desonrais-me! 50Eu não procuro a minha glória; há quem procure e julgue. 51Amen, amen vos digo: se alguém guardar a minha palavra, jamais verá a morte para sempre». 52Disseram-lhe, então, os judeus: «Agora sabemos que tens um demónio! Abraão morreu, os profetas também, e Tu dizes: "Se alguém guardar a minha palavra, jamais provará a morte para sempre"! 53Serás Tu maior que o nosso Pai Abraão, que morreu? Os profetas também morreram. Quem pretendes ser?»[121]. 54Respondeu Jesus: «Se Eu me glorificasse a mim mesmo, a minha glória nada seria. É o meu Pai quem me glorifica, aquele de quem dizeis: "É nosso Deus", 55mas não o conheceis; Eu, porém, conheço-o. Se dissesse que não o conheço seria um mentiroso igual a vós; mas conheço-o e guardo a sua palavra. 56Abraão, o vosso pai, exultou por ver o meu dia; viu e alegrou-se». 57Disseram-lhe, então, os judeus: «Nem sequer tens cinquenta anos e viste Abraão?». 58Disse-lhes Jesus: «Amen, amen vos digo: antes de Abraão existir, Eu Sou[122]». 59Pegaram, então, em pedras para lhe atirar, mas Jesus escondeu-se e saiu do templo.
9 Cura do cego de nascença[123] – 1Ao passar, viu um homem cego de nascença. 2E perguntaram-lhe os seus discípulos, dizendo: «Rabi, quem pecou, ele ou os seus pais, para que tivesse nascido cego?»[124]. 3Respondeu Jesus: «Nem ele pecou, nem os seus pais; mas foi assim para que nele se manifestem as obras de Deus. 4É necessário que nós realizemos as obras daquele que me enviou enquanto é dia. Está a chegar a noite, em que ninguém pode trabalhar[125]. 5Enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo».
6Tendo dito isto, cuspiu na terra, fez lama com a saliva[126], untou-lhe os olhos com a lama 7e disse-lhe: «Vai lavar-te na piscina de Siloé» – que significa «Enviado»[127]. Ele foi, lavou-se e regressou a ver.
8Então os vizinhos e os que antes o costumavam ver, porque era mendigo, diziam: «Não é este o que estava sentado a mendigar?». 9Uns diziam: «É este»; outros diziam: «Não, mas é parecido com ele». Ele dizia: «Sou eu». 10Diziam-lhe, então: «Como é que se te abriram os olhos?». 11Respondeu ele: «O homem chamado Jesus fez lama, untou-me os olhos e disse-me: "Vai a Siloé e lava-te". Fui e, depois de me ter lavado, comecei a ver». 12Disseram-lhe: «Onde está Ele?». Ele disse: «Não sei».
13Levaram aos fariseus o que tinha sido cego. 14Ora, era sábado o dia em que Jesus fizera lama e lhe abrira os olhos[128]. 15De novo lhe perguntaram também os fariseus como tinha começado a ver. Ele disse-lhes: «Pôs-me lama nos olhos, lavei-me e agora vejo». 16Diziam, então, alguns dos fariseus: «Esse homem não vem de Deus, porque não guarda o sábado». Mas outros diziam: «Como pode um homem pecador realizar tais sinais?». E havia divisão entre eles. 17Disseram, de novo, ao cego: «Tu, que dizes acerca dele, visto que te abriu os olhos?». Ele disse: «É um profeta».
18Mas os judeus não acreditaram que ele tivesse sido cego e começado a ver, até que chamaram os pais do que tinha começado a ver, 19e lhes perguntaram, dizendo: «Este é o vosso filho, que vós dizeis ter nascido cego? Então como é que agora vê?». 20Responderam os seus pais e disseram: «Sabemos que este é o nosso filho e que nasceu cego; 21mas como agora vê, não sabemos, nem nós sabemos quem lhe abriu os olhos. Perguntai-lhe; já tem idade, ele falará sobre si próprio». 22Os seus pais disseram isto porque tinham medo dos judeus. De facto, os judeus já tinham combinado que, se alguém o confessasse como Cristo, fosse expulso da sinagoga. 23Por isso os seus pais disseram: «Já tem idade; perguntai-lhe».
24Chamaram então, pela segunda vez, o homem que tinha sido cego e disseram-lhe: «Dá glória a Deus[129]! Nós sabemos que esse homem é pecador». 25Respondeu ele: «Se é pecador, não sei. Uma coisa sei: era cego e agora vejo». 26Disseram-lhe então: «Que te fez Ele? Como te abriu os olhos?». 27Respondeu-lhes: «Já vos disse e não ouvistes! Por que razão quereis ouvir de novo? Será que também vós vos quereis tornar seus discípulos?». 28Insultaram-no e disseram: «Tu é que és seu discípulo; nós somos discípulos de Moisés. 29Nós sabemos que Deus falou a Moisés; mas esse não sabemos de onde é». 30Respondeu o homem e disse-lhes: «Pois o que há de surpreendente nisto é que vós não sabeis de onde Ele é; no entanto, abriu-me os olhos! 31Sabemos que Deus não ouve pecadores, mas se alguém o temer e fizer a sua vontade, a esse o ouve. 32Nunca se ouviu dizer que alguém tenha aberto os olhos de um cego de nascença! 33Se Ele não viesse de Deus, nada poderia fazer». 34Eles responderam e disseram-lhe: «Tu nasceste todo em pecados e estás a ensinar-nos?»[130]. E expulsaram-no.
35Jesus ouviu que o tinham expulsado e, quando o encontrou, disse: «Tu acreditas no Filho do Homem?». 36Ele respondeu e disse: «E quem é, Senhor, para que acredite nele?». 37Disse-lhe Jesus: «Já o viste: é aquele que fala contigo». 38Ele, então, afirmou: «Acredito, Senhor!». E prostrou-se diante dele[131].
39Disse, então, Jesus: «Para um juízo[132] vim Eu a este mundo: para que os que não veem, vejam, e os que veem, se tornem cegos». 40Alguns dos fariseus que estavam com Ele ouviram isto e disseram-lhe: «Será que também nós somos cegos?». 41Disse-lhes Jesus: «Se fôsseis cegos, não teríeis pecado algum; mas como agora dizeis: "Vemos", o vosso pecado permanece».
10 Jesus, porta e bom pastor[133] – 1«Amen, amen vos digo: o que não entra pela porta no redil das ovelhas, mas sobe por outro lado, é ladrão e salteador. 2Mas o que entra pela porta é pastor das ovelhas. 3A este o porteiro abre a porta[134], e as ovelhas ouvem a sua voz; chama pelo nome as ovelhas que lhe pertencem e condu-las para fora[135]. 4Quando fez sair todas as que lhe pertencem, caminha à sua frente e as ovelhas seguem-no, porque reconhecem a sua voz. 5Jamais seguirão um estranho; pelo contrário, fugirão dele, porque não reconhecem a voz dos estranhos». 6Jesus falou-lhes nesta linguagem figurada[136], mas eles não compreenderam as coisas que lhes dizia.
7Disse, então, Jesus de novo: «Amen, amen vos digo: Eu sou a porta das ovelhas. 8Todos os que vieram antes de mim são ladrões e salteadores, mas as ovelhas não os ouviram. 9Eu sou a porta: se alguém entrar através de mim, será salvo; entrará e sairá e encontrará pastagem. 10O ladrão não vem senão para roubar, matar e destruir; Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância[137].
11Eu sou o bom pastor[138]: o bom pastor dá a sua vida[139] pelas ovelhas. 12O assalariado, que não é pastor e ao qual não pertencem as ovelhas, vê vir o lobo, abandona as ovelhas e foge – e o lobo arrebata-as e dispersa-as –, 13porque é assalariado e não se preocupa com as ovelhas. 14Eu sou o bom pastor: conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas conhecem-me[140], 15tal como o Pai me conhece e Eu conheço o Pai; e dou a minha vida pelas ovelhas.
16E tenho outras ovelhas que não são deste redil. É necessário que também a essas Eu conduza; ouvirão a minha voz e haverá um só rebanho e um só pastor. 17Por isso o Pai me ama: porque Eu dou a minha vida, para de novo a tomar. 18Ninguém ma tira, mas Eu por mim mesmo a dou. Tenho poder para a dar e tenho poder para de novo a tomar. Este mandamento recebi-o do meu Pai».
19Surgiu de novo uma divisão entre os judeus, por causa destas palavras. 20Diziam muitos deles: «Tem um demónio e está louco! Porque o ouvis?». 21Outros diziam: «Estas palavras não são de endemoniado! Como pode um demónio abrir os olhos de cegos?».
Jesus declara-se Filho de Deus – 22Houve, então, em Jerusalém a festa da Dedicação do Templo[141]. Era inverno. 23Jesus caminhava no templo, no pórtico de Salomão. 24Então os judeus rodearam-no e diziam-lhe: «Até quando nos manterás em suspenso[142]? Se Tu és o Cristo, diz-nos com clareza». 25Respondeu-lhes Jesus: «Disse-vos e não acreditais. As obras que Eu realizo em nome do meu Pai dão testemunho acerca de mim. 26No entanto, vós não acreditais, porque não sois das minhas ovelhas. 27As minhas ovelhas ouvem a minha voz; Eu conheço-as, e elas seguem-me. 28E Eu dou-lhes vida eterna: jamais hão de perecer para sempre, e ninguém as arrebatará da minha mão. 29O meu Pai, que mas deu, é maior que todos: ninguém as pode arrebatar da mão do Pai. 30Eu e o Pai somos um».
31Os judeus pegaram novamente em pedras para o apedrejar[143]. 32Respondeu-lhes Jesus: «Muitas obras boas vos mostrei da parte do Pai: por qual dessas obras me apedrejais?». 33Responderam-lhe os judeus: «Não é por causa de uma boa obra que te apedrejamos, mas por blasfémia, porque Tu, sendo homem, a ti mesmo te fazes Deus». 34Respondeu-lhes Jesus: «Não está escrito na vossa Lei: Eu disse: vós sois deuses[144]? 35Ora, se chamou deuses àqueles para quem veio a palavra de Deus – e a Escritura não pode ser destruída –, 36a respeito daquele que o Pai consagrou e enviou ao mundo vós dizeis: "Tu blasfemas", porque disse: "Sou Filho de Deus"? 37Se não realizo as obras do meu Pai, não acrediteis em mim; 38mas se as realizo, mesmo que não acrediteis em mim, acreditai nas obras, para que reconheçais e saibais[145] que o Pai está em mim e Eu estou no Pai». 39Procuravam, então, de novo prendê-lo, mas Ele escapou-se das suas mãos.
40E partiu novamente para a outra margem do Jordão, para o lugar onde João tinha primeiramente batizado, e ali permaneceu. 41Muitos foram ter com Ele e diziam: «João não realizou sinal algum, mas tudo quanto João disse acerca deste era verdade». 42E, ali, muitos acreditaram nele.
11 Ressurreição de Lázaro – 1Ora, estava doente um certo homem, Lázaro de Betânia, da povoação de Maria e de Marta, sua irmã. 2Maria era aquela que tinha ungido o Senhor com bálsamo e lhe tinha secado os pés com os seus cabelos[147]. Era o seu irmão Lázaro que estava doente. 3As irmãs mandaram, então, dizer-lhe: «Senhor, eis que aquele de quem és amigo[148] está doente». 4Ouvindo isto, Jesus disse: «Esta doença não leva à morte, mas é para a glória de Deus, para que por meio dela seja glorificado o Filho de Deus»[149]. 5Jesus amava Marta, a irmã dela e Lázaro. 6Quando ouviu que estava doente, permaneceu ainda dois dias no lugar onde estava.
7Depois disto, disse aos discípulos: «Vamos novamente para a Judeia». 8Disseram-lhe os discípulos: «Rabi, ainda agora os judeus procuravam apedrejar-te, e vais novamente para lá?». 9Respondeu Jesus: «Não são doze as horas do dia? Se alguém caminhar durante o dia, não tropeça, porque vê a luz deste mundo; 10mas se alguém caminhar durante a noite, tropeça, porque a luz não está nele». 11Depois de lhes dizer estas coisas, disse-lhes isto[150]: «Lázaro, o nosso amigo, adormeceu. Mas vou, para o despertar». 12Disseram-lhe os discípulos: «Senhor, se adormeceu, há de salvar-se». 13Ora, Jesus tinha falado da morte de Lázaro[151], mas eles pensaram que estivesse a falar do adormecimento do sono. 14Então disse-lhes Jesus com clareza: «Lázaro morreu! 15E alegro-me, por vós, que não estivesse lá, para que acrediteis. Mas vamos ter com ele». 16Disse, então, Tomé, o chamado Dídimo[152], aos condiscípulos: «Vamos também nós, para morrermos com Ele».
17Ora, quando chegou, Jesus encontrou-o há já quatro dias no sepulcro. 18Betânia ficava perto de Jerusalém, cerca de quinze estádios[153], 19e muitos judeus tinham vindo ter com Marta e Maria, para as confortar por causa do irmão. 20Quando Marta ouviu que Jesus estava a chegar, foi ao seu encontro. Maria, porém, ficou sentada em casa. 21Disse, então, Marta a Jesus: «Senhor, se estivesses aqui, o meu irmão não teria morrido. 22Mas, também agora, sei que tudo quanto pedires a Deus, Deus to dará». 23Disse-lhe Jesus: «O teu irmão ressuscitará». 24Disse-lhe Marta: «Sei que ressuscitará na ressurreição, no último dia». 25Disse-lhe Jesus: «Eu sou a ressurreição e a vida; quem acredita em mim, ainda que morra, viverá; 26e todo aquele que vive e acredita em mim jamais morrerá para sempre. Acreditas nisto?»[154]. 27Disse-lhe ela: «Sim, Senhor, eu acredito que Tu és o Cristo, o Filho de Deus que vem ao mundo».
28Tendo dito isto, retirou-se e chamou Maria, sua irmã, dizendo-lhe em segredo: «O Mestre está aqui e chama-te». 29Quando ela ouviu isto, levantou-se depressa e foi ter com Ele. 30Jesus ainda não tinha chegado à povoação, mas estava ainda no lugar aonde Marta tinha ido ao seu encontro. 31Então os judeus que estavam com ela em casa e a confortavam, ao verem Maria levantar-se tão depressa e sair, seguiram-na, pensando que fosse ao sepulcro, para ali chorar.
32Quando Maria chegou aonde Jesus estava, ao vê-lo, caiu a seus pés, dizendo-lhe: «Senhor, se estivesses aqui, o meu irmão não teria morrido». 33Então Jesus, quando a viu chorar, e os judeus, que com ela tinham vindo, também a chorar, comoveu-se profundamente e ficou perturbado. 34E disse: «Onde o pusestes?». Disseram-lhe: «Senhor, vem e vê». 35Jesus chorou[155]. 36Diziam, então, os judeus: «Vede como era seu amigo!»[156]. 37Mas alguns deles disseram: «Então ele, que abriu os olhos do cego, não podia ter feito com que ele não morresse?».
