Mc 1

From Biblia: Os Quatro Evangelhos e os Salmos
Jump to navigation Jump to search
INTRODUÇÃO
(1,1-13)


Título
(1,1)


1Princípio do evangelho de Jesus, Cristo, Filho de Deus[1].


Vinda de Jesus
(1,2-13)


João, o Batista (Mt 3,1-6.11; Lc 3,3-6.15s) – 2Tal como está escrito no profeta Isaías –

Eis que envio o meu mensageiro à tua frente[2],

que há de preparar o teu caminho[3].

3Uma voz que clama no deserto:

«Preparai o caminho do Senhor,

endireitai as suas veredas»[4]

4apareceu João Batista no deserto a proclamar um batismo de conversão[5] para perdão dos pecados. 5Acorria a ele toda a região da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém, e eram batizados por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados.

6João estava vestido com peles de camelo e com uma correia de couro à volta dos rins e alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre[6]. 7E proclamava, dizendo: «Atrás de mim vem aquele que é mais forte[7] do que eu; eu não sou digno de me inclinar para desatar[8] a correia das suas sandálias. 8Eu batizei-vos na água, mas Ele batizar-vos-á no Espírito Santo».


Batismo de Jesus (Mt 3,13-17; Lc 3,21s) – 9E aconteceu que, naqueles dias, veio Jesus de Nazaré da Galileia e foi batizado no rio Jordão por João. 10E imediatamente[9], ao sair da água, viu os céus rasgados e o Espírito, como uma pomba, a descer sobre[10] Ele. 11E uma voz surgiu dos céus: «Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo»[11].


Tentação de Jesus no deserto (Mt 4,1-11; Lc 4,1-13) – 12Imediatamente o Espírito o impeliu para o deserto, 13e no deserto esteve quarenta dias, sendo tentado por Satanás. Estava com os animais selvagens e os anjos serviam-no[12].


I
A MISSÃO DE JESUS NA GALILEIA E ARREDORES (1,14-8,26)


Início e conteúdo da missão (Mt 4,12-17; Lc 4,14s) – 14Depois de João ter sido preso, Jesus foi para a Galileia, proclamando o evangelho de Deus, 15dizendo: «Cumpriu-se o tempo e está próximo o reino de Deus; convertei-vos e acreditai no evangelho»[13].


Chamamento dos primeiros discípulos (Mt 4,18-22; Lc 5,1-11; Jo 1,35-51) – 16Ao passar junto ao mar da Galileia, viu Simão e André, irmão de Simão, lançando as redes no mar, pois eram pescadores. 17E disse-lhes Jesus: «Vinde atrás de mim, e farei com que vos torneis pescadores de homens»[14]. 18E imediatamente, deixando as redes, seguiram-no.

19Avançando um pouco, viu Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, que estavam no barco a consertar as redes, 20e imediatamente os chamou. Deixando o seu pai Zebedeu no barco com os assalariados, partiram atrás dele.


O DIA TÍPICO DE JESUS
(1,21-39)[15]


Na sinagoga de Cafarnaum. Cura de um endemoniado (Lc 4,31-37) – 21Entraram, então, em Cafarnaum. No sábado, tendo entrado na sinagoga, Ele começou imediatamente a ensinar, 22e estavam perplexos com o seu ensinamento, pois ensinava-os como quem tem autoridade e não como os doutores da lei.

23Ora, estava na sinagoga deles[16] um homem com um espírito impuro[17] e gritou, 24dizendo: «O que há entre nós e ti[18], Jesus de Nazaré? Vieste para nos destruir[19]? Sei quem Tu és: o Santo de Deus». 25Jesus repreendeu-o severamente, dizendo: «Cala-te e sai dele»[20]. 26Então o espírito impuro, sacudindo-o com violência e gritando com voz forte, saiu dele. 27Ficaram todos de tal modo estupefactos, que debatiam entre si, dizendo: «Que é isto? Um ensinamento novo, feito com autoridade! Dá ordens aos espíritos impuros e eles obedecem-lhe!». 28E a sua fama espalhou-se imediatamente por toda a parte, em toda a região da Galileia.


Em comunidade. Cura da sogra de Pedro (Mt 8,14s; Lc 4,38s) – 29Tendo saído da sinagoga, foram imediatamente para a casa de Simão e André, com Tiago e João[21]. 30Ora, a sogra de Simão estava deitada com febre, e imediatamente lhe falaram dela. 31Aproximando-se e agarrando-lhe a mão, levantou-a. A febre deixou-a, e ela começou a servi-los.