38Jesus, de novo profundamente comovido, foi ao sepulcro. Era uma gruta e tinha sido colocada uma pedra contra ela. 39Disse Jesus: «Tirai a pedra». Disse-lhe Marta, a irmã do defunto: «Senhor, já cheira mal, pois há quatro dias que está aqui». 40Disse-lhe Jesus: «Não te disse que, se acreditares, verás a glória de Deus?». 41Tiraram, então, a pedra. Jesus levantou os olhos para alto e disse: «Pai, dou-te graças, porque me ouviste. 42Eu sabia que sempre me ouves, mas disse-o por causa da multidão que me rodeia, para que acreditem que Tu me enviaste». 43Tendo dito isto, clamou com voz forte: «Lázaro, vem para fora!»[157]. 44O morto saiu, com as mãos e os pés enfaixados com ligaduras, e o seu rosto estava envolvido num sudário. Disse-lhes Jesus: «Desatai-o e deixai-o ir».
O Sinédrio decide a morte de Jesus[158] – 45Então, muitos dos judeus que tinham vindo ter com Maria, ao verem o que fizera, acreditaram nele. 46Mas alguns deles foram ter com os fariseus e disseram-lhes o que Jesus fizera.
47Os chefes dos sacerdotes e os fariseus reuniram, então, o sinédrio e diziam: «Que havemos de fazer, uma vez que este homem realiza muitos sinais? 48Se o deixarmos assim, todos acreditarão nele; virão os romanos e destruirão o nosso lugar santo[159] e a nossa nação». 49Mas um deles, Caifás, que era sumo-sacerdote naquele ano, disse-lhes: «Vós não percebeis nada! 50Não compreendeis que é melhor para vós que morra um só homem pelo povo e não pereça toda a nação?». 51Não disse isto por si mesmo, mas, sendo sumo-sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus estava prestes a morrer pela nação. 52E não só pela nação, mas também para congregar na unidade os filhos de Deus dispersos.
53Assim, a partir desse dia, deliberaram que o iriam matar. 54Por isso, Jesus já não andava publicamente entre os judeus, mas partiu dali para a região próxima do deserto, para uma cidade chamada Efraim, e aí permaneceu com os discípulos.
55Ora, estava próxima a Páscoa dos judeus e, da região, muitos subiram a Jerusalém, antes da Páscoa, para se purificarem. 56Procuravam, então, Jesus e diziam uns aos outros, enquanto estavam no templo: «Que vos parece? Não virá para a festa?». 57Os chefes dos sacerdotes e os fariseus tinham dado ordens para que, se alguém soubesse onde Ele estava, o indicasse, para o prenderem.
12 A unção em Betânia (Mt 26,6-13; Mc 14,3-9; Lc 7,36-50) – 1Então Jesus, seis dias antes da Páscoa[160], foi a Betânia, onde estava Lázaro que Jesus ressuscitara dos mortos. 2Ora, fizeram-lhe ali uma ceia; Marta servia, e Lázaro era um dos que estavam reclinados à mesa com Ele.
3Então Maria, tomando uma libra[161] de bálsamo de nardo puro, muito caro, ungiu os pés de Jesus e, com os seus cabelos, secou-lhe os pés. A casa encheu-se do odor do bálsamo. 4Disse Judas Iscariotes, um dos seus discípulos, o que estava prestes a entregá-lo: 5«Por que razão não se vendeu esse bálsamo por trezentos denários[162] e se deu aos pobres?». 6Disse isto não porque se preocupasse com os pobres, mas porque era ladrão e, como tinha a bolsa do dinheiro, tirava o que se ia depositando. 7Disse, então, Jesus: «Deixai-a, para que o guarde para o dia da minha sepultura. 8Pois pobres sempre os tendes convosco, mas a mim nem sempre me tendes».
9Entretanto, uma numerosa multidão de judeus soube que Ele estava ali e veio, não só por causa de Jesus, mas também para verem Lázaro, que ressuscitara dos mortos. 10Os chefes dos sacerdotes deliberaram, então, matar também Lázaro, 11porque, por sua causa, muitos se afastavam dos judeus e acreditavam em Jesus.
Entrada messiânica em Jerusalém (Mt 21,1-11; Mc 11,1-11; Lc 19,29-40) – 12No dia seguinte, a numerosa multidão que tinha vindo para a festa, ao ouvir dizer que Jesus estava a chegar a Jerusalém, 13apanhou ramos de palmeira, saiu ao seu encontro, e gritava:
Hossana!
Bendito o que vem em nome do Senhor,
o rei de Israel[163].
14Jesus, tendo encontrado um jumentinho, sentou-se nele, como está escrito:
15Não tenhas medo, filha de Sião!
Eis que vem o teu rei,
sentado na cria de uma jumenta[164].
16A princípio os seus discípulos não compreenderam isto, mas, quando Jesus foi glorificado, então recordaram-se de que isto estava escrito acerca dele e que foi isto o que lhe fizeram.
17Ora, a multidão, que tinha estado com Ele quando chamou Lázaro para fora do sepulcro e o ressuscitou dos mortos, dava testemunho. 18Também por causa disto a multidão veio ao seu encontro: porque ouviu que Ele tinha realizado esse sinal. 19Os fariseus disseram, então, entre si: «Vede como nada conseguis! Eis que o mundo foi atrás dele!».
Os gregos querem ver Jesus – 20Havia alguns gregos[165] entre os que tinham subido a Jerusalém[166] para adorar durante a festa. 21Estes foram, então, ter com Filipe, que era de Betsaida da Galileia, e pediram-lhe, dizendo: «Senhor, queremos ver Jesus»[167]. 22Filipe foi dizê-lo a André, e André e Filipe foram dizê-lo a Jesus. 23Jesus respondeu-lhes, dizendo: «Chegou a hora[168] de o Filho do Homem ser glorificado. 24Amen, amen vos digo: se o grão de trigo, ao cair na terra, não morrer, ele permanece só; mas, se morrer, dá muito fruto. 25Quem estima[169] a sua vida perde-a; quem menospreza[170] a sua vida neste mundo há de conservá-la para a vida eterna[171]. 26Se alguém me servir, que me siga, e onde Eu estou, aí estará também o meu servidor. Se alguém me servir, o Pai o honrará. 27Agora a minha alma está perturbada[172]! E que direi? Pai, salva-me desta hora? Mas foi por causa disto que Eu vim: para esta hora[173]! 28Pai, glorifica o Teu nome!»[174]. Veio, então, uma voz do céu: «Glorifiquei e de novo glorificarei!».
29A multidão, que estava presente e ouvira, dizia que tinha sido um trovão. Outros diziam: «Foi um anjo que lhe falou». 30Respondeu Jesus e disse: «Não foi por minha causa que surgiu esta voz, mas por vossa causa.31É agora o julgamento deste mundo; agora o Príncipe deste mundo[175] vai ser expulso. 32E Eu, quando for elevado da terra[176], atrairei todos a mim». 33Dizia isto assinalando com que género de morte estava prestes a morrer. 34Respondeu-lhe, então, a multidão: «Nós ouvimos da Lei que o Cristo permanece para sempre. Como dizes Tu que é necessário o Filho do Homem ser elevado? Quem é esse Filho do Homem?». 35Disse-lhes Jesus: «A luz ainda está entre vós por pouco tempo. Caminhai enquanto tendes a luz, para que as trevas não se apoderem de vós[177]. Quem caminha nas trevas não sabe para onde vai. 36Enquanto tendes a luz, acreditai na luz, para vos tornardes filhos da luz». Jesus disse estas coisas e, partindo, escondeu-se deles.
Conclusão narrativa do Livro dos Sinais: a falta de fé dos judeus – 37Apesar de Ele ter realizado tantos sinais diante deles, não acreditavam nele, 38para que se cumprisse a palavra do profeta Isaías, que disse:
Senhor, quem acreditou no que ouviu de nós?
E a força do Senhor[178] a quem foi revelada?
39Por isso não podiam acreditar, pois Isaías disse ainda:
40Cegou-lhes os olhos,
e endureceu-lhes o coração,
para que não vejam com os olhos,
e não entendam com o coração
e não se convertam,
e Eu os cure[179].
41Isaías disse isto porque viu a sua glória e falou acerca dele.
42Apesar de tudo, também entre os chefes muitos acreditaram nele, mas não o confessavam por causa dos fariseus, para não serem expulsos da sinagoga. 43De facto, amaram mais a glória dos homens do que a glória de Deus[180]!
Conclusão discursiva do Livro dos Sinais: a fé que salva – 44Então, Jesus clamou e disse: «Quem acredita em mim, não acredita em mim, mas naquele que me enviou. 45E quem me vê, vê aquele que me enviou. 46Eu como luz vim ao mundo, para que todo aquele que acredita em mim não permaneça nas trevas. 47E se alguém ouvir as minhas palavras e não as guardar, Eu não o julgo, pois não vim para julgar o mundo, mas para salvar o mundo. 48Quem me rejeita e não acolhe as minhas palavras, tem quem o julgue: a palavra que Eu disse, ela o há de julgar no último dia. 49Porque Eu não falei por mim mesmo; mas o Pai que me enviou, foi Ele que me deu um mandamento acerca do que havia de dizer e falar. 50E sei que o seu mandamento é vida eterna. Portanto, o que Eu digo, digo-o tal como o Pai me disse a mim».
13 O lava-pés – 1Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a sua hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até à consumação[182]. 2Durante a ceia, quando o Diabo já tinha lançado no coração de Judas, filho de Simão Iscariotes, a decisão de o entregar, 3Jesus, sabendo que o Pai tudo lhe colocara nas mãos e que de Deus saíra e para Deus voltava, 4levantou-se da ceia, tirou as vestes e, tomando uma toalha, atou-a à cintura. 5Depois deitou água na bacia e começou a lavar os pés dos discípulos e a secá-los com a toalha que tinha atado à cintura[183]. 6Chegou, então, a Simão Pedro, que lhe disse: «Senhor, Tu vais lavar-me os pés?». 7Respondeu Jesus e disse-lhe: «O que Eu estou a fazer, tu não o compreendes agora; entenderás depois». 8Disse-lhe Pedro: «Jamais me lavarás os pés!»[184]. Respondeu-lhe Jesus: «Se não te lavar, não terás parte comigo»[185]. 9Disse-lhe Simão Pedro: «Senhor, então não só os meus pés, mas também as mãos e a cabeça».10Disse-lhe Jesus: «Quem tomou banho não tem necessidade de lavar senão os pés, pois está inteiramente puro[186]. E vós estais puros, mas não todos». 11De facto, Ele sabia quem o haveria de entregar; por isso, disse: «Nem todos estais puros».
12Depois de lhes ter lavado os pés, tomou as suas vestes, reclinou-se de novo à mesa, e disse-lhes: «Entendeis o que vos fiz? 13Vós chamais-me "o Mestre" e "o Senhor" e dizeis bem, porque sou. 14Ora, se Eu, "o Senhor" e "o Mestre", vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. 15Dei-vos o exemplo, para que, assim como Eu vos fiz, vós façais também. 16Amen, amen vos digo: um servo não é maior do que o seu senhor, nem um apóstolo maior do que aquele que o enviou. 17Se compreendeis isto, felizes sereis se o fizerdes. 18Não falo de todos vós; Eu conheço aqueles que escolhi. Mas é para que se cumpra a Escritura: O que come o meu pão, levantou contra mim o seu calcanhar[187]. 19Desde já vo-lo digo, antes de acontecer, para que, quando acontecer, acrediteis que Eu Sou[188]. 20Amen, amen vos digo: quem recebe aquele que Eu enviar, a mim recebe; e quem me recebe, recebe aquele que me enviou».
Anúncio da traição de Judas (Mt 26,20-25; Mc 14,18-21; Lc 22,21-23) – 21Tendo dito isto, Jesus sentiu-se profundamente perturbado, deu testemunho e disse: «Amen, amen vos digo: um de vós me há de entregar!». 22Os discípulos olhavam uns para os outros, sem perceber de quem falava. 23Ora, estava reclinado no seio de Jesus[189] um dos seus discípulos, aquele que Jesus amava[190]. 24Fez-lhe, então, sinal Simão Pedro para que procurasse saber quem seria aquele acerca de quem falava. 25Ele, assim reclinado sobre o peito de Jesus, disse-lhe: «Senhor, quem é?». 26Respondeu Jesus: «É aquele a quem Eu der o bocado de pão que vou molhar». E, molhando o bocado de pão, tomou-o e deu-o a Judas, filho de Simão Iscariotes. 27E, depois do bocado de pão, entrou nele Satanás[191]. Disse-lhe, então, Jesus: «O que estás a fazer, faz depressa». 28Mas nenhum dos que estavam reclinados à mesa compreendeu porque lhe dissera isto; 29alguns pensavam que, uma vez que Judas tinha a bolsa do dinheiro, Jesus lhe tinha dito: «Compra aquilo de que temos necessidade para a festa», ou para dar alguma coisa aos pobres. 30Então, depois de tomar o bocado de pão, saiu imediatamente. Era noite[192].
31Quando ele saiu, disse Jesus: «Agora foi glorificado o Filho do Homem, e Deus foi glorificado nele. 32Se Deus foi glorificado nele, também Deus o glorificará em si mesmo, e glorificá-lo-á imediatamente».
O mandamento novo – 33«Filhinhos, ainda por um pouco estou convosco; haveis de procurar-me e, tal como disse aos judeus: "para onde Eu vou, vós não podeis ir", também vo-lo digo agora[193]. 34Dou-vos um mandamento novo[194]: que vos ameis uns aos outros; como vos amei, que também vós vos ameis uns aos outros. 35Nisto saberão todos que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns pelos outros».
Anúncio da negação de Pedro (Mt 26,30-35; Mc 14,26-31; Lc 22,31-34) – 36Disse-lhe Simão Pedro: «Senhor, para onde vais?». Respondeu-lhe Jesus: «Para onde vou não podes agora seguir-me; seguir-me-ás depois». 37Disse-lhe Pedro: «Senhor, por que razão não posso seguir-te agora? Darei a minha vida por ti!». 38Respondeu-lhe Jesus: «Darás a tua vida por mim? Amen, amen te digo: não cantará o galo, sem que me tenhas negado três vezes».
14 Jesus: caminho, verdade e vida – 1«Não se perturbe o vosso coração; acreditai em Deus e acreditai em mim. 2Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fosse, ter-vos-ia dito que vos vou preparar um lugar? 3E, quando Eu tiver partido e vos tiver preparado um lugar, virei de novo e levar-vos-ei comigo[195], para que onde Eu estou, estejais vós também. 4E para onde Eu vou, sabeis o caminho».
5Disse-lhe Tomé: «Senhor, não sabemos para onde vais; como podemos saber o caminho?». 6Disse-lhe Jesus: «Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim. 7Se me conheceis, conhecereis também o meu Pai. E desde já o conheceis e o vistes».
8Disse-lhe Filipe: «Senhor, mostra-nos o Pai e isso nos basta». 9Disse-lhe Jesus: «Há tanto tempo que estou convosco, e não me conheces, Filipe? Quem me viu, viu o Pai. Como dizes tu: "Mostra-nos o Pai"? 10Não acreditas que Eu estou no Pai, e o Pai está em mim? As palavras que Eu vos digo, não as digo por mim mesmo; o Pai, que permanece em mim[196], realiza as suas obras. 11Acreditai em mim: Eu estou no Pai, e o Pai está em mim. Se não, acreditai por causa das obras em si.
12Amen, amen vos digo: quem acredita em mim realizará também ele as obras que Eu realizo, e realizará maiores do que estas, porque Eu vou para o Pai. 13E aquilo que pedirdes em meu nome, fá-lo-ei, para que o Pai seja glorificado no Filho. 14Se me pedirdes algo no meu nome, Eu o farei».
Primeiro anúncio da vinda do Espírito Santo – 15«Se me amardes, guardareis os meus mandamentos. 16E Eu pedirei ao Pai, e dar-vos-á outro Paráclito[197], para que esteja convosco para sempre: 17o Espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem conhece. Vós o conheceis, porque junto a vós tem permanecido e em vós estará. 18Não vos deixarei órfãos: virei a vós[198]! 19Um pouco mais e o mundo já não me verá; vós, porém, ver-me-eis[199], porque Eu vivo e vós vivereis. 20Naquele dia, vós compreendereis que Eu estou no meu Pai, vós em mim e Eu em vós. 21Quem tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama. E quem me ama será amado pelo meu Pai; também Eu o amarei e a ele me hei de manifestar».
22Disse-lhe Judas, não o Iscariotes: «Senhor, que aconteceu para que estejas prestes a manifestar-te a nós e não ao mundo?». 23Respondeu Jesus e disse-lhe: «Se alguém me amar, guardará a minha palavra e o meu Pai o amará; viremos a ele e junto dele faremos morada. 24Quem não me ama não guarda as minhas palavras. Ora, a palavra que ouvis não é minha, mas do Pai que me enviou.
25Disse-vos estas coisas, permanecendo junto de vós; 26mas o Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará no meu nome, Ele vos ensinará todas as coisas e vos recordará todas as coisas que Eu vos disse».
Conclusão do primeiro discurso – 27«Deixo-vos a paz, dou-vos a minha paz; Eu não vo-la dou como a dá o mundo. Não se perturbe o vosso coração, nem se atemorize; 28ouvistes o que Eu vos disse: "Vou, mas virei a vós". Se me amásseis, alegrar-vos-íeis porque vou para o Pai, pois o Pai é maior do que Eu. 29E disse-vos agora, antes de acontecer, para que, quando aconteça, acrediteis. 30Já não falarei muito mais convosco, pois está a chegar o Príncipe do mundo; não que em mim tenha algum poder[200], 31mas para que o mundo saiba que amo o Pai e que, tal como o Pai me ordenou, assim faço.
Levantai-vos! Vamo-nos daqui»[201].
15 Jesus, a verdadeira videira – 1«Eu sou a verdadeira videira, e o meu Pai é o agricultor[202]. 2Todo o ramo que em mim não dá fruto Ele corta-o, e limpa[203] todo o que dá fruto para que dê mais fruto. 3Vós já estais limpos, por causa da palavra que vos disse. 4Permanecei em mim e Eu em vós[204]. Como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim também vós, se não permanecerdes em mim. 5Eu sou a videira, vós os ramos. O que permanece em mim e Eu nele, este dá muito fruto, porque sem mim nada podeis fazer. 6Se alguém não permanecer em mim, é lançado fora, como o ramo, e seca; então recolhem-nos, lançam-nos ao fogo e são queimados. 7Se permanecerdes em mim, e as minhas palavras permanecerem em vós, pedireis o que quiserdes e acontecer-vos-á. 8Nisto é o meu Pai glorificado: que deis muito fruto e[205] vos torneis meus discípulos.
9Assim como o Pai me amou, também Eu vos amei. Permanecei no meu amor. 10Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor, tal como Eu guardo os mandamentos do meu Pai e permaneço no seu amor.
11Disse-vos estas coisas para que a minha alegria esteja em vós, e a vossa alegria seja completa».
O mandamento do amor – 12«É este o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como Eu vos amei[206]. 13Ninguém tem maior amor do que este: que alguém dê a sua vida pelos seus amigos. 14Vós sois meus amigos, se fizerdes o que Eu vos mando. 15Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; chamo-vos amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi do meu Pai. 16Não fostes vós que me escolhestes, mas fui Eu que vos escolhi e vos designei, para que vades e deis fruto e o vosso fruto permaneça; para que aquilo que pedirdes ao Pai no meu nome, Ele vos dê. 17Isto vos mando: que vos ameis uns aos outros».
Primeiro anúncio da perseguição aos discípulos – 18«Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro que a vós, me odiou a mim. 19Se fôsseis do mundo, o mundo seria amigo do que é seu; mas, porque não sois do mundo – pelo contrário, Eu vos escolhi do mundo[207] –, por isso o mundo vos odeia. 20Recordai a palavra que Eu vos disse: "Um servo não é maior que o seu senhor". Se me perseguiram a mim, também vos perseguirão; se guardaram a minha palavra, também guardarão a vossa. 21Mas tudo isto vos farão por causa do meu nome, porque não conhecem aquele que me enviou. 22Se Eu não tivesse vindo e não lhes tivesse falado, não teriam pecado algum; agora, porém, não têm desculpa para o seu pecado. 23Quem me odeia, odeia também o meu Pai. 24Se Eu não tivesse realizado, entre eles, as obras que nenhum outro realizou, não teriam pecado algum; agora, porém, viram e odiaram quer a mim, quer ao meu Pai. 25Mas foi para que se cumprisse a palavra que está escrita na Lei deles: Odiaram-me sem motivo»[208].
Segundo anúncio da vinda do Espírito Santo – 26«Quando vier o Paráclito, que Eu vos enviarei de junto do Pai, o Espírito da verdade que procede do Pai, Ele dará testemunho acerca de mim; 27dai também vós testemunho, porque estais comigo desde o princípio»[209].
16 Segundo anúncio da perseguição aos discípulos – 1«Disse-vos estas coisas para que não seja motivo de escândalo para vós[210]. 2Hão de expulsar-vos das sinagogas; mas está a chegar a hora em que todo aquele que vos matar julgará estar a prestar culto a Deus. 3E farão isto porque não conheceram nem o Pai, nem a mim».
Terceiro anúncio da vinda do Espírito Santo – 4«Contudo, disse-vos estas coisas, para que, quando chegar a sua hora, vos recordeis que Eu vo-las disse. Não vos disse estas coisas desde o princípio, porque estava convosco. 5Agora, porém, vou para aquele que me enviou e nenhum de vós me pergunta: "Para onde vais?". 6Mas, porque vos disse estas coisas, a tristeza encheu o vosso coração. 7No entanto, Eu digo-vos a verdade: é melhor para vós que Eu parta, pois, se não partir, o Paráclito[211] não virá a vós; mas, se for, enviá-lo-ei a vós. 8E, quando Ele vier, denunciará o mundo quanto ao pecado, quanto à justiça e quanto ao julgamento: 9quanto ao pecado, porque não acreditam em mim; 10quanto à justiça, porque vou para o Pai e já não me vereis; 11quanto ao julgamento, porque o Príncipe deste mundo está julgado.
12Tenho ainda muitas coisas para vos dizer, no entanto não conseguis suportá-las por agora. 13Mas quando Ele vier, o Espírito da verdade, guiar-vos-á na verdade toda. De facto, não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que ouvir e anunciar-vos-á o que está para vir. 14Ele me glorificará, porque receberá do que é meu e vo-lo anunciará. 15Tudo quanto o Pai tem é meu. Por isso vos disse: recebe do que é meu e vo-lo anunciará».
Anúncio da partida para o Pai – 16«Mais um pouco e já não me vereis; um pouco mais e ver-me-eis». 17Disseram, então, alguns dos seus discípulos uns aos outros: «Que é isto que nos está a dizer: "Mais um pouco e já não me vereis; um pouco mais e ver-me-eis" e "Vou para o Pai"?». 18E diziam: «O que é esse "um pouco" de que nos fala? Não entendemos o que diz!».
19Jesus percebeu que queriam interrogá-lo e disse-lhes: «Indagais entre vós acerca do que disse: "Mais um pouco e já não me vereis; um pouco mais e ver-me-eis"? 20Amen, amen vos digo: haveis de chorar e lamentar-vos, mas o mundo alegrar-se-á; vós ficareis tristes, mas a vossa tristeza tornar-se-á alegria[212]. 21A mulher, quando está para dar à luz, sente tristeza, porque chegou a sua hora. Mas, quando nasce a criança, já não se lembra da tribulação, pela alegria de ter nascido um homem para o mundo. 22Assim também vós agora sentis tristeza, mas Eu hei de ver-vos de novo, e o vosso coração alegrar-se-á, e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria. 23Naquele dia nada me perguntareis.
Amen, amen vos digo: o que pedirdes ao Pai no meu nome, Ele vos dará. 24Até agora, nada pedistes no meu nome; pedi e recebereis, para que a vossa alegria seja completa.
25Disse-vos estas coisas em linguagem figurada; está a chegar a hora em que já não vos falarei em linguagem figurada, mas com clareza vos falarei acerca do Pai[213]. 26Naquele dia, pedireis no meu nome; não vos digo que Eu rogarei por vós ao Pai, 27pois o próprio Pai é vosso amigo, porque vós sois meus amigos e acreditastes que Eu saí de junto de Deus. 28Saí de junto do Pai e vim ao mundo; agora deixo o mundo e vou para o Pai».
Anúncio da dispersão dos discípulos – 29Disseram os seus discípulos: «Eis que agora falas com clareza e nada dizes em linguagem figurada. 30Agora compreendemos que sabes tudo e que não tens necessidade de que alguém te interrogue. Por isso acreditamos que saíste de Deus».
31Respondeu-lhes Jesus: «Agora acreditais? 32Eis que está a chegar a hora – e já chegou – em que sereis dispersos, cada um para o que é seu[214], e me deixareis só. Mas não estou só, porque o Pai está comigo».
Conclusão do discurso – 33«Disse-vos estas coisas para que em mim tenhais paz. No mundo tereis tribulações. Mas tende coragem: Eu venci o mundo!».
17 Oração conclusiva de Jesus pelos discípulos[215] – 1Tendo Jesus dito estas coisas, levantando os olhos[216] para o céu, disse: «Pai, chegou a hora! Glorifica o teu Filho, para que o Filho te glorifique, 2visto que lhe deste poder sobre toda a carne[217], para que dê vida eterna a todos os que lhe deste[218]. 3E a vida eterna é esta: que te conheçam, o único Deus verdadeiro, e aquele que enviaste, Jesus Cristo. 4Eu glorifiquei-te sobre a terra, consumando a obra que me deste para realizar[219]. 5Agora glorifica-me Tu, Pai, junto de ti mesmo, com a glória que tinha junto de ti, antes de o mundo existir[220].
6Manifestei o teu nome[221] aos homens que, do mundo, me deste. Eram teus e Tu mos deste e eles guardaram a tua palavra. 7Agora sabem que tudo quanto me deste vem de ti[222], 8porque as palavras que me deste, a eles as dei. E eles receberam-nas, souberam verdadeiramente que saí de ti e acreditaram que Tu me enviaste.
9Eu peço por eles; não peço pelo mundo[223], mas por aqueles que me deste, porque são teus. 10Tudo o que é meu é teu, e o que é teu é meu; e neles sou glorificado. 11Já não estou no mundo, mas eles estão no mundo, e Eu vou para ti. Pai santo, guarda-os no teu nome – aquele que me deste[224] – para que sejam um só[225], tal como Nós. 12Quando estava com eles, Eu guardava-os no teu nome – aquele que me deste –; protegi-os e nenhum deles se perdeu – a não ser o filho da perdição – para que se cumprisse a Escritura[226]. 13Mas agora vou para ti e digo estas coisas no mundo, para que tenham em si mesmos a plenitude da minha alegria[227]. 14Eu dei-lhes a tua palavra e o mundo odiou-os, porque não são do mundo, tal como Eu não sou do mundo. 15Não peço que os tires do mundo, mas que os guardes do Maligno[228]. 16Não são do mundo, tal como Eu não sou do mundo. 17Consagra-os na verdade[229]; a tua palavra é verdade. 18Tal como me enviaste ao mundo, também Eu os enviei ao mundo; 19por eles, Eu me consagro a mim mesmo, para que também eles sejam consagrados na verdade.
20Não peço apenas por estes, mas também por aqueles que acreditam em mim, por meio da sua palavra: 21para que todos sejam um só[230]; tal como Tu, Pai, estás em mim e Eu em ti, que também eles estejam em Nós, para que o mundo acredite que Tu me enviaste. 22Eu dei-lhes a glória que Tu me deste, para que sejam um só, tal como Nós somos um só. 23Eu estou neles e Tu em mim, para que sejam consumados num só, para que o mundo saiba que Tu me enviaste e os amaste, tal como me amaste a mim.
24Pai, aqueles que me deste, quero que, onde Eu estou, também eles comigo estejam, para que contemplem a minha glória, a que Tu me deste porque me amaste antes da fundação do mundo.
25Pai justo, o mundo não te conheceu, mas Eu conheci-te e estes reconheceram[231] que Tu me enviaste. 26Dei-lhes a conhecer o teu nome e dá-lo-ei a conhecer, para que o amor com que me amaste esteja neles, e também Eu neles esteja.