À porta. Curas e exorcismos (Mt 8,16; Lc 4,40s) – 32Ao cair da tarde, quando o sol se pôs, traziam-lhe todos os que tinham algum mal e os endemoniados. 33A cidade inteira estava reunida junto à porta. 34Curou muitos que tinham algum mal de vários tipos de doenças e expulsou muitos demónios, mas não permitia que os demónios falassem, porque o conheciam.


Com o Pai. Em oração (Mt 4,23; Lc 4,42-44) – 35De manhã muito cedo, ainda escuro, levantou-se, saiu e retirou-se para um lugar deserto, e aí rezava. 36Simão e os que estavam com ele foram à sua procura 37e, quando o encontraram, disseram-lhe: «Todos te procuram!». 38Ele disse-lhes: «Vamos a outra parte, às povoações vizinhas, a fim de proclamar aí também, pois foi para isso que Eu saí».

39E foi, pregando nas sinagogas deles por toda a Galileia e expulsando os demónios.


JESUS, OS PECADORES E A LEI
(1,40-3,6)


Purificação e cura de um leproso (Mt 8,2-4; Lc 5,12-16) – 40Veio ter com Ele um leproso[22], que, suplicando e caindo de joelhos, lhe disse: «Se quiseres, podes purificar-me». 41E Ele, profundamente compadecido[23], estendendo a sua mão, tocou-lhe e disse-lhe: «Quero: fica purificado!».42E imediatamente a lepra o deixou e ficou purificado. 43Advertindo-o severamente, imediatamente o despediu 44e disse-lhe: «Toma atenção, não digas nada a ninguém! Mas vai mostrar-te ao sacerdote e oferece pela tua purificação o que Moisés prescreveu, como testemunho para eles». 45Mas ele, depois de se ir embora, começou a proclamá-lo incessantemente, e o acontecimento divulgou-se de tal forma que Jesus já não podia entrar abertamente em nenhuma cidade. Ficava fora, em lugares desertos, e de toda a parte vinham ter com Ele.