18 Prisão de Jesus (Mt 26,30.36.47-56; Mc 14,26.32.43-52; Lc 22,39.47-53) – 1Tendo dito isto, Jesus saiu com os seus discípulos para o outro lado da torrente do Cédron, onde havia um jardim, no qual entraram Ele e os seus discípulos. 2Também Judas, o que o ia entregar, conhecia o lugar, porque muitas vezes ali se reunira Jesus com os seus discípulos. 3Então Judas, levando a coorte e os guardas dos chefes dos sacerdotes e dos fariseus, chegou ali com archotes, lanternas e armas. 4Ora, Jesus, sabendo tudo o que estava para lhe acontecer[232], saiu e disse-lhes: «Quem procurais?». 5Responderam-lhe: «Jesus, o Nazareno». Disse-lhes: «Eu Sou»[233]. Com eles estava também Judas, o que o ia entregar. 6Assim que Jesus lhes disse: «Eu Sou», recuaram e caíram por terra. 7Então de novo lhes perguntou: «Quem procurais?». Eles disseram: «Jesus, o Nazareno». 8Respondeu Jesus: «Já vos disse: Eu Sou. Se é, pois, a mim que procurais, deixai estes ir embora»; 9isto[234] para que se cumprisse a palavra que dissera: «Os que me deste, não perdi nenhum deles»[235]. 10Então, Simão Pedro, que tinha uma espada, desembainhou-a, feriu o servo do sumo-sacerdote e cortou-lhe a orelha direita. O nome do servo era Malco. 11Jesus disse a Pedro: «Mete a espada na bainha! O cálice que o Pai me deu, não o hei de beber?»[236]. 12Então a coorte, o comandante e os guardas dos judeus apoderaram-se de Jesus e manietaram-no.
Jesus perante Anás e Caifás. As negações de Pedro (Mt 26,58.69-75; Mc 14,54.66-72; Lc 22,54-62) – 13Levaram-no primeiro a Anás, pois era sogro de Caifás, que era o sumo-sacerdote naquele ano. 14Caifás era quem tinha aconselhado aos judeus: «É melhor morrer um só homem pelo povo»[237].
15Ora, Simão Pedro e outro discípulo[238] seguiam Jesus. Esse discípulo era conhecido do sumo-sacerdote e entrou com Jesus no pátio do sumo-sacerdote. 16Pedro, porém, ficou parado junto à porta, do lado de fora. O outro discípulo – o que era conhecido do sumo-sacerdote – saiu, falou com a porteira e fez Pedro entrar[239]. 17Então a porteira, uma jovem serva, disse a Pedro: «Não és, também tu, um dos discípulos desse homem?». Disse ele: «Não sou». 18Estavam ali[240] parados a aquecer-se os servos e os guardas, que tinham feito uma fogueira, porque estava frio. Também Pedro estava com eles, parado, a aquecer-se.
19Entretanto, o sumo-sacerdote interrogou Jesus acerca dos seus discípulos e acerca do seu ensinamento. 20Respondeu-lhe Jesus: «Eu falei abertamente ao mundo; Eu sempre ensinei na sinagoga e no templo, onde todos os judeus se reúnem, e nada disse em segredo. 21Porque me interrogas? Interroga os que ouviram o que lhes disse; eis que esses sabem o que Eu disse». 22Quando Ele disse isto, um dos guardas que estava perto deu uma bofetada a Jesus, dizendo: «É assim que respondes ao sumo-sacerdote?». 23Respondeu-lhe Jesus: «Se falei mal, dá testemunho acerca do que está mal; mas, se falei bem, porque me bates?». 24Então Anás enviou-o manietado a Caifás, o sumo-sacerdote[241].
25Entretanto, Simão Pedro continuava parado, a aquecer-se. Disseram-lhe então: «Não és, também tu, um dos seus discípulos?». Ele negou e disse: «Não sou». 26Disse um dos servos do sumo-sacerdote, familiar daquele a quem Pedro cortara a orelha: «Não te vi eu no jardim com Ele?». 27Pedro negou de novo, e imediatamente um galo cantou[242].
Jesus perante Pilatos (Mt 27,1-2.11-26; Mc 15,1-15; Lc 23,1-7.13-25)[243] – 28Levaram, então, Jesus, de Caifás para o pretório[244]. Era de manhã cedo. Eles não entraram no pretório para não se contaminarem e poderem comer a Páscoa[245].
29Então Pilatos saiu para fora ao encontro deles e disse: «Que acusação trazeis contra este homem?». 30Responderam e disseram-lhe: «Se este não fosse um malfeitor, não te o teríamos entregado». 31Disse-lhes Pilatos: «Tomai-o vós e julgai-o de acordo com a vossa Lei». Disseram-lhe os judeus: «Não nos é permitido matar ninguém» – 32isto[246] para que se cumprisse a palavra que Jesus dissera, assinalando com que género de morte estava prestes a morrer[247].
33Então Pilatos entrou de novo no pretório, chamou Jesus e disse-lhe: «Tu és o rei dos judeus?». 34Respondeu-lhe Jesus: «Tu dizes isso por ti mesmo, ou outros te o disseram acerca de mim?». 35Respondeu Pilatos: «Porventura sou eu judeu? O teu povo e[248] os chefes dos sacerdotes é que te entregaram a mim. Que fizeste?». 36Respondeu Jesus: «O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas teriam lutado para que não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui». 37Disse-lhe, então, Pilatos: «Portanto, Tu és rei?». Respondeu-lhe Jesus: «Tu dizes que sou rei. Eu para isto nasci e para isto vim ao mundo: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz». 38Disse-lhe Pilatos: «O que é a verdade?».
E tendo dito isto, saiu novamente ao encontro dos judeus e disse-lhes: «Eu não encontro nele culpa alguma. 39Mas é vosso costume que eu vos liberte alguém na Páscoa. Quereis que vos liberte o rei dos judeus?». 40Gritaram, então, novamente, dizendo: «Esse não, mas Barrabás!». Barrabás era um salteador.
19 (Mt 27,26-31; Mc 15,15-20) – 1Pilatos tomou, então, Jesus e mandou chicoteá-lo[249]. 2Os soldados, entrelaçando uma coroa de espinhos, puseram-na na cabeça de Jesus e envolveram-no num manto de púrpura[250]; 3aproximavam-se dele e diziam: «Salve, ó rei dos judeus!», e davam-lhe bofetadas.
4Pilatos saiu novamente para fora e disse-lhes: «Eis que vo-lo trago aqui fora, para que saibais que não encontro nele culpa alguma». 5Jesus saiu, então, para fora, trazendo a coroa de espinhos e o manto de púrpura. E Pilatos disse-lhes: «Eis o homem!». 6Quando o viram, os chefes dos sacerdotes e os guardas gritaram, dizendo: «Crucifica-o! Crucifica-o!». Disse-lhes Pilatos: «Tomai-o vós e crucificai-o, pois eu não encontro nele culpa». 7Responderam-lhe os judeus: «Nós temos uma Lei e, segundo a Lei, deve morrer, porque se fez Filho de Deus»[251]. 8Quando Pilatos ouviu estas palavras, com mais medo ficou.
9Entrou de novo no pretório e disse a Jesus: «De onde és Tu?». Mas Jesus não lhe deu resposta. 10Disse-lhe, então, Pilatos: «Não me falas? Não sabes que tenho poder para te libertar e tenho poder para te crucificar?». 11Respondeu-lhe Jesus: «Não terias poder algum contra mim, se não te tivesse sido dado do alto. Por isso, quem me entregou a ti tem maior pecado». 12A partir desse momento, Pilatos procurava libertá-lo, mas os judeus gritaram, dizendo: «Se o libertares, não és amigo de César; todo aquele que se faz rei opõe-se a César».
13Então Pilatos, ao ouvir estas palavras, levou Jesus para fora e sentou-se[252] no tribunal, no lugar chamado Lajedo, em hebraico «Gabbatá». 14Era o dia da Preparação da Páscoa, por volta da hora sexta[253]. E disse aos judeus: «Eis o vosso rei». 15Mas eles gritaram: «Fora! Fora! Crucifica-o!». Disse-lhes Pilatos: «Crucificarei o vosso rei?». Responderam os chefes dos sacerdotes: «Não temos rei senão César»[254].
16Então Pilatos entregou-lhes Jesus[255] para que fosse crucificado.
Crucificação de Jesus (Mt 27,31.33.37s; Mc 15,20.22.25-27; Lc 23,33.38) – Apoderaram-se, pois, de Jesus, 17e carregando Ele mesmo a cruz, saiu para o chamado «Lugar da Caveira», que em hebraico se diz «Gólgota», 18onde o crucificaram, e, com Ele, outros dois, um de cada lado, e Jesus no meio[256].
19Pilatos escreveu também um letreiro e colocou-o sobre a cruz; estava escrito: «Jesus, o nazareno, o rei dos judeus». 20Muitos dos judeus leram este letreiro, porque o lugar onde Jesus foi crucificado era perto da cidade; e estava escrito em hebraico, latim e grego. 21Diziam, então, a Pilatos os chefes dos sacerdotes dos judeus: «Não escrevas: "O rei dos judeus", mas que Ele disse: "Sou rei dos judeus"». 22Respondeu Pilatos: «O que escrevi, escrevi»[257].
Divisão das vestes (Mt 27,35; Mc 15,24; Lc 23,34) – 23Então os soldados, depois de crucificarem Jesus, tomaram as suas vestes e fizeram quatro partes – uma parte para cada soldado – e tomaram também a túnica. A túnica era sem costura, tecida num todo, de alto a baixo[258]. 24Disseram, então, uns aos outros: «Não a rasguemos, mas tiremos à sorte quem ficará com ela»; isto[259] para que se cumprisse a Escritura, que diz:
Dividiram as minhas vestes
entre si
e sobre a minha túnica lançaram sortes[260].
Ora, foi o que fizeram os soldados.
Jesus e a nova comunidade: a Mãe e o Discípulo Amado (Mt 27,55s; Mc 15,40s; Lc 23,49) – 25Junto à cruz de Jesus, estavam de pé a sua Mãe, a irmã da sua Mãe, Maria, mulher de Clopas, e Maria Madalena. 26Então Jesus, ao ver a Mãe e, próximo, o discípulo que amava[261], disse à Mãe: «Mulher, eis o teu filho». 27Depois disse ao discípulo: «Eis a tua Mãe». E, a partir daquela hora[262], o discípulo recebeu-a entre os seus.
A morte de Jesus (Mt 27,48-50; Mc 15,36s; Lc 23,46) – 28Depois disto, sabendo Jesus que já tudo estava consumado, para que fosse consumada a Escritura[263], disse: «Tenho sede!»[264]. 29Estava ali um vaso cheio de vinagre; pondo, então, uma esponja cheia de vinagre num ramo de hissopo, levaram-lha à boca[265]. 30Quando tomou o vinagre, Jesus disse: «Está consumado!». E, inclinando a cabeça, entregou o espírito[266].
O corpo inquebrado e trespassado – 31Os judeus, visto que era a Preparação, para que os corpos não permanecessem na cruz durante o sábado – era um grande dia o daquele sábado –, pediram a Pilatos que lhes quebrassem as pernas e fossem retirados[267]. 32Vieram, então, os soldados e quebraram as pernas do primeiro e do outro que tinha sido crucificado com ele. 33Mas, ao chegar a Jesus, como o viram já morto, não lhe quebraram as pernas. 34No entanto, um dos soldados trespassou-lhe o lado com uma lança; e saiu imediatamente sangue e água.
35Aquele que viu dá testemunho, e o seu testemunho é verdadeiro; e ele sabe que diz a verdade, para que também vós acrediteis[268].
36De facto, estas coisas aconteceram para que se cumprisse a Escritura: Nenhum osso lhe será quebrado[269]. 37E outra passagem da Escritura diz ainda: Olharão para aquele que trespassaram[270].
Sepultura de Jesus (Mt 27,57-61; Mc 15,42-47; Lc 23,50-56) – 38Depois disto, José de Arimateia, que era discípulo de Jesus – embora em segredo[271], por medo dos judeus –, pediu a Pilatos para retirar o corpo de Jesus. Pilatos permitiu-lho. Veio, então, e retirou o seu corpo. 39Veio também Nicodemos, o que anteriormente tinha ido ter com Jesus[272] de noite, trazendo uma mistura de mirra e aloés, de quase cem libras[273]. 40Tomaram, então, o corpo de Jesus e envolveram-no em ligaduras de linho, juntamente com os aromas, tal como entre os judeus é costume sepultar. 41Ora, no lugar onde tinha sido crucificado, havia um jardim, e no jardim um sepulcro novo, no qual ainda ninguém tinha sido posto. 42Foi aí, por causa da Preparação dos judeus, porque o sepulcro ficava perto, que puseram Jesus[274].
20 O sepulcro vazio (Mt 28,1-8; Mc 16,1-8; Lc 24,1-12) – 1No primeiro dia da semana[275], Maria Madalena foi de manhã cedo ao sepulcro, estando ainda escuro, e viu que a pedra tinha sido retirada do sepulcro. 2Foi a correr ter com Simão Pedro e com o outro discípulo, aquele de quem Jesus era amigo[276], e disse-lhes: «Tiraram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde o puseram». 3Pedro e o outro discípulo saíram, então, e foram ao sepulcro. 4Corriam os dois juntos, mas o outro discípulo correu mais depressa do que Pedro e chegou primeiro ao sepulcro. 5Debruçando-se, viu as ligaduras de linho depostas, mas não entrou[277]. 6Entretanto, chegou também Simão Pedro, que o seguia; entrou no sepulcro e viu as ligaduras de linho depostas 7e o sudário, que estivera sobre a cabeça de Jesus, não deposto com as ligaduras de linho, mas enrolado, num lugar à parte. 8Entrou também o outro discípulo, o que tinha chegado primeiro ao sepulcro; viu e acreditou. 9De facto, ainda não tinham compreendido a Escritura: era necessário Ele ressuscitar dos mortos.10Os discípulos foram, então, novamente para junto dos seus.
Encontro do Ressuscitado com Maria Madalena (Mt 28,9s; Mc 16,9-11) – 11Maria, porém, estava de pé junto ao sepulcro, do lado de fora, a chorar. Então, enquanto chorava, debruçou-se para o sepulcro 12e viu dois anjos em vestes brancas, sentados um à cabeceira e outro aos pés do lugar onde tinha sido deposto o corpo de Jesus. 13Disseram-lhe eles: «Mulher, porque choras?». Disse-lhes: «Tiraram o meu Senhor, e não sei onde o puseram». 14Tendo dito isto, voltou-se para trás e viu Jesus de pé, mas não sabia que era Jesus. 15Disse-lhe Jesus: «Mulher, porque choras? A quem procuras?». Ela, pensando que era o jardineiro, disse-lhe: «Senhor, se foste Tu que o levaste, diz-me onde o puseste, e eu irei buscá-lo». 16Disse-lhe Jesus: «Maria!». Ela, voltando-se, disse-lhe em hebraico: «Rabúni!» – que significa «Mestre»[278].17Disse-lhe Jesus: «Não me toques, pois ainda não subi para o Pai! Mas vai aos meus irmãos e diz-lhes: "Subo para o meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus"». 18Maria Madalena foi anunciar aos discípulos: «Vi o Senhor!», e as coisas que a ela tinha dito[279].
Encontro do Ressuscitado com a comunidade dominical (Mc 16,14-18; Lc 24,36-49) – 19Na tarde daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas as portas do lugar[280] onde estavam os discípulos, por medo dos judeus, veio Jesus e, de pé, no meio, disse-lhes: «A paz esteja convosco!»[281]. 20Tendo dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Então os discípulos alegraram-se ao verem o Senhor. 21Disse-lhes Jesus de novo: «A paz esteja convosco! Tal como o Pai me enviou, também Eu vos envio». 22Tendo dito isto, soprou e disse-lhes: «Recebei o Espírito Santo. 23Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, serão retidos»[282].
24Ora, Tomé, um dos Doze, o chamado Dídimo[283], não estava com eles quando veio Jesus. 25Diziam-lhe, então, os outros discípulos: «Vimos o Senhor!». Mas ele disse-lhes: «Se não vir nas suas mãos o lugar dos pregos, não meter o meu dedo no lugar dos pregos e não meter a minha mão no seu lado, jamais acreditarei».
26Oito dias depois, estavam de novo os seus discípulos dentro e Tomé com eles. Estando fechadas as portas, veio Jesus e, de pé, no meio, disse: «A paz esteja convosco!». 27Depois disse a Tomé: «Traz aqui o teu dedo e vê as minhas mãos; traz a tua mão e mete-a no meu lado. E não te tornes[284] incrédulo, mas crente». 28Respondeu Tomé e disse-lhe: «Meu Senhor e meu Deus!»[285]. 29Disse-lhe Jesus: «Porque me viste, acreditaste! Felizes os que não viram e acreditaram!».
30Muitos outros sinais realizou Jesus diante dos seus discípulos, que não estão escritos neste livro. 31Mas estes foram escritos para que acrediteis[286] que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, acreditando, tenhais vida no seu nome[287].
21 Aparição de Jesus junto ao mar de Tiberíades – 1Depois disto, Jesus manifestou-se de novo aos discípulos, junto ao mar de Tiberíades. Manifestou-se assim: 2estavam juntos Simão Pedro, Tomé, o chamado Dídimo[288], Natanael, de Caná da Galileia, os dois filhos de Zebedeu e outros dois dos seus discípulos[289]. 3Disse-lhes Simão Pedro: «Vou pescar». Disseram-lhe: «Também nós vamos contigo». Saíram e subiram para o barco, mas naquela noite não apanharam nada[290].
4Já ao surgir da manhã, Jesus estava de pé na margem, mas os discípulos não sabiam que era Jesus. 5Disse-lhes, então, Jesus: «Rapazes[291], tendes alguma coisa para comer?». Responderam-lhe: «Não». 6Mas Ele disse-lhes: «Lançai a rede para a parte direita do barco e encontrareis». Lançaram então; e já nem a conseguiam puxar[292], por causa da quantidade dos peixes.
7Então o discípulo, aquele que Jesus amava, disse a Pedro: «É o Senhor!». Quando Simão Pedro ouviu: «É o Senhor!», cingiu as vestes, pois estava nu, e lançou-se ao mar. 8Os outros discípulos foram no barco, arrastando a rede dos peixes, pois não estavam longe da terra, mas a cerca de duzentos cúbitos[293].
O Ressuscitado alimenta os discípulos – 9Quando desceram para terra, viram um braseiro, com peixe colocado em cima, e pão. 10Disse-lhes Jesus: «Trazei dos peixes que apanhastes agora». 11Então Simão Pedro subiu ao barco[294] e puxou a rede para terra, cheia de cento e cinquenta e três grandes peixes. E, apesar de serem tantos, a rede não se rompeu.
12Disse-lhes Jesus: «Vinde comer»[295]. Mas nenhum dos discípulos ousava perguntar-lhe: «Tu quem és?», sabendo que era o Senhor. 13Jesus veio[296], tomou o pão e deu-lho, e fez o mesmo com o peixe. 14Esta era já a terceira vez que Jesus se manifestava aos discípulos, depois de ressuscitar dos mortos.
Missão de Pedro e do Discípulo Amado – 15Depois de terem comido[297], disse Jesus a Simão Pedro: «Simão, filho de João, amas-me mais do que estes?». Disse-lhe: «Sim, Senhor, Tu sabes que sou teu amigo». Disse-lhe Ele: «Apascenta os meus cordeiros». 16Disse-lhe de novo, pela segunda vez: «Simão, filho de João, amas-me?». Disse-lhe: «Sim, Senhor, Tu sabes que sou teu amigo». Disse-lhe Jesus: «Pastoreia as minhas ovelhas». 17Disse-lhe pela terceira vez: «Simão, filho de João, és meu amigo?». Pedro entristeceu-se por Jesus lhe ter dito pela terceira vez[298]: «És meu amigo?» e disse-lhe: «Senhor, Tu sabes tudo; Tu sabes que sou teu amigo!». Disse-lhe Jesus: «Apascenta as minhas ovelhas. 18Amen, amen te digo: quando eras mais novo, a ti mesmo te vestias e andavas por onde querias; mas, quando envelheceres, estenderás as tuas mãos e outro te vestirá e levará para onde não queres». 19Disse isto assinalando com que género de morte Pedro glorificaria Deus. E, tendo dito isto, disse-lhe: «Segue-me»[299].
20Ao voltar-se, Pedro viu que o discípulo que Jesus amava o seguia[300], aquele que na ceia se reclinara sobre o seu peito e dissera: «Senhor, quem é o que te vai entregar?». 21Então Pedro, ao vê-lo, disse a Jesus: «Senhor, e que será dele?». 22Disse-lhe Jesus: «Se Eu quiser que ele permaneça até que Eu venha, que te importa? Tu segue-me!». 23Difundiu-se, então, entre os irmãos este dito: que aquele discípulo não morreria. Ora, Jesus não lhe disse que ele não morreria, mas sim: «Se Eu quiser que ele permaneça até que Eu venha[301], que te importa?».
24Este é o discípulo que dá testemunho destas coisas e que as escreveu[302], e sabemos que o seu testemunho é verdadeiro. 25Há, porém, ainda muitas outras coisas que Jesus fez, que se fossem escritas uma por uma, considero que nem o próprio mundo poderia conter os livros que se escreveriam.
- ↑ Na origem, era provavelmente um hino litúrgico da comunidade sobre Jesus (1,1-5.9-14.16-18), no qual o evangelista inseriu o que se refere a João Batista (1,6-8.15). Está dividido em duas partes, estruturadas de modo idêntico: 1) 1,1-13 (formulada na 3ª pessoa do singular e do plural): proclamação da dimensão universal e histórico-salvífica da Palavra; 2) 1,14-18 (formulada na 1ª pessoa do plural, no v. 14): confissão de fé da comunidade crente na Palavra encarnada. Nele são introduzidos os grandes temas, posteriormente desenvolvidos: Jesus é divino e pré-existente e, em determinado momento da história, fez-se homem (é Deus e homem), para tornar a pessoa humana participante da sua luz e vida divina. Embora rejeitado pelos seus, as trevas não o venceram e, por isso, a luz continua a brilhar nas trevas, possibilitando à criatura (primeira criação) tornar-se filho (segunda criação). A primeira criação aconteceu por meio de Jesus; assim também a segunda. O leitor é posto de sobreaviso: não acolher Jesus, na totalidade do seu mistério, significa não acolher Deus, pois Ele é o único revelador do Pai e o único por meio do qual se pode receber a graça verdadeira (sentido da hendíade graça e verdade: v. 14): o dom da vida eterna.
- ↑ Palavra corresponde ao termo grego lógos (traduzido por verbum na Vg), que tem um amplo conteúdo semântico: linguagem, narrativa, discurso, explicação, argumento, regra, razão, lógica, etc.. Identifica-se com Jesus, enquanto revelador único do Pai. Por isso se sublinha a sua pré-existência e natureza divina: não só já existia no princípio (expressão que remete para Gn 1,1), como foi por meio dele, Palavra divina, que Deus tudo criou (E Deus disse...: Gn 1,3.6.9ss).
- ↑ A expressão do que existe pode, gramaticalmente, ser interpretada de duas maneiras: ligar-se à frase anterior (como nesta tradução e de acordo com a opção da NVg, interpretando o grego como um semitismo, tão característico deste evangelho) ou ligar-se às palavras iniciais do v. 4 (como um nominativo pendens: O que existe, nisso estava a vida).
- ↑ Cf. 3,15; 5,26; 6,57; 11,25; 14,6.
- ↑ O presente brilha sublinha que a luz continua a brilhar: as trevas não conseguiram apoderar-se dela. Outros traduzem não a receberam ou não a compreenderam.
- ↑ Sobre a origem e o lugar dos vv. 6-8.15, cf. nota introdutória do Prólogo.
- ↑ A Palavra é acrescento da tradução. Retoma-se a caracterização da Palavra como luz (v. 5).
- ↑ Outra tradução possível: a luz verdadeira, que ilumina todo o homem, vinha ao mundo. Verdadeira no sentido de definitiva e plena; só ela pode libertar o homem do poder das trevas.
- ↑ Refere-se à Palavra (lógos), retomando a afirmação do v. 3.
- ↑ O mundo é uma expressão polivalente em Jo; pode ter um sentido: 1) natural: a terra ou o universo; 2) antropológico e existencial: a realidade em que os homens estão naturalmente imersos (cf. 3,16); 3) teológico: realidade que se opõe a Jesus e aos seus discípulos (7,7; 15,18s) e, como tal, está sujeita ao domínio de Satanás (cf. 12,31; 14,30; 16,11). Jesus é o salvador do mundo (4,42) em todas estas dimensões: salva o mundo e do mundo.
- ↑ A expressão é a mesma de 16,32 e 19,27.
- ↑ Semitismo em que o nome significa a pessoa, porque a identifica e, deste modo, a torna presente. O verbo acreditar, quando tem Jesus como objeto, é usado por Jo numa construção gramatical grega que expressa movimento (pisteúō eis autón): a fé é um processo que tende a um crescendo, mas que também pode regredir (o leitor será disso alertado várias vezes).
- ↑ Lit.: de sangues.
- ↑ Evocação da Tenda do Encontro (Ex 25,8), habitação de Deus no meio do seu povo; pela encarnação, é em Jesus, no templo do seu corpo, que se realiza a escatológica presença de Deus (2,21).
- ↑ Pela sua glória Deus tornava-se presente na Tenda do Encontro (cf. Ex 40,34s) e, depois, no templo (1Rs 8,10s).
- ↑ Isto é, a plenitude da graça.
- ↑ Deus, sem artigo, tem sentido adjetival. Outra tradução possível: o Unigénito, que é Deus e está no seio do Pai. Unigénito (monogenḗs) exprime a singularidade de Jesus (único, amado, no sentido do hebraico yahîd); no mesmo sentido é referido a Isaac em Heb 11,17 (cf. Gn 22,2.12.16).
- ↑ Lit.: explicou/ interpretou; exēgéomai é a raiz verbal de exegese.
- ↑ Os acontecimentos preenchem uma semana: da expressão no dia seguinte (vv. 29.35.43) resultam quatro dias, a que se juntam mais três em 2,1, com ao terceiro dia. Nos quatro primeiros dias, Jesus é apresentado com uma série de títulos cristológicos: Cordeiro de Deus (1,29.36), o que batiza no Espírito Santo (1,33), o Filho de Deus (1,34), Rabi (1,38.49), Messias (1,41), aquele sobre quem escreveram Moisés, na Lei, e os Profetas (1,45), Rei de Israel (1,49). Nas Bodas de Caná (2,1-12) é apresentada a sua missão.
- ↑ Os judeus, em Jo, podem ser os habitantes da Judeia (para os distinguir de outros), todos os israelitas ou ainda, numa utilização que lhe é típica, os adversários de Jesus, designando, sobretudo, os chefes que se lhe opõem e planeiam a sua morte (2,18; 5,10-12; 7,1.13; 9,22).
- ↑ Sobre o título Cristo, cf. Mt 1,1 nota.
- ↑ Is 40,3.
- ↑ A preposição grega en pode ter um sentido instrumental (com água).
- ↑ Tirar no sentido de levantar um peso, que oprime o mundo. A expressão refere-se ao cordeiro pascal (Ex 12,7-13) e ao Servo Sofredor (Is 53,7), e tem já em vista a morte de Jesus, que sobe para o Calvário à hora em que os cordeiros pascais começavam a ser imolados no templo de Jerusalém (cf. 19,14.36 notas).
- ↑ Cf. v. 26 nota.
- ↑ Cf. v. 26 nota.
- ↑ Outros mss. apresentam Eleito de Deus.
- ↑ Lit.: moraram.
- ↑ Isto é, pelas quatro horas da tarde.
- ↑ André aparece sempre a conduzir alguém a Jesus (6,8; 12,12). O outro discípulo, que permanece anónimo, parece ser o Discípulo Amado (cf. 13,23 nota).
- ↑ Kefas, em aramaico, significa pedra, rocha. A mudança do nome indica uma nova identidade ligada a uma missão entregue, que será especificada em 21,15ss (cf. Mt 16,18).
- ↑ Com probabilidade trata-se de Bartolomeu (Mt 10,3).
- ↑ Filho de Deus e rei de Israel têm um sentido messiânico, mas aqui ainda numa conceção muito humana e política. Por isso, Jesus de imediato a corrige: na cruz se verá a sua verdadeira identidade.
- ↑ Evocação do sonho de Jacob (Gn 28,11-17). Mas a verdadeira escada é a cruz redentora (3,13). O título Filho do Homem, com que normalmente Jesus se refere a si mesmo, é um semitismo que, no hebraico e no aramaico, significava primeiramente apenas homem; a partir de Dn 7,13 e da apocalíptica judaica, passou a evocar também uma figura misteriosa, vinda do céu, com a missão de julgar o mundo e estabelecer um reino universal e eterno. É sobretudo neste sentido que Jesus o utiliza.
- ↑ O episódio tem carácter programático e abre a secção que vai até 4,46-54. Está cheio de evocações messiânicas: bodas, banquete, vinho abundante e de qualidade única. A Mãe de Jesus surge também com um papel simbólico: representa o Israel fiel, que espera e acolhe o messias. Por isso é apresentada em primeiro lugar e Jesus trata-a por Mulher (como em 19,26). Do lado oposto, estão os chefes religiosos, representados pelo chefe de mesa que devia ter preparado tudo e é o único a não se aperceber de onde vem o vinho.
- ↑ Pergunta retórica. É que, de facto, há algo entre os dois, como se vê logo a seguir na atitude de ambos: a Mãe orienta os servos com as mesmas palavras com que o povo de Israel sela a aliança do Sinai (Ex 24,3.7), e Jesus antecipa a manifestação da sua glória, que acontecerá na hora (a da morte e ressurreição), na qual se selará a nova aliança. Os encontros de Jesus, até 4,54, explicitam os destinatários desta aliança: judeus ortodoxos (3,1-21), samaritanos (4,1-42) e pagãos (4,46-54), o que possivelmente reflete a composição da comunidade na qual este evangelho tem a sua origem e à qual se destina.