  1. Este primeiro v. é o título programático da obra: o leitor é convidado a acolher Jesus não só como Cristo (o Messias esperado) mas também como Filho de Deus. Esta é a boa notícia (significado da palavra grega evangelho): em Jesus não só se cumprem, como são superadas as esperanças messiânicas, pois Ele não é apenas filho de David (Messias), mas filho do próprio Deus, tal como o Pai atesta logo no momento do batismo (a enquadrar o ministério de Jesus: 1,11) e na transfiguração (a emoldurar os anúncios da sua paixão, morte e ressurreição: 9,7). A formulação grega é ambígua de modo a possibilitar uma dupla leitura: Jesus é não só o anunciador desta boa notícia, como também o seu conteúdo. A maioria dos mss. apresenta o título Filho de Deus.
  2. Lit.: diante do teu rosto.
  3. Cf. Ml 3,1; Ex 23,20 (LXX).
  4. Is 40,3. Mc segue o texto dos LXX que indica o deserto como o lugar onde se faz ouvir a voz; o TM e o de Qumran apresentam o deserto como lugar onde se deve preparar o caminho.
  5. A ideia principal de conversão (metánoia) é a mudança de mentalidade, de modo de pensar e, consequentemente, de viver (o que vai mais longe do que arrependimento, como por vezes se traduz por causa da palavra latina paenitentia que tem esse significado). Este é também o primeiro e principal convite de Jesus (1,15).
  6. O cinto de couro parece querer ligar João a Elias, que também caminhava no deserto (2Rs 1,8; 1Rs 19,4), o que é confirmado por Jesus em 9,13. A roupa é a característica dos profetas (Zc 13,4). A frugalidade da alimentação apresenta João como um asceta, preocupado com o essencial: preparar o caminho do Senhor. Os diferentes pormenores sublinham a chegada dos tempos escatológicos.
  7. Mais forte é um qualificativo de Deus nos LXX (2Sm 22,32s).
  8. Lit.: de, inclinando-me, desatar.
  9. Advérbio muito frequente em Mc para apresentar Jesus em constante movimento, o que sublinha a urgência do seu ministério e da resposta que lhe é devida (cf. 1,18). É consequência da chegada dos tempos escatológicos (1,15).
  10. A preposição grega eis normalmente expressa o movimento direcionado, mas é usada pelo grego da koiné também com o sentido de sobre.
  11. Trata-se de uma teofania trinitária, que manifesta a presença do Pai e do Espírito Santo na missão de Jesus. A declaração do Pai evoca a imagem e missão do Servo do Senhor em Is 42,1. A pomba foi, para Noé, o sinal de que o castigo do dilúvio tinha terminado, representando a paz e a reconciliação com Deus (Gn 8,8-12). A sua descida da realidade de Deus (céu) à dos homens (terra) significa que, em Jesus, que batiza no Espírito Santo, se realiza em plenitude a reconciliação e a comunhão entre Deus e os homens. Por isso, com a morte de Jesus também o véu do templo, que separava o divino do profano, se rasgou em dois, de alto a baixo (15,38).
  12. A convivência com as feras refere-se à paz messiânica que restabelece a harmonia do Éden (cf. Is 11,6-9).
  13. Este é o conteúdo fundamental do evangelho: o reino de Deus fez-se próximo em Jesus. Por isso, a conversão consiste em acreditar no evangelho (kaí explicativo: convertei-vos, isto é, acreditai no evangelho; cf. 1,4 nota). Ora, tendo presente que Jesus é não só o anunciador do evangelho, mas também o seu conteúdo (1,1), converter-se significa acreditar em Jesus, tornar-se seu discípulo (1,16-20; 2,13-18).
  14. Atrás de Jesus, percorrer o seu caminho, aprender com Ele e fazer como Ele é a vocação primeira do discípulo (1,20; 8,33.34). A finalidade é a de que o Senhor os torne pescadores de homens. O mar não é o mundo natural dos homens, mas das forças demoníacas (5,13); os discípulos são chamados a dar continuidade à missão do Mestre: retirar os seres humanos do mundo onde o Mal é senhor e transportá-los para o reino onde a soberania é de Deus. Por isso, o Mar da Galileia (ou de Tiberíades, ou de Genesaré) é lugar frequente da pregação e ação de Jesus.
  15. O dia típico de Jesus: de manhã na sinagoga, onde revela o poder da sua palavra (1,21-28); à tarde com a comunidade na casa de Simão (1,29-31); ao cair do sol à porta, a curar e expulsar demónios (1,32-34); à noite em oração (1,35-38).
  16. Lit.: E imediatamente estava na sinagoga deles um homem. A expressão sinagoga deles revela que a comunidade de Mc já não se sente ligada à sinagoga judaica.
  17. Expressão judaica para falar dos demónios. Lit.: em espírito impuro, o que sublinha a possessão como despersonalização do homem.
  18. Expressão tipicamente judaica, que permite uma dupla resposta consoante o contexto: normalmente é expectável a negativa (é o caso; cf. 5,7), mas não exclui a possibilidade da positiva (cf. Jo 2,4).
  19. Trata-se de uma pergunta retórica: os demónios sabem quem Jesus é e que veio para destruir a soberania do Mal sobre os seres humanos.
  20. Jesus não admite que os demónios façam afirmações sobre a sua pessoa, pois não têm autoridade existencial e espiritual para tal. O mesmo acontece quando Pedro, embora proclamando Jesus como Cristo, o pretende moldar aos seus critérios (cf. 8,32 nota).
  21. A casa é símbolo da comunidade reunida (7,17; 9,28.33; 10,10); corresponderá à vida da comunidade primitiva em que as casas serviam de lugar de reunião para a catequese e para o culto. Por contraposição aparecem os de fora (4,11).
  22. Sobre a lepra, cf. Lv 13-14.
  23. O verbo grego tem o sentido de comover-se até às entranhas. Jesus sente no mais profundo do seu ser a situação daquele homem cuja lepra, para além do sofrimento físico, implica sofrimento social (os leprosos estavam proibidos de se aproximar das cidades e das pessoas sãs) e religioso (a sua doença era considerada um castigo e tornava-os religiosamente impuros). Daí o pedido: não apenas que Jesus o cure, mas que o torne puro.




Capítulos

Mc 1 Mc 2 Mc 3 Mc 4 Mc 5 Mc 6 Mc 7 Mc 8 Mc 9 Mc 10 Mc 11 Mc 12 Mc 13 Mc 14 Mc 15 Mc 16