- ↑ Esta hora é anunciada, na primeira parte, como ainda não chegada e, na segunda, como chegada (7,30; 8,20; 12,23.27; 13,1; 17,1).
- ↑ Como cada medida levava aproximadamente 40 litros, no total eram c. 600. No pensamento bíblico, o número seis é imperfeito (por contraposição ao sete, que significa plenitude); trata-se do dom da Lei (significada nas talhas e na água para os rituais de purificação) que espera um dom superior e pleno: Jesus. Entre a água (Lei) e o vinho da nova aliança (Messias) há continuidade, mas também descontinuidade: o dom dado em Jesus é imensamente maior do que o oferecido através da Lei de Moisés (cf. 1,17; 3,14s; 6,58).
- ↑ Lit.: Todo o homem.
- ↑ Sinal é o termo usado por Jo para referir o que nos Sinópticos se chama ação poderosa (dýnamis) e, correntemente, milagre. O termo sinal aponta para outra realidade só acessível pela fé.
- ↑ Sem animais já não pode haver culto. O culto antigo cessou; no templo apenas fica o Cordeiro de Deus (1,25.36). Além disso, Jesus revela-se ainda como o verdadeiro templo da presença do Pai (2,19-22; 1,14), de onde brota a água escatológica (7,37-39; 19,34): nele e por Ele se dará o culto em espírito e verdade (4,21s; cf. 9,38).
- ↑ Sl 69,10.
- ↑ Lit. foi levantado dos mortos: o mesmo verbo usado nos vv. 19s, mas aqui no passivo teológico.
- ↑ Sobre acreditar no nome, cf. 1,12 nota.
- ↑ Representante do judaísmo ortodoxo. Vai ter com Jesus de noite, para não ser reconhecido; trata-se de um dos chefes, que acreditaram em Jesus, mas que por medo não o confessavam abertamente (12,42s; cf. 7,50-52). Nicodemos passará da noite para a luz no momento da hora de Jesus (19,39s), ao contrário de Judas (14,30 nota). Sobre a sua relação com a comunidade joanina, cf. 2,4 nota.
- ↑ A palavra grega ánōthen significa não só de novo, mas também do alto (3,5.7.31; 19,11.23). Os dois significados estão presentes, embora Nicodemos o entenda como nascimento biológico, tal como afirma no v. seguinte. No paralelismo sinonímico do v. 5, Jesus explicita o que quis dizer. A forma verbal passiva gennēthḗi significa literalmente ser gerado, o que implica uma ação de Deus (passivo teológico).
- ↑ O grego pneûma traduz nos LXX o ruah hebraico; ambos os termos significam vento/sopro ou espírito. É este duplo sentido que, certamente, está na base da comparação de Jesus: o que o vento faz, fá-lo o Espírito.
- ↑ Contraposição com o episódio narrado em Nm 21,4-9: a fé, expressa no olhar para a serpente, livrava apenas da morte física; a fé em Jesus morto e ressuscitado concede a vida eterna. O evangelista usa o verbo elevar (aqui e nas outras ocorrências: 8,28; 12,32.34) na ambiguidade do seu sentido: levantar e exaltar; o levantar de Jesus na cruz pelos judeus, é concomitantemente o seu exaltar na glória, pelo Pai. Daí ser uma necessidade teológica – corresponder ao desígnio divino –, tal como expressa o grego deî (é necessário; cf. 12,34). No final do v. 15, outros mss. leem: todo aquele que acredita nele tenha a vida eterna.
- ↑ Sobre acreditar no nome cf. 1,12 nota.
- ↑ João, para além da sua missão específica em relação a Jesus, também representa aqui o judaísmo profético e ascético.
- ↑ Responsável por preparar tudo para o casamento.
- ↑ Lit.: com alegria se alegra.
- ↑ O discurso do Batista parece acabar aqui; os vv. 31-36 têm mais sentido ligados ao v. 21, na continuidade do discurso de Jesus.
- ↑ Cf. v. 3 nota.
- ↑ Lit.: selou (forma de autenticar os documentos).
- ↑ Ele é acrescento da tradução; o sujeito, no grego, é dúbio: Deus ou Jesus? Tal como noutras passagens, a ambiguidade parece intencional, pois o Espírito Santo é dado pelo Pai (14,26), mas também pelo Filho (15,26).
- ↑ Os samaritanos eram considerados heterodoxos pelo judaísmo tradicional. Sobre a sua relação com a comunidade joanina e com o judaísmo ortodoxo, cf. Jo 2,4 nota e Mt 10,5 nota.
- ↑ Talvez a antiga Siquém.
- ↑ Meio-dia, hora a que, dada a intensidade do calor, ninguém ia ao poço.
- ↑ Todos estes elementos são próprios da chamada cena típica de matrimónio (Gn 24,10ss; 29,1ss; Ex 2,15ss; a cena típica é um recurso literário que narra de acordo com um esquema estabelecido); Jesus dá-lhe uma dimensão espiritual (aliança: 2,1-12) e promete à samaritana um outro tipo de água, que lhe matará a sede religiosa e existencial. Os judeus desprezavam os samaritanos por motivos religiosos (2Rs 17,24-41; Esd 4,1-5); Jesus inclui o judaísmo heterodoxo na aliança que veio realizar. A água viva que propõe à samaritana é o Espírito Santo, como se afirma expressamente quando as mesmas palavras ocorrem em 7,37-39.
- ↑ Monte Garizim, onde os samaritanos tiveram o seu templo. Isto confirma que a questão fundamental do diálogo é religiosa.
- ↑ Trata-se de um novo culto, de uma nova maneira de relacionamento com Deus, que acontece em e por Jesus, o novo templo (2,13ss) e Cordeiro de Deus (1,29.35); Ele é o caminho, a verdade e a vida (14,6), que promete e concede o Espírito da verdade (14,17).
- ↑ Lit.: Eu sou. Talvez uma evocação do nome divino revelado a Moisés (Ex 3,14); cf. a expressão em forma absoluta em 8,24.28.58; 13,19; 18,5.
- ↑ Cf. 19,28.30.
- ↑ Lit.: brancos.
- ↑ Lit.: por causa da tua fala.
- ↑ E não apenas do judaísmo ortodoxo.
- ↑ Um representante do judaísmo paganizado (cf. 2,4 nota).
- ↑ Uma hora da tarde.
- ↑ Pela sequência das festas de peregrinação, seria o Pentecostes. Mas tudo se vai concentrar no sábado, a festa semanal.
- ↑ O nome da porta advém do facto de ser por ela que entravam em Jerusalém os animais para os sacrifícios no templo.
- ↑ Lit.: ressequidos, ou seja, que tinham algum membro paralisado (cf. Mt 12,10).
- ↑ Faltam nos melhores mss. o final do v. 3 e todo o v. 4: que esperavam a agitação da água, [4] pois o anjo do Senhor descia à piscina, de tempos a tempos, e agitava a água; o primeiro que entrasse nela, depois da agitação da água, ficava curado da enfermidade que tivesse. Trata-se, provavelmente, de uma glosa para explicar a crença popular nas qualidades terapêuticas da água.
- ↑ Lit: que trinta e oito anos tinha na sua doença. Possível referência a Dt 2,14 (tempo do caminho de Israel pelo deserto até à terra prometida).
- ↑ O episódio parece ter a sua conclusão em 7,19-24.
- ↑ Até agora (héōs árti) não indica conclusão, mas durabilidade ou constância (até ao sábado).
- ↑ Deus é o único que trabalha também ao sábado na sua missão de julgar; com esta afirmação, Jesus afirma-se igual a Deus.
- ↑ Tradução de philéō para o distinguir de agapáō (amar).
- ↑ Este parece ser o sentido de krísis neste evangelho (e não condenação).
- ↑ Emissários é acrescento da tradução.
- ↑ Cf. Jo 19,28.30.
- ↑ Inesperadamente Jesus está de novo na Galileia, o que leva alguns autores a considerar o cap. 6 como um inciso.
- ↑ A única Páscoa, das três referidas por Jo, em que Jesus não sobe a Jerusalém. Mas nela os leitores são preparados para a terceira com um discurso de Jesus, cujo conteúdo será então vivido e manifestado: a sua realeza pela doação do seu corpo e sangue, para a vida do mundo.
- ↑ Posição em que na cultura greco-romana se tomava a refeição. O texto apresenta uma série de elementos e expressões eucarísticas: tomar os pães, dar graças e distribuir aos que estavam reclinados; também pedaços é a palavra com que a Didaqué (finais do séc. I) fala dos fragmentos eucarísticos, e recolher/reunir (synágō, vv. 12.13) é o verbo com que S. Clemente, S. Inácio de Antioquia e a Didaqué se referem à reunião dos cristãos.
- ↑ Lit.: Os homens.
- ↑ Lit.: o profeta que vem (particípio presente).
- ↑ Jesus recusa uma realeza segundo os critérios do mundo; na paixão e na cruz revelar-se-á o seu modo de reinar.
- ↑ C. 5 quilómetros (um estádio equivale a 192 metros).
- ↑ Lit.: Eu sou (cf. 4,26 nota).
- ↑ Lit.: eles subiram...e foram.
- ↑ Cf. Ex 16,4ss.
- ↑ Sl 78,24; cf. Ex 16,4.15.
- ↑ Is 54,13 (LXX). Cf. Jr 31,33s.
- ↑ O verbo trṓgō (o mesmo nos vv. 56.58d) sublinha um comer efetivo.
- ↑ O adjetivo verdadeiro, assim como o escândalo que suscita aos judeus, faz perceber que não se trata de uma forma simbólica de falar. O mesmo em 6,56.58.
- ↑ Uma vez mais a contraposição qualitativa entre Moisés e Jesus: aquele foi intermediário para um pão que alimentava apenas fisicamente; Jesus é o pão de Deus, que alimenta a vida divina recebida no batismo (1,12-13; 3,5ss) e que não acaba na morte física.
- ↑ O discurso de Jesus sobre a carne e o sangue que é preciso comer e beber cria a primeira grande crise no grupo dos seus discípulos; provavelmente o episódio reflete também dificuldades na comunidade primitiva em relação à eucaristia. A pragmática do texto é bem vincada: também o leitor é chamado a uma decisão, de permanecer (acreditar) ou de ir embora (v. 67).
- ↑ Dois verbos no perfeito grego, que indicam uma ação do passado cujos efeitos continuam no presente.
- ↑ Ao contrário dos outros que foram embora, Judas, em cisma interior com Jesus e, portanto, com a comunidade, continua hipocritamente presente. Mas Jesus, mesmo sabendo quem ele era e o que faria (v. 70), deu-lhe até ao fim a hipótese da conversão e do regresso à comunhão (13,1.16).
- ↑ Festa de peregrinação, para agradecer as últimas colheitas e, mais tarde, a proteção divina na passagem pelo deserto, centrada na aliança (cf. Ne 8). Durante a festa, o povo dormia em tendas (como no deserto) e as celebrações estavam dominadas por dois ritos: 1) o da água, com procissões diárias à piscina de Siloé, de onde os sacerdotes levavam água para derramar em libação no altar do templo, em memória da que Deus fizera brotar da rocha de Meribá (Ex 17,1ss); 2) o da luz, com grandes luminárias acendidas no templo, em memória da nuvem luminosa que guiara Israel pelo deserto (Ex 13,21). O rito da água adquiriu também um significado messiânico e escatológico (Is 12,3; 55,1; Ez 36,25-27; 47,1-12): quando vier o Messias, todos os povos acorrerão ao templo (Ag 2,1-7; Zc 14,16), onde, de uma fonte aberta, sairá uma água viva (Zc 14,8ss) que lavará Jerusalém de todo o pecado. É neste contexto que Jesus se apresenta como o dador da água viva (7,37-39; cf. 2,19-22; 19,34) e a luz do mundo (8,12). No episódio do cego de nascença (9,1ss), que se inicia precisamente na piscina de Siloé, os dois elementos, água e luz, estão presentes: nas águas do Enviado (Jesus) o cego recebe a luz (física e, sobretudo, espiritual).
- ↑ Tradução de kairós (tempo favorável, momento oportuno), diferente de khrónos (tempo cronológico).
- ↑ Na próxima peregrinação, a da Páscoa de regresso ao Pai, fá-lo-á abertamente (cf. 12,12ss; 16,25).
- ↑ Isto é, frequentado uma escola rabínica.
- ↑ Refere-se à cura do doente, narrada em 5,1ss.
- ↑ Habitantes é acrescento da tradução.
- ↑ A preposição grega pará indica aqui proveniência.
- ↑ É a hora da morte e ressurreição de Jesus, a acontecer conforme o projeto de Deus e a vontade de Jesus (8,20; 12,27; 13,1; 16,25; 17,1).
- ↑ Diáspora refere-se à dispersão dos judeus (de raça ou por conversão) no estrangeiro.
- ↑ Confluência de referências bíblicas (Is 48,21; Ez 37,1; Zc 14,8). Este texto é uma crux clássica; conforme a pontuação, assim se interpreta de quem é o ventre a que se refere o texto: daquele que acredita em Jesus (...venha a mim e beba. Quem crê em mim, como diz a Escritura...) ou de Jesus (o texto apresentado). O contexto imediato e alargado faz perceber que é de Jesus que a água – o Espírito Santo – brotará (19,34). Já à samaritana Jesus anunciara esta água viva como um dom que Ele oferecerá (4,10-11). No entanto, é possível que a ambiguidade seja propositada: uma vez recebido, de Jesus, o Espírito Santo torna-se, no crente, uma nascente de onde constantemente jorra a vida divina. Sobre o significado da água nesta festa, cf. 7,2 nota.
- ↑ No sentido em que o Espírito ainda não fora dado, como se lê em alguns mss..
- ↑ 2Sm 7,12-16; Mq 5,1.
- ↑ 7,53-8,11 não se encontra na maioria dos mss. gregos, nas antigas versões e nos Padres da Igreja. O estilo é mais lucano que joanino, pelo que alguns autores defendem que se situaria a seguir a Lc 21,38. Mas é inquestionável o seu valor canónico e tradicional.
- ↑ Jesus é acrescento da tradução.
- ↑ Sobre o contexto destas afirmações, cf. 7,2 nota.
- ↑ Cf. Mc 12,41 nota.
- ↑ Evocação do nome divino revelado a Moisés (Ex 3,14); cf. vv. 28.58; 13,19; 18,5 (e provavelmente 4,26).
- ↑ Frase de difícil interpretação. Outras hipóteses de tradução: Primeiro, porque vos falo?, ou O que vos digo desde o princípio?.
- ↑ Cf. v. 24 nota. A elevação de Jesus na cruz será, paradoxalmente, o momento da grande manifestação da sua natureza divina (cf. 19,31-37; 3,15 nota).
- ↑ O discurso passa a ser dirigido, até ao final do cap., aos discípulos vindos do judaísmo que parecem acreditar em Jesus como Messias, mas não na sua pré-existência e divindade. Daí a dureza de Jesus: não acreditar na totalidade do seu mistério significa ser mentiroso e ter por Pai o Diabo.
- ↑ Vosso é acrescento da tradução, de acordo com o que apresentam alguns mss..
- ↑ Lit.: O que fazes de ti mesmo?.
- ↑ Cf. v. 24 nota.
- ↑ É a conclusão (com 10,1-21) das afirmações de Jesus durante a festa das Tendas (cf. 7,2 nota). Cf. Mt 9,27-31; 20,29-34; Mc 8,22-26; 10,46-53; Lc 18,35-43.
- ↑ Havia quem entendesse a doença como consequência do pecado. Tratando-se de um cego de nascença, essa mentalidade atribuía o pecado aos pais. Jesus recusa tal lógica retributiva.
- ↑ Lit: que ninguém pode realizar (o mesmo verbo do início do v.).
- ↑ Evocação da criação do homem (Gn 2,7): a saliva no pó (como o Criador com o hálito) comunica vida; o que Jesus vai realizar é equiparável ao gesto primordial de Deus. O episódio tem uma conotação batismal.
- ↑ Jesus é o verdadeiro Enviado do Pai (3,17; 5,24.36-38; 8,42; 9,7; 11,42; 17,8.21-25).
- ↑ Tal como em 5,1ss.
- ↑ Fórmula rabínica para admoestar quem se pensa ter mentido, no sentido de: Honra Deus, dizendo a verdade! (cf. Is 7,19).
- ↑ Lit.: e tu ensinas-nos?
- ↑ No sentido de adorou-o, como em todas as ocorrências do verbo proskynéō em Jo (4,20.21.22.23.24; 12,20); o gesto expressa reconhecimento da divindade de Jesus.
- ↑ No contexto, o grego kríma tem um sentido mais de discernimento do que julgamento (para o que se usa krísis; cf. 5,29 nota).
- ↑ Jesus utiliza duas imagens para falar da sua natureza e relação com os discípulos: é não só o pastor anunciado pelos profetas (Ez 34,1-31; Zc 11,4-17; Jr 23,1-3) que conduz as ovelhas à vida divina, como é a única porta, através da qual tal pode acontecer.
- ↑ Porta é acrescento da tradução.
- ↑ Os pastores recolhiam as suas ovelhas em grandes recintos comuns; de manhã cada um chamava pelas suas, as únicas que reconheciam a sua voz e, por isso, o seguiam.
- ↑ Palavra de difícil tradução, equivalente ao machal hebraico: não se trata de uma parábola, nem de uma alegoria, mas de algo intermédio.
- ↑ Refere-se à vida divina; a finalidade da vinda de Jesus é oferecê-la.
- ↑ Lit.: pastor belo, que se pode interpretar no sentido de ser modelo, cuja característica é especificada na afirmação seguinte: dar a vida pelas ovelhas.
- ↑ Lit.: põe a sua vida (como algo que Jesus pode tirar e recuperar: v. 17). Jesus oferece a sua vida biológica (psykhḗ), para que os seus discípulos possam receber a vida divina (zōḗ: v. 10).
- ↑ Ovelhas é, nas duas ocorrências do v., acrescento da tradução.
- ↑ A festa da Consagração ou Dedicação do Templo (Hanukkāh) celebrava-se dois meses após a das Tendas, para festejar a consagração do templo, depois de profanado por Antíoco IV Epifânio: colocou sobre o altar dos holocaustos, durante três anos (167-164 a.C.), o ídolo Baal Chamayim, versão oriental de Zeus, o supremo deus grego (1Mac 1,54; 2Mac 6,1-7). Na celebração o povo proclamava: Nunca mais!. Jesus apresenta-se como o verdadeiro consagrado/dedicado: é nele, que o Pai consagrou e enviou ao mundo (v. 36), e já não no templo, que se manifesta a presença de Deus (10,30; cf. 2,19-22).
- ↑ Lit.: Até quando levantas a nossa alma?.
- ↑ Ironia joanina: os judeus que, durante a festa, gritavam «nunca mais!» permitir a profanação do templo, preparam-se para profanar Jesus, verdadeira presença do Pai.
- ↑ Sl 82,6.
- ↑ Trata-se, as duas vezes, do mesmo verbo ginṓskō (reconhecer, saber): a primeira no aoristo conjuntivo (indica algo que é necessário começar), e a segunda no presente (consequência da primeira ação).
- ↑ 11,1-12,50 é uma secção de transição entre o Livro dos Sinais, concluído com um balanço da vida pública de Jesus (12,37-43), e o Livro da Hora da Peregrinação Gloriosa para o Pai (13,1-20,29), que acontece no contexto da peregrinação de Jesus para a celebração da Páscoa derradeira. A viagem é antecipada pela morte de Lázaro (11,1), tal como a sua ressurreição antecipa e ilumina a morte e ressurreição de Jesus.
- ↑ Episódio narrado apenas em 12,3, mas referido antecipadamente talvez porque a comunidade já o conhecia quando o evangelho foi escrito.
- ↑ Tradução de philéō para o distinguir de agapáō (amar).
- ↑ A morte e revivificação de Lázaro confirmam o que Jesus dissera acerca do poder que tem sobre a sua própria vida e a morte (10,18), bem como o de conceder a vida divina (10,10); o episódio é uma antecipação da hora da glorificação de Jesus, que acontecerá na sua morte e ressurreição (cf. 12,23ss).
- ↑ Lit.: Disse-lhes estas coisas e depois disto disse-lhes.
- ↑ Lit.: da morte dele.
- ↑ To'ma' em aramaico, e Dídymos em grego, significam gémeo.
- ↑ C. 3 quilómetros.
- ↑ Cf. v. 4 nota. A pergunta a Marta é feita também ao leitor, que no batismo recebeu a vida divina.
- ↑ Embora sublinhe fortemente a natureza divina de Jesus, Jo não deixa de recordar ao leitor que Jesus é verdadeiramente homem: como Filho de Deus ressuscitará Lázaro, como ser humano comove-se com a morte do amigo e o sofrimento de Marta e Maria.
- ↑ Tradução de philéō para o distinguir de agapáō (amar).
- ↑ Tal como na Criação (Gn 1,3ss), a Palavra é de tal maneira poderosa que basta ser pronunciada para realizar o que significa (Jo 1,2).
- ↑ Cf. Mt 26,57-68; Mc 14,53-65; Lc 23,66-71.
- ↑ Santo é acrescento da tradução por se tratar do templo (cf. Mt 24,15).
- ↑ A vida pública de Jesus começou numa semana cuidadosamente apresentada, que culminou com a antecipação da manifestação da glória em Caná, prenúncio da aliança messiânica (cf. 1,19-2,12 nota); o final da vida terrena de Jesus é também cuidadosamente apresentado, criando no leitor uma expectativa crescente, que culminará na sua glorificação pela morte e ressurreição.
- ↑ 300 gramas.
- ↑ Um denário (moeda romana de prata) era o pagamento normal por um dia de trabalho (Mt 20,2-13).
- ↑ Sl 118,25s. Trata-se de uma conceção muito política da missão do Messias. Sobre o significado de hossana, cf. Mc 11,9 nota.
- ↑ Combinação de vários textos proféticos: Zc 9,9; Is 40,9; Sf 3,14s.
- ↑ Trata-se de prosélitos, isto é, não-judeus convertidos ao judaísmo.
- ↑ A Jerusalém é acrescento da tradução.
- ↑ Quando têm por objeto Jesus (ou o Pai, ou o reino ou outra realidade espiritual), os verbos de visão expressam habitualmente experiências e percursos de fé (por ex.: 3,3; 9,37; 14,9; 19,37).
- ↑ É a hora para que tende todo o evangelho, razão da encarnação de Jesus (v. 27); o seu levantamento/crucificação permitirá que todos o possam ver (19,37) e a Ele sejam atraídos (v. 32), ou seja, recebam, pela fé no Filho de Deus, a salvação (3,16s).
- ↑ Tradução de philéō para o distinguir de agapáō (amar).
- ↑ Lit.: o que odeia, do verbo miséō, que na mentalidade semita não tem a radicalidade que possui no português; trata-se de menosprezar uma coisa em relação a outra mais importante (cf. Mt 5,43 nota).
- ↑ Vida traduz dois termos gregos diferentes presentes no v.: psykhḗ, a vida biológica; zōḗ, a vida eterna, própria de Deus.
- ↑ Sl 6,4.
- ↑ Evocação da angústia do Getsémani sinóptico (Mc 14,32ss).
- ↑ Sobre nome, cf. 1,12 nota.
- ↑ Isto é, Satanás (cf. 14,30).
- ↑ Cf. notas de 3,14-15; 12,23; 21,5.
- ↑ Cf. 1,5.
- ↑ Is 53,1. Lit.: o braço do Senhor; trata-se de um semitismo, que sublinha a força exercida.
- ↑ Is 6,9s (cf. Mt 13,13; Mc 4,12; Lc 8,10).
- ↑ A primeira parte do evangelho parece terminar originalmente aqui; os vv. que se seguem ligam melhor com o v. 36a. A afirmação é um desafio ao leitor: amar a glória de Deus acima de tudo e professar abertamente a fé em Jesus.
- ↑ Os temas apresentados nos caps. 13-14 são relidos nos caps. 15-16, que expressam uma fase posterior da comunidade, quando esta vive o drama das perseguições; o cap. 17 relê a oração de Jesus à luz da necessidade de a comunidade se manter unida. O que Jesus promete ou pede nesta secção (13-17) encontra a sua realização no encontro do Ressuscitado com os discípulos (20,19-29).
- ↑ A consumação (télos: fim/consumação) realizar-se-á na cruz (tetélestai: está consumado – 19,28.30). De notar a insistência no saber de Jesus (vv. 1.3): a consciência de que regressa ao Pai (cf. 3,13), levando à consumação o seu amor salvífico (cf. 3,14-16), depois da recíproca entrega da Mãe e do Discípulo Amado. Então poderá declarar: Está consumado (cf. 19,27 nota).
- ↑ Lavar os pés a outros era próprio de escravos não judeus. Daí a repulsa de Pedro. Trata-se de um gesto simbólico, que antecipa a morte de Jesus e representa toda a sua vida: despojou-se da sua dignidade (significada nas vestes) para manifestar o seu amor; o próprio Jesus interpreta o gesto e apresenta-o como um exemplo que os discípulos devem assumir (vv. 12-15).
- ↑ Lit.: Jamais me lavarás os pés para sempre.
- ↑ A expressão ter parte com é um semitismo que significa participação; aqui, no amor salvífico de Jesus. Para que tal aconteça, é preciso Pedro mudar de mentalidade e de critérios.
- ↑ O grego katharós tem um duplo sentido, ambos presentes na declaração de Jesus: limpo e puro.
- ↑ Sl 41,10.
- ↑ Evocação do nome divino revelado a Moisés; cf. 8,24.28.58; 18,5 (e provavelmente 4,26).
- ↑ Gesto necessário para poder olhar e falar com Jesus, tendo em conta a maneira greco-romana de comer (reclinando-se à mesa sobre um dos braços). Mas é também uma indicação simbólica: a presença da mesma expressão de 1,18, usada para falar da relação de intimidade de Jesus com o Pai (no seio/peito), indica que tal como, por essa razão, Jesus é o revelador do Pai, assim também o Discípulo Amado é o revelador de Jesus (cf. nota seguinte).
- ↑ É a primeira referência explícita ao Discípulo Amado, o autor do Evangelho (21,20.24), no sentido de ser a origem da tradição. Reaparece explicitamente em 19,25-27; 20,1-10; 21,7; 21,20-23, e de forma implícita em 18,15-16; 19,35 e provavelmente 1,40. O seu anonimato é um desafio ao leitor: tornar-se Discípulo Amado de Jesus (pela fidelidade e testemunho).
- ↑ Ao receber o pão (gesto que implica comunhão e intimidade), Judas entrega-se à mentira: o seu coração não está com Jesus, mas contra Ele. Por isso, entrou nele Satanás, o pai da mentira (cf. 8,44).
- ↑ Noite física e existencial: Judas está dominado pelas trevas.
- ↑ 8,22s.
- ↑ Cf. Mt 22,34-40; Mc 12,28-31; Lc 10,25-28. É novo no fundamento cristológico: Cristo é, com a total oferta da vida, simultaneamente fonte e modelo do amor cristão.
- ↑ Lit.: para mim.
- ↑ Ou habita em mim.
- ↑ O grego paráklētos significa advogado, defensor, intercessor. É outro, depois de Jesus (1Jo 2,1).
- ↑ Lit.: venho a vós.
- ↑ Sobretudo na assembleia dominical, onde o Senhor se faz presente e continua a conceder o Espírito (20,19ss).
- ↑ Lit.: em mim não tem nada.
- ↑ Possivelmente o texto original continuaria em 18,1, onde, depois desta dupla ordem, Jesus chega com os discípulos ao jardim, no outro lado do Cédron (sobre a inserção dos cap. 15-17, cf. nota introdutória de 13,1-17,26).
- ↑ A imagem da videira (tal como a da vinha) é atribuída pelo AT a Israel (Is 5,1ss; Jr 2,21; Ez 15,2ss; 19,10ss; Sl 80,9-16). Jesus proclama-se a genuína videira para falar da íntima unidade com os discípulos, garantida pelo Pai.
- ↑ O grego kathaírō (limpar) tem um duplo sentido, aqui presente, de podar ou tornar puro (o mesmo acontece no v. seguinte com o adjetivo katharós).
- ↑ O grego ménō (permanecer) significa também habitar e exprime a íntima união de Jesus com o Pai e com o Espírito Santo; o seu uso para falar da relação de Jesus com os discípulos significa que esta bebe daquela (vv. 10s).
- ↑ O grego kaí (e) tem aqui um sentido explicativo: que deis muito fruto, isto é, que vos torneis meus discípulos. Dar fruto é condição imprescindível para se tornar discípulo.
- ↑ Cf. 13,34 nota.
- ↑ Escolher do mundo no sentido de retirar do todo e pôr de parte; significa subtrair os discípulos ao espírito do mundo e dos seus critérios de vida.
- ↑ Sl 35,19; 69,5.
- ↑ Ou e também vós dais testemunho. A tradução tem em conta os dois critérios imprescindíveis para dar o testemunho original sobre Jesus: ter recebido o Espírito, que conduzirá à verdade plena do que o Senhor disse e fez (14,26; 16,13), e ter estado com Ele desde o princípio (cf. 1Jo 1,1; Lc 24,48-49 e, sobretudo, a escolha de Matias em At 1,21-22).
- ↑ Lit.: para que não vos seja pedra de tropeço; verbo skandalízō, que se refere à pedra (skándalon) que faz tropeçar (Mt 16,23par.), no sentido de pecar. Os discípulos ver-se-ão perante situações que porão à prova a fidelidade da sua fé em Jesus (cf. 6,61).
- ↑ Cf. 14,16 nota.
- ↑ Cf. 20,20: os discípulos alegraram-se ao ver o Senhor.
- ↑ Lit.: anunciarei acerca do Pai. Isto é, pela doação da própria vida, que expressa o amor de Deus e de Jesus (3,16; 10,11ss; 13,1; 15,13).
- ↑ A mesma expressão em 1,11 e 19,27.
- ↑ Jesus transforma em oração tudo o que antes afirmou, pedindo ao Pai pelos atuais e futuros discípulos.
- ↑ Lit.: os seus olhos.
- ↑ Semitismo com o sentido de cada ser humano.
- ↑ Lit.: para que tudo o que lhe deste lhes dê vida eterna. Cf. 10,10.
- ↑ Cf. 19,28.30.
- ↑ Reafirmação da pré-existência de Jesus (cf. 1,1ss).
- ↑ Sobre nome (também nos vv. 11.12.26), cf. 1,12 nota.
- ↑ Lit.: está junto de ti.
- ↑ Mundo no sentido negativo, como âmbito onde reina o Príncipe deste mundo (cf. 15,18; 1,7 nota); os discípulos já estão sob o senhorio de um outro rei: Jesus.
- ↑ Alguns mss. apresentam aqueles que me deste (cf. v. 12).
- ↑ Um só traduz, aqui e nos vv. 21.22.23, o numeral grego no neutro: uma só coisa.
- ↑ Não é a traição de Judas que cumpre a Escritura, mas o facto de nenhum se perder. Filho da perdição é um semitismo, para dizer que Judas se excluiu da salvação, entregando-se ao Mal.
- ↑ Lit.: a minha alegria plenificada.
- ↑ Cf. Mt 6,13.
- ↑ Ou santifica-os na verdade; o significado do verbo hagiázō é retirar, no sentido de pôr de parte para uma dedicação exclusiva a Deus. A preposição grega en tem provavelmente sentido instrumental: consagra-os/santifica-os com a verdade.
- ↑ Cf. v. 21 nota.
- ↑ Lit.: conheceram.
- ↑ Lit.: tudo o que estava a vir sobre Ele.
- ↑ Evocação do nome divino revelado no Sinai; daí a reação no v. 6 (cf. 8,24.28.54; 13,19; e provavelmente 4,26).
- ↑ Isto é acrescento da tradução.
- ↑ Tratando-se de palavras de Jesus (em 17,12), ao usar a fórmula para que se cumprisse, com que normalmente introduz as palavras da Escritura, o evangelista dá-lhes o mesmo peso que às desta.
- ↑ Cf. Mt 26,39.
- ↑ 11,50.
- ↑ Certamente o Discípulo Amado, que, na última ceia, na paixão e na ressurreição de Jesus, é referido sempre juntamente com Pedro (13,23s; 20,1-10; 21,7.20-23; cf. 13,23 nota), exceto junto à cruz (19,25-27.35).
- ↑ O verbo ficou parado (heistḗkei) sublinha que Pedro deixou de seguir Jesus. Ao ficar do lado de fora, enquanto Jesus está dentro, separa-se dele num crescendo que se consumará na tríplice negação. O outro discípulo, o Discípulo Amado, esforça-se para que isso não aconteça (nem a Pedro, nem ao leitor: a finalidade do seu livro é que o discipulado seja consistente e fiel).
- ↑ Ali é acrescento da tradução.
- ↑ O relato do processo judaico da paixão é reduzido porque este já aconteceu em toda a primeira parte do evangelho, desde o interrogatório a João Batista (1,19) até à decisão de matar Jesus (11,49-53).
- ↑ À tríplice negação (predita por Jesus: 13,38) corresponderá a tríplice reabilitação no amor (21,15ss).
- ↑ São sete cenas (18,28-32.33-38a.38b-40; 19,1-3.4-7.8-12.13-16a) ordenadas de modo concêntrico, que alternam entre o interior do pretório (Pilatos e Jesus) e o exterior (Pilatos e o povo, instigado pelas autoridades judaicas).
- ↑ O pretório era a residência oficial do pretor ou alto magistrado romano nas províncias.
- ↑ Ao entrar em casa de pagãos, um judeu ficava impuro, porque se considerava que aqueles enterravam aí as crianças abortadas (cf. mOhalot 18,7). Impuro, não podia comer a Páscoa, isto é, o cordeiro pascal.
- ↑ Isto é acrescento da tradução.
- ↑ Os romanos tinham retirado aos judeus o poder de condenar à morte; de acordo com a lei judaica, Jesus teria sido apedrejado (cf. 8,59; 10,31); segundo o costume romano, foi crucificado. Assim se cumpre o que Jesus anunciara sobre a sua morte (3,14; 8,28; 12,32-34; 13,31s).
- ↑ O kaí (e) poderá ter aqui sentido explicativo: o teu povo, isto é, os chefes dos sacerdotes.
- ↑ Sentido causativo; lit.: Pilatos tomou Jesus e chicoteou.
- ↑ Símbolos da sua dignidade real.
- ↑ Para os judeus é esta a verdadeira razão por que Jesus deve ser condenado, mas, quando percebem que surtiu efeito contrário em Pilatos (vv. 8-12a), invocam a questão política (v. 12b).
- ↑ Lit.: sentou (ekáthisen). Quem? Pilatos (uso intransitivo: sentou-se) ou Jesus (uso transitivo: fez Jesus sentar-se)? Formalmente Pilatos; o evangelista, porém, na sua típica ironia, provoca uma segunda leitura: quem verdadeiramente se senta para julgar é Jesus, a quem foi confiado o poder de o fazer (5,22).
- ↑ Meio-dia, hora a que no templo começava a imolação dos cordeiros pascais. O evangelista interrompe a narrativa para dizer ao leitor que Jesus é o verdadeiro cordeiro da Páscoa e aquele que tira o pecado do mundo, permitindo a comunhão de vida eterna com Deus (1,29.35; cf. 19,36).
- ↑ Afirmação que, para um judeu, é quase uma blasfémia: o único Senhor de Israel é Deus.
- ↑ Lit.: entregou-lho.
- ↑ A narrativa do caminho para o Calvário e da crucificação é reduzida ao mínimo; sublinha-se sobretudo o seu sentido teológico, com Jesus no centro, quase como que numa corte: é rei não só de Israel, mas do mundo inteiro, como se assinala nas três línguas do letreiro (vv. 19s).
- ↑ O uso do tempo perfeito em grego significa aqui uma ação cujos efeitos continuam no presente: o reinado de Jesus continua hoje e crescerá até à consumação, quando houver um só rebanho e um só pastor (10,16).
- ↑ As vestes referem-se ao manto real (v. 2), e as quatro partes evocam os quatro pontos cardeais (cf. Mt 24,31; Mc 13,27; Ap 6,8; 7,1; 20,8), reforçando a universalidade da realeza de Jesus já expressa no letreiro, na qual todos são chamados a tomar parte. A túnica, em contacto direto com a pele, é, na mentalidade bíblica, símbolo da pessoa; sendo sem costura, isto é, sem divisão, é sinal da unidade da natureza de Jesus, divina e humana.
- ↑ Isto é acrescento da tradução.
- ↑ Sl 22,19.
- ↑ Sobre o Discípulo Amado, cf. 13,23 nota.
- ↑ Segundo alguns, tem sentido causativo: por causa daquela hora, ou seja, na hora de Jesus nasce a sua nova família, a nova comunidade, representada na Mãe e no Discípulo Amado (cf. notas a 2,4 e 12,23).
- ↑ Toda a Escritura e não apenas determinada passagem.
- ↑ Cf. Sl 69,22; 63,2; 42,3.
- ↑ Cf. Sl 22,16; 69,22.
- ↑ Jesus entrega o seu espírito, o seu hálito de vida, ao Pai (cf. 3,8 nota). Mas o evangelista, com a expressão, sublinha que a morte de Jesus, tal como Ele prometera, é também o momento da dádiva do Espírito Santo (cf. 7,37-39; 16,7) à comunidade aqui representada na Mãe de Jesus e no Discípulo Amado (19,25-27.34), dom que se renova em todas as comunidades reunidas no primeiro dia da semana (20,22).
- ↑ Quebrar as pernas (crurifragium) provocava a morte por asfixia. Se os corpos permanecessem na cruz no dia seguinte, toda a terra de Israel ficaria impura (cf. Dt 21,22s) e a celebração da Páscoa impossibilitada.
- ↑ Vós acrediteis: o uso do presente, em grego, significa que se trata de gente que já acredita, mas com dificuldade em aceitar a morte de alguém que era Messias e Filho de Deus, precisando, por isso, de fortalecer/corrigir a fé: Cristo morreu verdadeiramente, mas a sua não é uma morte estéril. O evangelista vê, no facto das pernas não quebradas e na saída de sangue e água, um significado cristológico, eclesiológico e soteriológico preparado ao longo da obra: é necessário receber um Cristo inteiro (uma cristologia sem fraturas), como forma de manter a unidade eclesiológica e, assim, receber os dons soteriológicos. O sangue significa a vida de Jesus, doada para que os homens tenham a vida divina (6,53ss), isto é, o Espírito Santo, anunciado como essa água que sairia do seio de Jesus aquando da sua glorificação (4,13-15; 7,35-39). Numa posterior camada de sentido, o sangue referir-se-á à eucaristia (6,55) e a água ao batismo (3,5), os sacramentos de que vive a Igreja.
- ↑ Fusão de três passagens: Ex 12,10.46 e Nm 9,12 (sobre o cordeiro pascal a quem não se pode quebrar qualquer osso) e Sl 33,21 (sobre o Justo perseguido).
- ↑ Lit.: E outra Escritura diz. Trata-se de Zc 12,10 (cf. 12,12 nota; Ap 1,7).
- ↑ Lit.: sendo discípulo escondido de Jesus.
- ↑ Lit.: com Ele.
- ↑ 30 quilos; a quantidade evoca um sepultamento real. Sobre Nicodemos, cf. 3,1-15; 7,50-52.
- ↑ A pressa era motivada pelo declinar do dia; a pureza ritual para celebrar a Páscoa não permitia o contacto com um cadáver.
- ↑ Domingo, o dia do Senhor, como desde o princípio a comunidade cristã designa o dia da ressurreição (Ap 1,10).
- ↑ Cf. 13,23 nota. Tradução de philéō para o distinguir de agapáō (amar).
- ↑ Espera por Pedro, a quem reconhece primazia (21,15ss).
- ↑ Maria não reconhece Jesus pelo aspeto corporal (é o mesmo corpo, embora diferente) e nem sequer pela voz, mas pelo modo como Jesus a chama (cf. 10,3s.14s).
- ↑ O testemunho sobre o Ressuscitado é antes de mais uma experiência pessoal (vi) e só depois um anúncio. O verbo anunciar que rege os dois momentos sublinha a sua indissociabilidade.
- ↑ Lugar é acrescento da tradução.
- ↑ Lit.: Paz a vós, que traduz a expressão hebraica Chālōm 'alēikem (cf. Jr 4,10; Sl 122,8).
- ↑ É o mesmo Jesus (como denotam as chagas), mas a sua presença é diferente (entra estando as portas fechadas). Na comunidade dominical Ele ocupa o lugar central e, nela, continua a dirigir a palavra aos seus discípulos e a conceder-lhes a paz e o dom do Espírito Santo (cf. 19,30 nota), para serem mediadores do perdão, com que Ele, Cordeiro de Deus, tira o pecado do mundo (1,29.36). Tudo isto se atualiza nas assembleias dominicais de todos os tempos e lugares.
- ↑ Cf. 11,16 nota.
- ↑ O uso do presente, em grego, significa aqui que é necessário interromper algo que já estava a acontecer.
- ↑ A mais explícita profissão de fé na natureza divina de Jesus. No entanto, Jesus não a valoriza, sublinhando que a fé não é acreditar no que se vê, mas acreditar sem ver. Este é o grande desafio feito ao leitor do evangelho: acreditar de acordo com o testemunho do Discípulo Amado (cf. 19,35; 20,31; 21,24s).
- ↑ Cf. 19,35 nota.
- ↑ A finalidade do livro é apresentar e exortar a uma reta cristologia: Jesus é Messias e Filho de Deus; aceitá-la é condição para garantir a unidade da comunidade (vós) e a participação na vida divina. Sobre nome, cf. 1,12 nota.
- ↑ Cf. 11,16 nota.
- ↑ Ao todo são sete, número que significa totalidade: representam toda a Igreja, de cuja missão pastoral, orientada por Pedro, se vai falar (cf. Mt 4,18-22par.).
- ↑ Cf. Lc 5,4(ss).
- ↑ Ou Filhinhos. A pergunta, retórica, sublinha onde está o segredo de uma pesca (pastoral) bem sucedida: na obediência à palavra de Jesus.
- ↑ Lit.: já nem a conseguiam atrair: é o mesmo verbo hélkō de 12,32, onde Jesus prometera que, na sua morte e ressurreição, atrairia todos a si; por isso, as redes são atraídas para a margem, onde Ele se encontra.
- ↑ C. 100 metros.
- ↑ Ao barco é acrescento da tradução.
- ↑ Ou vinde almoçar, ou ainda vinde quebrar o jejum: no tempo de Jesus havia normalmente duas refeições, a primeira, a que se refere o texto, e o jantar. Tendo em conta os verbos e o texto seguinte, com um claro sabor eucarístico, este quebrar o jejum é também simbólico.
- ↑ O verbo vir causa estranheza, visto que Jesus já estava presente; talvez seja uma forma de invocar a sua vinda dominical, pois em 20,26 (cf. 20,19) é usado o mesmo verbo, especificando a vinda como eucarística.
- ↑ Cf. 21,12 nota.
- ↑ Cf. 18,27 nota.
- ↑ Jesus entrega a Pedro a missão de apascentar, mas recorda-lhe o fundamental: segui-lo, ser discípulo.
- ↑ O pronome o [seguia] é acrescento da tradução, que mantém a ambiguidade do grego sobre a quem é que o Discípulo Amado seguia: Jesus ou Pedro? Mais uma vez, parece intencional: o Discípulo Amado, seguindo Pedro, incumbido do ministério pastoral, está a seguir Jesus.
- ↑ De facto, ele permanece, no testemunho transmitido, agora conservado em livro.
- ↑ Escreveu no mesmo sentido causativo de 19,22: Pilatos não escreveu, mas fez escrever; o Discípulo Amado fez escrever, no sentido de estar na origem da tradição presente neste evangelho (cf. 13,23 nota).